TJDF APC - 948914-20120110482259APC
CONSTITUCIONAL. CIVIL. REGISTRO PÚBLICO. NOME. ALTERAÇÃO. SUPRESSÃO DE PATRONÍMICO DE FAMÍLIA. SITUAÇÃO EXCEPCIONAL. CACOFONIA JOCOSA. FALTA DE IDENTIFICAÇÃO. PRESERVAÇÃO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. VALOR SUPERIOR DO ORDENAMENTO JURÍDICO. SENTENÇA REFORMADA. 1. O nome civil integra os direitos da personalidade nos termos do artigo 16 e seguintes do Código Civil, e constitui um símbolo designativo da pessoa, isto é, como ela é conhecida no meio social e a indicação de sua ancestralidade. Em razão disso, o nome, como atributo da personalidade, está intimamente ligado à dignidade da pessoa humana, de maneira que é por meio dele que ela se projeta, se relaciona e se vê e é vista no meio social. Desse modo, ele deve exprimir uma realidade designativa, ou seja, estar condizente com a realidade vivida pela pessoa, sem artificialismo, e de forma a respeitar sua integridade moral e psíquica. 2. A respeito do nome civil, a legislação brasileira adotou a teoria da inalterabilidade relativa, de maneira que tanto o nome como o sobrenome podem ser alterados nas situações expressamente contidas em lei como em outras situações excepcionais não previstas pelo legislador, mas que são necessárias como forma de se afirmar os valores decorrentes da dignidade da pessoa humana. As hipóteses de alteração elencadas em lei decorrem do casamento, do divórcio, da adoção, da união estável, da substituição por apelidos públicos e notórios dentre outras e estão previstas no Código Civil e nos artigos 56 e seguintes da Lei de Registros Públicos. Por outro lado, em razão de o legislador não poder antever todas as hipóteses passíveis de alteração do prenome como do sobrenome de uma pessoa, a jurisprudência, calcada nos princípios constitucionais e na ponderação de interesses, tem caso a caso apreciado as situações fáticas e os argumentos trazidos pelas partes, para, de maneira fundamentada e racional, decidir pela alteração dos elementos designativos do nome civil. 3. No caso, a situação particular da apelante merece ser considerada para que seja excluído o patronímico de família PINTO constante de seu nome, sem que fosse colocado outro sugerido pelo Juízo. A respeito do sobrenome PINTO a apelante afirmou que desde seu primeiro casamento já não mais o utilizava. Ademais, a conjugação dele com o outro sobrenome LOLLI lhe apavora, vez que na infância foi vítima de brincadeiras e apelidos que a traumatizavam, o que impediria de retornar a utilização daquele patronímico de família. É certo que a análise individual de cada um dos sobrenomes da apelante não lhe causaria nenhum constrangimento. Contudo, está evidente que a conjugação dos dois pode causar uma cacofonia e revelar uma expressão jocosa referente a órgão sexual masculino. Tal expressão verbal inequivocadamente trouxe e trará transtornos à apelante em razão da baixa elevação cultural de nossa sociedade, que faz piada de tudo e de todos. Tanto isso é verdade que foi editada a Lei 13.185/2015 que visa combater o bullying - que foi a ação que vitimou a apelante em sua infância e adolescência - sobretudo por meio da educação. Contudo, enquanto não evoluirmos a ponto de se evitar o bullying, pessoas como a apelante não podem ter sua dignidade violada, o que impõe a supressão do sobrenome PINTO de seu nome. 4. Por outro lado, é certo que, conforme anotado na r. sentença, sempre que possível, o artigo 56 da Lei de Registros Públicos prevê a essencialidade dos apelidos de família, de maneira que eles, a rigor, devem integrar o nome da pessoa como forma de se demonstrar sua ancestralidade. Nesse diapasão, o juízo a quo sugeriu a substituição do sobrenome PINTO pelo SOUZA, como forma de preservar a referida regra. Entretanto, a regra inscrita no artigo 56 da Lei de Registros Públicos não é absoluta, devendo ser interpretada a partir dos princípios constitucionais, notadamente o da dignidade da pessoa humana que orienta a definição do nome civil das pessoas. No caso, além da conjunção do sobrenome PINTO com LOLLI causar uma cacofonia que perturbou e traumatizou a apelante, também o sobrenome SOUZA, de sua mãe enquanto solteira, não identificaria sua ancestralidade materna, vez que sua mãe há muito já deixou de utilizá-lo. Além disso, nota-se que para a apelante a utilização do sobrenome SOUZA lhe traria uma falta de identidade, pois não se reconheceria naquele sobrenome, o que, por certo, também de traria angustia e sofrimento. Como se não bastasse isso, desde o seu primeiro casamento, o que remonta há mais de 35 anos, quando foi substituído sobrenome PINTO pelo dos seus maridos, a referência à família de seu sobrenome sempre foi LOLLI, de modo que não traria nenhum prejuízo social a manutenção apenas deste patronímico de família. 5. Recurso conhecido e provido.
Ementa
CONSTITUCIONAL. CIVIL. REGISTRO PÚBLICO. NOME. ALTERAÇÃO. SUPRESSÃO DE PATRONÍMICO DE FAMÍLIA. SITUAÇÃO EXCEPCIONAL. CACOFONIA JOCOSA. FALTA DE IDENTIFICAÇÃO. PRESERVAÇÃO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. VALOR SUPERIOR DO ORDENAMENTO JURÍDICO. SENTENÇA REFORMADA. 1. O nome civil integra os direitos da personalidade nos termos do artigo 16 e seguintes do Código Civil, e constitui um símbolo designativo da pessoa, isto é, como ela é conhecida no meio social e a indicação de sua ancestralidade. Em razão disso, o nome, como atributo da personalidade, está intimamente ligado à dignidade da pessoa humana, de maneira que é por meio dele que ela se projeta, se relaciona e se vê e é vista no meio social. Desse modo, ele deve exprimir uma realidade designativa, ou seja, estar condizente com a realidade vivida pela pessoa, sem artificialismo, e de forma a respeitar sua integridade moral e psíquica. 2. A respeito do nome civil, a legislação brasileira adotou a teoria da inalterabilidade relativa, de maneira que tanto o nome como o sobrenome podem ser alterados nas situações expressamente contidas em lei como em outras situações excepcionais não previstas pelo legislador, mas que são necessárias como forma de se afirmar os valores decorrentes da dignidade da pessoa humana. As hipóteses de alteração elencadas em lei decorrem do casamento, do divórcio, da adoção, da união estável, da substituição por apelidos públicos e notórios dentre outras e estão previstas no Código Civil e nos artigos 56 e seguintes da Lei de Registros Públicos. Por outro lado, em razão de o legislador não poder antever todas as hipóteses passíveis de alteração do prenome como do sobrenome de uma pessoa, a jurisprudência, calcada nos princípios constitucionais e na ponderação de interesses, tem caso a caso apreciado as situações fáticas e os argumentos trazidos pelas partes, para, de maneira fundamentada e racional, decidir pela alteração dos elementos designativos do nome civil. 3. No caso, a situação particular da apelante merece ser considerada para que seja excluído o patronímico de família PINTO constante de seu nome, sem que fosse colocado outro sugerido pelo Juízo. A respeito do sobrenome PINTO a apelante afirmou que desde seu primeiro casamento já não mais o utilizava. Ademais, a conjugação dele com o outro sobrenome LOLLI lhe apavora, vez que na infância foi vítima de brincadeiras e apelidos que a traumatizavam, o que impediria de retornar a utilização daquele patronímico de família. É certo que a análise individual de cada um dos sobrenomes da apelante não lhe causaria nenhum constrangimento. Contudo, está evidente que a conjugação dos dois pode causar uma cacofonia e revelar uma expressão jocosa referente a órgão sexual masculino. Tal expressão verbal inequivocadamente trouxe e trará transtornos à apelante em razão da baixa elevação cultural de nossa sociedade, que faz piada de tudo e de todos. Tanto isso é verdade que foi editada a Lei 13.185/2015 que visa combater o bullying - que foi a ação que vitimou a apelante em sua infância e adolescência - sobretudo por meio da educação. Contudo, enquanto não evoluirmos a ponto de se evitar o bullying, pessoas como a apelante não podem ter sua dignidade violada, o que impõe a supressão do sobrenome PINTO de seu nome. 4. Por outro lado, é certo que, conforme anotado na r. sentença, sempre que possível, o artigo 56 da Lei de Registros Públicos prevê a essencialidade dos apelidos de família, de maneira que eles, a rigor, devem integrar o nome da pessoa como forma de se demonstrar sua ancestralidade. Nesse diapasão, o juízo a quo sugeriu a substituição do sobrenome PINTO pelo SOUZA, como forma de preservar a referida regra. Entretanto, a regra inscrita no artigo 56 da Lei de Registros Públicos não é absoluta, devendo ser interpretada a partir dos princípios constitucionais, notadamente o da dignidade da pessoa humana que orienta a definição do nome civil das pessoas. No caso, além da conjunção do sobrenome PINTO com LOLLI causar uma cacofonia que perturbou e traumatizou a apelante, também o sobrenome SOUZA, de sua mãe enquanto solteira, não identificaria sua ancestralidade materna, vez que sua mãe há muito já deixou de utilizá-lo. Além disso, nota-se que para a apelante a utilização do sobrenome SOUZA lhe traria uma falta de identidade, pois não se reconheceria naquele sobrenome, o que, por certo, também de traria angustia e sofrimento. Como se não bastasse isso, desde o seu primeiro casamento, o que remonta há mais de 35 anos, quando foi substituído sobrenome PINTO pelo dos seus maridos, a referência à família de seu sobrenome sempre foi LOLLI, de modo que não traria nenhum prejuízo social a manutenção apenas deste patronímico de família. 5. Recurso conhecido e provido.
Data do Julgamento
:
15/06/2016
Data da Publicação
:
24/06/2016
Órgão Julgador
:
5ª TURMA CÍVEL
Relator(a)
:
MARIA IVATÔNIA
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