main-banner

Jurisprudência


TJDF APC - 952938-20150110393810APC

Ementa
CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C REPARAÇÃO DE DANOS. PRELIMINAR: IRREGULARIDADE FORMAL DO APELO.REJEIÇÃO. MÉRITO: BLOG DO EDIVERDADE. VEICULAÇÃO DE MATÉRIA OFENSIVA AO AUTOR, EX-ADMINISTRADOR REGIONAL DO VARJÃO. PROVEDOR DE SERVIÇOS DE INTERNET. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA. PRESSUPOSTOS AUSENTES. CONTROLE EDITORIAL. INEXISTÊNCIA. APRECIAÇÃO E NOTIFICAÇÃO JUDICIAL. NECESSIDADE. ART. 19, § 1º, DA LEI N. 12.965/14 (MARCO CIVIL DA INTERNET). DANO MORAL AFASTADO. RECURSO DESPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA. 1. Segundo o Enunciado Administrativo n. 2 do STJ, aos recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016), como é o caso dos autos, devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas, até então, pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. 2. Ostentando o recurso de apelação do autor fundamentos de fato e de direito hábeis, em tese, a rechaçar a conclusão da sentença (CPC/73, art. 514, II), rejeita-se a preliminar de irregularidade formal do apelo. 3. A Constituição Federal garante a livre manifestação do pensamento e a liberdade de imprensa (arts. 5º, IVe XIV, e 220), indispensáveis ao regime democrático. Afinal, a transmissão de informações enseja a difusão de idéias/debates, possibilitando à sociedade, como destinatária da informação, o exercício do juízo crítico e a formação de opinião. Além disso, também se preocupou a CF em resguardar a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, garantindo, em caso de violação, a correspondente indenização por danos morais e materiais, bem como o direito de resposta (CF, art. 5º, V e X). Evidenciada colisão entre esses direitos constitucionais, cabe ao julgador ponderar os interesses em conflito e dar prevalência àquele que segundo as circunstâncias jurídicas e fáticas for mais justo, mediante a utilização da proporcionalidade. 4. No âmbito da internet, a Lei n. 12.965/14, conhecida como Marco Civil da Internet, estabelece princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da internet no Brasil, além de determinar as diretrizes para atuação da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios em relação à matéria, tendo como fundamento o respeito à liberdade de expressão, comunicação e manifestação do pensamento (arts. 2º, 3º, I, 4º, II, e 8º), sem se olvidar da proteção à intimidade e à privacidade, resguardando eventual indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação (arts. 3º, II, 7º, I e 8º). Tal legislaçãoentrou em vigor em 23/6/2014, ou seja, anteriormente aos fatos narrados pelo autor, sendo aplicável ao caso. 5. Com o advento da Lei n. 12.965/14, a responsabilidade civil dos provedores de internet sofreu significante modificação. 5.1. Quanto aos casos anteriores ao Marco Civil da Internet (Lei n. 12.965/14), de acordo com o acórdão paradigmático do REsp n. 1308830/RS, da lavra da insigne Rel. Ministra Nancy Andrighi (Terceira Turma, julgado em 08/05/2012, DJe 19/06/2012), firmou-se o entendimento de que os provedores de internet: a) não respondem objetivamente pela inserção no sítio, por terceiros, de informações abusivas; b) não são obrigados a realizar um controle prévio sobre o conteúdo das informações postadas pelos usuários; c) devem, assim que notificados sobre a existência de dados ilegais, removê-los, no prazo de 24h, sob pena de responsabilização em razão da inércia; d) devem manter um sistema eficaz de identificação de seus usuários. 5.2. Após o Marco Civil da Internet, os provedores de internet, embora não tenham o dever de fiscalização prévia do teor das informações postadas na web por cada usuário, somente poderão ser responsabilizados civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiro se, após ordem judicial específica, não tomar as providências cabíveis para tornar indisponível o conteúdo tido por infringente, conforme arts. 18 e 19 da legislação específica. Ou seja, o comando da Lei n. 12.965/14 é oposto ao entendimento anterior do STJ de que a notificação poderia ser extrajudicial, sendo necessária, portanto, a criação de um mecanismo de litigiosidade para fins de responsabilização do provedor de internet. 5.3. Não obstante as críticas a essa nova forma de disciplinar a matéria, fato é que, por escolha do legislador, a partir do advento do Marco Civil da Internet, cabe ao Poder Judiciário, e não ao provedor de internet, quando provocado, a missão de analisar se determinada manifestação deve ou não ser extirpada da rede mundial de computadores e, se for o caso, fixar a reparação civil contra o real responsável pelo ato ilícito. Somente o descumprimento da ordem judicial, determinando a retirada específica do material ofensivo, pode ensejar a reparação civil do provedor (REsp 1568935/RJ, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 05/04/2016, DJe 13/04/2016). 6. No particular, embora o autor tenha sido Administrador Regional do Varjão/DF e, portanto, esteja naturalmente sujeito a fiscalização e críticas que digam respeito ao exercício de sua função pública, verifica-se que as matérias publicadas no blog do Ediverdade ultrapassam a esfera da liberdade de manifestação do pensamento e do direito à informação, configurando abalo a direitos da personalidade. Essa abusividade é incontroversa, ante a falta de insurgência por parte do provedor, limitando-se a discussão à sua responsabilização ou não a título de danos morais. 7. Em que pese essa situação desabonadora, não há falar em condenação do provedor ao pagamento de danos morais. Isso porque a responsabilidade deve ser carreada ao autor do ilícito e não ao intermediário da transmissão (SANTOS, Antonio Jeová, in Dano moral indenizável, 2016, p. 365). O provedor de internet somente poderia responder por eventual dano moral se, condenado a minimizar os danos do autor (suspendendo a divulgação do conteúdo e identificando seu responsável), ficasse inerte, fato que, nesse momento, ainda é prematuro afirmar, mesmo se admitindo a obrigação imposta em sede de tutela antecipada, conforme art. 19 da Lei n. 12.965/14. Ademais, se os provedores se dessem ao trabalho de bloquear todo e qualquer conteúdo, estariam exercendo censura prévia, vulnerando o art. 5º, IV e IX, da CF. 8. Preliminar de irregularidade formal do apelo rejeitada. Recurso conhecido e desprovido. Sentença mantida.

Data do Julgamento : 06/07/2016
Data da Publicação : 11/07/2016
Órgão Julgador : 1ª TURMA CÍVEL
Relator(a) : ALFEU MACHADO
Mostrar discussão