main-banner

Jurisprudência


TJDF APC - 964711-20150110250472APC

Ementa
CIVIL E DIREITO DO CONSUMIDOR. INCORPORAÇÃOIMOBILIÁRIA. UNIDADE AUTÔNOMA. CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA. IMÓVEL EM CONSTRUÇÃO. PRAZO DE ENTREGA. PREVISÃO DE DILATAÇÃO SEM NECESSIDADE DE JUSTIFICAÇAO. LEGITIMIDADE.TERMO FINAL. INOBSERVÂNCIA. ENTRAVES NO LICENCIAMENTO DA OBRA E OBTENÇÃO DO HABITE-SE. AUSÊNCIA DE JUSTIFICATIVA. FATOS COMPREENDIDOS PELA ÁLA DE PREVISIBILIDADE DO NEGÓCIO. INADIMPLEMENTO DA CONSTRUTORA. CARACTERIZAÇÃO. ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL. NÃO CARACTERIZAÇÃO. INADIMPLÊNCIA SUBSTANCIAL. FALTA DE ENTREGA DO BEM PROMETIDO. RESCISÃO DO CONTRATO. DIREITO DA PROMITENTE COMPRADORA. RESTITUIÇÃO DAS PARTES AO ESTADO ANTERIOR. DEVOLUÇÃO INTEGRAL DAS PARCELAS PAGAS. IMPERATIVO LEGAL. SINAL. NATUREZA. ARRAS CONFIRMATÓRIAS. RETENÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. COMPREENSÃO COMO PRINCÍPIO DE PAGAMENTO. REPETIÇÃO. INDENIZAÇÃO A TÍTULO DE LUCROS CESSANTES E MULTA CONTRATUAL. CUMULAÇÃO. INVIABILIDADE. NATUREZA COMPENSATÓRIA DA MULTA. MAJORAÇÃO DA PENA CONTRATUAL. REVERSÃO DA DISPOSIÇÃO MORATÓRIA CONVENCIONADA. INVIABILIDADE. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DE DESEQUILÍBRIO CONTRATUAL. ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA. INCC - ÍNDICE NACIONAL DE CUSTO DA CONSTRUÇÃO. ÍNDICE SETORIAL. UTILIZAÇÃO. INADEQUAÇÃO. JUROS MORATÓRIOS. RESPONSABILIDADE CONTRATUAL. CITAÇÃO. TERMO INICIAL. VERBAS SUCUMBENCIAIS. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA E PROPORCIONAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. EXISTÊNCIA DE CONDENAÇÃO. ARBITRAMENTO. PARÂMETROS. VALOR DA CONDENAÇÃO. MULTA DO ARTIGO 475-J DO CPC DE 1973 (ART. 523 DO CPC DE 2015). INCIDÊNCIA. PRÉVIA INTIMAÇÃO DO DEVEDOR. POR PUBLICAÇÃO. 1. Desde que pactuada em prazo razoável e compatível com o porte do empreendimento a ser executado, não se reveste de ilegalidade ou abusividade a cláusula que prevê a prorrogação do prazo de entrega do imóvel em construção prometido à venda, independentemente de justa causa, pois encerra a previsão regulação consoante a natureza das atividades inerentes à construção civil, pois sujeita a fatores que, conquanto previsíveis, não estão afetados à álea de previsibilidade sistemática e precisa da construtora, tais como as intempéries climáticas, a falta de mão-de-obra, de materiais e maquinários, legitimando que se acautele e estabeleça a prorrogação como fórmula justamente de viabilizar a conclusão do empreendimento dentro do prazo estimado e participado ao adquirente. 2. O descumprimento sem motivo justificado, pela construtora e incorporadora, do prazo estabelecido em compromisso de promessa de compra e venda para a entrega da unidade imobiliária negociada caracteriza inadimplemento contratual culposo, fazendo emergir, para a promissária adquirente, o direito de pleitear a rescisão judicial do contrato, e, operado o distrato por culpa das promitentes vendedoras, devem as partes ser conduzidas ao estado anterior ao nascimento do negócio. 3. A teoria do substancial adimplemento, emergindo de criação doutrinária e pretoriana coadunada com os princípios informativos do contrato e volvida a obstar o uso desequilibrado do direito de resolução por parte do credor em prol da preservação da avença, quando viável e for de interesse dos contraentes, mediante ponderação do adimplido com o descumprido e aferido que fora insignificante, não é aplicável à hipótese de contrato de promessa de compra e venda em que a promissária vendedora deixa de entrega o imóvel no prazo prometido, à medida em que, não concluído e entregue a coisa, não subsiste adimplemento substancial parcial a legitimar a preservação do concertado, ainda que solvido parcialmente o preço ajustado. 4. Aferida a culpa da construtora pela rescisão contratual em virtude do atraso excessivo e injustificado em que incidira na conclusão do empreendimento, repercutindo, por consequência, no prazo limite para entrega do imóvel contratado, a promissária adquirente, optando pelo desfazimento do negócio, faz jus à devolução das parcelas do preço pagas, na sua integralidade, por traduzir corolário lógico e primário do desfazimento do contrato, não assistindo à alienante suporte para reter qualquer importância que lhe fora destinada. 5. As arras confirmatórias consubstanciam pacto acessório cuja finalidade é a entrega de algum bem volvido a assegurar ou confirmar a obrigação principal assumida, e, traduzindo obrigação acessória destinada a confirmar a celebração do negócio jurídico, sendo da mesma espécie que a prestação principal - como no caso de promessa de compra e venda de imóvel em construção -, transmuda-se em início de pagamento para efeito de amortização da dívida (CC, art. 417), resultando que, rescindido o negócio, o valor pago a título de sinal pelo promitente comprador deve integrar o montante que lhe deve ser restituído, observado o direito de retenção do percentual equivalente à cláusula penal, como consectário da rescisão, na forma simples. 6. Contemplando o contrato vedação ao arrependimento e regulação acerca da irretratabilidade e irrevogabilidade da convenção, o vertido pelo promissário adquirente à guisa de sinal encerra natureza de arras confirmatórias, servindo para confirmar a celebração do negócio e transmudando-se em início de pagamento, não ostentando a natureza indenizatória própria das arras penitenciais, ensejando que, rescindido o negócio por culpa do adquirente, as arras devem-lhe ser restituídas, pois compreendidas no que vertera em pagamento do preço, notadamente quando contempla o contrato cláusula penal destacada (CC, arts. 417 e 420). 7. Configurado o atraso injustificado na entrega do imóvel prometido à venda, considerado, inclusive, o prazo de prorrogação convencionado, ensejando que a consumidora ficasse privada de dele usufruir economicamente durante o interstício em que perdurara a mora da construtora, assiste-lhe o direito de ser compensada pecuniariamente pela vantagem econômica que deixara de auferir no interregno em que persistira a mora, consoante a cláusula compensatória prevista contratualmente. 8. A cláusula penal que prescreve que, incorrendo a promitente vendedora em mora quanto à conclusão e entrega do imóvel que prometera à venda, sujeitar-se-á a pena convencional equivalente a 0,5% do valor do preço convencionado, por mês de atraso, encerra nítida natureza compensatória, compreendendo, além da sanção motivada pela inadimplência, os prejuízos experimentados pela promissária compradora com o atraso traduzidos no que deixaram de auferir com a fruição direta. 9. A natureza compensatória e sancionatória da cláusula penal encerra a apreensão de que a pena convencional compreende, além da penalização da inadimplente, os prejuízos experimentados pelo contratante adimplente, resultando que, optando por exigir indenização superior à convencionada, deve comprovar que os prejuízos que sofrera efetivamente excederam o prefixado na cláusula penal, resultando que, não evidenciando o promissário comprador que o que deixara de auferir com o imóvel prometido enquanto perdurara o negócio suplanta o que lhe é contratualmente assegurado, representando a prefixação dos prejuízos que sofrera, não pode ser contemplado com qualquer importe a título de lucros cessantes (CC, art. 416, parágrafo único). 10. A cláusula penal de conteúdo compensatório destina-se a sancionar a inadimplente de forma proporcional ao inadimplemento e assegurar a composição dos prejuízos experimentados pela contraparte, e não fomentar ganho indevido ao contratante adimplente, derivando que, qualificada a mora da promissária vendedora na entrega do imóvel que prometera a venda, deve sofrer a incidência da disposição penal, que, contudo, deve ser interpretada em consonância com seu alcance e destinação, que afastam qualquer composição superior ao que prescreve se não comprovado que os prejuízos experimentados pelo adimplente superam o que alcança, inclusive porque a inadimplência da promitente vendedora não pode ser transformada em fonte de locupletamento ilícito ao adimplente (CC, art. 884). 11. Conquanto inexorável que o retardamento na entrega de imóvel em construção seja passível de irradiar a incidência de multa contratual, o reconhecimento desse fato demanda a aferição de previsão contratual, resultando que, existente no instrumento contratual previsão de multa arbitrata em determinado percentual em benefício da adquirente, inviável a cominação de sanção à construtora mediante reversão da cláusula penal que regulava o efeito da mora da adquirente no pagamento das parcelas convencionadas sob o prisma da equalização da relação obrigacional, devendo prevalecer a multa compensatória encartada expressamente em cláusula contratual, vez que encontra previsão expressa no acordo estabelecido entre as partes e, traduzindo a prefixação da sanção derivada da mora e a composição das perdas irradiadas pela inadimplência, ostenta natureza sancionatória e compensatória. 12. Conquanto ostente o negócio de promessa de compra e venda que enlaçara em seus vértices construtora e incorporadora e pessoa física destinatária final do imóvel negociado natureza de relação de consumo, a interseção do judiciário sobre as cláusulas contratuais avençadas somente se afigura legítima, como forma de ser preservado o equilíbrio da relação negocial, em se deparando com disposições abusivas, iníquas ou desvantajosas para a consumidora, porquanto ainda sobeja vigorante como princípio informador do direito obrigacional a autonomia da vontade dos contratantes (CDC, art. 51, IV, e § 1º). 13. Contemplando o contrato de promessa de compra e venda cláusula penal de natureza compensatória para a hipótese de inadimplemento da promissária vendedora, que compreende sanção e compensação pelo inadimplemento, soa extravagante e carente de lastro material se ventilar, a par da sua aplicação, sua majoração e, ainda, a inversão da disposição penal endereçada à consumidora para a hipótese de incorrer em mora quanto ao pagamento de parcelas do preço, porquanto, sob essa ótica, a par de se vulnerar a autonomia de vontade, se estaria criando obrigação agregada à cláusula penal já convencionada, implicando nítida invasão sobre o convencionado e, à guisa de se equalizar a relação, fomentando desequilíbrio na relação negocial em favor da consumidora. 14. A atualização monetária se qualifica como simples instrumento destinado a assegurar a intangibilidade da obrigação, resguardando sua identidade no tempo mediante o incremento do seu valor nominal com índice de correção apurado desde que fora fixada e até sua efetiva liquidação ante sua sujeição à ação da inflação, que redunda em mitigação da sua real e efetiva expressão pecuniária, donde emerge que, de molde a ser assegurada sua destinação teleológica, deve ser paramentada por índice que reflete os efeitos genéricos da inflação sem atrelamento a setor empresarial específico, como é o caso do INCC, cuja utilização deve ficar adstrita às hipóteses de indexação de obrigações provenientes de imóveis em construção, não se afigurando legítima sua extensão e utilização para atualização de parcelas vertidas em razão de rescisão contratual, ainda que tivesse o negócio como objeto a compra e venda de imóvel em construção, devendo ser utilizado nessa hipótese, como indexador, o INPC. 15. A responsabilidade da promitente vendedora pela restituição à consumidora dos valores advindos do distrato do negócio entabulado é de natureza contratual, o que determina que, rescindido o negócio por sua culpa, os juros moratórios incidentes sobre a condenação que lhe fora imposta sujeitem-se à regra geral, tendo como termo inicial a citação, pois é o ato que demarca o momento em que, ciente da sua obrigação, incorre em mora. 16. O parcial acolhimento da pretensão formulada, resultando em êxito e decaimento parcial quanto ao pedido, enseja a caracterização da sucumbência recíproca, emergindo da inferência a necessidade de as verbas sucumbenciais serem rateadas de forma ponderada com a resolução como forma de serem conformadas ao preceituado pelo legislador processual, compensando-se os honorários advocatícios (CPC/1973, art. 21, e CPC/2015, art. 86). 17. Encerrando a ação pretensão de natureza condenatória e acolhido parcialmente o pedido, os honorários advocatícios devidos aos patronos das partes como contrapartida pelos serviços que realizaram, ponderados os trabalhos efetivamente executados, o zelo com que se portaram, o local e tempo de execução dos serviços e a natureza e importância da causa, devem necessariamente ser mensurados em percentual incidente sobre o valor da condenação, ensejando que sejam mensurados de conformidade com esses parâmetros de forma a ser privilegiada a previsão legal (CPC/1973, art. 20, §§ 3º e 4°, CPC/2015, art. 85, §2°). 18. Consoante princípio de hermenêutica, nenhum dispositivo legal pode ser interpretado de forma isolada e deslocado do contexto normativo em que está inserido, o que conduz à certeza de que, cotejados sistematicamente os artigos 475-B e 475-J do CPC, a deflagração do cumprimento de sentença é condicionada, sempre, à iniciativa do credor, que, inclusive, ao reclamar sua iniciação, deve ilustrar a pretensão com memória atualizada e discriminada do cálculo que viabilizara a liquidação do débito, resultando que, ainda não mensurada a obrigação por quem interessa sua satisfação, o obrigado está impossibilitado de solvê-la espontaneamente como forma de safar-se da incidência da sanção processual destinada a conferir efetividade e autoridade à condenação que lhe fora imposta. 19. Estando a deflagração da fase executiva condicionada à iniciativa do credor, não se iniciando por inércia em razão do advento da coisa julgada, a sanção processual contemplada pelo artigo 475-J do CPC de 1973 (CPC/2015, art. 523) como forma de viabilizar a rápida materialização da condenação e assegurar autoridade ao provimento jurisdicional condenatório tem sua incidência condicionada à prévia intimação do devedor, por publicação, para satisfazer espontaneamente a obrigação que o aflige, não se coadunando com a exegese sistemática da regulação normativa imprimida ao procedimento do cumprimento de sentença sua incidência independentemente da inércia do credor e em razão do aperfeiçoamento do trânsito em julgado do provimento condenatório. 20. Apelações conhecidas. Apelação das rés parcialmente provida. Apelação da autora desprovida. Unânime.

Data do Julgamento : 06/07/2016
Data da Publicação : 23/09/2016
Órgão Julgador : 1ª TURMA CÍVEL
Relator(a) : TEÓFILO CAETANO
Mostrar discussão