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Jurisprudência


TJDF APC - 974438-20130111590273APC

Ementa
ADMINISTRATIVO. CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. HOSPITAL PÚBLICO. LONGA ESPERA. AUSÊNCIA DE DIAGNÓSTICO DE APENDICITE. POSTERIOR ATENDIMENTO PELA REDE PARTICULAR DE SAÚDE. MÁ PRESTAÇÃO DO SERVIÇO PÚBLICO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. PRESSUPOSTOS PRESENTES. DANO MATERIAL. RESTITUIÇÃO DO VALOR GASTO COM A CIRURGIA DE EMERGÊNCIA REALIZADA NA REDE PRIVADA DE SAÚDE. POSSIBILIDADE. DANOS MORAIS. CONFIGURAÇÃO. QUANTUM. REDUÇÃO. OBEDIÊNCIA AOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. HONORÁRIOS RECURSAIS. NOVA SISTEMÁTICA DO CPC/2015. DESCABIMENTO. CONFUSÃO ENTRE CREDOR E DEVEDOR. SÚMULA N. 421/STJ.RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. SENTENÇA REFORMADA EM PARTE. 1. Segundo o Enunciado Administrativo n. 3 do STJ, aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016), como é o caso dos autos, devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC. 2. A teoria do risco administrativo constitui fundamento do regramento inserto no art. 37, § 6º, da CF - reforçado pelos arts. 43, 186 e 927 do CC -, que disciplina a responsabilidade civil objetiva do Poder Público pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, ressalvado o direito de regresso contra os causadores do dano, se houver, por parte destes, culpa ou dolo. Já noscasos em que o dano decorre de uma omissão administrativa, a responsabilidade civil do Estado é subjetiva, fundada na teoria da falta de serviço, impondo à parte ofendida a demonstraçãode que o dano é consequência direta da culpa no mau funcionamento ou inexistência de um serviço afeto à Administração Pública. 3. Tratando-se de erro médico imputado ao Estado, e em que pese a existência de posições dissonantes no âmbito do TJDFT acerca da natureza da responsabilização, se de cunho subjetivo (exige a comprovação de culpa/dolo) ou objetivo (do risco), é sempre necessária a demonstração da conduta tida por irregular e do nexo causal dessa atuação com o prejuízo experimentado pelo administrado, para fins de reparação de danos. 4. Segundo o acervo probatório, o autor deu entrada no Hospital Regional da Asa Norte - HRAN na madrugada do dia 12/12/2012 e não houve o diagnóstico de apendicite, mesmo após 8 horas de espera, recebendo alta médica e sendo liberado para repouso. Consta do prontuário que o paciente teria informado ao médico responsável pelo atendimento que sentia fortes dores abdominais há mais ou menos 14 horas. 4.1. O caso demandava investigação mais aprofundada, não tendo o médico plantonista se utilizado de todos os meios e exames ao seu alcance, ou seja, não realizou investigação adequada em relação ao quadro clínico do autor. Tanto é assim que, no mesmo dia, o autor foi atendido na rede privada de saúde, ocasião em que foi constatada a presença de apendicite aguda e realizada a cirurgia de emergência (apendicectomia), com a necessidade, ainda, de outra intervenção, por apresentar no pós-operatório quadro de abdômen agudo obstrutivo. 4.2. Segundo a prova oral, o exame físico poderia dar quase certeza do diagnóstico, contudo, a realização de tomografia permitiria a exatidão de quase 95% do diagnóstico. Nesse passo, as medidas adotadas no hospital público foram paliativas, não tendo sido realizado o diagnóstico da doença. 4.3. Embora o Distrito Federal tenha defendido que o diagnóstico de apendicite é complexo, não trouxe aos autos qualquer prova dessa alegação, pugnando, inclusive, pela desistência da prova pericial. Sob esse panorama, não é crível exigir do autor que retornasse ao nosocômio público para a realização de tratamento, haja vista que de lá havia sido liberado, após 8 horas de espera, sem diagnóstico preciso. 4.4. Desse modo, sobressai evidente a falha na prestação do serviço hospitalar público e, conseguintemente, o dever de reparação de danos, ante a omissão do diagnóstico do autor, por falta de investigação adequada, com a necessidade de intervenção da rede particular de saúde para solucionar o caso. 5. O critério para o ressarcimento dos prejuízos materiais encontra-se nos arts. 402 e 403 do CC, que compreende os danos emergentes (diminuição patrimonial ocasionada à vítima) e os lucros cessantes (frustração da expectativa de um lucro esperado), sendo necessária a comprovação da efetiva perda patrimonial. 5.1. No caso, cabível a restituição da quantia de R$ 32.819,17, referente ao procedimento cirúrgico de emergência. 6. O dano moral se relaciona diretamente com os prejuízos ocasionados a direitos da personalidade, cuja violação afeta diretamente à dignidade do indivíduo e constitui motivação suficiente para fundamentar uma ação dessa natureza. 6.1. No particular, patente a existência de violação a direitos da personalidade, tendo em vista que, em razão da ausência de diagnóstico tempestivo e preciso, o autor passou por várias horas de dor e angústia quanto à solução de seu quadro clínico, com risco premente de danos maiores à vida, o que configura grave falha na prestação do serviço público de saúde (CF, art. 5º, V e X). 7. A quantificação dos danos morais deve obedecer a critérios de razoabilidade e proporcionalidade, levando-se em conta, além da necessidade de compensação dos danos sofridos, as circunstâncias do caso, a gravidade do prejuízo, a situação do ofensor e a prevenção de comportamentos futuros análogos. Normativa da efetiva extensão do dano (CC, art. 944). 7.1. Embora o autor tenha passado por um longo período de espera e dor no hospital público, sem o diagnóstico clínico, com a necessidade de procura da rede particular de saúde para solucionar esse quadro, tal peculiaridade não justifica o vultoso montante arbitrado em 1º Grau. Nesse passo, impõe-se a redução do valor dos danos morais de R$ 20.000,00 para R$ 8.000,00. 8. Não foram fixados honorários sucumbenciais recursais na espécie (Enunciado Administrativo n. 7 do STJ), haja vista que a ação foi proposta pela Defensoria Pública em desfavor do Distrito Federal, ente que a mantém, extinguindo-se a obrigação de pagar honorários, em face da confusão entre credor e devedor, conforme art. 381 do CC e Súmula n. 421/STJ. 9. Recurso conhecido e parcialmente provido para reduzir o valor dos danos morais para R$ 8.000,00. Demais fundamentos da sentença mantidos.

Data do Julgamento : 19/10/2016
Data da Publicação : 27/10/2016
Órgão Julgador : 1ª TURMA CÍVEL
Relator(a) : ALFEU MACHADO
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