main-banner

Jurisprudência


TJDF APC - 984853-20140111452692APC

Ementa
CIVIL. PROCESSUAL CIVIL.AÇÃO DE COMINATÓRIA C/C INDENIZATÓRIA. REGISTRO DE TRANSFERÊNCIA DE PROPRIEDADE DE VEÍCULO. AGRAVO RETIDO NÃO REITERADO. ART. 523, §1º DO CPC/73. NÃO CONHECIDO. PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA. REJEITADA. MÉRITO. OBRIGAÇÃO DE REGISTRO DA TRADIÇÃO DE VEÍCULO. NOVO PROPRIETÁRIO. ART. 123, §1º DO CTB. RESPONSABILIDADE DO ANTIGO PROPRIETÁRIO EM FACE DE TRIBUTOS E INFRAÇÕES INCIDENTES APÓS A TRANSAÇÃO. ART. 134 CTB. MITIGAÇÃO. JURISPRUDÊNCIA DO STJ E DO TJDFT. OMISSÃO DO COMPRADOR. CONDUTA ILÍCITA. DEVER DE INDENIZAR. VERIFICAÇÃO. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. VEÍCULO USADO. RESPONSABILIDADE DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. NÃO VERIFICADA. NÃO INTERMEDIAÇÃO DO NEGÓCIO. DANOS MATERIAIS. COMPROVAÇÃO. PERDA DE UMA CHANCE. INOCORRÊNCIA. POSSIBILIDADE DE ÊXITO REAL E SÉRIA. NÃO VERIFICADA. INDENIZAÇÃO NÃO DEVIDA. DANO MORAL. CONFIGURAÇÃO. QUANTUM. OBEDIÊNCIA AOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. ADSTRIÇÃO À NORMATIVA DA EFETIVA EXTENSÃO DO DANO. RECURSO PROVIDO EM PARTE. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. REDISTRIBUIÇÃO. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. 1. Segundo o Enunciado Administrativo n. 2 do STJ, aos recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016), como é o caso dos autos, devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas, até então, pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. 2. A apelante autora não reiterou, em suas razões recursais, o pedido de apreciação do agravo retido, o que impede o seu conhecimento, conforme se extrai do disposto no art. 523, § 1°, do CPC/73. 3. A ilegitimidade passiva elencada em contrarrazões pela instituição financeira (credora fiduciária) deve ser aferida com base na teoria da asserção, adotada majoritariamente pela doutrina e jurisprudência pátrias, segundo a qual não se exige que a pertinência subjetiva com o direito material seja real, bastando a mera afirmação da parte autora exarada em sua inicial. Preliminar de ilegitimidade passiva rejeitada. 4. Por força do art. 123, I, § 1º, do CTB, uma vez operada a transferência do veículo, cabe ao novo proprietário a obtenção de novo Certificado de Registro e Licenciamento do Veículo (CRLV), devendo responder por todas as obrigações daí advindas, nelas inclusas os impostos, taxas e multas gerados após a data da transação. 5. A jurisprudência abalizada do c. STJ e desta e. Corte tem temperado a aplicação da regra do art. 134 do CTB, consolidando entendimento de que pode ser mitigada a responsabilidade solidária do antigo proprietário, notadamente quanto às infrações de trânsito cometidas após a alienação e pelos tributos devidos depois desse negócio jurídico, nos casos em que restar efetivamente comprovada a transferência de propriedade. 5.1. É de se ressaltar que, enquanto a mitigação do art. 134 do CTB se dá em face das penalidades (infrações) de trânsito ocorridas após a tradição do bem e somente nos casos em que esta resta devidamente comprovada nos autos, o afastamento da responsabilidade do antigo proprietário quanto aos tributos (imposto ou taxa) incidentes sobre o veículo após a alienação decorre da ausência de permissivo legal, posto que não se afigura possível interpretar extensivamente a norma citada para criar responsabilidade tributária ao antigo proprietário não prevista no Código Tributário Nacional. 5.2. Assim, demonstrada a tradição do veículo, sobretudo considerando que não depende da comunicação ao órgão de trânsito para que se aperfeiçoe a transferência da propriedade, tem-se que, ainda que tenha o antigo proprietário quedado inerte, é possível que seja afastada sua responsabilidade solidária tanto quanto aos impostos incidentes e infrações (penalidades) cometidas por terceiros após a alienação do veículo.Precedentes do STJ e deste TJDFT. 6. No caso, consta dos autos igualmente Documento de Autorização para Transferência de veículo - DUT, datado de 05/05/2008, do qual constam as assinaturas do proprietário vendedor e comprador reconhecidas junto ao Ofício de Notas, tendo sido a cópia do documento colacionada devidamente autenticada, constituindo prova inequívoca da transferência do veículo na data mencionada. 6.1. A responsabilidade pela adoção das providências administrativas atinentes ao registro da transferência da propriedade do veículo, a partir da tradição, recai tão somente sobre o adquirente, porquanto se tornara o proprietário dobem em função da compra e venda realizada diretamente com o antigo dono do veículo. 6.2. A participação da instituição bancária limita-se à viabilização financeira da aludida transação mediante contrato firmado com o novo proprietário, tomando o próprio veículo como garantia. Assim, por não ter intermediado ou participado do encontro de vontades entabulado pelas partes, bem como por se tratar de veículo usado adquirido de particular, não deve ser a instituição financeira responsabilizada conjuntamente pela inadimplência imputável exclusivamente ao novel proprietário. 7. No que cinge ao dano material postulado, uma vez comprovado que o autor arcou com as despesas relativas ao veículo incidentes após a tradição do veículo, deve ser provida a parcela do pedido relativa à indenização do dano material. 8. Não merece guarida o pedido autoral atinente à indenização pela perda de uma chance, no que diz respeito à impossibilidade de obter êxito no financiamento, visto que o dever de reparação de possíveis prejuízos com fundamento na denominada teoria da perda de uma chance exige que seja séria e real a possibilidade de êxito, o que afasta qualquer reparação no caso de uma simples esperança subjetiva ou mera expectativa aleatória (STJ, REsp 614.266/MG, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, DJe de 02/08/2013), o que não restou verificado in casu. 9. O dano moral, como é cediço, relaciona-se diretamente com os prejuízos ocasionados a direitos da personalidade, como, por exemplo, à honra, à imagem, à integridade física e psicológica, à liberdade etc. Daí porque a violação de quaisquer dessas prerrogativas, afetas diretamente à dignidade do indivíduo, constitui motivação suficiente para fundamentar uma ação compensatória dessa natureza. 9.1. Na espécie, indubitável a existência de nexo causal entre a conduta do comprador, quando descumpre obrigação que lhe cabia no prazo imposto pelo art. 123, §1º do CTB, e as consequências suportadas pelo autor, consoante conteúdo probatório coligido aos autos, submetido ao crivo do contraditório. 9.2. Possível auferir dos autos a ocorrência de aforamento de execução fiscal em função dos débitos relativos ao veículo transacionado, com a inclusão de seus dados em cadastro restritivo de crédito (SERASA), ocorridos após 6 (seis) anos da alienação do veículo ao comprador, situação que, indubitavelmente, gera uma quebra na legítima expectativa depositada no comprador, que descumpriu obrigação de diligenciar junto ao DETRAN/DF o registro da transferência de propriedade do veículo, mesmo de posse do DUT devidamente assinado e com firma reconhecida. 9.3. A quantificação dos danos morais deve obedecer a critérios de razoabilidade e proporcionalidade, levando-se em conta, além da necessidade de compensação dos danos sofridos, as circunstâncias do caso, a gravidade do prejuízo, a situação do ofensor e a prevenção de comportamentos futuros análogos. Normativa da efetiva extensão do dano (CC, art. 944). Nesse passo, tenho por adequada sua fixação no montante de R$ 5.000,00 (cinco mil reais). 10. Em função da inversão parcial da sucumbência, com a parcial procedência do apelo do autor, deve-se redistribuir a verba honorária, fixada na origem em R$ 800,00 (oitocentos reais), consoante apreciação equitativa do juiz na forma do art. 20, §4º do CPC/73, então vigente e aplicável ao caso, de maneira que 80% da verba seja suportada pelo terceiro requerido, e 20% seja suportado pelo autor, facultada a compensação, suspensa a exigibilidade para o autor em função de litigar sob o páreo da gratuidade de justiça, benefício que ora se estende ao réu, tendo em vista o pedido formulado, presença da declaração de hipossuficiência e, notadamente, por litigar sob assistência da Defensoria Pública do Distrito Federal. 11. Isso posto, CONHEÇO do apelo do autor, NÃO CONHEÇO do agravo retido, REJEITO A PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA levantada em contrarrazões, e, no mérito, DOU PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO para, reformando parcialmente a sentença, condenar o réu Jasson Adriano Vieira Silva a) na obrigação de fazer concernente à diligenciar junto ao DETRAN/DF o registro da transferência do veículo; b) na indenização em proveito do autor por danos materiais na ordem de R$ 2.866,86 (dois mil oitocentos e sessenta e seis reais e oitenta e seis centavos), corrigidos a partir da data do efetivo prejuízo (Súmula 43 do STJ), e juros moratórios a partir do evento danoso (Art. 398 do CC e Súmula 54 do STJ) e c) na compensação por danos morais no montante de R$ 5.000,00 (cinco mil reais). Mantida, quanto ao demais, a sentença de improcedência.

Data do Julgamento : 23/11/2016
Data da Publicação : 14/12/2016
Órgão Julgador : 1ª TURMA CÍVEL
Relator(a) : ALFEU MACHADO
Mostrar discussão