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Jurisprudência


TJDF APC / Agravo Regimental no(a) Apelação Cível-20120111028656APC

Ementa
CONSTITUCIONAL. PROCESSO CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NA APELAÇÃO. DOENÇA GRAVE. QUADRO CLÍNICO CRÍTICO. DIREITO À SAÚDE. DIREITO À VIDA. DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. MÍNIMO EXISTENCIAL. IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS. IMPRESCINDIBILIDADE DE MEDICAMENTOS. FÁRMACO NÃO PADRONIZADO. AUSÊNCIA DE PREVISÃO EM PROTOCOLOS CLÍNICOS OU DIRETRIZES TERAPÊUTICAS. STA/STF Nº 175. ARTS. 19-M E SS. DA LEI Nº 8.080/90. INTERPRETAÇÃO CONFORME A CONSTITUIÇÃO. COMPATIBILIDADE COM ASSISTÊNCIA PRESTADA POR MEIO DE MEDICAMENTO INDICADO PELO MÉDICO DO PACIENTE. DISPONIBILIZAÇÃO DOS MEIOS NECESSÁRIOS AO EXERCÍCIO DO DIREITO À SAÚDE. TRATAMENTO MAIS ADEQUADO E EFICAZ. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. DECISÃO MANTIDA. 1 - O Direito à Saúde, inserto na Carta Política de 1988, em seu art. 196, bem como o Princípio da Igualdade, esculpido no artigo 5º, caput da mesma Lei Maior, são erigidos a balizadores para todos os que são responsáveis pela garantia dos direitos fundamentais em nossa sociedade, mormente os operadores do Direito, e em consonância com os ditames constitucionais mencionados encontram-se o art. 204, inciso II, e o art. 205, inciso I, ambos da Lei Orgânica do Distrito Federal. 2 - O direito à saúde está intimamente vinculado ao direito constitucional à vida (artigo 5º, caput), bem como ao fundamento da dignidade da pessoa humana, disposto no artigo 1º, inciso III, da Constituição Federal, devendo salientar que a doutrina consagra como núcleo da dignidade da pessoa humana o mínimo existencial, que abrange o conjunto de prestações materiais absolutamente necessárias para que o indivíduo tenha uma vida digna. 3 - In casu, ainda que haja indícios de que alguns dos medicamentos solicitados não sejam padronizados nem constem de Protocolos Clínicos e ou Diretrizes Terapêuticas, percebe-se que a jurisprudência tem se sedimentado amplamente no sentido de que a mera falta de padronização não pode servir de fundamento, por si só, para o não fornecimento de medicamentos indispensáveis ao direito à vida da paciente. 4 - Acerca da vedação da disponibilização de medicamento sem a existência de protocolo clínico, o Exmo. Sr. Ministro Gilmar Ferreira Mendes, na STA nº 175, asseverou que Se, por um lado, a elaboração dos Protocolos Clínicos e das Diretrizes Terapêuticas privilegia a melhor distribuição de recursos públicos e a segurança dos pacientes, por outro a aprovação de novas indicações terapêuticas pode ser muito lenta e, assim, acabar por excluir o acesso de pacientes do SUS a tratamento há muito prestado pela iniciativa privada. Parece certo que a inexistência de Protocolo Clínico no SUS não pode significar violação ao princípio da integralidade do sistema, nem justificar a diferença entre as opções acessíveis aos usuários da rede pública e as disponíveis aos usuários da rede privada. Nesses casos, a omissão administrativa no tratamento de determinada patologia poderá ser objeto de impugnação judicial, tanto por ações individuais como coletivas (...) (STA 175 AgR, Relator(a): Min. GILMAR MENDES (Presidente), Tribunal Pleno, julgado em 17/03/2010, DJe-076 DIVULG 29-04-2010 PUBLIC 30-04-2010 EMENT VOL-02399-01 PP-00070) 5 - Conquanto o direito à saúde tratar-se de norma constitucional de caráter programático, é vedado ao Poder Público interpretá-la de modo a retirar sua efetividade, principalmente diante de regulamentação efetivada pelo legislador infraconstitucional. Aceitar o art. 196 da Carta Magna como mera norma programática, incapaz de produzir efeitos, apenas indicando diretrizes a serem observadas pelo Poder Público, significaria negar a força normativa da Constituição, não podendo tal norma ser transformada em promessa constitucional inconsequente, impondo aos entes federados um dever de prestação positiva assegurada mediante políticas sociais e econômicas, que visem à redução de doenças, à promoção, à proteção e à recuperação da saúde, o que é implementado por meio do Sistema Único de Saúde - SUS. 6 - Quanto à inexistência de políticas públicas, é imprescindível distinguir se a não prestação decorre de uma vedação legal à sua dispensação ou de uma decisão administrativa de não fornecê-la. 6.1 - Assim, no tocante ao primeiro caso, o fornecimento de fármaco que não possua registro na ANVISA é vedado à Administração Pública porquanto o registro de medicamento é uma garantia à saúde pública, o que não se verifica no presente caso porquanto o medicamento foi devidamente registrado naquela agência reguladora. 6.2 - Sobre a segunda hipótese, esta deve ser subdividida em duas hipóteses: 1º) o SUS fornece tratamento alternativo, mas não adequado a determinado paciente; 2º) o SUS não tem qualquer tratamento específico para determinada patologia. 6.3 - Isso porque o Sistema Único de Saúde filiou-se à corrente da'Medicina com base em evidências'. Com isso, adotaram-se os 'Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas', que consistem num conjunto de critérios que permitem determinar o diagnóstico de doenças e o tratamento correspondente com os medicamentos disponíveis e as respectivas doses (...)Ademais, não se pode esquecer de que a gestão do Sistema Único de Saúde, obrigado a observar o princípio constitucional do acesso universal e igualitário à sações e prestações de saúde, só torna-se viável mediante a elaboração de políticas públicas que repartamos recursos (naturalmente escassos) da forma mais eficiente possível. Obrigar a rede pública a financiar toda e qualquer ação e prestação de saúde existente geraria grave lesão à ordem administrativa elevaria ao comprometimento do SUS, de modo a prejudicar ainda mais o atendimento médico da parcela da população mais necessitada. Dessa forma, podemos concluir que, em geral, deverá ser privilegiado o tratamento fornecido pelo SUS em detrimento de opção diversa escolhida pelo paciente, sempre que não for comprovada a ineficácia ou a impropriedade da política de saúde existente. Essa conclusão não afasta, contudo, a possibilidade de o Poder Judiciário, ou de a própria Administração, decidir que medida diferente da custeada pelo SUS deve ser fornecida a determinada pessoa que, por razões específicas do seu organismo, comprove que o tratamento fornecido não é eficaz no seu caso. Inclusive, como ressaltado pelo próprio Ministroda Saúde na Audiência Pública, há necessidade de revisão periódica dos protocolos existentes e de elaboração de novos protocolos. Assim, não se pode afirmar que os Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas do SUS são inquestionáveis, o que permite sua contestação judicial. (STA 175 AgR, Relator(a): Min. GILMAR MENDES (Presidente), Tribunal Pleno, julgado em 17/03/2010, DJe-076 DIVULG 29-04-2010 PUBLIC 30-04-2010 EMENT VOL-02399-01 PP-00070) 7 - A aplicação dos arts. 19-M e ss. da Lei nº 8.080/90 que tratam da dispensação de medicamento como ação de assistência terapêutica integral mediante a existência de protocolo clínico não inviabiliza a assistência por medicamento orientado pelo médico do paciente e, por consequência, não há qualquer afronta ao texto constitucional, ante a contemplação do princípio da dignidade da pessoa humana. 8 - O ente federado não pode se furtar do seu dever de oportunizar ao indivíduo uma existência digna por meio da disponibilização dos meios necessários ao exercício do direito à saúde, reduzindo ou dificultando o acesso a ele, por meio de criação de entraves jurídicos ou embaraços com o objetivo de postergar a prestação jurisdicional outrora deferida. 9 - A jurisprudência do c. Superior Tribunal de Justiça tem seguido o entendimento de que deve ser propiciado aos necessitados não qualquer tratamento, mas o tratamento mais adequado e eficaz, apto a ofertar ao enfermo maior dignidade de vida e menor sofrimento, independentemente do custo do insumo ou procedimento médico indicado ao paciente. 10 - Recurso conhecido e improvido. Decisão mantida.

Data do Julgamento : 25/02/2015
Data da Publicação : 06/03/2015
Órgão Julgador : 3ª TURMA CÍVEL
Relator(a) : ALFEU MACHADO
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