TJDF APC -Apelação Cível-20100110218008APC
CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. RELAÇÃO DE CONSUMO NÃO CONFIGURADA. INAPLICABILIDADE DO CDC - LEI 8078/90 E 14 §3º. INEXISTÊNCIA DE DEFEITO/VÍCIO NO SISTEMA INTERNET BANKING CONTRATADO E PERICIADO. TEORIA FINALISTA OU SUBJETIVA. DESTINATÁRIO FINAL. ORIENTAÇÃO PREDOMINANTE NO E. STJ APÓS 2009. INTERPRETAÇÃO RESTRITA DA EXPRESSÃO CONSUMIDOR VULNERÁVEL COMO DESTINATÁRIO FINAL A MERECER ESPECIAL TUTELA. NÃO INCIDÊNCIA DAS SÚMULAS 297/STJ E 479/STJ. QUESTÕES PROCESSUAIS. SEGREDO DE JUSTIÇA PLEITEADO. DESCABIMENTO. EXCEPCIONALIDADE ADMITIDA SOMENTE NOS CASOS DO ART. 5º LX DA CF/88 E ART. 155, DO CPC. PRELIMINARES. AGRAVO RETIDO. PROVA ORAL INDEFERIDA. DESOBEDIÊNCIA AO PREVISTO NO ART. 523 §1º DO CPC. NECESSIDADE DE REITERAÇÃO EM SEDE RECURSAL. ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM E AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR. REJEIÇÃO. SUSTENTADO JULGAMENTO INFRA PETITA EM DESACORDO COM O ART. 460, DO CPC. INOCORRÊNCIA. OBEDIÊNCIA AO CONTIDO NO ART. 935, DO CCB/02. INDEPENDÊNCIA DAS ESFERAS CÍVEL E CRIMINAL. MÉRITO. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA. ARTIGOS 932, III E 933, DO CCB/02. RESPONSABILIDADE PELA ESCOLHA DE PREPOSTOS. TRANSFERÊNCIA DE VALORES AUTORIZADA MEDIANTE SENHA PESSOAL RECOMENDADA INTRANSFERÍVEL. AUTORIZADORES E UTILIZADORES DE SENHAS PESSOAIS. INFORMAÇÕES PRIVILEGIADAS. RESPONSÁVEIS PELO DETALHAMENTO DE CADA PAGAMENTO PENDENTE DE APROVAÇÃO INDIVIDUALIZADA. LIBERAÇÃO. FUNCIONÁRIOS AUTORIZADOS E PREVIAMENTE CADASTRADOS. AUSÊNCIA DA DEVIDA ANÁLISE CONTÁBIL/FISCALIZAÇÃO. OMISSÃO. NEGLIGÊNCIA. REMESSAS REALIZADAS VIA INTERNET BANKING DA EMPRESA. APURADA FRAUDE NA TRANSFERÊNCIA ELETRÔNICA DE FUNDOS. FALHA HUMANA. CULPA IN ELIGENDO. AUSÊNCIA INJUSTIFICÁVEL DE REGISTROS E FISCALIZAÇÃO NA CONTABILIDADE DA EMPRESA APESAR DE GERENCIAMENTO/VOLUME FINANCEIRO MUITO ALTO DE REMESSAS E TRANSFERÊNCIAS. COMPORTAMENTO CONTRADITÓRIO. CULPA EXCLUSIVA DA EMPRESA. ELEIÇÃO E AUTORIZAÇÃO DE FUNCIONÁRIOS PARA MANUSEIO DO SISTEMA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. ARTIGOS 932, III E 933, DO CCB/02. SÚMULA 341/STF. FORTUITO EXTERNO. EXCLUDENTE DE RESPONSABILIDADE. LAUDO PERICIAL. PROVA TÉCNICA ESPECIALIZADA E CONVINCENTE. REGRA DO ARTIGO 333, I E II, DO CPC. ÔNUS DA PROVA. NEXO DE CAUSALIDADE DEMONSTRADO QUANTO À FRAUDE. ACERVO PROBATÓRIO CONVINCENTE. INQUÉRITO E AÇÃO PENAL. DENÚNCIA FORMALIZADA CONTRA EX-FUNCIONÁRIOS DA EMPRESA RECORRIDA APÓS INVESTIGAÇÃO CRITERIOSA. ÔNUS PROCESSUAL ATENDIDO. EVIDENCIADA FALHA DA CONTABILIDADE DA EMPRESA. RECONHECIMENTO DA AUTORIA E RESPONSABILIDADE PELOS VÍCIOS DE PROCEDIMENTOS INTERNOS E PRÁTICAS INDEVIDAS POR PREPOSTOS AUTORIZADOS. RECONHECIMENTO TAMBÉM EM AUDITORIA INTERNA. ÔNUS PROCESSUAL DO ART. 333, I E II, DO CPC. SEGUNDA PERÍCIA MAIS COMPLETA, MELHOR ELABORADA E DETALHADA, ESCLARECENDO DETALHES TÉCNICOS ESPECÍFICOS PELA NECESSIDADE DE ESPECIALIZAÇÃO DA MATÉRIA SEGURANÇA DAS INFORMAÇÕES. APURAÇÃO DA ADEQUAÇÃO DO SISTEMA E REMESSAS INDEVIDAS DESAUTORIZADAS. SENTENÇA REFORMADA IN TOTUM. PERSUASÃO RACIONAL DO JUIZ. REGRA DO ART. 130/131, DO CPC. LIVRE CONVENCIMENTO MOTIVADO. PROVA PERICIAL. ESCLARECIMENTOS ADICIONAIS E COMPLEMENTARES DA 2ª PERÍCIA, MAIS COMPLETA E TECNICAMENTE DETALHADA. REGRA DOS ARTIGOS 436/439, DO CPC. LIVRE CONVICÇÃO E APRECIAÇÃO DO VALOR DE UMA E OUTRA. ART. 439 PARÁGRAFO ÚNICO DO CPC. CORREÇÃO DE EVENTUAIS OMISSÕES OU INEXATIDÃO DOS RESULTADOS DA 1ª PERÍCIA. PROVA DOS FATOS ALEGADOS. ART. 333, I E II, DO CPC. FATOS CONSTITUTIVOS DO DIREITO. ACERVO PROBATÓRIO TÉCNICO CONVINCENTE. PREQUESTIONAMENTO IMPLÍCITO. ORIENTAÇÃO DO E. STJ. RECURSO PROVIDO NA ÍNTEGRA. SENTENÇA REFORMADA IN TOTUM. PRECEDENTES DO E. STJ. 1. Tendo em vista que o apelante não reiterou, em suas razões de apelação, o pedido de apreciação do agravo retido, é impositivo o não conhecimento do mesmo, conforme dispõe o art. 523, § 1° do CPC. Ante ao que dispõe o art. 523, § 1° do CPC, não se conhece do agravo retido, se a parte agravante não reitera em razões ou contrarrazões de apelação, o pedido de apreciação do recurso.2. O segredo de justiça constitui medida excepcional prevista na Constituição Federal, que permite a restrição da publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem, consoante dispõe o inciso LX, do artigo 5º, sem prejuízo do interesse público à informação (art. 93, IX). Por sua vez, o art. 155 do Código de Processo Civil determina que os atos processuais são públicos, correndo todavia em segredo de justiça os processos em que o exigir o interesse público. Neste diapasão, é direito fundamental do cidadão a publicidade dos atos processuais, nos termos do art. 5º, LX da Constituição Federal. 3. Quanto à alegação de julgamento infra petita, em desacordo com o previsto no art. 460, do CPC, considerando o pedido alternativo às fls. 1175 e seguintes, diante da existência de pleitos visando recuperar o apontado prejuízo, consideradas as demandas ajuizadas contra os ex-funcionários das empresas autoras; à evidência não há que se falar em enriquecimento sem causa, reconhecidamente rechaçado pelo ordenamento jurídico.4. O simples fato de estar o apelante e as apeladas valendo-se dos meios cabíveis contra as pessoas responsáveis pelos alegados danos, ex-funcionários das empresas apeladas, com o objetivo de tentar reaver o sustentado prejuízo, decorre do direito constitucional de ação em razão de estar o sistema, em tese, a amparar a reparação do dano (art. 186, do CCB/02).5. À luz do disposto no art. 935, do CCB/02, a responsabilidade civil é independente da criminal, não se podendo questionar mais sobre a existência do fato ou sobre quem seja o seu autor quando estas questões se acharem decididas no juízo criminal. Sucede que na fase inquisitorial, com a instauração do inquérito, inicia-se um procedimento preparatório, de caráter administrativo, da ação penal, voltado à colheita de provas para apurar a prática de uma infração penal e sua autoria, baseado no sigilo e falta de contrariedade à defesa, dentre outras características.6. As condições da ação, sendo a legitimidade passiva uma delas, devem ser analisadas exclusivamente sob o ângulo processual e tendo como substrato os fatos narrados na inicial e não os fatos provados. 7. Segundo a Teoria da Asserção, adotada pelo nosso Código de Processo Civil, as condições da ação devem ser aferidas a partir das afirmações feitas pelo autor na exordial, de forma hipotética, sob pena de se restringir o direito de ação somente a quem possuir o direito material. Porém, restando comprovada, durante a instrução processual, a inexistência dessas condições, a sentença será de improcedência do pedido e não de extinção do feito sem resolução do mérito. 8. Apesar da notória sinalização da Súmula 297/STJ quanto à aplicação do CDC - Código de Defesa do Consumidor - Lei Nº 8078/90, com seus institutos de ordem pública e interesse social, às instituições financeiras, e ainda o teor da Súmula 479/STJ que prevê a responsabilidade objetiva pelos danos gerados por fortuito interno, relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito das operações bancárias, fato é que tais enunciados não servem à solução do caso em exame porquanto se cuida exatamente de situação que aponta, na análise das provas, perícias e alegações, para culpa exclusiva de terceiro, excludente de ilicitude (prepostos vinculados às recorridas que se utilizavam indevidamente de informações e dados privilegiados para fraudar o sistema) e responsabilização objetiva consoante previsão dos artigos 932, III e 933, ambos do CCB/02, uma vez que houve modificação em relação ao Código Civil de 1916, à culpa in eligendo e in comitendo.9. O STJ superou a discussão acerca do alcance da expressão destinatário final constante do art. 2º, do CDC, consolidando a Teoria Finalista como aquela que indica a melhor diretriz para a interpretação do conceito de consumidor.10. Sintonizado com o pensamento daquela prestigiada Corte Superior, o caso em exame deve ser solucionado à luz da corrente FINALISTA ou SUBJETIVA que, partindo do conceito econômico de consumidor, propõe que a interpretação da expressão destinatário final seja restrita, fundamentando-se no fato de que somente o consumidor, parte mais vulnerável na relação contratual, merece a especial tutela. Assim, consumidor seria o não profissional, ou seja, aquele que adquire ou utiliza um produto para uso próprio ou de sua família. 11. Tratando-se de financiamento obtido por empresário, destinado precipuamente a incrementar a sua atividade negocial, não se podendo qualificá-lo, portanto, como destinatário final, inexistente é a pretendida relação de consumo. Inaplicação no caso do Código de Defesa do Consumidor. (STJ, REsp 218505/MG, DJ 14.02.2000, Rel. Min. BARROS MONTEIRO, J. 16.09.1999).12. A jurisprudência do STJ se encontra consolidada no sentido de que a determinação da qualidade de consumidor deve, em regra, ser feita mediante aplicação da teoria finalista, que, numa exegese restritiva do art. 2º do CDC, considera destinatário final tão somente o destinatário fático e econômico do bem ou serviço, seja ele pessoa física ou jurídica.13. Pela teoria finalista, fica excluído da proteção do CDC o consumo intermediário, assim entendido como aquele cujo produto retorna para as cadeias de produção e distribuição, compondo o custo (e, portanto, o preço final) de um novo bem ou serviço. Vale dizer, só pode ser considerado consumidor, para fins de tutela pela Lei nº 8.078/90, aquele que exaure a função econômica do bem ou serviço, excluindo-o de forma definitiva do mercado de consumo.14. Assim, as súmulas e citações jurisprudenciais apresentadas pelas apeladas e defendidas na sentença combatida data vênia não sinalizam para o entendimento predominante no e. STJ sobre o tema de fundo porquanto referentes a fraudes e delitos praticados por terceiros sob a responsabilidade das instituições bancárias, envolvendo clientes prejudicados principalmente em abertura de contas correntes ou contratação de empréstimos com utilização de documentos falsos por terceiros, clonagens sem a devida apuração e conferência de dados pela instituição, situação que não se adequa ao caso sub examine.15. À luz de todo o exposto, a relação em apreço é eminentemente civil, devendo ser observada e solucionada pelas regras do Código Civil Brasileiro de 2002, nos moldes da responsabilidade civil subjetiva, sendo imprescindível a acurada apreciação de todo o acervo probatório produzido.16. O artigo 932, inciso III c/c art. 933, do Código Civil preveem que o empregador ou o comitente é responsável pela reparação civil dos atos danosos provocados por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele. Trata-se de hipótese de responsabilidade objetiva por fato de terceiro. Empregado ou preposto é aquele que recebe ordens, está sob o poder de direção e vigilância de outrem. Uma vez caracterizada essa relação de subordinação jurídica, emerge a responsabilidade patronal pelos danos causados, dolosa ou culposamente, por seus empregados ou prepostos no exercício do trabalho ou em razão dele.17. A responsabilidade civil por ato ilícito pressupõe a existência de uma relação de causa e efeito entre o fato danoso e a culpa do agente. A responsabilidade da empresa decorre da culpa de seu preposto (culpa in eligendo), nos termos do enunciado da Súmula 341/STF.18. De todo o acervo produzido, restou evidenciado que toda a fraude só aconteceu porque pessoas foram autorizadas a utilizar o sistema contratado internet banking, com informações privilegiadas de Senhas e códigos, em tese, com excesso de poderes e/ou desvio de função sem que as recorridas soubessem das transferências fraudulentas ou fiscalizasse mediante seu sistema interno contábil tal situação, responsabilizando-se, porém, pelos atos de seus prepostos.19. Da simples leitura da contraminuta ao Agravo Retido (fls. 1690/1697), a própria agravada (recorrida), à fl. 1692, RECONHECE que seus ex-colaboradores lançavam ordens de pagamento para os fornecedores no ambiente de internet banking da ora agravante com inscrição no CNPJ e CPF de sua própria titularidade, de familiares e de terceiros de relação pessoal, o que corrobora que houve quebra do nexo causal em relação ao sistema contratado com a apelante, mas conduta irregular de prepostos das empresas, pessoas eleitas por elas, tratando-se de FORTUITO EXTERNO (art. 932, III, e 933, do CCB/02).20. Demonstrado que a fraude foi promovida por prepostos com privilégios concedidos pelas apeladas, de confiança das mesmas, tem-se por excluída a responsabilidade do banco apelante que prestou os serviços exigidos, na forma contratada, conforme apurado em sede da 2ª perícia técnica especializada, configurando o FORTUITO EXTERNO por fato que não guarda nenhuma relação com a atividade do fornecedor, absolutamente estranho ao produto ou serviço prestado, ocorrido em momento posterior ao da formulação e execução do pactuado, não havendo que se falar em defeito do produto ou serviço, mas voluntária atividade ilícita, a ser demonstrada na esfera competente, à evidência, situação bem diferente daquela quando existe o risco da atividade negocial e sua responsabilização - artigo 927 parágrafo único, do CCB/02, que cuida da Teoria do Risco da Atividade.21. O fato de terceiro, consoante a respeitada doutrina de SÉRGIO CAVALIERI FILHO, in PROGRAMA DE RESPONSABILIDADE CIVIL, 10ª Edição, 2012, Ed. Atlas, págs. 198/199, exclui a responsabilidade com o rompimento do nexo causal entre o agente e o dano sofrido pela vítima (recorridas), produzindo por si só o resultado da fraude, e destruindo a relação causal entre as recorridas e o aparente causador do dano (sistema de internet banking do apelante). 22. A teoria da aparência equipara o estado de fato ao estado de direito em certas circunstâncias e em atenção a certas pessoas. Então, basta que a competência do preposto seja aparente para acarretar a responsabilidade do comitente. Considera-se suficiente a razoável aparência do cargo. Em última instância, a teoria da aparência prestigia o princípio da confiança, a credibilidade depositada por terceiros naquele que se apresenta como preposto de alguém.23. Prestigiar a irresponsabilidade das recorridas quanto à ausência de fiscalização, má administração e utilização de seus setores de contabilidade e organização administrativa na arriscada e comprometedora escolha de prepostos para áreas de atuação de extrema confiança, por envolver grande aporte de recursos, transações de grande vulto, repasses e transferências de dinheiro configura, data vênia comportamento contraditório que fere a boa-fé objetiva e os deveres anexos de conduta, não podendo ser chancelada pelo Direito diante da clareza das cláusulas de responsabilidade conhecidas e não observadas pelas apeladas (cláusulas pactuadas previstas nas Normas Gerais Regulamentadoras de Produtos e para Prestação de Serviços para Pessoas Jurídicas Clientes do apelante).24. Consoante se infere dos autos, as apeladas contrataram um sistema de segurança para facilitação no atendimento de clientes e recebimento de pagamentos, utilizaram mal, sem a devida e exigida fiscalização, pelo aporte de valores transferidos ou manuseados diariamente, o sistema pela conduta deliberada de seus prepostos que estavam transferindo recursos inadequadamente para suas contas e repartindo valores em espécie de grupo fechado, e pretendem responsabilizar o sistema pelos danos causados pelos seus próprios servidores. Tal comportamento é manifestamente contraditório e evidentemente alcança a proibição de venire contra factum proprium, amplamente consagrada no direito civil brasileiro.25. É clara também, neste contexto, a violação do dever de lealdade contratual da parte recorrente, o que Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald denominam de dever derivado dos deveres de conduta, o qual é o mais imediato dever concorrente da boa-fé, mandamento de cooperação recíproca, impondo às partes a abstenção sobre qualquer conduta capaz de falsear o objetivo do negócio ou desequilibrar o jogo das prestações por elas consignado. Agir com deslealdade implica atingir a dignidade do outro contratante.26. Apesar de cuidar-se de responsabilidade prevista nos artigos 932, III e 933, do CCB/02, apenas como argumentação, importa ainda ser detidamente analisado o acervo probatório dos autos em atenção à regra processual quanto ao ônus de provar o alegado, à luz do disposto no art. 333, I e II, do CPC.27. A partir do momento em que alguém, mediante conduta culposa, viola direito de outrem e causa-lhe dano, está-se diante de um ato ilícito e deste ato deflui o inexorável dever de indenizar, consoante os artigos 186 e 927, do CCB/02.28. Apesar de não estar o Juízo adstrito ao Laudo Pericial, na livre apreciação da prova, podendo estabelecer as suas conclusões livremente, sob o pálio do Princípio do Livre Convencimento Racional e/ou Persuasão Racional do Juiz, fato é que, de acordo com os artigos 436/439, do CPC, esclarecimentos técnicos hábeis e específicos relacionados com a segurança da informação foram trazidos pelo Auxiliar do Juízo às fls. 1985/2145 corroborando o que indicam os artigos 932, III e 933, do CCB/02, esclarecendo que, efetivamente, todo o impasse decorreu da negligência das recorridas no gerenciamento contábil- administrativo-fiscal, má-fé de pessoas (prepostos da empresa) devidamente autorizados a manusear o Sistema bem como todo o esquema apurado só não foi deflagrado antes por ineficiência ou má-fé de responsáveis pela área contábil da empresa recorrida, não havendo que se falar em responsabilidade do apelante por inexistência de vícios ou defeitos no sistema questionado pelas autoras recorridas, diante de todo o acervo probatório examinado, em especial o Laudo Pericial às fls. 2039/2444.29. Desse modo, dos fatos e documentos trazidos à baila, ainda restou apurada a negligência das recorridas nas irregularidades examinadas por falha administrativa e contábil como principal responsável pelo ocorrido. As questões e níveis de segurança foram comprovados nos autos através de segunda perícia a qual apresentou testes e conclusões específicas quanto ao questionado, informando que o Sistema Safra Office Banking é certificado, possuindo recursos de segurança que permitem ao cliente controlar permissão do que um usuário pode ou não fazer no sistema; mas não podem substituir a contabilidade da empresa suplantando todas as suas operações e observâncias legais de registro e controle de entradas, saídas e documentos. 30. No tocante ao prequestionamento, a jurisprudência do Colendo Superior Tribunal de Justiça afirma que a exigência legal quanto ao prequestionamento é de que a tese defendida pela parte seja posta com clareza na instância ordinária, ensejando prequestionamento implícito.31. Como já demonstrado nos julgados supra, a indicação de dispositivos legais, expressamente, para fins de prequestionamento, é desnecessária, pois a obrigação na exposição de motivos habita na efetiva discussão da matéria. O prequestionamento essencial está relacionado à matéria debatida e não ao preceito legal apontado pela parte. Apelação conhecida. Agravo regimental não conhecido. Questões processuais indeferidas. Preliminares rejeitadas. Sentença reformada. Recurso provido.
Ementa
CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. RELAÇÃO DE CONSUMO NÃO CONFIGURADA. INAPLICABILIDADE DO CDC - LEI 8078/90 E 14 §3º. INEXISTÊNCIA DE DEFEITO/VÍCIO NO SISTEMA INTERNET BANKING CONTRATADO E PERICIADO. TEORIA FINALISTA OU SUBJETIVA. DESTINATÁRIO FINAL. ORIENTAÇÃO PREDOMINANTE NO E. STJ APÓS 2009. INTERPRETAÇÃO RESTRITA DA EXPRESSÃO CONSUMIDOR VULNERÁVEL COMO DESTINATÁRIO FINAL A MERECER ESPECIAL TUTELA. NÃO INCIDÊNCIA DAS SÚMULAS 297/STJ E 479/STJ. QUESTÕES PROCESSUAIS. SEGREDO DE JUSTIÇA PLEITEADO. DESCABIMENTO. EXCEPCIONALIDADE ADMITIDA SOMENTE NOS CASOS DO ART. 5º LX DA CF/88 E ART. 155, DO CPC. PRELIMINARES. AGRAVO RETIDO. PROVA ORAL INDEFERIDA. DESOBEDIÊNCIA AO PREVISTO NO ART. 523 §1º DO CPC. NECESSIDADE DE REITERAÇÃO EM SEDE RECURSAL. ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM E AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR. REJEIÇÃO. SUSTENTADO JULGAMENTO INFRA PETITA EM DESACORDO COM O ART. 460, DO CPC. INOCORRÊNCIA. OBEDIÊNCIA AO CONTIDO NO ART. 935, DO CCB/02. INDEPENDÊNCIA DAS ESFERAS CÍVEL E CRIMINAL. MÉRITO. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA. ARTIGOS 932, III E 933, DO CCB/02. RESPONSABILIDADE PELA ESCOLHA DE PREPOSTOS. TRANSFERÊNCIA DE VALORES AUTORIZADA MEDIANTE SENHA PESSOAL RECOMENDADA INTRANSFERÍVEL. AUTORIZADORES E UTILIZADORES DE SENHAS PESSOAIS. INFORMAÇÕES PRIVILEGIADAS. RESPONSÁVEIS PELO DETALHAMENTO DE CADA PAGAMENTO PENDENTE DE APROVAÇÃO INDIVIDUALIZADA. LIBERAÇÃO. FUNCIONÁRIOS AUTORIZADOS E PREVIAMENTE CADASTRADOS. AUSÊNCIA DA DEVIDA ANÁLISE CONTÁBIL/FISCALIZAÇÃO. OMISSÃO. NEGLIGÊNCIA. REMESSAS REALIZADAS VIA INTERNET BANKING DA EMPRESA. APURADA FRAUDE NA TRANSFERÊNCIA ELETRÔNICA DE FUNDOS. FALHA HUMANA. CULPA IN ELIGENDO. AUSÊNCIA INJUSTIFICÁVEL DE REGISTROS E FISCALIZAÇÃO NA CONTABILIDADE DA EMPRESA APESAR DE GERENCIAMENTO/VOLUME FINANCEIRO MUITO ALTO DE REMESSAS E TRANSFERÊNCIAS. COMPORTAMENTO CONTRADITÓRIO. CULPA EXCLUSIVA DA EMPRESA. ELEIÇÃO E AUTORIZAÇÃO DE FUNCIONÁRIOS PARA MANUSEIO DO SISTEMA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. ARTIGOS 932, III E 933, DO CCB/02. SÚMULA 341/STF. FORTUITO EXTERNO. EXCLUDENTE DE RESPONSABILIDADE. LAUDO PERICIAL. PROVA TÉCNICA ESPECIALIZADA E CONVINCENTE. REGRA DO ARTIGO 333, I E II, DO CPC. ÔNUS DA PROVA. NEXO DE CAUSALIDADE DEMONSTRADO QUANTO À FRAUDE. ACERVO PROBATÓRIO CONVINCENTE. INQUÉRITO E AÇÃO PENAL. DENÚNCIA FORMALIZADA CONTRA EX-FUNCIONÁRIOS DA EMPRESA RECORRIDA APÓS INVESTIGAÇÃO CRITERIOSA. ÔNUS PROCESSUAL ATENDIDO. EVIDENCIADA FALHA DA CONTABILIDADE DA EMPRESA. RECONHECIMENTO DA AUTORIA E RESPONSABILIDADE PELOS VÍCIOS DE PROCEDIMENTOS INTERNOS E PRÁTICAS INDEVIDAS POR PREPOSTOS AUTORIZADOS. RECONHECIMENTO TAMBÉM EM AUDITORIA INTERNA. ÔNUS PROCESSUAL DO ART. 333, I E II, DO CPC. SEGUNDA PERÍCIA MAIS COMPLETA, MELHOR ELABORADA E DETALHADA, ESCLARECENDO DETALHES TÉCNICOS ESPECÍFICOS PELA NECESSIDADE DE ESPECIALIZAÇÃO DA MATÉRIA SEGURANÇA DAS INFORMAÇÕES. APURAÇÃO DA ADEQUAÇÃO DO SISTEMA E REMESSAS INDEVIDAS DESAUTORIZADAS. SENTENÇA REFORMADA IN TOTUM. PERSUASÃO RACIONAL DO JUIZ. REGRA DO ART. 130/131, DO CPC. LIVRE CONVENCIMENTO MOTIVADO. PROVA PERICIAL. ESCLARECIMENTOS ADICIONAIS E COMPLEMENTARES DA 2ª PERÍCIA, MAIS COMPLETA E TECNICAMENTE DETALHADA. REGRA DOS ARTIGOS 436/439, DO CPC. LIVRE CONVICÇÃO E APRECIAÇÃO DO VALOR DE UMA E OUTRA. ART. 439 PARÁGRAFO ÚNICO DO CPC. CORREÇÃO DE EVENTUAIS OMISSÕES OU INEXATIDÃO DOS RESULTADOS DA 1ª PERÍCIA. PROVA DOS FATOS ALEGADOS. ART. 333, I E II, DO CPC. FATOS CONSTITUTIVOS DO DIREITO. ACERVO PROBATÓRIO TÉCNICO CONVINCENTE. PREQUESTIONAMENTO IMPLÍCITO. ORIENTAÇÃO DO E. STJ. RECURSO PROVIDO NA ÍNTEGRA. SENTENÇA REFORMADA IN TOTUM. PRECEDENTES DO E. STJ. 1. Tendo em vista que o apelante não reiterou, em suas razões de apelação, o pedido de apreciação do agravo retido, é impositivo o não conhecimento do mesmo, conforme dispõe o art. 523, § 1° do CPC. Ante ao que dispõe o art. 523, § 1° do CPC, não se conhece do agravo retido, se a parte agravante não reitera em razões ou contrarrazões de apelação, o pedido de apreciação do recurso.2. O segredo de justiça constitui medida excepcional prevista na Constituição Federal, que permite a restrição da publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem, consoante dispõe o inciso LX, do artigo 5º, sem prejuízo do interesse público à informação (art. 93, IX). Por sua vez, o art. 155 do Código de Processo Civil determina que os atos processuais são públicos, correndo todavia em segredo de justiça os processos em que o exigir o interesse público. Neste diapasão, é direito fundamental do cidadão a publicidade dos atos processuais, nos termos do art. 5º, LX da Constituição Federal. 3. Quanto à alegação de julgamento infra petita, em desacordo com o previsto no art. 460, do CPC, considerando o pedido alternativo às fls. 1175 e seguintes, diante da existência de pleitos visando recuperar o apontado prejuízo, consideradas as demandas ajuizadas contra os ex-funcionários das empresas autoras; à evidência não há que se falar em enriquecimento sem causa, reconhecidamente rechaçado pelo ordenamento jurídico.4. O simples fato de estar o apelante e as apeladas valendo-se dos meios cabíveis contra as pessoas responsáveis pelos alegados danos, ex-funcionários das empresas apeladas, com o objetivo de tentar reaver o sustentado prejuízo, decorre do direito constitucional de ação em razão de estar o sistema, em tese, a amparar a reparação do dano (art. 186, do CCB/02).5. À luz do disposto no art. 935, do CCB/02, a responsabilidade civil é independente da criminal, não se podendo questionar mais sobre a existência do fato ou sobre quem seja o seu autor quando estas questões se acharem decididas no juízo criminal. Sucede que na fase inquisitorial, com a instauração do inquérito, inicia-se um procedimento preparatório, de caráter administrativo, da ação penal, voltado à colheita de provas para apurar a prática de uma infração penal e sua autoria, baseado no sigilo e falta de contrariedade à defesa, dentre outras características.6. As condições da ação, sendo a legitimidade passiva uma delas, devem ser analisadas exclusivamente sob o ângulo processual e tendo como substrato os fatos narrados na inicial e não os fatos provados. 7. Segundo a Teoria da Asserção, adotada pelo nosso Código de Processo Civil, as condições da ação devem ser aferidas a partir das afirmações feitas pelo autor na exordial, de forma hipotética, sob pena de se restringir o direito de ação somente a quem possuir o direito material. Porém, restando comprovada, durante a instrução processual, a inexistência dessas condições, a sentença será de improcedência do pedido e não de extinção do feito sem resolução do mérito. 8. Apesar da notória sinalização da Súmula 297/STJ quanto à aplicação do CDC - Código de Defesa do Consumidor - Lei Nº 8078/90, com seus institutos de ordem pública e interesse social, às instituições financeiras, e ainda o teor da Súmula 479/STJ que prevê a responsabilidade objetiva pelos danos gerados por fortuito interno, relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito das operações bancárias, fato é que tais enunciados não servem à solução do caso em exame porquanto se cuida exatamente de situação que aponta, na análise das provas, perícias e alegações, para culpa exclusiva de terceiro, excludente de ilicitude (prepostos vinculados às recorridas que se utilizavam indevidamente de informações e dados privilegiados para fraudar o sistema) e responsabilização objetiva consoante previsão dos artigos 932, III e 933, ambos do CCB/02, uma vez que houve modificação em relação ao Código Civil de 1916, à culpa in eligendo e in comitendo.9. O STJ superou a discussão acerca do alcance da expressão destinatário final constante do art. 2º, do CDC, consolidando a Teoria Finalista como aquela que indica a melhor diretriz para a interpretação do conceito de consumidor.10. Sintonizado com o pensamento daquela prestigiada Corte Superior, o caso em exame deve ser solucionado à luz da corrente FINALISTA ou SUBJETIVA que, partindo do conceito econômico de consumidor, propõe que a interpretação da expressão destinatário final seja restrita, fundamentando-se no fato de que somente o consumidor, parte mais vulnerável na relação contratual, merece a especial tutela. Assim, consumidor seria o não profissional, ou seja, aquele que adquire ou utiliza um produto para uso próprio ou de sua família. 11. Tratando-se de financiamento obtido por empresário, destinado precipuamente a incrementar a sua atividade negocial, não se podendo qualificá-lo, portanto, como destinatário final, inexistente é a pretendida relação de consumo. Inaplicação no caso do Código de Defesa do Consumidor. (STJ, REsp 218505/MG, DJ 14.02.2000, Rel. Min. BARROS MONTEIRO, J. 16.09.1999).12. A jurisprudência do STJ se encontra consolidada no sentido de que a determinação da qualidade de consumidor deve, em regra, ser feita mediante aplicação da teoria finalista, que, numa exegese restritiva do art. 2º do CDC, considera destinatário final tão somente o destinatário fático e econômico do bem ou serviço, seja ele pessoa física ou jurídica.13. Pela teoria finalista, fica excluído da proteção do CDC o consumo intermediário, assim entendido como aquele cujo produto retorna para as cadeias de produção e distribuição, compondo o custo (e, portanto, o preço final) de um novo bem ou serviço. Vale dizer, só pode ser considerado consumidor, para fins de tutela pela Lei nº 8.078/90, aquele que exaure a função econômica do bem ou serviço, excluindo-o de forma definitiva do mercado de consumo.14. Assim, as súmulas e citações jurisprudenciais apresentadas pelas apeladas e defendidas na sentença combatida data vênia não sinalizam para o entendimento predominante no e. STJ sobre o tema de fundo porquanto referentes a fraudes e delitos praticados por terceiros sob a responsabilidade das instituições bancárias, envolvendo clientes prejudicados principalmente em abertura de contas correntes ou contratação de empréstimos com utilização de documentos falsos por terceiros, clonagens sem a devida apuração e conferência de dados pela instituição, situação que não se adequa ao caso sub examine.15. À luz de todo o exposto, a relação em apreço é eminentemente civil, devendo ser observada e solucionada pelas regras do Código Civil Brasileiro de 2002, nos moldes da responsabilidade civil subjetiva, sendo imprescindível a acurada apreciação de todo o acervo probatório produzido.16. O artigo 932, inciso III c/c art. 933, do Código Civil preveem que o empregador ou o comitente é responsável pela reparação civil dos atos danosos provocados por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele. Trata-se de hipótese de responsabilidade objetiva por fato de terceiro. Empregado ou preposto é aquele que recebe ordens, está sob o poder de direção e vigilância de outrem. Uma vez caracterizada essa relação de subordinação jurídica, emerge a responsabilidade patronal pelos danos causados, dolosa ou culposamente, por seus empregados ou prepostos no exercício do trabalho ou em razão dele.17. A responsabilidade civil por ato ilícito pressupõe a existência de uma relação de causa e efeito entre o fato danoso e a culpa do agente. A responsabilidade da empresa decorre da culpa de seu preposto (culpa in eligendo), nos termos do enunciado da Súmula 341/STF.18. De todo o acervo produzido, restou evidenciado que toda a fraude só aconteceu porque pessoas foram autorizadas a utilizar o sistema contratado internet banking, com informações privilegiadas de Senhas e códigos, em tese, com excesso de poderes e/ou desvio de função sem que as recorridas soubessem das transferências fraudulentas ou fiscalizasse mediante seu sistema interno contábil tal situação, responsabilizando-se, porém, pelos atos de seus prepostos.19. Da simples leitura da contraminuta ao Agravo Retido (fls. 1690/1697), a própria agravada (recorrida), à fl. 1692, RECONHECE que seus ex-colaboradores lançavam ordens de pagamento para os fornecedores no ambiente de internet banking da ora agravante com inscrição no CNPJ e CPF de sua própria titularidade, de familiares e de terceiros de relação pessoal, o que corrobora que houve quebra do nexo causal em relação ao sistema contratado com a apelante, mas conduta irregular de prepostos das empresas, pessoas eleitas por elas, tratando-se de FORTUITO EXTERNO (art. 932, III, e 933, do CCB/02).20. Demonstrado que a fraude foi promovida por prepostos com privilégios concedidos pelas apeladas, de confiança das mesmas, tem-se por excluída a responsabilidade do banco apelante que prestou os serviços exigidos, na forma contratada, conforme apurado em sede da 2ª perícia técnica especializada, configurando o FORTUITO EXTERNO por fato que não guarda nenhuma relação com a atividade do fornecedor, absolutamente estranho ao produto ou serviço prestado, ocorrido em momento posterior ao da formulação e execução do pactuado, não havendo que se falar em defeito do produto ou serviço, mas voluntária atividade ilícita, a ser demonstrada na esfera competente, à evidência, situação bem diferente daquela quando existe o risco da atividade negocial e sua responsabilização - artigo 927 parágrafo único, do CCB/02, que cuida da Teoria do Risco da Atividade.21. O fato de terceiro, consoante a respeitada doutrina de SÉRGIO CAVALIERI FILHO, in PROGRAMA DE RESPONSABILIDADE CIVIL, 10ª Edição, 2012, Ed. Atlas, págs. 198/199, exclui a responsabilidade com o rompimento do nexo causal entre o agente e o dano sofrido pela vítima (recorridas), produzindo por si só o resultado da fraude, e destruindo a relação causal entre as recorridas e o aparente causador do dano (sistema de internet banking do apelante). 22. A teoria da aparência equipara o estado de fato ao estado de direito em certas circunstâncias e em atenção a certas pessoas. Então, basta que a competência do preposto seja aparente para acarretar a responsabilidade do comitente. Considera-se suficiente a razoável aparência do cargo. Em última instância, a teoria da aparência prestigia o princípio da confiança, a credibilidade depositada por terceiros naquele que se apresenta como preposto de alguém.23. Prestigiar a irresponsabilidade das recorridas quanto à ausência de fiscalização, má administração e utilização de seus setores de contabilidade e organização administrativa na arriscada e comprometedora escolha de prepostos para áreas de atuação de extrema confiança, por envolver grande aporte de recursos, transações de grande vulto, repasses e transferências de dinheiro configura, data vênia comportamento contraditório que fere a boa-fé objetiva e os deveres anexos de conduta, não podendo ser chancelada pelo Direito diante da clareza das cláusulas de responsabilidade conhecidas e não observadas pelas apeladas (cláusulas pactuadas previstas nas Normas Gerais Regulamentadoras de Produtos e para Prestação de Serviços para Pessoas Jurídicas Clientes do apelante).24. Consoante se infere dos autos, as apeladas contrataram um sistema de segurança para facilitação no atendimento de clientes e recebimento de pagamentos, utilizaram mal, sem a devida e exigida fiscalização, pelo aporte de valores transferidos ou manuseados diariamente, o sistema pela conduta deliberada de seus prepostos que estavam transferindo recursos inadequadamente para suas contas e repartindo valores em espécie de grupo fechado, e pretendem responsabilizar o sistema pelos danos causados pelos seus próprios servidores. Tal comportamento é manifestamente contraditório e evidentemente alcança a proibição de venire contra factum proprium, amplamente consagrada no direito civil brasileiro.25. É clara também, neste contexto, a violação do dever de lealdade contratual da parte recorrente, o que Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald denominam de dever derivado dos deveres de conduta, o qual é o mais imediato dever concorrente da boa-fé, mandamento de cooperação recíproca, impondo às partes a abstenção sobre qualquer conduta capaz de falsear o objetivo do negócio ou desequilibrar o jogo das prestações por elas consignado. Agir com deslealdade implica atingir a dignidade do outro contratante.26. Apesar de cuidar-se de responsabilidade prevista nos artigos 932, III e 933, do CCB/02, apenas como argumentação, importa ainda ser detidamente analisado o acervo probatório dos autos em atenção à regra processual quanto ao ônus de provar o alegado, à luz do disposto no art. 333, I e II, do CPC.27. A partir do momento em que alguém, mediante conduta culposa, viola direito de outrem e causa-lhe dano, está-se diante de um ato ilícito e deste ato deflui o inexorável dever de indenizar, consoante os artigos 186 e 927, do CCB/02.28. Apesar de não estar o Juízo adstrito ao Laudo Pericial, na livre apreciação da prova, podendo estabelecer as suas conclusões livremente, sob o pálio do Princípio do Livre Convencimento Racional e/ou Persuasão Racional do Juiz, fato é que, de acordo com os artigos 436/439, do CPC, esclarecimentos técnicos hábeis e específicos relacionados com a segurança da informação foram trazidos pelo Auxiliar do Juízo às fls. 1985/2145 corroborando o que indicam os artigos 932, III e 933, do CCB/02, esclarecendo que, efetivamente, todo o impasse decorreu da negligência das recorridas no gerenciamento contábil- administrativo-fiscal, má-fé de pessoas (prepostos da empresa) devidamente autorizados a manusear o Sistema bem como todo o esquema apurado só não foi deflagrado antes por ineficiência ou má-fé de responsáveis pela área contábil da empresa recorrida, não havendo que se falar em responsabilidade do apelante por inexistência de vícios ou defeitos no sistema questionado pelas autoras recorridas, diante de todo o acervo probatório examinado, em especial o Laudo Pericial às fls. 2039/2444.29. Desse modo, dos fatos e documentos trazidos à baila, ainda restou apurada a negligência das recorridas nas irregularidades examinadas por falha administrativa e contábil como principal responsável pelo ocorrido. As questões e níveis de segurança foram comprovados nos autos através de segunda perícia a qual apresentou testes e conclusões específicas quanto ao questionado, informando que o Sistema Safra Office Banking é certificado, possuindo recursos de segurança que permitem ao cliente controlar permissão do que um usuário pode ou não fazer no sistema; mas não podem substituir a contabilidade da empresa suplantando todas as suas operações e observâncias legais de registro e controle de entradas, saídas e documentos. 30. No tocante ao prequestionamento, a jurisprudência do Colendo Superior Tribunal de Justiça afirma que a exigência legal quanto ao prequestionamento é de que a tese defendida pela parte seja posta com clareza na instância ordinária, ensejando prequestionamento implícito.31. Como já demonstrado nos julgados supra, a indicação de dispositivos legais, expressamente, para fins de prequestionamento, é desnecessária, pois a obrigação na exposição de motivos habita na efetiva discussão da matéria. O prequestionamento essencial está relacionado à matéria debatida e não ao preceito legal apontado pela parte. Apelação conhecida. Agravo regimental não conhecido. Questões processuais indeferidas. Preliminares rejeitadas. Sentença reformada. Recurso provido.
Data do Julgamento
:
20/03/2013
Data da Publicação
:
26/03/2013
Órgão Julgador
:
1ª Turma Cível
Relator(a)
:
ALFEU MACHADO
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