TJDF APC -Apelação Cível-20111010046366APC
CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO REPARATÓRIO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. ACIDENTE DE TRÂNSITO. ATROPELAMENTO. ÓBITO DA VÍTIMA. SÚMULA IMPEDITIVA DE RECURSO (CPC, 518, § 1º). NÃO APRECIAÇÃO DO APELO DO MOTORISTA RÉU. MICROÔNIBUS PERTENCENTE À COOPERATIVA PRESTADORA DO SERVIÇO PÚBLICO DE TRANSPORTE. IRREGULARIDADE DE REPRESENTAÇÃO. REJEIÇÃO. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA E SOLIDÁRIA. CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA NÃO DEMONSTRADA. DESVIO DE ITINERÁRIO. IRRELEVÂNCIA. DANO MORAL CONFIGURADO. PERDA DE ENTE FAMILIAR (MÃE/ESPOSA). PREJUÍZO PRESUMIDO. QUANTIFICAÇÃO. OBEDIÊNCIA AOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. ADSTRIÇÃO À NORMATIVA DA EFETIVA EXTENSÃO DO DANO. SENTENÇA MANTIDA.1. Uma vez inadmitida a apelação em Primeira Instância, por falta de preparo, com base na súmula impeditiva de recurso (CPC, art. 518, § 1º), e tendo em vista a ausência de impugnação do motorista réu, via agravo de instrumento, tem-se por inviável o enfrentamento do seu conteúdo pelo Tribunal.2. A exibição do estatuto da entidade em juízo como condição de validade do instrumento de mandato outorgado ao seu procurador não é obrigatória, salvo se houver impugnação da parte contrária ou elementos que evidenciem a falsidade do documento. Por essa razão, não tendo sido acostado aos autos o respectivo estatuto, tem higidez formal a procuração outorgada por pessoa que se apresentou como representante legal da cooperativa, em prol da boa-fé que permeia os atos da vida civil e comercial e da teoria da aparência. Ao fim e ao cabo, tendo atendido prontamente aos atos de intimação do processo, não pode a parte levantar possível nulidade sanável de representação, quase dois anos depois de sua primeira manifestação nos autos, em sede recursal, afinal, a ninguém é dado beneficiar-se da própria torpeza. Preliminar rejeitada.3. A responsabilidade civil das pessoas prestadoras do serviço público de transporte, fundada na teoria do risco administrativo, é objetiva em relação a prejuízos ocasionados a terceiros usuários e não usuários do serviço (CF, art. 37, § 6º; CC, arts. 186, 927, 932, III e 942), sendo desnecessário perquirir acerca da existência de culpa. Basta a prova do fato lesivo (ação/omissão do prestador de serviço público), da ocorrência dano e do nexo causal entre eles, para fins de responsabilização.4. À luz dos elementos de prova, considerando que o condutor do microônibus de propriedade da entidade permissionária desse serviço público realizou manobra de conversão à esquerda em direção ao entroncamento, sem, contudo, certificar-se de que a transposição não ofereceria risco aos demais usuários da via (CTB, arts. 28, 34, 36 e 44), deve responder pelos danos causados em razão do atropelamento da mãe e esposa dos autores, cujas lesões resultaram em seu óbito, por traumatismo cranioencefálico.5. Irrelevante a alegação de desvio de itinerário do motorista que conduzia o ônibus, para fins de elisão da responsabilidade da prestadora do serviço público de transporte, por se tratar de responsabilidade civil objetiva.6. Há hipóteses excludentes da responsabilidade, dentre elas a culpa exclusiva da vítima. Não se desincumbindo a entidade ré quanto à demonstração desse fato extintivo do direito postulado (CPC, art. 333, II), prepondera a sua responsabilidade no caso concreto. 7. As circunstâncias fáticas narradas são capazes de atentar contra direitos da personalidade, sendo evidente o dano moral experimentado pelos autores, marido e filhos da vítima, cujo prejuízo é in re ipsa, ou seja, deriva inexoravelmente do próprio fato ofensivo (morte da esposa/mãe). A morte de um ente familiar querido, a toda evidência, desencadeia naturalmente uma sensação dolorosa de fácil e objetiva percepção, dispensada demonstração, notadamente em razão da imprevisibilidade do evento. É o que se chama de danos morais reflexos ou por ricochete. Ou seja, embora o evento danoso tenha afetado determinada pessoa, seus efeitos acabam por atingir, indiretamente, a integridade moral de terceiros (préjudice d'affection). 8. O valor dos danos morais, à míngua de parâmetro legislativo e dado o repúdio à tarifação dessa espécie de prejuízo, deve ser fixado segundo o prudente arbítrio do juiz, balizado pelos postulados da proporcionalidade e da razoabilidade, levando-se em conta as circunstâncias do caso concreto (gravidade, condições das partes etc.), sem fomentar a obtenção de vantagem indevida ou comportamentos irresponsáveis (CC, arts. 884 e 944). No particular, é de ser relevado, ainda, que o falecimento prematuro e imprevisível de um ente familiar querido enseja profundo abalo no íntimo dos autores, inexistindo meios de recompor efetivamente a situação ao status quo ante, mormente em razão da condição irreversível que é a morte. Nesse panorama, escorreito o valor dos danos morais arbitrado na sentença, à razão de R$ 100.000,00 (cem mil reais) para cada autor.9. Recurso conhecido, preliminar de irregularidade de representação processual rejeitada, e, no mérito, desprovido. Sentença mantida.
Ementa
CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO REPARATÓRIO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. ACIDENTE DE TRÂNSITO. ATROPELAMENTO. ÓBITO DA VÍTIMA. SÚMULA IMPEDITIVA DE RECURSO (CPC, 518, § 1º). NÃO APRECIAÇÃO DO APELO DO MOTORISTA RÉU. MICROÔNIBUS PERTENCENTE À COOPERATIVA PRESTADORA DO SERVIÇO PÚBLICO DE TRANSPORTE. IRREGULARIDADE DE REPRESENTAÇÃO. REJEIÇÃO. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA E SOLIDÁRIA. CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA NÃO DEMONSTRADA. DESVIO DE ITINERÁRIO. IRRELEVÂNCIA. DANO MORAL CONFIGURADO. PERDA DE ENTE FAMILIAR (MÃE/ESPOSA). PREJUÍZO PRESUMIDO. QUANTIFICAÇÃO. OBEDIÊNCIA AOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. ADSTRIÇÃO À NORMATIVA DA EFETIVA EXTENSÃO DO DANO. SENTENÇA MANTIDA.1. Uma vez inadmitida a apelação em Primeira Instância, por falta de preparo, com base na súmula impeditiva de recurso (CPC, art. 518, § 1º), e tendo em vista a ausência de impugnação do motorista réu, via agravo de instrumento, tem-se por inviável o enfrentamento do seu conteúdo pelo Tribunal.2. A exibição do estatuto da entidade em juízo como condição de validade do instrumento de mandato outorgado ao seu procurador não é obrigatória, salvo se houver impugnação da parte contrária ou elementos que evidenciem a falsidade do documento. Por essa razão, não tendo sido acostado aos autos o respectivo estatuto, tem higidez formal a procuração outorgada por pessoa que se apresentou como representante legal da cooperativa, em prol da boa-fé que permeia os atos da vida civil e comercial e da teoria da aparência. Ao fim e ao cabo, tendo atendido prontamente aos atos de intimação do processo, não pode a parte levantar possível nulidade sanável de representação, quase dois anos depois de sua primeira manifestação nos autos, em sede recursal, afinal, a ninguém é dado beneficiar-se da própria torpeza. Preliminar rejeitada.3. A responsabilidade civil das pessoas prestadoras do serviço público de transporte, fundada na teoria do risco administrativo, é objetiva em relação a prejuízos ocasionados a terceiros usuários e não usuários do serviço (CF, art. 37, § 6º; CC, arts. 186, 927, 932, III e 942), sendo desnecessário perquirir acerca da existência de culpa. Basta a prova do fato lesivo (ação/omissão do prestador de serviço público), da ocorrência dano e do nexo causal entre eles, para fins de responsabilização.4. À luz dos elementos de prova, considerando que o condutor do microônibus de propriedade da entidade permissionária desse serviço público realizou manobra de conversão à esquerda em direção ao entroncamento, sem, contudo, certificar-se de que a transposição não ofereceria risco aos demais usuários da via (CTB, arts. 28, 34, 36 e 44), deve responder pelos danos causados em razão do atropelamento da mãe e esposa dos autores, cujas lesões resultaram em seu óbito, por traumatismo cranioencefálico.5. Irrelevante a alegação de desvio de itinerário do motorista que conduzia o ônibus, para fins de elisão da responsabilidade da prestadora do serviço público de transporte, por se tratar de responsabilidade civil objetiva.6. Há hipóteses excludentes da responsabilidade, dentre elas a culpa exclusiva da vítima. Não se desincumbindo a entidade ré quanto à demonstração desse fato extintivo do direito postulado (CPC, art. 333, II), prepondera a sua responsabilidade no caso concreto. 7. As circunstâncias fáticas narradas são capazes de atentar contra direitos da personalidade, sendo evidente o dano moral experimentado pelos autores, marido e filhos da vítima, cujo prejuízo é in re ipsa, ou seja, deriva inexoravelmente do próprio fato ofensivo (morte da esposa/mãe). A morte de um ente familiar querido, a toda evidência, desencadeia naturalmente uma sensação dolorosa de fácil e objetiva percepção, dispensada demonstração, notadamente em razão da imprevisibilidade do evento. É o que se chama de danos morais reflexos ou por ricochete. Ou seja, embora o evento danoso tenha afetado determinada pessoa, seus efeitos acabam por atingir, indiretamente, a integridade moral de terceiros (préjudice d'affection). 8. O valor dos danos morais, à míngua de parâmetro legislativo e dado o repúdio à tarifação dessa espécie de prejuízo, deve ser fixado segundo o prudente arbítrio do juiz, balizado pelos postulados da proporcionalidade e da razoabilidade, levando-se em conta as circunstâncias do caso concreto (gravidade, condições das partes etc.), sem fomentar a obtenção de vantagem indevida ou comportamentos irresponsáveis (CC, arts. 884 e 944). No particular, é de ser relevado, ainda, que o falecimento prematuro e imprevisível de um ente familiar querido enseja profundo abalo no íntimo dos autores, inexistindo meios de recompor efetivamente a situação ao status quo ante, mormente em razão da condição irreversível que é a morte. Nesse panorama, escorreito o valor dos danos morais arbitrado na sentença, à razão de R$ 100.000,00 (cem mil reais) para cada autor.9. Recurso conhecido, preliminar de irregularidade de representação processual rejeitada, e, no mérito, desprovido. Sentença mantida.
Data do Julgamento
:
23/10/2013
Data da Publicação
:
25/10/2013
Órgão Julgador
:
1ª Turma Cível
Relator(a)
:
ALFEU MACHADO
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