TJDF APC -Apelação Cível-20120110204878APC
CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. CONSUMIDOR. LITISCONSÓRCIO PASSIVO FACULTATIVO COM PROCURADORES DISTINTOS. PRAZO RECURSAL EM DOBRO. INOVAÇÃO RECURSAL. CARACTERIZAÇÃO. CONHECIMENTO PARCIAL DO APELO. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ AFASTADA. AÇÃO REPARATÓRIA DE DANOS MATERIAIS. CERCEAMENTO DE DEFESA. DISPENSABILIDADE DE PRODUÇÃO DE PROVAL ORAL E PERICIAL. POSSIBILIDADE DE JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. PRELIMINAR REJEITADA. COMPRA DE MOTOCICLETA NOVA. PRESENÇA DE VÍCIO DE ADEQUAÇÃO/QUALIDADE, COM A NECESSIDADE DE SUBSTITUIÇÃO DE PEÇAS, NÃO SANADO NO TRINTÍDIO ESTABELECIDO PELO ART. 18 DO CDC. TEORIA DA QUALIDADE. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DA EMPRESA REPRESENTANTE DA MARCA E DA REVENDEDORA POR VÍCIO DO PRODUTO, RESGUARDADO O DIREITO DE REGRESSO. RESTITUIÇÃO DA QUANTIA EFETIVAMENTE PAGA, DEVIDAMENTE ATUALIZADA. POSSIBILIDADE. OPÇÃO RESGUARDADA AO CONSUMIDOR. DEVOLUÇÃO DO BEM E DA DOCUMENTAÇÃO PERTINENTE. DESNECESSIDADE DE FIXAÇÃO DE MULTA E PRAZO PARA TANTO. AUSÊNCIA DE RESISTÊNCIA DO CONSUMIDOR NO CUMPRIMENTO DESSAS MEDIDAS, APÓS O TRÂNSITO EM JULGADO DA DECISÃO. SENTENÇA MANTIDA.1. Cuidando-se de litisconsórcio passivo facultativo, com procuradores distintos, formado pela presença da representante da marca Suzuki no Brasil (J. TOLEDO SUZUKI MOTOS DO BRASIL) e da revendedora (PINHEIROS MOTOS LTDA. - PINAUTO MOTOS) no polo passivo da demanda por vício do produto, a contagem do prazo recursal sofre a dobra prevista no art. 191 do CPC, não havendo falar em intempestividade dos apelos por elas interpostos.2. As questões não suscitadas nem discutidas no processo, salvo as apreciáveis de ofício, não podem ser objeto de apreciação pelo Tribunal no julgamento da apelação, incorrendo em supressão de instância e consequente ofensa ao princípio do juízo natural, posto que não fomentada a questão ao Juízo de origem. Existindo argumentação não debatida, qual seja, a incúria do consumidor quanto à manutenção periódica de sua motocicleta, trazida à baila No recurso, este deve ter conhecimento apenas parcial (CPC, arts. 128, 300, 515, § 1º, e 517). Recurso da ré J. TOLEDO SUZUKI MOTOS DO BRASIL conhecido apenas em parte. 3. A inovação recursal não constitui fundamento hábil à condenação da parte por litigância de má-fé (CPC, art. 17), sobretudo quando não demonstrado abuso passível de justificar a aplicação dessa sanção.4. O juiz é o destinatário da prova, cabendo-lhe decidir quais são os elementos suficientes para formar seu convencimento, para que possa decidir motivadamente a questão controvertida e da maneira mais célere possível, indeferindo, para tanto, as diligências inúteis ou meramente protelatórias (CPC, arts. 125, I, 130 e 131). Nesse toar, não há falar em cerceamento de defesa pelo julgamento antecipado da lide, quando a prova oral vindicada, assim como a realização de perícia técnica, mostram-se dispensáveis à resolução da lide. A uma, porque há nos autos documentos suficientes sobre a demora na solução dos problemas apresentados pela moto adquirida. Em segundo lugar, porque a oitiva de testemunha com o intuito de ilidir a responsabilidade da parte ré (demora no conserto de motocicleta) diz respeito ao próprio mérito da demanda. Em terceiro lugar, porque a substituição de diversas peças em motocicleta com tão pouco tempo de uso, corroborada documentalmente, por óbvio, constitui indicativo evidente de que o bem apresentava defeito. Preliminar de nulidade da sentença rejeitada.5. O Código de Defesa do Consumidor, em seus arts. 6º, I e VI, 8º a 10, impõe um dever de qualidade dos produtos e serviços prestados pelos fornecedores (teoria da qualidade), tanto na adequação do produto ou serviço no mercado de consumo (responsabilidade por vício do produto e do serviço) como em aspectos de segurança (responsabilidade pelo fato do produto e do serviço). Protege-se, assim, a confiança que o consumidor deposita na prestabilidade de fruição do bem e no dever de incolumidade próprio e de terceiros na sua utilização. 6. Quanto aos vícios de adequação/qualidade, estabelece o Código de Defesa do Consumidor, em seu artigo 18, que todos os fornecedores que integram a cadeia de fornecimento são responsáveis solidariamente, perante o consumidor, pelos vícios dos produtos e serviços que introduziram ou participaram de sua produção no mercado de consumo. Nesse toar, se a cada um deles é imputada a responsabilidade pela garantia de qualidade/adequação do produto, sobressai evidente a desnecessidade de apuração de eventual culpa da concessionária responsável pelos reparos da moto, resguardado o direito de regresso.7. Diante do defeito apresentado que obsta a utilização do bem, cabe ao consumidor exigir a troca das peças viciadas. Não sendo essas substituídas no prazo máximo de 30 (trinta) dias, pode o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha, com fulcro no § 1º do art. 18 do CDC: a) a substituição do produto por outro da mesma espécie, em perfeitas condições de uso; b) a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos; e c) o arbitramento proporcional do preço. Tais soluções têm como propósito coibir a prática de abusos contra o consumidor, evitado que a solução do vício venha a ser protelada sem qualquer previsão. 8. Pelos elementos de prova colacionados, verifica-se que o consumidor adquiriu uma moto 0 Km, em 2/5/2011, a qual veio a apresentar defeitos ainda durante o prazo de garantia (na quilometragem de 790 Km e de 2.750 Km), cujos reparos ultrapassaram o trintídio estabelecido pelo Código de Defesa do Consumidor (entrega da moto na concessionária em 28/12/2011 e finalização do serviço apenas em 12/3/2012, sendo que a demanda em comento foi ajuizada em 15/2/2012). Nesse panorama, uma vez que ultrapassado o prazo de 30 (trinta) dias inserto no § 1º do art. 18 do CDC, tem o autor o direito à restituição imediata da quantia paga, pelo direito formativo extintivo de resolução do contrato, ex vi legis, retornado as partes ao estado anterior (status quo ante). Ao fim e ao cabo, quem adquire uma moto nova espera não ter que lidar com problemas deste tipo, no mínimo, pelo prazo da garantia do produto. 9. Considerando que a moto não se encontra em poder do consumidor, mas sim da concessionária responsável pelos reparos, afasta-se a possibilidade de enriquecimento indevido, podendo a parte ré retirar o bem diretamente do estabelecimento daquela, mormente porque a transferência de propriedade de bem móvel, como é o caso, perfaz-se com a tradição. De igual forma, tendo o consumidor exercido a alternativa de restituição imediata do valor pago, por óbvio, cabe a ele devolver a documentação da motocicleta, sendo desnecessária a fixação de multa e prazo para tanto quando não oferecida resistência no cumprimento de tal medida, após o trânsito em julgado da decisão. Mais a mais, nada impede que, quando do cumprimento do julgado, em caso de resistência da parte, tais medidas possam ser postuladas.10. Recurso da ré J. TOLEDO SUZUKI MOTOS DO BRASIL parcialmente conhecido e, na parte conhecida, desprovido. Recurso da ré PINHEIROS MOTOS LTDA. (PINAUTO MOTOS) conhecido e desprovido. Sentença mantida.
Ementa
CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. CONSUMIDOR. LITISCONSÓRCIO PASSIVO FACULTATIVO COM PROCURADORES DISTINTOS. PRAZO RECURSAL EM DOBRO. INOVAÇÃO RECURSAL. CARACTERIZAÇÃO. CONHECIMENTO PARCIAL DO APELO. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ AFASTADA. AÇÃO REPARATÓRIA DE DANOS MATERIAIS. CERCEAMENTO DE DEFESA. DISPENSABILIDADE DE PRODUÇÃO DE PROVAL ORAL E PERICIAL. POSSIBILIDADE DE JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. PRELIMINAR REJEITADA. COMPRA DE MOTOCICLETA NOVA. PRESENÇA DE VÍCIO DE ADEQUAÇÃO/QUALIDADE, COM A NECESSIDADE DE SUBSTITUIÇÃO DE PEÇAS, NÃO SANADO NO TRINTÍDIO ESTABELECIDO PELO ART. 18 DO CDC. TEORIA DA QUALIDADE. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DA EMPRESA REPRESENTANTE DA MARCA E DA REVENDEDORA POR VÍCIO DO PRODUTO, RESGUARDADO O DIREITO DE REGRESSO. RESTITUIÇÃO DA QUANTIA EFETIVAMENTE PAGA, DEVIDAMENTE ATUALIZADA. POSSIBILIDADE. OPÇÃO RESGUARDADA AO CONSUMIDOR. DEVOLUÇÃO DO BEM E DA DOCUMENTAÇÃO PERTINENTE. DESNECESSIDADE DE FIXAÇÃO DE MULTA E PRAZO PARA TANTO. AUSÊNCIA DE RESISTÊNCIA DO CONSUMIDOR NO CUMPRIMENTO DESSAS MEDIDAS, APÓS O TRÂNSITO EM JULGADO DA DECISÃO. SENTENÇA MANTIDA.1. Cuidando-se de litisconsórcio passivo facultativo, com procuradores distintos, formado pela presença da representante da marca Suzuki no Brasil (J. TOLEDO SUZUKI MOTOS DO BRASIL) e da revendedora (PINHEIROS MOTOS LTDA. - PINAUTO MOTOS) no polo passivo da demanda por vício do produto, a contagem do prazo recursal sofre a dobra prevista no art. 191 do CPC, não havendo falar em intempestividade dos apelos por elas interpostos.2. As questões não suscitadas nem discutidas no processo, salvo as apreciáveis de ofício, não podem ser objeto de apreciação pelo Tribunal no julgamento da apelação, incorrendo em supressão de instância e consequente ofensa ao princípio do juízo natural, posto que não fomentada a questão ao Juízo de origem. Existindo argumentação não debatida, qual seja, a incúria do consumidor quanto à manutenção periódica de sua motocicleta, trazida à baila No recurso, este deve ter conhecimento apenas parcial (CPC, arts. 128, 300, 515, § 1º, e 517). Recurso da ré J. TOLEDO SUZUKI MOTOS DO BRASIL conhecido apenas em parte. 3. A inovação recursal não constitui fundamento hábil à condenação da parte por litigância de má-fé (CPC, art. 17), sobretudo quando não demonstrado abuso passível de justificar a aplicação dessa sanção.4. O juiz é o destinatário da prova, cabendo-lhe decidir quais são os elementos suficientes para formar seu convencimento, para que possa decidir motivadamente a questão controvertida e da maneira mais célere possível, indeferindo, para tanto, as diligências inúteis ou meramente protelatórias (CPC, arts. 125, I, 130 e 131). Nesse toar, não há falar em cerceamento de defesa pelo julgamento antecipado da lide, quando a prova oral vindicada, assim como a realização de perícia técnica, mostram-se dispensáveis à resolução da lide. A uma, porque há nos autos documentos suficientes sobre a demora na solução dos problemas apresentados pela moto adquirida. Em segundo lugar, porque a oitiva de testemunha com o intuito de ilidir a responsabilidade da parte ré (demora no conserto de motocicleta) diz respeito ao próprio mérito da demanda. Em terceiro lugar, porque a substituição de diversas peças em motocicleta com tão pouco tempo de uso, corroborada documentalmente, por óbvio, constitui indicativo evidente de que o bem apresentava defeito. Preliminar de nulidade da sentença rejeitada.5. O Código de Defesa do Consumidor, em seus arts. 6º, I e VI, 8º a 10, impõe um dever de qualidade dos produtos e serviços prestados pelos fornecedores (teoria da qualidade), tanto na adequação do produto ou serviço no mercado de consumo (responsabilidade por vício do produto e do serviço) como em aspectos de segurança (responsabilidade pelo fato do produto e do serviço). Protege-se, assim, a confiança que o consumidor deposita na prestabilidade de fruição do bem e no dever de incolumidade próprio e de terceiros na sua utilização. 6. Quanto aos vícios de adequação/qualidade, estabelece o Código de Defesa do Consumidor, em seu artigo 18, que todos os fornecedores que integram a cadeia de fornecimento são responsáveis solidariamente, perante o consumidor, pelos vícios dos produtos e serviços que introduziram ou participaram de sua produção no mercado de consumo. Nesse toar, se a cada um deles é imputada a responsabilidade pela garantia de qualidade/adequação do produto, sobressai evidente a desnecessidade de apuração de eventual culpa da concessionária responsável pelos reparos da moto, resguardado o direito de regresso.7. Diante do defeito apresentado que obsta a utilização do bem, cabe ao consumidor exigir a troca das peças viciadas. Não sendo essas substituídas no prazo máximo de 30 (trinta) dias, pode o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha, com fulcro no § 1º do art. 18 do CDC: a) a substituição do produto por outro da mesma espécie, em perfeitas condições de uso; b) a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos; e c) o arbitramento proporcional do preço. Tais soluções têm como propósito coibir a prática de abusos contra o consumidor, evitado que a solução do vício venha a ser protelada sem qualquer previsão. 8. Pelos elementos de prova colacionados, verifica-se que o consumidor adquiriu uma moto 0 Km, em 2/5/2011, a qual veio a apresentar defeitos ainda durante o prazo de garantia (na quilometragem de 790 Km e de 2.750 Km), cujos reparos ultrapassaram o trintídio estabelecido pelo Código de Defesa do Consumidor (entrega da moto na concessionária em 28/12/2011 e finalização do serviço apenas em 12/3/2012, sendo que a demanda em comento foi ajuizada em 15/2/2012). Nesse panorama, uma vez que ultrapassado o prazo de 30 (trinta) dias inserto no § 1º do art. 18 do CDC, tem o autor o direito à restituição imediata da quantia paga, pelo direito formativo extintivo de resolução do contrato, ex vi legis, retornado as partes ao estado anterior (status quo ante). Ao fim e ao cabo, quem adquire uma moto nova espera não ter que lidar com problemas deste tipo, no mínimo, pelo prazo da garantia do produto. 9. Considerando que a moto não se encontra em poder do consumidor, mas sim da concessionária responsável pelos reparos, afasta-se a possibilidade de enriquecimento indevido, podendo a parte ré retirar o bem diretamente do estabelecimento daquela, mormente porque a transferência de propriedade de bem móvel, como é o caso, perfaz-se com a tradição. De igual forma, tendo o consumidor exercido a alternativa de restituição imediata do valor pago, por óbvio, cabe a ele devolver a documentação da motocicleta, sendo desnecessária a fixação de multa e prazo para tanto quando não oferecida resistência no cumprimento de tal medida, após o trânsito em julgado da decisão. Mais a mais, nada impede que, quando do cumprimento do julgado, em caso de resistência da parte, tais medidas possam ser postuladas.10. Recurso da ré J. TOLEDO SUZUKI MOTOS DO BRASIL parcialmente conhecido e, na parte conhecida, desprovido. Recurso da ré PINHEIROS MOTOS LTDA. (PINAUTO MOTOS) conhecido e desprovido. Sentença mantida.
Data do Julgamento
:
08/05/2013
Data da Publicação
:
13/05/2013
Órgão Julgador
:
1ª Turma Cível
Relator(a)
:
ALFEU MACHADO
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