TJDF APC -Apelação Cível-20120111629106APC
DIREITO ECONÔMICO E PROCESSUAL CIVIL. CONTRATO DE FINANCIAMENTO COM ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. REVISÃO DE CLÁUSULAS FINANCEIRAS. NATUREZA JURÍDICA. JUROS REMUNERATÓRIOS. CAPITALIZAÇÃO MENSAL. PACTUAÇÃO. LEGALIDADE. INFIRMAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. TARIFA DE CADASTRO. LEGALIDADE. AUTORIZAÇÃO REGULATÓRIA. COBRANÇA CONTRATUALMENTE PREVISTA. PRESERVAÇÃO (RESOLUÇÕES BACEN nº 2.303/96, 3.518/07, 3.693/09 e 3.919/10). TESE FIRMADA PELO STJ SOB O FORMATO DO ARTIGO 543-C DO CPC (REsp nº 1.251.331-RS). TARIFAS DE REGISTRO DE CONTRATO, DE INSERÇÃO DE GRAVAME ELETRÔNICO E DE RESSARCIMENTO POR SERVIÇOS DE TERCEIROS. ILEGALIDADE. AUSÊNCIA DE PREVISÃO REGULATÓRIA E DE CONTRAPRESTAÇÃO SUBJACENTE. DEVOLUÇÃO. FORMA SIMPLES. TARIFA DE LIQUIDAÇÃO ANTECIPADA. LEGITIMIDADE. INFIRMAÇÃO.1. O contrato bancário, enlaçando em seus vértices instituição financeira e consumidor como destinatário final do importe mutuado, qualifica-se como relação de consumo, não derivando da sua natureza jurídica, contudo, a possibilidade de ser revisado ante sua simples qualificação, estando a interseção judicial sobre o ajustado condicionada à aferição de que está permeado por cláusulas abusivas e desprovidas de estofo legal ou desconforme com os usos e práticas bancárias. 2. A capitalização mensal de juros, derivando do expressamente avençado, está revestida de lastro e se afigura legítima, sendo passível de incidir nas operações creditícias derivadas dos contratos concertados por instituição financeira integrante do Sistema Financeiro Nacional a partir do dia 31 de março de 2000, quando entrara a viger a Medida Provisória atualmente identificada com o nº 2.170-36, de 23 de agosto de 2001. 3. A apreensão de que o contrato contempla taxa de juros anual superior ao duodécuplo da taxa mensal é suficiente para ensejar a apreensão de que os juros remuneratórios são contados de forma capitalizada, afigurando-se essa inferência, a seu turno, suficiente para esclarecer o tomador do empréstimo acerca da prática, tornando dispensável a expressa consignação, em cláusula específica, de que os acessórios serão computados de forma capitalizada como pressuposto para o reconhecimento da subsistência de previsão contratual legitimando-a. 4. A capitalização de juros está impregnada na gênese das operações bancárias, posto que os recursos imobilizados em aplicações financeiras rendem juros mensais ou diários, conforme o caso, e as instituições financeiras tomadoras das aplicações, ao remunerá-los, não destacam juros de forma simples, computando-os de forma sistemática e progressiva, incidindo-os sobre a integralidade do montante aplicado, e não apenas sobre o principal original, ensejando que, se suportam juros compostos ao remunerarem as aplicações que lhe são confiadas, também estão legitimadas a exigir juros compostos ao fomentar empréstimos.5. Conquanto questionada a constitucionalidade do preceptivo que autoriza a capitalização mensal de juros nos mútuos bancários, a augusta Suprema Corte, a quem está conferida a competência para afirmar a desconformidade de qualquer preceptivo impregnado em diploma legal federal com a Constituição Federal, ainda não se pronunciara de forma conclusiva e definitiva acerca da argüição, ensejando que sobeje vigendo incólume, tanto que a egrégia Corte Superior de Justiça vem aplicando-o sem nenhuma reserva, reconhecendo e afirmando a liceidade da capitalização mensal de juros, desde que emirja do avençado, mormente porque não lhe compete velar pela constitucionalidade do direito federal infraconstitucional, mas pela uniformidade da sua interpretação e aplicação. 6. A tarifa de cadastro, ou denominação congênere, é passível de ser exigida uma única vez ao início do relacionamento entabulado entre consumidor e a instituição financeira, pois, aliado ao fato de que é legitimada sua cobrança pelo órgão regulador competente - Resoluções BACEN nº 2.303/96, 3.518/07, 3.693/09 e 3.919/10, - emerge dos serviços desenvolvidos pela instituição financeira volvidos à viabilização do estabelecimento do vínculo - pesquisas cadastrais, preparação de cadastro etc. -, legitimando o reembolso dos seus custos, e, outrossim, não se divisando abusividade concreta na sua exigibilidade se ponderada sua expressão pecuniária com o valor do contrato firmado, torna-se inviável sua invalidação ou mitigação, conforme tese firmado pela Corte Superior de Justiça sob o formato do artigo 543-C do estatuto processual (REsp nº 1.251.331 - RS).7. As tarifas de registro do contrato, de inclusão de gravame eletrônico e de despesas com serviços de terceiros consubstanciam a transferência para o consumidor dos custos operacionais que devem ser absorvidos pelo próprio banco, por serem inerentes às suas atividades, não se comprazendo essa transubstanciação de encargo, mormente porque desprovida de autorização proveniente autoridade reguladora do sistema financeiro, com a natureza jurídica da relação estabelecida entre a instituição financeira e o cliente, à medida que o CDC repugna a sujeição do consumidor a disposição que o coloque em franca desvantagem em relação ao fornecedor (CDC, art. 51, IV e § 1º).8. Conquanto a cobrança das tarifas de registro do contrato, de inclusão de gravame eletrônico e de despesas com serviços de terceiros derive de previsão encartada no instrumento firmado, a apreensão de que o contrato não consigna a origem e destinação dos encargos, resultando na constatação de que foram exigidos do mutuário sem sua prévia cientificação, violando o dever anexo de informação que encarta o legislador de consumo (CDC, art. 6º, III), conduz à certeza de que, independentemente do montante que alcançam, se destinam pura e simples à transmissão ao consumidor dos custos inerentes aos serviços fomentados pela instituição financeira, que deveria assumi-los por estarem encartados nos seus custos operacionais, o que é suficiente para transmudar a cobrança em vantagem abusiva e objetivamente aferível ante a subsistência de acessórios desguarnecidos da corresponde causa subjacente legítima.9. O legislador de consumo assegura ao consumidor o pagamento antecipado da obrigação, e, considerando que a liquidação antecipada abrevia a percepção do capital imobilizado pelo mutante, resguarda-lhe o direito de obter a redução proporcional dos juros e demais encargos, resultando dessa apreensão que a cobrança da tarifa de desconto pela liquidação antecipada, ainda que lastreada em autorização normativa proveniente da autoridade reguladora do sistema financeiro - Resolução CMN nº 3516/07 -, traduz a sujeição do consumidor a vantagem exagerada e a utilização de fórmula destinada a coibir a fruição de direito legalmente assegurado, ensejando que seja infirmada sua cobrança por repugnar as ressalvadas asseguradas ao consumidor de serviços bancários (CDC, arts. 51, I e IV). 10. A cobrança de qualquer tarifa bancária, conquanto emergindo de autorização regulatória editada pela autoridade monetária, não está imune ao controle judicial realizado sob o prisma da legislação de consumo, à medida que, conquanto a autoridade monetária esteja revestida de lastro para regular o funcionamento do sistema bancário, sua atuação tem como limites a legislação positiva, resultando que, aferida que a tarifa que engendrara não se coaduna com a legislação de consumo, transubstanciando vantagem indevida ao banco, deve ser infirmada sua legitimidade, ainda que derivada de regulação normativa subalterna.11. Apelação do autor parcialmente conhecida e parcialmente provida. Apelo do réu conhecido e parcialmente provido. Unânime.
Ementa
DIREITO ECONÔMICO E PROCESSUAL CIVIL. CONTRATO DE FINANCIAMENTO COM ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. REVISÃO DE CLÁUSULAS FINANCEIRAS. NATUREZA JURÍDICA. JUROS REMUNERATÓRIOS. CAPITALIZAÇÃO MENSAL. PACTUAÇÃO. LEGALIDADE. INFIRMAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. TARIFA DE CADASTRO. LEGALIDADE. AUTORIZAÇÃO REGULATÓRIA. COBRANÇA CONTRATUALMENTE PREVISTA. PRESERVAÇÃO (RESOLUÇÕES BACEN nº 2.303/96, 3.518/07, 3.693/09 e 3.919/10). TESE FIRMADA PELO STJ SOB O FORMATO DO ARTIGO 543-C DO CPC (REsp nº 1.251.331-RS). TARIFAS DE REGISTRO DE CONTRATO, DE INSERÇÃO DE GRAVAME ELETRÔNICO E DE RESSARCIMENTO POR SERVIÇOS DE TERCEIROS. ILEGALIDADE. AUSÊNCIA DE PREVISÃO REGULATÓRIA E DE CONTRAPRESTAÇÃO SUBJACENTE. DEVOLUÇÃO. FORMA SIMPLES. TARIFA DE LIQUIDAÇÃO ANTECIPADA. LEGITIMIDADE. INFIRMAÇÃO.1. O contrato bancário, enlaçando em seus vértices instituição financeira e consumidor como destinatário final do importe mutuado, qualifica-se como relação de consumo, não derivando da sua natureza jurídica, contudo, a possibilidade de ser revisado ante sua simples qualificação, estando a interseção judicial sobre o ajustado condicionada à aferição de que está permeado por cláusulas abusivas e desprovidas de estofo legal ou desconforme com os usos e práticas bancárias. 2. A capitalização mensal de juros, derivando do expressamente avençado, está revestida de lastro e se afigura legítima, sendo passível de incidir nas operações creditícias derivadas dos contratos concertados por instituição financeira integrante do Sistema Financeiro Nacional a partir do dia 31 de março de 2000, quando entrara a viger a Medida Provisória atualmente identificada com o nº 2.170-36, de 23 de agosto de 2001. 3. A apreensão de que o contrato contempla taxa de juros anual superior ao duodécuplo da taxa mensal é suficiente para ensejar a apreensão de que os juros remuneratórios são contados de forma capitalizada, afigurando-se essa inferência, a seu turno, suficiente para esclarecer o tomador do empréstimo acerca da prática, tornando dispensável a expressa consignação, em cláusula específica, de que os acessórios serão computados de forma capitalizada como pressuposto para o reconhecimento da subsistência de previsão contratual legitimando-a. 4. A capitalização de juros está impregnada na gênese das operações bancárias, posto que os recursos imobilizados em aplicações financeiras rendem juros mensais ou diários, conforme o caso, e as instituições financeiras tomadoras das aplicações, ao remunerá-los, não destacam juros de forma simples, computando-os de forma sistemática e progressiva, incidindo-os sobre a integralidade do montante aplicado, e não apenas sobre o principal original, ensejando que, se suportam juros compostos ao remunerarem as aplicações que lhe são confiadas, também estão legitimadas a exigir juros compostos ao fomentar empréstimos.5. Conquanto questionada a constitucionalidade do preceptivo que autoriza a capitalização mensal de juros nos mútuos bancários, a augusta Suprema Corte, a quem está conferida a competência para afirmar a desconformidade de qualquer preceptivo impregnado em diploma legal federal com a Constituição Federal, ainda não se pronunciara de forma conclusiva e definitiva acerca da argüição, ensejando que sobeje vigendo incólume, tanto que a egrégia Corte Superior de Justiça vem aplicando-o sem nenhuma reserva, reconhecendo e afirmando a liceidade da capitalização mensal de juros, desde que emirja do avençado, mormente porque não lhe compete velar pela constitucionalidade do direito federal infraconstitucional, mas pela uniformidade da sua interpretação e aplicação. 6. A tarifa de cadastro, ou denominação congênere, é passível de ser exigida uma única vez ao início do relacionamento entabulado entre consumidor e a instituição financeira, pois, aliado ao fato de que é legitimada sua cobrança pelo órgão regulador competente - Resoluções BACEN nº 2.303/96, 3.518/07, 3.693/09 e 3.919/10, - emerge dos serviços desenvolvidos pela instituição financeira volvidos à viabilização do estabelecimento do vínculo - pesquisas cadastrais, preparação de cadastro etc. -, legitimando o reembolso dos seus custos, e, outrossim, não se divisando abusividade concreta na sua exigibilidade se ponderada sua expressão pecuniária com o valor do contrato firmado, torna-se inviável sua invalidação ou mitigação, conforme tese firmado pela Corte Superior de Justiça sob o formato do artigo 543-C do estatuto processual (REsp nº 1.251.331 - RS).7. As tarifas de registro do contrato, de inclusão de gravame eletrônico e de despesas com serviços de terceiros consubstanciam a transferência para o consumidor dos custos operacionais que devem ser absorvidos pelo próprio banco, por serem inerentes às suas atividades, não se comprazendo essa transubstanciação de encargo, mormente porque desprovida de autorização proveniente autoridade reguladora do sistema financeiro, com a natureza jurídica da relação estabelecida entre a instituição financeira e o cliente, à medida que o CDC repugna a sujeição do consumidor a disposição que o coloque em franca desvantagem em relação ao fornecedor (CDC, art. 51, IV e § 1º).8. Conquanto a cobrança das tarifas de registro do contrato, de inclusão de gravame eletrônico e de despesas com serviços de terceiros derive de previsão encartada no instrumento firmado, a apreensão de que o contrato não consigna a origem e destinação dos encargos, resultando na constatação de que foram exigidos do mutuário sem sua prévia cientificação, violando o dever anexo de informação que encarta o legislador de consumo (CDC, art. 6º, III), conduz à certeza de que, independentemente do montante que alcançam, se destinam pura e simples à transmissão ao consumidor dos custos inerentes aos serviços fomentados pela instituição financeira, que deveria assumi-los por estarem encartados nos seus custos operacionais, o que é suficiente para transmudar a cobrança em vantagem abusiva e objetivamente aferível ante a subsistência de acessórios desguarnecidos da corresponde causa subjacente legítima.9. O legislador de consumo assegura ao consumidor o pagamento antecipado da obrigação, e, considerando que a liquidação antecipada abrevia a percepção do capital imobilizado pelo mutante, resguarda-lhe o direito de obter a redução proporcional dos juros e demais encargos, resultando dessa apreensão que a cobrança da tarifa de desconto pela liquidação antecipada, ainda que lastreada em autorização normativa proveniente da autoridade reguladora do sistema financeiro - Resolução CMN nº 3516/07 -, traduz a sujeição do consumidor a vantagem exagerada e a utilização de fórmula destinada a coibir a fruição de direito legalmente assegurado, ensejando que seja infirmada sua cobrança por repugnar as ressalvadas asseguradas ao consumidor de serviços bancários (CDC, arts. 51, I e IV). 10. A cobrança de qualquer tarifa bancária, conquanto emergindo de autorização regulatória editada pela autoridade monetária, não está imune ao controle judicial realizado sob o prisma da legislação de consumo, à medida que, conquanto a autoridade monetária esteja revestida de lastro para regular o funcionamento do sistema bancário, sua atuação tem como limites a legislação positiva, resultando que, aferida que a tarifa que engendrara não se coaduna com a legislação de consumo, transubstanciando vantagem indevida ao banco, deve ser infirmada sua legitimidade, ainda que derivada de regulação normativa subalterna.11. Apelação do autor parcialmente conhecida e parcialmente provida. Apelo do réu conhecido e parcialmente provido. Unânime.
Data do Julgamento
:
02/04/2014
Data da Publicação
:
15/04/2014
Órgão Julgador
:
1ª Turma Cível
Relator(a)
:
TEÓFILO CAETANO
Mostrar discussão