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Jurisprudência


TJDF APC -Apelação Cível-20120710013286APC

Ementa
EMPRESARIAL. CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO. AÇÃO DE RESCISÃO DE CONTRATO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAS. INOVAÇÃO RECURSAL. REJEIÇÃO. GRATUIDADE DE JUSTIÇA. DEFERIMENTO. ERRO MATERIAL NA SENTENÇA. RETIFICAÇÃO. CONTRATO VERBAL DE COMPRA E VENDA DE COTAS DE SOCIEDADE. VALOR SUPERIOR AO DE MERCADO. INADIMPLEMENTO DAS OBRIGAÇÕES PRETÉRITAS PELAS ANTIGAS SÓCIAS. QUEBRA DA BOA-FÉ OBJETIVA. RESCISÃO CONTRATUAL. POSSIBILIDADE. RETORNO AO STATUS QUO ANTE. DESNECESSIDADE DE APURAÇÃO POR HAVERES. DANOS MATERIAIS. REDUÇÃO DOS VALORES E ABATIMENTO COM DESPESAS PAGAS PELA PARTE CONTRÁRIA. DANO MORAL. CONFIGURAÇÃO. QUANTUM COMPENSATÓRIO. REDUÇÃO. OBEDIÊNCIA AOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. NORMATIVA DA EFETIVA EXTENSÃO DO DANO. SENTENÇA REFORMADA, EM PARTE.1. A mera transcrição de cláusula contratual, cujo teor expressa a responsabilidade das antigas sócias pelas dívidas da sociedade contraídas antes da admissão da sócia substituta, não caracteriza inovação recursal, mormente quando o seu conteúdo é abordado na decisão de Primeira Instância e na petição inicial. Preliminar rejeitada.2. Estando as rés recorrentes sob o patrocínio da Defensoria Pública, instituição esta que ostenta rígido controle na aferição da hipossuficiência de seus assistidos, e constando dos autos a declaração de pobreza de cada uma delas, é de se deferir o pedido de gratuidade judiciária formulado em sede recursal.3. Verificada a ocorrência de erro material na sentença, quanto à indicação de um dos valores da condenação, do qual faltou a importância de R$ 0,50 (cinquenta centavos), à luz do art. 463, I, do CPC, cabe ao julgador retificar esse equívoco, fazendo constar a correta quantia de R$ 102.400,50 (cento e dois mil, quatrocentos reais e cinquenta centavos).4. A relação obrigacional é pautada pela vontade e integrada pela boa-fé, resguardando o fiel processamento da relação jurídica entabulada mediante a imposição de deveres de conduta a ambos os contratantes (CC, art. 422). A quebra da boa-fé, pela ruptura das obrigações estabelecidas, vulnera a confiança daquele que foi induzido a legítimas expectativas de que o contrato seria realizado de determinada maneira.5. Pelos elementos dos autos, verifica-se que as partes celebraram contrato verbal de compra e venda, tendo a autora adquirido 75% das cotas da sociedade, pela importância de R$ 112.500,00 (cento e doze mil e quinhentos reais). Reforça a existência dessa relação jurídica o fato de ter havido alteração contratual para incluir a autora como sócia majoritária da sociedade, permanecendo do outro lado apenas uma das antigas sócias. 6. Também não se questiona que as rés, cerca de um mês antes da celebração do contrato com a autora, adquiriram o ponto comercial e as instalações da empresa por quantia bem inferior, à razão de R$ 80.000,00 (oitenta mil reais), dívida esta que não foi objeto de quitação.7. Sob essa ótica, a superioridade do preço cobrado, o inadimplemento das obrigações pretéritas ao contrato de compra e venda e a ausência de affectio societatis autorizam o pedido de rescisão contratual formulado pela autora e, conseguintemente, legitimam a anulação da alteração contratual e autorizam o retorno das partes ao status quo ante (devolução da quantia paga pela autora e restituição das cotas às antigas sócias).8. Não há falar em apuração de haveres para fins de dissolução da sociedade, pois a causa de pedir funda-se em fatos ocorridos antes da celebração da avença, o que remete mais adequadamente à rescisão do contrato.9. O critério para o ressarcimento dos danos materiais encontra-se no art. 402 do CC, que compreende os danos emergentes (diminuição patrimonial ocasionada à vítima) e os lucros cessantes (frustração da expectativa de um lucro esperado), sendo necessária a demonstração da efetiva perda patrimonial. Na espécie, observa-se que nem todos os prejuízos materiais discriminados pela autora quedaram comprovados, fazendo-se necessário extrair da condenação os valores de R$ 3.600,00 (três mil e seiscentos reais) e de R$ 949,49 (novecentos e quarenta e nove reais e quarenta e nove centavos). Lado outro, as rés, durante a constância da relação jurídica, comprovaram gastos com a sociedade à razão de R$ 2.320,00 (dois mil, trezentos e vinte reais), os quais devem ser abatidos da condenação.10. A inobservância de cláusulas contratuais gera frustrações para a parte inocente, mas não se apresenta, em regra, como suficiente para produzir dano na esfera íntima do indivíduo, pois o descumprimento das obrigações contratuais não é de todo imprevisível. O caso concreto, todavia, foge da esfera de mero descumprimento contratual, ensejando abuso de direito. Note-se que a autora investiu de boa-fé no negócio que acabara de entabular, pagando a contraprestação respectiva. As rés, ao seu turno, além de cobrar montante muito superior ao de compra do estabelecimento, não quitaram as dívidas anteriores à inserção da autora na sociedade, frustrando, com essa atitude, as legítimas expectativas de lucros, atentando contra direitos da personalidade da autora, para fins de dano moral (CC, arts. 186, 187 e 927). 11. O quantum dos danos morais deve obedecer a critérios de razoabilidade e proporcionalidade, levando-se em conta, além da necessidade de reparação dos danos sofridos, as circunstâncias do caso, a gravidade do prejuízo, a situação do ofensor, a condição do ofendido e a prevenção de comportamentos futuros análogos. O valor pecuniário não pode ser fonte de obtenção de vantagem indevida, mas também não pode ser irrisório, para não fomentar comportamentos irresponsáveis. Normativa da efetiva extensão do dano (CC, art. 944). Nesse passo, à luz do caso concreto, impõe-se a redução do valor dos danos morais arbitrado na sentença para R$ 8.000,00 (oito mil reais).12. Inovação recursal rejeitada. Gratuidade de justiça deferida. Erro material da sentença retificado de ofício. Recursos de apelação conhecidos e parcialmente providos para: a) extrair da condenação por danos materiais os valores de R$ 3.600,00 (três mil e seiscentos reais) e de R$ 949,49 (novecentos e quarenta e nove reais e quarenta e nove centavos); b) determinar o abatimento da quantia de R$ 2.320,00 (dois mil, trezentos e vinte reais) da condenação por danos materiais; c) reduzir os danos morais para R$ 8.000,00 (oito mil reais). Pela sucumbência, as rés arcarão com o pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, estes no valor de R$ 1.500,00 (um mil e quinhentos reais).

Data do Julgamento : 09/10/2013
Data da Publicação : 14/10/2013
Órgão Julgador : 1ª Turma Cível
Relator(a) : ALFEU MACHADO
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