TJDF APC -Apelação Cível-20120910148096APC
CIVIL E PROCESSO CIVIL. ACIDENTE DE TRÂNSITO. COLISÃO DE CAMINHÃO COM RESIDÊNCIA. RESULTADO. ÓBITO DE CRIANÇA DE TENRA IDADE ALOJADA NO INTERIOR DA RESIDÊNCIA. PRESCRIÇÃO. TERMO INICIAL. FATO. ILÍCITO PENAL. APURAÇÃO. SUSPENSÃO DO INTERREGNO. IMPLEMENTO. INOCORRÊNCIA. ART. 200 DO CÓDIGO CIVIL. AFIRMAÇÃO. ELISÃO. SENTENÇA. CASSAÇÃO. EXAMINAÇÃO IMEDIATA DO MÉRITO. POSSIBILIDADE (ART. 515, § 1º). RESPONSABILIDADE DA EMPRESA BENEFICIÁRIA DO TRANSPORTE EFETUADO. AFIRMAÇÃO. GENITORA DA VÍTIMA FATAL. DANO MORAL DECORRENTE DO ÓBITO. CARACTERIZAÇÃO. COMPENSAÇÃO PECUNIÁRIA. GRAVIDADE DO FATO. OBSERVÂNCIA DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. ADEQUAÇÃO. PENSÃO POR MORTE. FAMÍLIA DE BAIXA RENDA. AUXÍLIO PRESUMIDO. CONCESSÃO. MENSURAÇÃO. PARÂMETROS. 1. Irradiando o fato ilícito efeitos nas esferas cível e criminal, demandando que seja aferido, apurado e sancionado no juízo criminal, a prescrição da pretensão indenizatória resta suspensa até que haja definitiva resolução da pretensão criminal (CC, art. 200), emergindo dessa regulação que, manejada a pretensão reparatória no curso da ação penal deflagrada em desfavor do protagonista do ilícito, não fora alcançada pela prescrição, cujo fluxo, sob essa moldura, sequer se iniciara. 2. Elidida a prescrição reconhecida pela sentença, redundando na reforma do originariamente decidido, o tribunal, estando a ação devidamente instruída e tendo percorrido o itinerário procedimental, restando resguardado o devido processo legal, está autorizado a resolver as questões suscitadas e não resolvidas, ou seja, o próprio mérito da ação, ainda que não tenham sido resolvidas inteiramente pela sentença, não importando a resolução do mérito em ofensa ao princípio do duplo grau de jurisdição ante a previsão legal que autoriza esse procedimento como expressão dos princípios da economia, efetividade e celeridade processuais (CPC, art. 515, § 1º). 3. Incorre em inexorável negligência o condutor que, estacionando o veículo de transporte de cargas que conduzia em via inclinada e deixando seu controle, descendo do veículo, não adota as medidas que lhe estavam afetadas e destinadas a obstar que o automotor, sofrendo a incidência dos efeitos da lei inercial, entrasse em movimento quando desprovido de controle, vindo a atingir residências, destruindo-as parcialmente, emergindo do infortúnio o óbito de criança que se encontrava no interior de uma das casas afetadas, devendo ser reputado culpado pelos efeitos que sua postura ensejara.4. Emergindo acidente de trânsito motivado pela conduta negligente do condutor do automotor, a empresa para a qual prestava serviços é solidariamente responsável a compor os danos derivados do ilícito, legitimando que a genitora da vítima fatal a acione com o escopo de obter a composição dos danos materiais e a compensação do dano moral que o ilícito lhe ensejara por ter ficado desprovida da filha de tenra idade que viera a ser atingida violentamente pelo veículo de transporte de cargas quando se encontrava no interior da sua residência. 5. O óbito de filha de tenra idade por ter sido atropelada por caminhão quando se encontrava no interior da própria residência, que fora invadida pelo automotor, afetando a intangibilidade psicológica da mãe, enseja a caracterização do dano moral, legitimando que lhe seja deferida compensação pecuniária de conformidade com as circunstâncias em que se verificaram o evento danoso e a gravidade das dores experimentadas pela genitora, que padecerá com a perda da infante pelo resto da existência, experimentando padecimento psicológico que a acompanhará enquanto cumpre sua jornada de vida.6. O dano moral, porque afeta diretamente os atributos da personalidade do ofendido, maculando os seus sentimentos e impregnando indelével nódoa na sua existência, ante as ofensas que experimentara no que lhe é mais caro - integridade física/psicológica, dignidade, auto-estima, honra, credibilidade, tranqüilidade etc. -, se aperfeiçoa com a simples ocorrência do ato ilícito que se qualifica como sua origem genética, não reclamando sua qualificação que do ocorrido tenha derivado qualquer repercussão no patrimônio material do lesado. 7. A mensuração da compensação pecuniária devida ao atingido por ofensas de natureza moral, conquanto permeada por critérios de caráter eminentemente subjetivo ante o fato de que os direitos da personalidade não são tarifados, deve ser efetivada de forma parcimoniosa e em ponderação com os princípios da proporcionalidade, atentando-se para a gravidade dos danos havidos e para o comportamento do ofensor, e da razoabilidade, que recomenda que o importe fixado não seja tão excessivo a ponto de ensejar uma alteração na situação financeira dos envolvidos nem tão inexpressivo que redunde em uma nova ofensa ao vitimado.8. Sob o âmbito das famílias menos abastadas é presumível que os filhos, desde que habilitados a laborar, concorram para as despesas domésticas comuns, resultando que, derivando de acidente a morte de filha menor inserida em família que se enquadra em aludida qualificação, assiste à genitora o direito de auferir pensão, no valor de 2/3 do salário mínimo, desde a data em que a herdeira completaria 14 anos (momento em que estaria apta a exercer atividade laborativa na condição de aprendiz; CF, art. 7º, XXXIII), até os 25 anos, e, no patamar de 1/3 do salário mínimo, dos 25 anos de idade (quando presumivelmente constituiria família própria e, ante as despesas inerentes ao lar próprio, diminuiria o auxílio financeiro conferido aos pais), até a data em que a vítima do dano civil complete 65 anos, longevidade presumível do brasileiro. Precedentes do Colendo Superior Tribunal de Justiça. 9. Aferido que a vítima do ilícito civil postulara a percepção, de uma só vez, do correspondente à pensão que lhe é devida em decorrência da morte da filha e inexistindo dúvidas de que a responsável pela reparação do dano é dotada de capacidade econômica para honrar de imediato a obrigação, afigura-se plenamente viável que a satisfação da cominação se aperfeiçoe de imediato e em única parcela, de forma a ser resguardada efetividade ao objetivo da composição sem afetar o equilíbrio financeiro da obrigada, mediante aplicação analógica da norma prevista no parágrafo único do artigo 950 do Código Civil. 10. Apelação conhecida e provida para cassar a sentença e, examinado o mérito, acolher o pedido inicial. Unânime.
Ementa
CIVIL E PROCESSO CIVIL. ACIDENTE DE TRÂNSITO. COLISÃO DE CAMINHÃO COM RESIDÊNCIA. RESULTADO. ÓBITO DE CRIANÇA DE TENRA IDADE ALOJADA NO INTERIOR DA RESIDÊNCIA. PRESCRIÇÃO. TERMO INICIAL. FATO. ILÍCITO PENAL. APURAÇÃO. SUSPENSÃO DO INTERREGNO. IMPLEMENTO. INOCORRÊNCIA. ART. 200 DO CÓDIGO CIVIL. AFIRMAÇÃO. ELISÃO. SENTENÇA. CASSAÇÃO. EXAMINAÇÃO IMEDIATA DO MÉRITO. POSSIBILIDADE (ART. 515, § 1º). RESPONSABILIDADE DA EMPRESA BENEFICIÁRIA DO TRANSPORTE EFETUADO. AFIRMAÇÃO. GENITORA DA VÍTIMA FATAL. DANO MORAL DECORRENTE DO ÓBITO. CARACTERIZAÇÃO. COMPENSAÇÃO PECUNIÁRIA. GRAVIDADE DO FATO. OBSERVÂNCIA DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. ADEQUAÇÃO. PENSÃO POR MORTE. FAMÍLIA DE BAIXA RENDA. AUXÍLIO PRESUMIDO. CONCESSÃO. MENSURAÇÃO. PARÂMETROS. 1. Irradiando o fato ilícito efeitos nas esferas cível e criminal, demandando que seja aferido, apurado e sancionado no juízo criminal, a prescrição da pretensão indenizatória resta suspensa até que haja definitiva resolução da pretensão criminal (CC, art. 200), emergindo dessa regulação que, manejada a pretensão reparatória no curso da ação penal deflagrada em desfavor do protagonista do ilícito, não fora alcançada pela prescrição, cujo fluxo, sob essa moldura, sequer se iniciara. 2. Elidida a prescrição reconhecida pela sentença, redundando na reforma do originariamente decidido, o tribunal, estando a ação devidamente instruída e tendo percorrido o itinerário procedimental, restando resguardado o devido processo legal, está autorizado a resolver as questões suscitadas e não resolvidas, ou seja, o próprio mérito da ação, ainda que não tenham sido resolvidas inteiramente pela sentença, não importando a resolução do mérito em ofensa ao princípio do duplo grau de jurisdição ante a previsão legal que autoriza esse procedimento como expressão dos princípios da economia, efetividade e celeridade processuais (CPC, art. 515, § 1º). 3. Incorre em inexorável negligência o condutor que, estacionando o veículo de transporte de cargas que conduzia em via inclinada e deixando seu controle, descendo do veículo, não adota as medidas que lhe estavam afetadas e destinadas a obstar que o automotor, sofrendo a incidência dos efeitos da lei inercial, entrasse em movimento quando desprovido de controle, vindo a atingir residências, destruindo-as parcialmente, emergindo do infortúnio o óbito de criança que se encontrava no interior de uma das casas afetadas, devendo ser reputado culpado pelos efeitos que sua postura ensejara.4. Emergindo acidente de trânsito motivado pela conduta negligente do condutor do automotor, a empresa para a qual prestava serviços é solidariamente responsável a compor os danos derivados do ilícito, legitimando que a genitora da vítima fatal a acione com o escopo de obter a composição dos danos materiais e a compensação do dano moral que o ilícito lhe ensejara por ter ficado desprovida da filha de tenra idade que viera a ser atingida violentamente pelo veículo de transporte de cargas quando se encontrava no interior da sua residência. 5. O óbito de filha de tenra idade por ter sido atropelada por caminhão quando se encontrava no interior da própria residência, que fora invadida pelo automotor, afetando a intangibilidade psicológica da mãe, enseja a caracterização do dano moral, legitimando que lhe seja deferida compensação pecuniária de conformidade com as circunstâncias em que se verificaram o evento danoso e a gravidade das dores experimentadas pela genitora, que padecerá com a perda da infante pelo resto da existência, experimentando padecimento psicológico que a acompanhará enquanto cumpre sua jornada de vida.6. O dano moral, porque afeta diretamente os atributos da personalidade do ofendido, maculando os seus sentimentos e impregnando indelével nódoa na sua existência, ante as ofensas que experimentara no que lhe é mais caro - integridade física/psicológica, dignidade, auto-estima, honra, credibilidade, tranqüilidade etc. -, se aperfeiçoa com a simples ocorrência do ato ilícito que se qualifica como sua origem genética, não reclamando sua qualificação que do ocorrido tenha derivado qualquer repercussão no patrimônio material do lesado. 7. A mensuração da compensação pecuniária devida ao atingido por ofensas de natureza moral, conquanto permeada por critérios de caráter eminentemente subjetivo ante o fato de que os direitos da personalidade não são tarifados, deve ser efetivada de forma parcimoniosa e em ponderação com os princípios da proporcionalidade, atentando-se para a gravidade dos danos havidos e para o comportamento do ofensor, e da razoabilidade, que recomenda que o importe fixado não seja tão excessivo a ponto de ensejar uma alteração na situação financeira dos envolvidos nem tão inexpressivo que redunde em uma nova ofensa ao vitimado.8. Sob o âmbito das famílias menos abastadas é presumível que os filhos, desde que habilitados a laborar, concorram para as despesas domésticas comuns, resultando que, derivando de acidente a morte de filha menor inserida em família que se enquadra em aludida qualificação, assiste à genitora o direito de auferir pensão, no valor de 2/3 do salário mínimo, desde a data em que a herdeira completaria 14 anos (momento em que estaria apta a exercer atividade laborativa na condição de aprendiz; CF, art. 7º, XXXIII), até os 25 anos, e, no patamar de 1/3 do salário mínimo, dos 25 anos de idade (quando presumivelmente constituiria família própria e, ante as despesas inerentes ao lar próprio, diminuiria o auxílio financeiro conferido aos pais), até a data em que a vítima do dano civil complete 65 anos, longevidade presumível do brasileiro. Precedentes do Colendo Superior Tribunal de Justiça. 9. Aferido que a vítima do ilícito civil postulara a percepção, de uma só vez, do correspondente à pensão que lhe é devida em decorrência da morte da filha e inexistindo dúvidas de que a responsável pela reparação do dano é dotada de capacidade econômica para honrar de imediato a obrigação, afigura-se plenamente viável que a satisfação da cominação se aperfeiçoe de imediato e em única parcela, de forma a ser resguardada efetividade ao objetivo da composição sem afetar o equilíbrio financeiro da obrigada, mediante aplicação analógica da norma prevista no parágrafo único do artigo 950 do Código Civil. 10. Apelação conhecida e provida para cassar a sentença e, examinado o mérito, acolher o pedido inicial. Unânime.
Data do Julgamento
:
29/08/2012
Data da Publicação
:
13/09/2012
Órgão Julgador
:
1ª Turma Cível
Relator(a)
:
TEÓFILO CAETANO
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