TJDF APO - 1097097-20160110869232APO
DIREITO ADMININSTRATIVO E CONSTITUCIONAL. APELAÇÃO CÍVEL E REMESSA NECESSÁRIA. AÇÃO ORDINÁRIA. DIREITO À SAÚDE. CRIANÇA COM MÁ FORMAÇÃO GENÉTICA. SOFRIMENTO, PIORA DO ESTADO CLINICO E RISCO À VIDA. OBRIGAÇÃO DE FAZER. REALIZAÇÃO DE CIRURGIA PELO ESTADO. SOFRIMENTO IMPERATIVADE. FIXAÇÃO DE MULTA COMINATÓRIA CONTRA A FAZENDA PÚBLICA. POSSIBILIDADE. PATAMAR DIÁRIO. ADEQUAÇÃO. DESCUMPRIMENTO REITERADO DE ORDEM LIMINAR NO CURSO DO PROCESSO. RECALCITRÂNCIA INJUSTIFICADA. DEMORA DE MAIS DE UM ANO NO CUMPRIMENTO DA LIMINAR, POSTERIORMENTE CONFIRMADA NA SENTENÇA. POSSÍVEL PIORA DO QUADRO CLINICO e RESULTANDO NA MORTE DA AUTORA. ASTREINTES MÓDICAS DIANTE DAS PECULIARIDADES DO CASO. REMESSA DOS AUTOS AO MP. ART. 40 DO CPP. REEXAME NECESSÁRIO E RECURSO DE APELAÇÃO DESPROVIDOS. 1. O direito à saúde, inserto nos arts. 6º e 196 da CF e arts. 204, II, e 205, I, da Lei Orgânica do Distrito Federal, é dever do Estado estendido de forma solidária a todos os entes da federação, de observância obrigatória pelos responsáveis pela garantia dos direitos fundamentais em nossa sociedade, mormente os operadores do direito. A Constituição não é ornamental, não se tratando de um arcabouço de idéia e princípios, reclama, pois, uma efetividade real de suas normas que, no que atine ao direito à saúde, deve se realizar por meio de políticas sociais e econômicas, propiciando aos necessitados não qualquer tratamento, mas o tratamento mais adequado e eficaz, apto a ofertar ao enfermo maior dignidade de vida e menor sofrimento, independentemente do custo do insumo ou procedimento médico indicado. 3. No particular, observa-se que a autora, menor de tenra idade, nascida em 01/07/2013, sofria de má-formação genética extensa, e que era imprescindível a submissão à cirurgia de gastrostomia com fundoplicatura em caráter de urgência, para correção de doença do refluxo gástrico grave, episódios de pneumonia aspirativa, desnutrição severa, que lhe impunha a necessidade de internação e risco de morte. Nesse contexto, a autora não poderia ficar a mercê do Estado, sob pena de manutenção do sofrimento vivenciado com seu estado de saúde, passível de ser agravado e resultar em morte da paciente. 4. A par dessas nuances, como ressaltado, o réu recorrente não comprovou a falta de vagas no setor competente, bem como materiais e equipe médica, tampouco a insuficiência de recursos orçamentários, o que afasta a alegação de desrespeito à fila de pacientes na mesma situação e aos postulados da universalidade (CF, art. 196), da reserva do possível, da isonomia, da impessoalidade e da moralidade. 5. A multa diária (astreintes) não possui caráter punitivo, mas sim inibitório, a fim de coagir a parte ao cumprimento da obrigação de fazer estabelecida (CPC, art. 536 e 537). Nesse propósito, deve atender aos critérios de proporcionalidade e razoabilidade, não podendo servir como modo de enriquecimento sem causa (CC, art. 884). 5.1. Na espécie, é legal e legítima a fixação de multa pecuniária diária, nos limites arbitrados na sentença, visando a resguardar o cumprimento da obrigação de fazer imposta ao DISTRITO FEDERAL, consubstanciada na materialização do direito à saúde (internação e realização de cirurgia do paciente), mormente porque não apresentada qualquer justificativa plausível para a mora e evidenciado manifesto intuito de se furtar ao cumprimento da determinação judicial no curso do processo. 5.2. Somente em 16/10/2017 foi realizada a cirurgia requerida pela autora, depois de mais de um ano do deferimento do atendimento cirúrgico por decisão que vige desde 05/09/2016, e de 4 intimações pessoais descumpridas e ignoradas pelo Distrito Federal além da intimações oficiais destinadas aos seus Procuradores, resultando em sofrimento pessoal, possível agravamento do estado de saúde e potencialmente contribuindo para o óbito de criança dias depois da cirurgia, o que impõe a manutenção da astreinte e exige efetiva apuração pelo órgão ministerial a fim de se aferir eventual prática de conduta criminal e de ato de improbidade administrativa envolvidos. 6. Recurso de apelação e remessa oficial conhecidos e desprovidos.
Ementa
DIREITO ADMININSTRATIVO E CONSTITUCIONAL. APELAÇÃO CÍVEL E REMESSA NECESSÁRIA. AÇÃO ORDINÁRIA. DIREITO À SAÚDE. CRIANÇA COM MÁ FORMAÇÃO GENÉTICA. SOFRIMENTO, PIORA DO ESTADO CLINICO E RISCO À VIDA. OBRIGAÇÃO DE FAZER. REALIZAÇÃO DE CIRURGIA PELO ESTADO. SOFRIMENTO IMPERATIVADE. FIXAÇÃO DE MULTA COMINATÓRIA CONTRA A FAZENDA PÚBLICA. POSSIBILIDADE. PATAMAR DIÁRIO. ADEQUAÇÃO. DESCUMPRIMENTO REITERADO DE ORDEM LIMINAR NO CURSO DO PROCESSO. RECALCITRÂNCIA INJUSTIFICADA. DEMORA DE MAIS DE UM ANO NO CUMPRIMENTO DA LIMINAR, POSTERIORMENTE CONFIRMADA NA SENTENÇA. POSSÍVEL PIORA DO QUADRO CLINICO e RESULTANDO NA MORTE DA AUTORA. ASTREINTES MÓDICAS DIANTE DAS PECULIARIDADES DO CASO. REMESSA DOS AUTOS AO MP. ART. 40 DO CPP. REEXAME NECESSÁRIO E RECURSO DE APELAÇÃO DESPROVIDOS. 1. O direito à saúde, inserto nos arts. 6º e 196 da CF e arts. 204, II, e 205, I, da Lei Orgânica do Distrito Federal, é dever do Estado estendido de forma solidária a todos os entes da federação, de observância obrigatória pelos responsáveis pela garantia dos direitos fundamentais em nossa sociedade, mormente os operadores do direito. A Constituição não é ornamental, não se tratando de um arcabouço de idéia e princípios, reclama, pois, uma efetividade real de suas normas que, no que atine ao direito à saúde, deve se realizar por meio de políticas sociais e econômicas, propiciando aos necessitados não qualquer tratamento, mas o tratamento mais adequado e eficaz, apto a ofertar ao enfermo maior dignidade de vida e menor sofrimento, independentemente do custo do insumo ou procedimento médico indicado. 3. No particular, observa-se que a autora, menor de tenra idade, nascida em 01/07/2013, sofria de má-formação genética extensa, e que era imprescindível a submissão à cirurgia de gastrostomia com fundoplicatura em caráter de urgência, para correção de doença do refluxo gástrico grave, episódios de pneumonia aspirativa, desnutrição severa, que lhe impunha a necessidade de internação e risco de morte. Nesse contexto, a autora não poderia ficar a mercê do Estado, sob pena de manutenção do sofrimento vivenciado com seu estado de saúde, passível de ser agravado e resultar em morte da paciente. 4. A par dessas nuances, como ressaltado, o réu recorrente não comprovou a falta de vagas no setor competente, bem como materiais e equipe médica, tampouco a insuficiência de recursos orçamentários, o que afasta a alegação de desrespeito à fila de pacientes na mesma situação e aos postulados da universalidade (CF, art. 196), da reserva do possível, da isonomia, da impessoalidade e da moralidade. 5. A multa diária (astreintes) não possui caráter punitivo, mas sim inibitório, a fim de coagir a parte ao cumprimento da obrigação de fazer estabelecida (CPC, art. 536 e 537). Nesse propósito, deve atender aos critérios de proporcionalidade e razoabilidade, não podendo servir como modo de enriquecimento sem causa (CC, art. 884). 5.1. Na espécie, é legal e legítima a fixação de multa pecuniária diária, nos limites arbitrados na sentença, visando a resguardar o cumprimento da obrigação de fazer imposta ao DISTRITO FEDERAL, consubstanciada na materialização do direito à saúde (internação e realização de cirurgia do paciente), mormente porque não apresentada qualquer justificativa plausível para a mora e evidenciado manifesto intuito de se furtar ao cumprimento da determinação judicial no curso do processo. 5.2. Somente em 16/10/2017 foi realizada a cirurgia requerida pela autora, depois de mais de um ano do deferimento do atendimento cirúrgico por decisão que vige desde 05/09/2016, e de 4 intimações pessoais descumpridas e ignoradas pelo Distrito Federal além da intimações oficiais destinadas aos seus Procuradores, resultando em sofrimento pessoal, possível agravamento do estado de saúde e potencialmente contribuindo para o óbito de criança dias depois da cirurgia, o que impõe a manutenção da astreinte e exige efetiva apuração pelo órgão ministerial a fim de se aferir eventual prática de conduta criminal e de ato de improbidade administrativa envolvidos. 6. Recurso de apelação e remessa oficial conhecidos e desprovidos.
Data do Julgamento
:
16/05/2018
Data da Publicação
:
22/05/2018
Órgão Julgador
:
6ª TURMA CÍVEL
Relator(a)
:
ALFEU MACHADO
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