TJDF APO - 851960-20140110057124APO
CONSTITUCIONAL, ADMINISTRATIVO E CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. ESTABELECIMENTO HOSPITALAR PÚBLICO. ATENDIMENTO DEFEITUOSO. RETARDAMENTO NA REALIZAÇÃO DE PROCEDIMENTO CIRÚRGICO. DETERMINAÇÃO JUDICIAL. DESCUMPRIMENTO. PACIENTE ACOMETIDO DE NEOPLASIA MALIGNA. PROGRESSÃO DA DOENÇA. IMPOSSIBILIDADE SUPERVENIENTE DE REALIZAÇÃO DA CIRURGIA. EFEITOS LESIVOS. OMISSÃO. DANO MORAL. CARACTERIZAÇÃO. VALOR DA INDENIZAÇÃO. GRAVIDADE DA CONDUDA E DE SEUS EFEITOS. MENSURAÇÃO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. PENSÃO VITALÍCIA. INAPTIDÃO PARA EXERCÍCIO DE ATIVIDADE LABORAL. DECORRÊNCIA DA PRÓPRIA DOENÇA. NEXO DE CAUSALIDADE. AUSÊNCIA. REJEIÇÃO. CONVERSÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER EM PERDAS E DANOS. IMPOSSIBILIDADE DE CUMPRIMENTO. NOVA CONDENAÇÃO EM DANOS MATERIAIS. DUPLICIDADE. IMPOSSIBILIDADE. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CONDENAÇÃO DA FAZENDA PÚBLICA. MENSURAÇÃO. 1. Aviada ação indenizatória em desfavor do estado sob a imputação de negligência havida nos serviços públicos fomentados por hospital da rede pública, consubstanciando a falha na imputação de demora excessiva na realização de procedimento cirúrgico para retirada de tumor maligno, culminando o retardamento no agravamento da doença e na inviabilidade de realização do procedimento prescrito, a responsabilidade do ente público é de natureza subjetiva por derivar a ilicitude imputada do comportamento omissivo debitado ao serviço público por não ter sido fomentado na forma do esperado e exigido (faute du service publique). 2. Apurado que paciente da rede pública de saúde acometido por neoplasia maligna encontrava-se apto à realização de procedimento cirúrgico que lhe fora indicado como necessário para o tratamento da enfermidade, a demora desarrazoada na consumação do tratamento preceituado, mesmo após cominação de obrigação de fazer por decisão judicial antecipatória de tutela, culminando no agravamento da doença a ponto de se tornar impossível a realização do procedimento, afetando substancialmente o estado clínico do enfermo e as chances de cura, configura omissão ilícita na prestação dos serviços públicos de saúde, configurando ato ilícito apto à deflagração da responsabilidade civil. 3. Apreendido que a omissão estatal no fomento adequado do serviço público de saúde do qual necessitara o paciente culminara no agravamento de sua doença e na impossibilidade de realização de procedimento cirúrgico para retirada de tumor maligno, inviabilizando a cura da doença, o efeito lesivo consubstancia fato gerador do dano moral, à medida que a omissão ilícita afetara a higidez física, disposição, bem-estar, auto-estima e tranqüilidade do lesado, agravando seu estado de saúde e restringindo duas chances de cura, causando lesão à sua integridade física e colocando-o sob risco de morte, caracterizando-se como ofensa aos predicados da sua personalidade, conferindo legitimidade ao cabimento de compensação pecuniária coadunada com a gravidade dos efeitos que experimentara. 4. O dano moral, porque afeta diretamente os atributos da personalidade do ofendido, maculando os seus sentimentos e impregnando indelével nódoa na sua existência, ante as ofensas que experimentara no que lhe é mais caro - integridade física/psicológica, dignidade, auto-estima, honra, credibilidade, tranqüilidade etc. -, se aperfeiçoa com a simples ocorrência do ato ilícito que se qualifica como sua origem genética, não reclamando sua qualificação que do ocorrido tenha derivado qualquer repercussão no patrimônio material do lesado. 5. A compensação pecuniária derivada do dano moral deve ser efetivada de forma parcimoniosa e em conformação com os princípios da proporcionalidade, atentando-se para a gravidade dos danos havidos e para o comportamento do ofensor e do próprio lesado em face do ilícito que o vitimara, e da razoabilidade, que recomenda que o importe fixado não seja tão excessivo a ponto de ensejar alteração na situação financeira dos envolvidos, nem tão inexpressivo que redunde em uma nova ofensa à vitima, ensejando que sua expressão seja modulada de forma a não interferir no equilíbrio da economia interna do lesante. 6. Apurado que a conduta ilícita fora de alta gravidade e reprovabilidade, inclusive com repugnante descumprimento a decisões judiciais, e que seus efeitos foram extremamente gravosos para o paciente, que tivera inviabilizada sua chance de tratamento, obrigando-se a conviver com sofrimento intenso decorrente do agravamento da doença que o afligira, vilipendiando sua dignidade enquanto ser humano, não se mostra desproporcional o valor da indenização arbitrado em consideração a tais circunstâncias. 7. Ausente o nexo de causalidade entre a conduta omissiva estatal e a inaptidão do paciente para realização de atividade laborativa, porquanto decorrera da própria doença que o acometera e não da sua evolução, resta ilidida a obrigação estatal de indenizar o paciente por meio de pensão vitalícia, por não se aperfeiçoar o silogismo necessário à responsabilidade civil. 8. Aviada ação cominatória de obrigação de fazer, cujo objeto era a realização do procedimento cirúrgico do qual necessitava o paciente, sua conversão em perdas e danos, em virtude da impossibilidade de asseguração da tutela específica, tem por escopo justamente indenizar os prejuízos materiais suportados pela parte lesada em razão do não cumprimento da obrigação, tornando inviável o deferimento de indenização material além da já assegurada quando não demonstrado prejuízo excedente, sob pena de bis in idem. 9. Os honorários advocatícios nas ações em que condenada a Fazenda pública devem ser arbitrados de conformidade com o critério de equidade ponderado com os parâmetros legalmente delineados, em importe apto a compensar os trabalhos efetivamente executados pelo patrono da parte autora, observado o zelo com que se portara, o local de execução dos serviços e a natureza e importância da causa, não podendo ser desvirtuados da sua destinação teleológica e serem arbitrados em importe desconforme com os parâmetros fixados pelo legislador (CPC, art. 20, §§ 3º e 4º). 10. Apelações conhecidas e desprovidas. Remessa necessária parcialmente provida. Unânime.
Ementa
CONSTITUCIONAL, ADMINISTRATIVO E CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. ESTABELECIMENTO HOSPITALAR PÚBLICO. ATENDIMENTO DEFEITUOSO. RETARDAMENTO NA REALIZAÇÃO DE PROCEDIMENTO CIRÚRGICO. DETERMINAÇÃO JUDICIAL. DESCUMPRIMENTO. PACIENTE ACOMETIDO DE NEOPLASIA MALIGNA. PROGRESSÃO DA DOENÇA. IMPOSSIBILIDADE SUPERVENIENTE DE REALIZAÇÃO DA CIRURGIA. EFEITOS LESIVOS. OMISSÃO. DANO MORAL. CARACTERIZAÇÃO. VALOR DA INDENIZAÇÃO. GRAVIDADE DA CONDUDA E DE SEUS EFEITOS. MENSURAÇÃO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. PENSÃO VITALÍCIA. INAPTIDÃO PARA EXERCÍCIO DE ATIVIDADE LABORAL. DECORRÊNCIA DA PRÓPRIA DOENÇA. NEXO DE CAUSALIDADE. AUSÊNCIA. REJEIÇÃO. CONVERSÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER EM PERDAS E DANOS. IMPOSSIBILIDADE DE CUMPRIMENTO. NOVA CONDENAÇÃO EM DANOS MATERIAIS. DUPLICIDADE. IMPOSSIBILIDADE. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CONDENAÇÃO DA FAZENDA PÚBLICA. MENSURAÇÃO. 1. Aviada ação indenizatória em desfavor do estado sob a imputação de negligência havida nos serviços públicos fomentados por hospital da rede pública, consubstanciando a falha na imputação de demora excessiva na realização de procedimento cirúrgico para retirada de tumor maligno, culminando o retardamento no agravamento da doença e na inviabilidade de realização do procedimento prescrito, a responsabilidade do ente público é de natureza subjetiva por derivar a ilicitude imputada do comportamento omissivo debitado ao serviço público por não ter sido fomentado na forma do esperado e exigido (faute du service publique). 2. Apurado que paciente da rede pública de saúde acometido por neoplasia maligna encontrava-se apto à realização de procedimento cirúrgico que lhe fora indicado como necessário para o tratamento da enfermidade, a demora desarrazoada na consumação do tratamento preceituado, mesmo após cominação de obrigação de fazer por decisão judicial antecipatória de tutela, culminando no agravamento da doença a ponto de se tornar impossível a realização do procedimento, afetando substancialmente o estado clínico do enfermo e as chances de cura, configura omissão ilícita na prestação dos serviços públicos de saúde, configurando ato ilícito apto à deflagração da responsabilidade civil. 3. Apreendido que a omissão estatal no fomento adequado do serviço público de saúde do qual necessitara o paciente culminara no agravamento de sua doença e na impossibilidade de realização de procedimento cirúrgico para retirada de tumor maligno, inviabilizando a cura da doença, o efeito lesivo consubstancia fato gerador do dano moral, à medida que a omissão ilícita afetara a higidez física, disposição, bem-estar, auto-estima e tranqüilidade do lesado, agravando seu estado de saúde e restringindo duas chances de cura, causando lesão à sua integridade física e colocando-o sob risco de morte, caracterizando-se como ofensa aos predicados da sua personalidade, conferindo legitimidade ao cabimento de compensação pecuniária coadunada com a gravidade dos efeitos que experimentara. 4. O dano moral, porque afeta diretamente os atributos da personalidade do ofendido, maculando os seus sentimentos e impregnando indelével nódoa na sua existência, ante as ofensas que experimentara no que lhe é mais caro - integridade física/psicológica, dignidade, auto-estima, honra, credibilidade, tranqüilidade etc. -, se aperfeiçoa com a simples ocorrência do ato ilícito que se qualifica como sua origem genética, não reclamando sua qualificação que do ocorrido tenha derivado qualquer repercussão no patrimônio material do lesado. 5. A compensação pecuniária derivada do dano moral deve ser efetivada de forma parcimoniosa e em conformação com os princípios da proporcionalidade, atentando-se para a gravidade dos danos havidos e para o comportamento do ofensor e do próprio lesado em face do ilícito que o vitimara, e da razoabilidade, que recomenda que o importe fixado não seja tão excessivo a ponto de ensejar alteração na situação financeira dos envolvidos, nem tão inexpressivo que redunde em uma nova ofensa à vitima, ensejando que sua expressão seja modulada de forma a não interferir no equilíbrio da economia interna do lesante. 6. Apurado que a conduta ilícita fora de alta gravidade e reprovabilidade, inclusive com repugnante descumprimento a decisões judiciais, e que seus efeitos foram extremamente gravosos para o paciente, que tivera inviabilizada sua chance de tratamento, obrigando-se a conviver com sofrimento intenso decorrente do agravamento da doença que o afligira, vilipendiando sua dignidade enquanto ser humano, não se mostra desproporcional o valor da indenização arbitrado em consideração a tais circunstâncias. 7. Ausente o nexo de causalidade entre a conduta omissiva estatal e a inaptidão do paciente para realização de atividade laborativa, porquanto decorrera da própria doença que o acometera e não da sua evolução, resta ilidida a obrigação estatal de indenizar o paciente por meio de pensão vitalícia, por não se aperfeiçoar o silogismo necessário à responsabilidade civil. 8. Aviada ação cominatória de obrigação de fazer, cujo objeto era a realização do procedimento cirúrgico do qual necessitava o paciente, sua conversão em perdas e danos, em virtude da impossibilidade de asseguração da tutela específica, tem por escopo justamente indenizar os prejuízos materiais suportados pela parte lesada em razão do não cumprimento da obrigação, tornando inviável o deferimento de indenização material além da já assegurada quando não demonstrado prejuízo excedente, sob pena de bis in idem. 9. Os honorários advocatícios nas ações em que condenada a Fazenda pública devem ser arbitrados de conformidade com o critério de equidade ponderado com os parâmetros legalmente delineados, em importe apto a compensar os trabalhos efetivamente executados pelo patrono da parte autora, observado o zelo com que se portara, o local de execução dos serviços e a natureza e importância da causa, não podendo ser desvirtuados da sua destinação teleológica e serem arbitrados em importe desconforme com os parâmetros fixados pelo legislador (CPC, art. 20, §§ 3º e 4º). 10. Apelações conhecidas e desprovidas. Remessa necessária parcialmente provida. Unânime.
Data do Julgamento
:
25/02/2015
Data da Publicação
:
06/03/2015
Órgão Julgador
:
1ª TURMA CÍVEL
Relator(a)
:
TEÓFILO CAETANO
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