TJDF APO - 923998-20140110534882APO
CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO INDENIZATÓRIA DE DANOS MORAIS E MATERIAIS. MORTE DE DETENTO EM CELA DE DELEGACIA. DEVER ESTATAL DE VELAR PELA INTEGRIDADE FÍSICA E MORAL. (CF, ARTS. 5º, LXIX, E 37, § 6º; CC, ARTS. 43, 186 E 927). RESPONSABILIDADE OBJETIVA. PRESSUPOSTOS PRESENTES. PENSÃO EM FAVOR DA MÃE. CC, ART. 948. FAMÍLIA DE BAIXA RENDA. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA PRESUMIDA. DANO MORAL. CONFIGURAÇÃO. QUANTUM. OBEDIÊNCIA AOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. JUROS DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA. OBSERVÂNCIA DO ART. 1º-F DA LEI N. 9.494/97, COM REDAÇÃO DADA PELA LEI N. 11.960/09. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. DEFENSORIA PÚBLICA DO DISTRITO FEDERAL. CONFUSÃO ENTRE CREDOR E DEVEDOR. SÚMULA N. 421/STJ.SENTENÇA MANTIDA. 1. O Estado, no exercício do poder que a lei lhe confere de fazer juízo de valor sobre o comportamento das pessoas e lhes impor pena privativa de liberdade, tem o dever de preservar a incolumidade física e moral do preso que se encontra sob sua custódia, nos termos do art. 5º, XLIX, da Constituição Federal. Por isso, responde objetivamente pela morte de detentos nas dependências de estabelecimento prisional ou de cela de Delegacia, pois o dano é inerente à sua atuação (CF, art. 37, § 6º; CC, arts. 43, 186 e 927). 2. No particular, observa-se que o filho da autora foi preso em flagrante, em 22/1/2014, por suposto furto de ônibus da empresa em que era funcionário, tendo sido encontrado morto na manhã seguinte em cela da 17ª Delegacia de Polícia, por asfixia mecânica decorrente de constrição cervical. 3. Responde o Estado pelo suicídio ocorrido dentro de cela de Delegacia de Polícia (culpa in vigilando - ineficiência na guarda e/ou proteção), devendo eventual atuação da vítima ser sopesada por ocasião do arbitramento da indenização. 4. Conforme art. 948 do CC, é devido o pensionamento mensal de 2/3 do salário mínimo à genitora, ainda que o falecido não exercesse, à época, atividade remunerada, até a idade em que a vítima completaria 25 anos de idade, uma vez que se presume ajuda mútua entre os integrantes de famílias de baixa renda. A partir de então, a pensão será reduzida à 1/3 do salário mínimo até a data em que a vítima completaria 65 anos ou até o falecimento da beneficiária, o que ocorrer primeiro. 5. As circunstâncias fáticas narradas são capazes de atentar contra direitos da personalidade, sendo evidente o dano moral experimentado e cujo prejuízo é in re ipsa, ou seja, deriva inexoravelmente do próprio fato ofensivo. A morte de um ente familiar querido, na qualidade de filho da autora, a toda evidência, desencadeia naturalmente uma sensação dolorosa de fácil e objetiva percepção, dispensada demonstração, notadamente em razão da imprevisibilidade do evento. É o que se chama de danos morais reflexos ou por ricochete. Ou seja, embora o evento danoso tenha afetado determinada pessoa, seus efeitos acabam por atingir, indiretamente, a integridade moral de terceiros (préjudice d'affection). 6. O valor dos danos morais deve ser arbitrado em consonância com os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, devendo se atentar para a extensão da dor, do sentimento, das marcas deixadas pelo evento danoso e ainda as condições sociais e econômicas da vítima (servente de limpeza) e da pessoa obrigada (DF), sem falar na prevenção de comportamentos futuros análogos. Normativa da efetiva extensão do dano (CC, art. 944). 6.1. É de ser relevado que a dinâmica dos fatos que culminou com o falecimento inesperado do detento enseja profundo abalo no íntimo da autora, inexistindo meios de recompor efetivamente a situação ao status quo ante, mormente em razão da condição irreversível que é a morte. Serve a compensação pecuniária apenas para abrandar a aflição da autora que conviverá com a ausência do filho, mesmo porque tamanha dor emocional não se atenua com o transcurso do tempo, ao revés, a saudade e a ausência são potencializadas com o passar dos anos. O fato de o convívio entre as partes ter sido impedido em razão do ato voluntário praticado pelo próprio detento também há de ser sopesado. 6.2. Nesse passo, escorreito o valor dos danos morais fixado em 1º Grau, no importe de R$ 50.000,00. 7. Em se tratando de indenização por danos morais fixada contra a Fazenda Pública, os juros de mora fluem a partir da data do evento danoso (Súmula n. 54/STJ c/c art. 398 do CC), ao passo que a correção monetária incide a partir do arbitramento da quantia (Súmula n. 362/STJ), observado o disposto na Lei n. 9.494/97 (com a alteração dada pela Lei n. 11.960/09). 8. Sem condenação final do Distrito Federal em custas, em razão de isenção legal (Decreto-Lei n. 500/69). 8.1. Os honorários advocatícios não são devidos à Defensoria Pública quando ela atua contra a pessoa jurídica de direito público à qual pertença (Súmula n. 421/STJ). 9. Reexame necessário e recursos de apelação conhecidos e desprovidos. Sentença mantida.
Ementa
CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO INDENIZATÓRIA DE DANOS MORAIS E MATERIAIS. MORTE DE DETENTO EM CELA DE DELEGACIA. DEVER ESTATAL DE VELAR PELA INTEGRIDADE FÍSICA E MORAL. (CF, ARTS. 5º, LXIX, E 37, § 6º; CC, ARTS. 43, 186 E 927). RESPONSABILIDADE OBJETIVA. PRESSUPOSTOS PRESENTES. PENSÃO EM FAVOR DA MÃE. CC, ART. 948. FAMÍLIA DE BAIXA RENDA. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA PRESUMIDA. DANO MORAL. CONFIGURAÇÃO. QUANTUM. OBEDIÊNCIA AOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. JUROS DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA. OBSERVÂNCIA DO ART. 1º-F DA LEI N. 9.494/97, COM REDAÇÃO DADA PELA LEI N. 11.960/09. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. DEFENSORIA PÚBLICA DO DISTRITO FEDERAL. CONFUSÃO ENTRE CREDOR E DEVEDOR. SÚMULA N. 421/STJ.SENTENÇA MANTIDA. 1. O Estado, no exercício do poder que a lei lhe confere de fazer juízo de valor sobre o comportamento das pessoas e lhes impor pena privativa de liberdade, tem o dever de preservar a incolumidade física e moral do preso que se encontra sob sua custódia, nos termos do art. 5º, XLIX, da Constituição Federal. Por isso, responde objetivamente pela morte de detentos nas dependências de estabelecimento prisional ou de cela de Delegacia, pois o dano é inerente à sua atuação (CF, art. 37, § 6º; CC, arts. 43, 186 e 927). 2. No particular, observa-se que o filho da autora foi preso em flagrante, em 22/1/2014, por suposto furto de ônibus da empresa em que era funcionário, tendo sido encontrado morto na manhã seguinte em cela da 17ª Delegacia de Polícia, por asfixia mecânica decorrente de constrição cervical. 3. Responde o Estado pelo suicídio ocorrido dentro de cela de Delegacia de Polícia (culpa in vigilando - ineficiência na guarda e/ou proteção), devendo eventual atuação da vítima ser sopesada por ocasião do arbitramento da indenização. 4. Conforme art. 948 do CC, é devido o pensionamento mensal de 2/3 do salário mínimo à genitora, ainda que o falecido não exercesse, à época, atividade remunerada, até a idade em que a vítima completaria 25 anos de idade, uma vez que se presume ajuda mútua entre os integrantes de famílias de baixa renda. A partir de então, a pensão será reduzida à 1/3 do salário mínimo até a data em que a vítima completaria 65 anos ou até o falecimento da beneficiária, o que ocorrer primeiro. 5. As circunstâncias fáticas narradas são capazes de atentar contra direitos da personalidade, sendo evidente o dano moral experimentado e cujo prejuízo é in re ipsa, ou seja, deriva inexoravelmente do próprio fato ofensivo. A morte de um ente familiar querido, na qualidade de filho da autora, a toda evidência, desencadeia naturalmente uma sensação dolorosa de fácil e objetiva percepção, dispensada demonstração, notadamente em razão da imprevisibilidade do evento. É o que se chama de danos morais reflexos ou por ricochete. Ou seja, embora o evento danoso tenha afetado determinada pessoa, seus efeitos acabam por atingir, indiretamente, a integridade moral de terceiros (préjudice d'affection). 6. O valor dos danos morais deve ser arbitrado em consonância com os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, devendo se atentar para a extensão da dor, do sentimento, das marcas deixadas pelo evento danoso e ainda as condições sociais e econômicas da vítima (servente de limpeza) e da pessoa obrigada (DF), sem falar na prevenção de comportamentos futuros análogos. Normativa da efetiva extensão do dano (CC, art. 944). 6.1. É de ser relevado que a dinâmica dos fatos que culminou com o falecimento inesperado do detento enseja profundo abalo no íntimo da autora, inexistindo meios de recompor efetivamente a situação ao status quo ante, mormente em razão da condição irreversível que é a morte. Serve a compensação pecuniária apenas para abrandar a aflição da autora que conviverá com a ausência do filho, mesmo porque tamanha dor emocional não se atenua com o transcurso do tempo, ao revés, a saudade e a ausência são potencializadas com o passar dos anos. O fato de o convívio entre as partes ter sido impedido em razão do ato voluntário praticado pelo próprio detento também há de ser sopesado. 6.2. Nesse passo, escorreito o valor dos danos morais fixado em 1º Grau, no importe de R$ 50.000,00. 7. Em se tratando de indenização por danos morais fixada contra a Fazenda Pública, os juros de mora fluem a partir da data do evento danoso (Súmula n. 54/STJ c/c art. 398 do CC), ao passo que a correção monetária incide a partir do arbitramento da quantia (Súmula n. 362/STJ), observado o disposto na Lei n. 9.494/97 (com a alteração dada pela Lei n. 11.960/09). 8. Sem condenação final do Distrito Federal em custas, em razão de isenção legal (Decreto-Lei n. 500/69). 8.1. Os honorários advocatícios não são devidos à Defensoria Pública quando ela atua contra a pessoa jurídica de direito público à qual pertença (Súmula n. 421/STJ). 9. Reexame necessário e recursos de apelação conhecidos e desprovidos. Sentença mantida.
Data do Julgamento
:
02/03/2016
Data da Publicação
:
15/03/2016
Órgão Julgador
:
1ª TURMA CÍVEL
Relator(a)
:
ALFEU MACHADO
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