TJDF APO -Apelação/Reexame necessário-20120111128622APO
CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO REPARATÓRIA DE DANOS MORAIS E MATERIAIS. MORTE DE DETENTO SOB A CUSTÓDIA DO ESTADO. DEVER DE VELAR PELA INTEGRIDADE FÍSICA E MORAL. (CF, ARTS. 5º, LXIX, E 37, § 6º; CC, ARTS. 43, 186 E 927). RESPONSABILIDADE OBJETIVA. PRESSUPOSTOS PRESENTES. RESTITUIÇÃO DAS DESPESAS COM FUNERAL. POSSIBILIDADE. PENSIONAMENTO EM FAVOR DA FILHA MENOR. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA PRESUMIDA. CC, ART. 948. DANO MORAL CONFIGURADO. QUANTUM. OBEDIÊNCIA AOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. MATÉRIAS DE ORDEM PÚBLICA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. PARÂMETROS DO ART. 20 DO CPC. MAJORAÇÃO. SENTENÇA REFORMADA EM PARTE.1. O Estado, no exercício do poder que a lei lhe confere de fazer juízo de valor sobre o comportamento das pessoas e lhes impor pena privativa de liberdade, tem o dever de preservar a incolumidade física e moral do preso que se encontra sob sua custódia, nos termos do art. 5º, XLIX, da Constituição Federal. Por isso, responde objetivamente pela morte de detentos nas dependências do estabelecimento prisional, pois o dano é inerente à sua atuação (CF, art. 37, § 6º; CC, arts. 43, 186 e 927).2. No particular, tendo em vista o falecimento do preso, vítima de homicídio por asfixia praticada pelos companheiros de cela, após haver informado aos agentes penitenciários sobre eventuais ameaças, bem assim apurado que um dos autores do delito não recebeu a medicação controlada que fazia uso, razão pela qual apresentava maior irritabilidade no dia do crime, encontra-se configurada a responsabilidade civil do Estado para fins de reparação dos danos ocasionados pela inobservância ao seu dever constitucional de guarda.3. Nos termos do art. 948, II, do CC, é devida reparação material à filha menor de idade pela morte do seu genitor, porquanto há presunção jurídica de dependência econômica decorrente da relação parental, no patamar equivalente a 2/3 do salário mínimo, já que não comprovado o exercício de atividade laborativa pelo falecido, desde o evento danoso até o limite temporal de 25 anos, quando então se presume ter concluído sua formação. Precedentes.4. Por se tratar de caso de homicídio, o dano material também engloba as despesas com o funeral (CC, art. 948, I), devidamente comprovadas na espécie, a serem corrigidas desde o seu desembolso (Súmula n. 43/STJ).5. As circunstâncias fáticas narradas são capazes de atentar contra direitos da personalidade, sendo evidente o dano moral experimentado e cujo prejuízo é in re ipsa, ou seja, deriva inexoravelmente do próprio fato ofensivo. A morte de um ente familiar querido, na qualidade de filho, esposo e pai das autoras, a toda evidência, desencadeia naturalmente uma sensação dolorosa de fácil e objetiva percepção, dispensada demonstração, notadamente em razão da imprevisibilidade do evento. É o que se chama de danos morais reflexos ou por ricochete. Ou seja, embora o evento danoso tenha afetado determinada pessoa, seus efeitos acabam por atingir, indiretamente, a integridade moral de terceiros (préjudice d'affection). 6. O quantum dos danos morais deve ser arbitrado em consonância com os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, devendo se atentar para a extensão da dor, do sentimento, das marcas deixadas pelo evento danoso e ainda as condições sociais e econômicas da vítima e da pessoa obrigada, sem falar na prevenção de comportamentos futuros análogos. Normativa da efetiva extensão do dano (CC, art. 944). 6.1. É de ser relevado que a dinâmica dos fatos que culminaram com o falecimento inesperado do detento enseja profundo abalo no íntimo das autoras, inexistindo meios de recompor efetivamente a situação ao status quo ante, mormente em razão da condição irreversível que é a morte. 6.2. Não bastasse o fato de se encontrarem privadas da companhia do ente familiar que se encontrava preso, serve a compensação pecuniária para abrandar a aflição das autoras que conviverão com a ausência dele. Tamanha dor emocional não se atenua com o transcurso do tempo, ao revés, a saudade e a ausência são potencializadas com o passar dos anos.6.3. Em homenagem aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, e levando em conta a situação peculiar de perda de um ente familiar, a dor, o preito de saudade e o conforto espiritual, escorreito o montante dos danos morais fixado em Primeira Instância, no importe de R$ 30.000,00 (trinta mil reais) para cada uma das autoras, o qual respeita às peculiaridades do caso concreto e às finalidades do instituto (CC, art. 944).7. Os juros de mora e a correção monetária funcionam como consectários legais da condenação e, por isso, constituem matéria de ordem pública, as quais podem ser conhecidas e modificadas de ofício em Instância recursal sem implicar reformatio in pejus ou julgamento extra/ultra petita. 7.1. Em se tratando de indenização por danos morais fixada contra a Fazenda Pública, os juros de mora fluem a partir da data do evento danoso (Súmula n. 54/STJ c/c art. 398 do CC), observado o disposto na Lei n. 9.494/97 (com a alteração dada pela Lei n. 11.960/09), e a correção monetária, pelo IPCA, a partir do arbitramento da quantia (Súmula n. 362/STJ).8. Vencida a Fazenda Pública e diante das particularidades do caso concreto, a majoração dos honorários advocatícios para o importe de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) melhor atende aos parâmetros dos §§ 3º e 4º do art. 20 do CPC (grau de zelo do profissional, lugar da prestação do serviço, natureza e importância da causa, trabalho realizado pelo advogado e tempo exigido para o seu serviço).9. Recurso de apelação das autoras conhecido e parcialmente provido para fixar a data do evento danoso como termo inicial do pensionamento, bem assim majorar os honorários advocatícios para R$ 5.000,00 (cinco mil reais). Reexame necessário e recurso de apelação do réu conhecidos e desprovidos. Juros de mora dos danos morais a partir do evento morte e correção monetária a partir do arbitramento. Demais termos da sentença mantidos.
Ementa
CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO REPARATÓRIA DE DANOS MORAIS E MATERIAIS. MORTE DE DETENTO SOB A CUSTÓDIA DO ESTADO. DEVER DE VELAR PELA INTEGRIDADE FÍSICA E MORAL. (CF, ARTS. 5º, LXIX, E 37, § 6º; CC, ARTS. 43, 186 E 927). RESPONSABILIDADE OBJETIVA. PRESSUPOSTOS PRESENTES. RESTITUIÇÃO DAS DESPESAS COM FUNERAL. POSSIBILIDADE. PENSIONAMENTO EM FAVOR DA FILHA MENOR. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA PRESUMIDA. CC, ART. 948. DANO MORAL CONFIGURADO. QUANTUM. OBEDIÊNCIA AOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. MATÉRIAS DE ORDEM PÚBLICA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. PARÂMETROS DO ART. 20 DO CPC. MAJORAÇÃO. SENTENÇA REFORMADA EM PARTE.1. O Estado, no exercício do poder que a lei lhe confere de fazer juízo de valor sobre o comportamento das pessoas e lhes impor pena privativa de liberdade, tem o dever de preservar a incolumidade física e moral do preso que se encontra sob sua custódia, nos termos do art. 5º, XLIX, da Constituição Federal. Por isso, responde objetivamente pela morte de detentos nas dependências do estabelecimento prisional, pois o dano é inerente à sua atuação (CF, art. 37, § 6º; CC, arts. 43, 186 e 927).2. No particular, tendo em vista o falecimento do preso, vítima de homicídio por asfixia praticada pelos companheiros de cela, após haver informado aos agentes penitenciários sobre eventuais ameaças, bem assim apurado que um dos autores do delito não recebeu a medicação controlada que fazia uso, razão pela qual apresentava maior irritabilidade no dia do crime, encontra-se configurada a responsabilidade civil do Estado para fins de reparação dos danos ocasionados pela inobservância ao seu dever constitucional de guarda.3. Nos termos do art. 948, II, do CC, é devida reparação material à filha menor de idade pela morte do seu genitor, porquanto há presunção jurídica de dependência econômica decorrente da relação parental, no patamar equivalente a 2/3 do salário mínimo, já que não comprovado o exercício de atividade laborativa pelo falecido, desde o evento danoso até o limite temporal de 25 anos, quando então se presume ter concluído sua formação. Precedentes.4. Por se tratar de caso de homicídio, o dano material também engloba as despesas com o funeral (CC, art. 948, I), devidamente comprovadas na espécie, a serem corrigidas desde o seu desembolso (Súmula n. 43/STJ).5. As circunstâncias fáticas narradas são capazes de atentar contra direitos da personalidade, sendo evidente o dano moral experimentado e cujo prejuízo é in re ipsa, ou seja, deriva inexoravelmente do próprio fato ofensivo. A morte de um ente familiar querido, na qualidade de filho, esposo e pai das autoras, a toda evidência, desencadeia naturalmente uma sensação dolorosa de fácil e objetiva percepção, dispensada demonstração, notadamente em razão da imprevisibilidade do evento. É o que se chama de danos morais reflexos ou por ricochete. Ou seja, embora o evento danoso tenha afetado determinada pessoa, seus efeitos acabam por atingir, indiretamente, a integridade moral de terceiros (préjudice d'affection). 6. O quantum dos danos morais deve ser arbitrado em consonância com os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, devendo se atentar para a extensão da dor, do sentimento, das marcas deixadas pelo evento danoso e ainda as condições sociais e econômicas da vítima e da pessoa obrigada, sem falar na prevenção de comportamentos futuros análogos. Normativa da efetiva extensão do dano (CC, art. 944). 6.1. É de ser relevado que a dinâmica dos fatos que culminaram com o falecimento inesperado do detento enseja profundo abalo no íntimo das autoras, inexistindo meios de recompor efetivamente a situação ao status quo ante, mormente em razão da condição irreversível que é a morte. 6.2. Não bastasse o fato de se encontrarem privadas da companhia do ente familiar que se encontrava preso, serve a compensação pecuniária para abrandar a aflição das autoras que conviverão com a ausência dele. Tamanha dor emocional não se atenua com o transcurso do tempo, ao revés, a saudade e a ausência são potencializadas com o passar dos anos.6.3. Em homenagem aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, e levando em conta a situação peculiar de perda de um ente familiar, a dor, o preito de saudade e o conforto espiritual, escorreito o montante dos danos morais fixado em Primeira Instância, no importe de R$ 30.000,00 (trinta mil reais) para cada uma das autoras, o qual respeita às peculiaridades do caso concreto e às finalidades do instituto (CC, art. 944).7. Os juros de mora e a correção monetária funcionam como consectários legais da condenação e, por isso, constituem matéria de ordem pública, as quais podem ser conhecidas e modificadas de ofício em Instância recursal sem implicar reformatio in pejus ou julgamento extra/ultra petita. 7.1. Em se tratando de indenização por danos morais fixada contra a Fazenda Pública, os juros de mora fluem a partir da data do evento danoso (Súmula n. 54/STJ c/c art. 398 do CC), observado o disposto na Lei n. 9.494/97 (com a alteração dada pela Lei n. 11.960/09), e a correção monetária, pelo IPCA, a partir do arbitramento da quantia (Súmula n. 362/STJ).8. Vencida a Fazenda Pública e diante das particularidades do caso concreto, a majoração dos honorários advocatícios para o importe de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) melhor atende aos parâmetros dos §§ 3º e 4º do art. 20 do CPC (grau de zelo do profissional, lugar da prestação do serviço, natureza e importância da causa, trabalho realizado pelo advogado e tempo exigido para o seu serviço).9. Recurso de apelação das autoras conhecido e parcialmente provido para fixar a data do evento danoso como termo inicial do pensionamento, bem assim majorar os honorários advocatícios para R$ 5.000,00 (cinco mil reais). Reexame necessário e recurso de apelação do réu conhecidos e desprovidos. Juros de mora dos danos morais a partir do evento morte e correção monetária a partir do arbitramento. Demais termos da sentença mantidos.
Data do Julgamento
:
13/11/2013
Data da Publicação
:
25/11/2013
Órgão Julgador
:
1ª Turma Cível
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