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Jurisprudência


TJDF APR - 1010062-20160610078569APR

Ementa
APELAÇÃO CRIMINAL. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. RESISTÊNCIA. PRELIMINAR. INSTITUTOS DESPENALIZADORES AO CRIME CONEXO. POSSIBILIDADE. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. PRELIMINAR REJEITADA. APLICAÇÃO DA LEI MARIA DA PENHA À CONTRAVEÇÕES PENAIS. PRELIMINAR REJEITADA. MÉRITO. VIOLAÇÃO DOMICÍLIO. AUSÊNCIA DE CONSENTIMENTO DA PROPRIETÁRIA. AMEAÇA. TEORIA DA ACTIO LIBERA IN CAUSA. ANIMO CALMO E REFLETIVO. LESÃO CORPORAL. LAUDO PERICIAL E PROVA ORAL. VIAS DE FATO. RECEPÇÃO PELA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. RESISTÊNCIA. DOSIMETRIA. PERSONALIDADE. CONDUTA SOCIAL. CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME. PRELIMINARES REJEITADAS. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.1. O processamento conjunto dos crimes de violência de gênero e delito de resistência perante o Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher não obsta a incidência dos institutos despenalizadores ao crime conexo, praticado contra policiais do gênero masculino, não sujeito à vedação do artigo 41 da Lei 11.340/2016, consoante dispõe o parágrafo único do artigo 60 da Lei 9.099/95.2. A prática de delito de menor potencial ofensivo não é suficiente para que sejam oferecidos os benefícios da transação penal (artigo 76 da Lei 9.099/95) ou suspensão condicional do processo (artigo 89 da Lei 9.099/95), os quais exigem, dentre outras condições, não tenha o acusado sido beneficiado com a transação penal nos últimos cinco anos e não tenha condenação penal anterior.3. A vedação à incidência dos institutos despenalizadores da Lei 9.099/95, contida no artigo 41 da Lei 11.340/2006, deve abarcar toda sorte de violência de gênero praticada do âmbito doméstico e familiar contra a mulher, sejam definidas na legislação penal como crimes ou como contravenções penais.4. Não há falar em absolvição pelo delito de invasão de domicílio qualificado por ter sido praticado no período noturno, por atipicidade da conduta pelo consentimento da proprietária da casa, quando as vítimas e testemunhas foram uníssonas em afirmar que o réu não tinha autorização para ingressar na residência, tanto que pulou o telhado e uma janela para acessar seu interior.5.Vigora no ordenamento jurídico pátrio a teoria da actio libera in causa, segundo a qual se o indivíduo agiu livremente ao ingerir bebida alcoólica ou consumir drogas, responderá pelos crimes praticados durante o estado de embriaguez.6. A caracterização do delito de ameaça não demanda ânimo calmo e refletido, bastando o prenúncio de causar mal injusto e grave, incutindo real temor à vítima. Aliás, o estado de exaltação do agente é, por vezes, fator relevante na credibilidade da intimidação, fazendo com que a vítima se atemorize com a promessa proferida.7. Nos crimes praticados em situação de violência doméstica e familiar, as declarações da vítima, quando apresentadas de maneira firme e coerente, assumem importante força probatória, sendo aptas a comprovar a materialidade e autoria e, por consequência, ensejar decreto condenatório, mormente quando corroboradas por testemunhas e laudo pericial.8. A contravenção de vias de fato é subsidiária, configurando-se exatamente quando a agressão não deixar marcas aparentes, pois, quando deixar, estará caracterizado o delito de lesão corporal.9. A contravenção penal de vias de fato foi recepcionada pela ordem constitucional vigente, não havendo violação ao princípio da legalidade, pois a expressão vias de fato não perfaz termo vago e impreciso, sem delimitar quais condutas estariam abarcadas pela norma proibitiva; ao revés abarca os atos de ataque ou violência contra pessoa, desde que não caracterizem lesões corporais.10. Afasta-se a valoração negativa da personalidade, uma vez que, não dispondo o Juízo de conhecimento técnico para sua aferição, apenas condenações penais definitivas anteriores podem macular referida circunstância judicial.11. Mantém-se a valoração negativa da conduta social, pois devidamente fundamentada no comportamento do acusado junto aos seus familiares, constantemente perturbando-os, gritando ao lado de fora da residência, causando constrangimento e medo, quando não lhe é deferido o ingresso.12. O comportamento do réu, de munir-se de uma faca para ameaçar a vítima, excede ao ordinário do tipo, o qual se consuma com a mera verbalização ou gesticulação inibitórias; e perfaz circunstância mais gravosa, pois gera maior intimidação da vítima, se comparada com a ameaça realizada por agente desarmado.13. A aplicação a agravante alínea f do inciso II do art. 61 do Código Penal e a incidência da Lei Maria da Penha não gera bis in idem. A agravante figura como motivação para a exasperação da pena na segunda fase; ao passo que a Lei 11.340/2006 gera outros efeitos, tais como a fixação da competência e o óbice à incidência dos institutos despenalizadores previstos na Lei n. 9.099/95.14. A aplicação a agravante alínea f do inciso II do art. 61 do Código Penal não incide sobre o crime conexo de resistência, cujas vítimas não foram aquelas contra as quais foram praticadas violências domésticas e familiares contra a mulher, mas os policiais que compareceram ao local para socorrê-las.15. As turmas do Superior Tribunal de Justiça responsáveis pelo julgamento de matéria criminal, em recentes julgados, admitiram que o valor mínimo de indenização previsto no artigo 387, inciso IV, do Código de Processo Penal inclua também eventuais danos morais sofridos pela vítima (AgRg no REsp 1612912/SC e REsp 1585684/DF)16. É imperioso que, na sentença penal condenatória, o Juízo de conhecimento apresente motivação concreta a respeito de o crime em exame violar ou não direitos da personalidade da vítima, sob pena de ser decotada a condenação por violação ao artigo 93, IX, da Constituição Federal.17. Preliminares rejeitadas. Recurso parcialmente provido.

Data do Julgamento : 06/04/2017
Data da Publicação : 17/04/2017
Órgão Julgador : 2ª TURMA CRIMINAL
Relator(a) : SILVANIO BARBOSA DOS SANTOS
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