TJDF APR - 858179-20110110472250APR
APELAÇÃO CRIMINAL. ART. 89 DA LEI DE LICITAÇÕES. DENÚNCIA. REQUISITOS. SUJEITO ATIVO. INQUÉRITO POLICIAL. PRESCINDIBILIDADE. PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA. INOCORRÊNCIA. FATOS NOVOS. ALEGAÇÕES FINAIS. APRECIAÇÃO. INQUÉRITO CIVIL. REQUISITOS. PRINCÍPIO DA CORRELAÇÃO. JUSTA CAUSA. PRINCÍPIO DO JUIZ NATURAL. ELEMENTO SUBJETIVO. DOLO ESPECÍFICO. DELAÇÃO PREMIADA. PROVA. EXCLUDENTE DE CULPABILIDADE. ÔNUS PROBATÓRIO DA DEFESA. PARTICIPAÇÃO DE MENOR IMPORTÂNCIA. NÃO APLICAÇÃO. DOSIMETRIA DA PENA. CONSEQUÊNCIAS DO CRIME. CONFISSÃO ESPONTÂNEA. PENA DE MULTA. I - O recurso de apelação possui efeito devolutivo amplo, devolvendo toda a matéria decidida pela instância a quo, razão pela qual não fica o Tribunal adstrito às teses jurídicas trazidas nas razões recursais. II - Nos delitos cometidos em concurso de pessoas não é possível, em regra, individualizar de forma pormenorizada as condutas de cada um dos envolvidos. Todavia, não há falar-se em inépcia da denúncia, quando a peça acusatória descreve de forma clara e precisa a dinâmica delitiva como um todo para que, no curso da instrução criminal seja apurada a conduta específica de cada um, sendo necessário apenas que a descrição não seja superficial de forma a inviabilizar a defesa efetiva dos réus. III - O art. 89 da Lei 8.666/93 prevê como sujeito ativo do delito ali previsto não somente o agente que, na qualidade de servidor público, ostenta poderes para dispensar ou inexigir o procedimento licitatório para a celebração de contrato com a Administração, mas também aquele que de qualquer forma beneficia-se ou concorre para a prática da contratação ilegal. IV - Os procedimentos previstos no art. 514 do código de Processo Penal aplicam-se apenas aos delitos funcionais próprios, ou seja, àqueles praticados por servidores públicos o exercício de suas atribuições, como nos casos previstos nos arts. 312 a 326 do Código Penal. V - O inquérito policial não é indispensável à propositura da ação penal, podendo o Ministério Público oferecer denúncia ou queixa baseada em outros elementos de convicção. VI - O oferecimento da denúncia sem a observância dos prazos legais configura apenas mera irregularidade e não causa de nulidade processual. VII - Não há nulidade na sentença que deixa de refutar todas as teses defensivas trazidas em sede de alegações finais, uma vez que, tendo o magistrado optado pela tese sustentada pelo órgão ministerial, ele, reflexamente, afasta algumas teses aviadas pela Defesa. VIII - Atendidos os requisitos constantes daResolução nº 23 do Conselho Nacional do Ministério Público, não há que se falar em nulidade da ação civil pública que subsidiou a denúncia. IX - A congruência entre a denúncia e a sentença serve para prevenir que o réu seja sentenciado por fato absolutamente alheio ao descrito na peça acusatória. Assim, se a descrição da denúncia contém as circunstâncias elementares do tipo, não há que se falar em violação ao princípio da correlação, pois garantido o contraditório e a ampla defesa ao acusado. X - Presentes os indícios de autoria e materialidade do crime do art. 89 da Lei 8.666/93 quando do oferecimento da denúncia, não há falar-se em ausência de justa causa para a propositura da ação penal. XI - O art. 132 do Código de Processo Civil, aplicado subsidiariamente ao Código de Processo Penal, afasta o caráter absoluto do princípio da identidade física do juiz. XII - Não há como se reconhecer a prescrição quando não verificado o transcurso do lapso temporal previsto no art. 109 do Código Penal entre os marcos interruptivos contidos no art. 117 do mesmo diploma legal. XIII - O delito previsto no art. 89 da Lei 8.666/93 não existe na modalidade culposa. Pressupõe-se, para efeito de sua tipificação, além do necessário dolo simples ou genérico, traduzido na vontade livre e consciente de contratar com dispensa ou inexigibilidade de licitação fora das hipóteses legais, a comprovação do dolo específico consistente na intenção de causar prejuízo ao erário, ou mesmo a comprovação de que a conduta tenha causado efetivo prejuízo aos cofres públicos. XIV - Os depoimentos prestados por quem foi beneficiado pelo instituto da delação premiada possui valor probatório, podendo ser utilizados para lastrear a condenação dos envolvidos no delito, quando amparados por outros elementos de prova. XV - Para a caracterização da coação moral irresistível necessária a demonstração da existência de uma ameaça grave, que vicie a vontade do agente, sendo certo que, conforme inteligência do art. 156, caput, do Código de Processo Penal, incumbe à Defesa fazer prova de suas alegações quando a argumentação não encontra amparo na prova dos autos. XVI - Inviável o reconhecimento da participação de menor importância se restou evidenciado nos autos que os réus tomaram medidas executivas para a consecução da empreitada criminosa, ainda que as ações de cada um tenham sido distintas. XVII - A delação premiada tem por escopo a elucidação de processos complexos, restando descaracterizado o instituto se verificado que não houve contribuição eficaz do acusado na identificação dos demais autores e elucidação do esquema ilícito. XVIII - A existência de esquema ilícito que compromete a eficiência e credibilidade da Administração Pública perante a sociedade em geral, mormente quando os fatos foram noticiados em todos os jornais do país e envolveram valores exorbitantes, justificam a exasperação da pena-base em razão da análise desfavorável das consequências do crime. XIX - A atenuante genérica da confissão espontânea não conduz à redução da pena aquém do mínimo legalmente previsto no preceito secundário da norma, conforme Súmula 231 do Superior Tribunal de Justiça. Precedente do Supremo Tribunal Federal - Repercussão Geral, RE nº 597270 RG-QO/RS. XX - Na fixação da pena pecuniária, o Julgador deve observar o teor do disposto no art. 99 da Lei 8.666/93, de forma a adotar valor percentual que corresponda à vantagem efetivamente obtida ou potencialmente auferível pelo agente. Não havendo nos autos elementos a indicar o valor determinado da vantagem efetivamente obtida, ou ao menos potencialmente auferível pelo réu, mostra-se mais razoável a fixação da pena de multa no percentual mínimo. XXI - Preliminares rejeitadas. Três recursos providos e seis parcialmente providos.
Ementa
APELAÇÃO CRIMINAL. ART. 89 DA LEI DE LICITAÇÕES. DENÚNCIA. REQUISITOS. SUJEITO ATIVO. INQUÉRITO POLICIAL. PRESCINDIBILIDADE. PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA. INOCORRÊNCIA. FATOS NOVOS. ALEGAÇÕES FINAIS. APRECIAÇÃO. INQUÉRITO CIVIL. REQUISITOS. PRINCÍPIO DA CORRELAÇÃO. JUSTA CAUSA. PRINCÍPIO DO JUIZ NATURAL. ELEMENTO SUBJETIVO. DOLO ESPECÍFICO. DELAÇÃO PREMIADA. PROVA. EXCLUDENTE DE CULPABILIDADE. ÔNUS PROBATÓRIO DA DEFESA. PARTICIPAÇÃO DE MENOR IMPORTÂNCIA. NÃO APLICAÇÃO. DOSIMETRIA DA PENA. CONSEQUÊNCIAS DO CRIME. CONFISSÃO ESPONTÂNEA. PENA DE MULTA. I - O recurso de apelação possui efeito devolutivo amplo, devolvendo toda a matéria decidida pela instância a quo, razão pela qual não fica o Tribunal adstrito às teses jurídicas trazidas nas razões recursais. II - Nos delitos cometidos em concurso de pessoas não é possível, em regra, individualizar de forma pormenorizada as condutas de cada um dos envolvidos. Todavia, não há falar-se em inépcia da denúncia, quando a peça acusatória descreve de forma clara e precisa a dinâmica delitiva como um todo para que, no curso da instrução criminal seja apurada a conduta específica de cada um, sendo necessário apenas que a descrição não seja superficial de forma a inviabilizar a defesa efetiva dos réus. III - O art. 89 da Lei 8.666/93 prevê como sujeito ativo do delito ali previsto não somente o agente que, na qualidade de servidor público, ostenta poderes para dispensar ou inexigir o procedimento licitatório para a celebração de contrato com a Administração, mas também aquele que de qualquer forma beneficia-se ou concorre para a prática da contratação ilegal. IV - Os procedimentos previstos no art. 514 do código de Processo Penal aplicam-se apenas aos delitos funcionais próprios, ou seja, àqueles praticados por servidores públicos o exercício de suas atribuições, como nos casos previstos nos arts. 312 a 326 do Código Penal. V - O inquérito policial não é indispensável à propositura da ação penal, podendo o Ministério Público oferecer denúncia ou queixa baseada em outros elementos de convicção. VI - O oferecimento da denúncia sem a observância dos prazos legais configura apenas mera irregularidade e não causa de nulidade processual. VII - Não há nulidade na sentença que deixa de refutar todas as teses defensivas trazidas em sede de alegações finais, uma vez que, tendo o magistrado optado pela tese sustentada pelo órgão ministerial, ele, reflexamente, afasta algumas teses aviadas pela Defesa. VIII - Atendidos os requisitos constantes daResolução nº 23 do Conselho Nacional do Ministério Público, não há que se falar em nulidade da ação civil pública que subsidiou a denúncia. IX - A congruência entre a denúncia e a sentença serve para prevenir que o réu seja sentenciado por fato absolutamente alheio ao descrito na peça acusatória. Assim, se a descrição da denúncia contém as circunstâncias elementares do tipo, não há que se falar em violação ao princípio da correlação, pois garantido o contraditório e a ampla defesa ao acusado. X - Presentes os indícios de autoria e materialidade do crime do art. 89 da Lei 8.666/93 quando do oferecimento da denúncia, não há falar-se em ausência de justa causa para a propositura da ação penal. XI - O art. 132 do Código de Processo Civil, aplicado subsidiariamente ao Código de Processo Penal, afasta o caráter absoluto do princípio da identidade física do juiz. XII - Não há como se reconhecer a prescrição quando não verificado o transcurso do lapso temporal previsto no art. 109 do Código Penal entre os marcos interruptivos contidos no art. 117 do mesmo diploma legal. XIII - O delito previsto no art. 89 da Lei 8.666/93 não existe na modalidade culposa. Pressupõe-se, para efeito de sua tipificação, além do necessário dolo simples ou genérico, traduzido na vontade livre e consciente de contratar com dispensa ou inexigibilidade de licitação fora das hipóteses legais, a comprovação do dolo específico consistente na intenção de causar prejuízo ao erário, ou mesmo a comprovação de que a conduta tenha causado efetivo prejuízo aos cofres públicos. XIV - Os depoimentos prestados por quem foi beneficiado pelo instituto da delação premiada possui valor probatório, podendo ser utilizados para lastrear a condenação dos envolvidos no delito, quando amparados por outros elementos de prova. XV - Para a caracterização da coação moral irresistível necessária a demonstração da existência de uma ameaça grave, que vicie a vontade do agente, sendo certo que, conforme inteligência do art. 156, caput, do Código de Processo Penal, incumbe à Defesa fazer prova de suas alegações quando a argumentação não encontra amparo na prova dos autos. XVI - Inviável o reconhecimento da participação de menor importância se restou evidenciado nos autos que os réus tomaram medidas executivas para a consecução da empreitada criminosa, ainda que as ações de cada um tenham sido distintas. XVII - A delação premiada tem por escopo a elucidação de processos complexos, restando descaracterizado o instituto se verificado que não houve contribuição eficaz do acusado na identificação dos demais autores e elucidação do esquema ilícito. XVIII - A existência de esquema ilícito que compromete a eficiência e credibilidade da Administração Pública perante a sociedade em geral, mormente quando os fatos foram noticiados em todos os jornais do país e envolveram valores exorbitantes, justificam a exasperação da pena-base em razão da análise desfavorável das consequências do crime. XIX - A atenuante genérica da confissão espontânea não conduz à redução da pena aquém do mínimo legalmente previsto no preceito secundário da norma, conforme Súmula 231 do Superior Tribunal de Justiça. Precedente do Supremo Tribunal Federal - Repercussão Geral, RE nº 597270 RG-QO/RS. XX - Na fixação da pena pecuniária, o Julgador deve observar o teor do disposto no art. 99 da Lei 8.666/93, de forma a adotar valor percentual que corresponda à vantagem efetivamente obtida ou potencialmente auferível pelo agente. Não havendo nos autos elementos a indicar o valor determinado da vantagem efetivamente obtida, ou ao menos potencialmente auferível pelo réu, mostra-se mais razoável a fixação da pena de multa no percentual mínimo. XXI - Preliminares rejeitadas. Três recursos providos e seis parcialmente providos.
Data do Julgamento
:
26/03/2015
Data da Publicação
:
31/03/2015
Classe/Assunto
:
Segredo de Justiça
Órgão Julgador
:
3ª TURMA CRIMINAL
Relator(a)
:
NILSONI DE FREITAS CUSTODIO
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