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Jurisprudência


TJDF APR -Apelação Criminal-20030310039715APR

Ementa
PENAL E PROCESSUAL PENAL. ESTUPRO. PRELIMINARES. ILEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO. DECADÊNCIA DO DIREITO DE REPRESENTAÇÃO. ARTIGO 212 DO CPP. FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO DA SENTENÇA. MÉRITO. INSUFICIÊNCIA DE PROVAS. ATIPICIDADE DE CONDUTA. DESCLASSIFICAÇÃO PARA O DELITO DE POSSE SEXUAL MEDIANTE FRAUDE. FIXAÇÃO DA PENA NO MÍNIMO LEGAL. REGIME. PROGRESSÃO DE REGIME. CONDENAÇÃO À INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. CUSTAS. APELAR EM LIBERDADE. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.No caso, houve representação e prova da miserabilidade, pelo que se rejeita a preliminar de ilegitimidade do Ministério Público.Rejeita-se a preliminar de decadência do direito de ação, pois a comprovação da insuficiência de recursos da vítima e de sua família para a propositura da ação penal já havia sido juntada aos autos muito antes do oferecimento da denúncia, sendo certo que a declaração da autoridade policial possui fé pública, mais ainda quando resultado de entrevista pessoal da vítima e de seus familiares. A norma, posta no artigo 563 do Código de Processo Penal, agasalha o princípio pas de nullité sans grief: Nenhum ato será declarado nulo, se da nulidade não resultar prejuízo para a acusação ou para a defesa. A demonstração de prejuízo é requerida para a declaração tanto de nulidade absoluta como de relativa. É da jurisprudência reiterada do Supremo Tribunal Federal que o âmbito normativo do dogma fundamental da disciplina das nulidades - pas de nullité sans grief - compreende as nulidades absolutas (HC 81.510, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 1ª Turma, unânime, DJ de 12/04/2002; HC 97.667, rel. Min. Ellen Gracie, 2ª Turma, DJe de 25/06/2009; HC 82.899, rel. Min. Cezar Peluso, 2ª Turma, DJe de 25/06/2009; HC 86.166, rel. Min. Eros Grau, 1ª Turma, DJ de 17/02/2006).Não basta, simploriamente, dizer-se que, como o réu foi condenado, teve prejuízo com a inversão da ordem de perguntar. É evidente que, se a nulidade tem a ver com a ordem de perguntar, há de ser demonstrado prejuízo decorrente da sua inversão. E, na espécie, em nenhum momento se explica na preliminar onde o prejuízo causado à defesa. Preliminar de nulidade rejeitada. A autoria e materialidade do crime de estupro, bem como a dosimetria da pena foram efetivadas de forma fundamentada, sendo esta última com correta análise das circunstâncias judiciais e legais, restando bem dosada a reprimenda.O conjunto probatório revela-se robusto a amparar a condenação, sendo consubstanciado no laudo de exame de corpo de delito de conjunção carnal, o qual atestou a conjunção carnal em data recente e a presença de espermatozóides, bem como nos depoimentos da vítima e das testemunhas. O pedido de absolvição por atipicidade de conduta, bem como o de desclassificação para o crime de posse sexual mediante fraude não exalam juridicidade, porquanto devidamente caracterizadas a violência e a grave ameaça, sem evidências de fraude.Não pode a pena ser fixada no mínimo legal diante da presença de circunstâncias judiciais desfavoráveis e da ausência de fatores diminutivos da pena nas demais etapas subseqüentes de fixação.Ao concluir o julgamento, em 23/02/2006, do HC nº 82.959/SP, o Supremo Tribunal Federal, em composição plenária, por seis votos a cinco, deferiu o pedido de habeas corpus e declarou, incidenter tantum, a inconstitucionalidade do §1º do art. 2º da Lei 8.072/90, na parte em que vedava a possibilidade de progressão do regime de cumprimento da pena nos crimes hediondos ou a eles equiparados, por afrontar o direito à individualização da pena. Acatado esse entendimento, é bem de ver que o crime de estupro continua equiparado a hediondo, definição que continua a existir, o que reclama cuidado especial na fixação do regime. Afinal, é a própria lei nº 8.072/1990 que considera tais crimes mais graves, pela maior reprovabilidade da conduta, o que exige maior rigor no regime prisional, a exemplo do que ocorre no crime de tortura. Impõe-se, assim, o regime inicial fechado.Pertinente o reconhecimento do direito à progressão de regime, pois até a edição da Lei nº 11.464/07, o autor de crimes hediondos ou equiparados estava submetido à progressão de regime nos moldes do artigo 112 da Lei de Execução Penal, isso após declarada a inconstitucionalidade da norma contida no § 1º do art. 2º da Lei nº 8.072/90. Esta, embora formalmente vigente, perdera sua eficácia jurídica. Nesse contexto, a Lei nº 11.464/2007 ratificou um direito que decorria da invalidade do dispositivo que impedia a progressão, mas impôs um regramento especial mais rigoroso no tocante ao requisito temporal a ser cumprido. Surge então, neste aspecto, como novatio legis in pejus, somente podendo ser aplicada aos casos posteriores à sua vigência. Os anteriores continuam regidos pela legislação mais benéfica que os regulava, como o caso dos autos.Não há cogitar-se de condenação do autor do fato criminoso a indenizar prejuízos morais da vítima sem que esta haja formado qualquer pedido neste sentido. A interpretação do art. 387, IV, do CPP, deve ser compatibilizada com o princípio da inércia da jurisdição. Sem pedido não pode o juiz condenar. No caso, não houve pedido. Logo, não cabe qualquer indenização. Ademais, o fato-crime é anterior à Lei n. 11.719/08, que deu nova redação ao inciso IV do art. 387 do CPP. Trata-se de lei nova e mais grave que não se aplica para trás (art. 5º, XL, da Constituição Federal).O pleito de isenção de custas deverá ser aferido pelo juízo da execução penal, já que é ônus advindo da condenação, não impedindo a sua fixação o fato de ser o acusado juridicamente pobre. Rejeita-se o pedido de recorrer em liberdade, uma vez que o apelante demonstrou possuir periculosidade, em virtude da prática reiterada de crimes, já sendo a segunda condenação por delito de estupro. Necessária, pois, a prisão cautelar para garantir a ordem pública. Ademais, respondeu ao processo custodiado.Apelo parcialmente provido, só para assegurar a progressão de regime e excluir a indenização à vítima por dano moral.

Data do Julgamento : 17/06/2010
Data da Publicação : 01/07/2010
Classe/Assunto : Segredo de Justiça
Órgão Julgador : 1ª Turma Criminal
Relator(a) : MARIO MACHADO
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