TJDF APR -Apelação Criminal-20070110542474APR
APELAÇÃO CRIMINAL. EXTORSÃO MEDIANTE SEQUESTRO. SENTENÇA CONDENATÓRIA PELO CRIME DE SEQUESTRO E CÁRCERE PRIVADO. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE PELO CRIME DE EXERCÍCIO ARBITRÁRIO DAS PRÓPRIAS RAZÕES. PEDIDO DE REINTERROGATÓRIO DOS RÉUS. INDEFERIMENTO. ATO JUDICIAL REALIZADO DE ACORDO COM A NORMA PROCESSUAL VIGENTE NO MOMENTO DE SUA REALIZAÇÃO. PRELIMINARES. INÉPCIA DA DENÚNCIA. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS DO ARTIGO 41 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA IDENTIDADE FÍSICA DO JUIZ E DO JUIZ NATURAL. NÃO CONFIGURAÇÃO. RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. PEDIDO DE CONDENAÇÃO PELO CRIME DE EXTORSÃO MEDIANTE SEQUESTRO. DÚVIDA QUANTO AO FATO DE A VÍTIMA SER INTEGRANTE DE GRUPO DE ESTELIONATÁRIOS. IN DUBIO PRO REO. NULIDADE. VIOLAÇÃO À REGRA DO MUTATIO LIBELLI. GRAVE SOFRIMENTO FÍSICO E MORAL NARRADO NA DENÚNCIA. APLICAÇÃO DA EMENDATIO LIBELLI. VIOLAÇÃO AO ARTIGO 93, INCISO IX, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. INCIDÊNCIA DA QUALIFICADORA DEVIDAMENTE JUSTIFICADA NA SENTENÇA. EXCLUSÃO DO CRIME DE SEQUESTRO E CÁRCERE PRIVADO. IMPOSSIBILIDADE. CRIME MAIS GRAVE NÃO PODE SER ABSORVIDO POR DELITO MENOS GRAVE. PRECEDENTES DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. ATIPICIDADE DA CONDUTA. DOLO DE PRIVAR ILEGALMENTE A LIBERDADE DA VÍTIMA DEMONSTRADO NOS AUTOS. INCIDÊNCIA DA QUALIFICADORA COM SUPORTE NA PROVA DOS AUTOS. MANUTENÇÃO. CONCURSO FORMAL DE CRIMES. AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL. GRATUIDADE DE JUSTIÇA. COMPETÊNCIA DA VARA DE EXECUÇÕES PENAIS. EXTENSÃO A CORRÉU DA CAUSA DE DIMINUIÇÃO PREVISTA NO ARTIGO 14 DA LEI 9.807/1999. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. RECURSOS CONHECIDOS. INDEFERIDOS OS PEDIDOS DE REINTERROGATÓRIO DOS RÉUS E REJEITADAS AS PRELIMINARES DE INÉPCIA DA DENÚNCIA, DE VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA IDENTIDADE FÍSICA DO JUIZ, DE NÃO APLICAÇÃO DA REGRA DA MUTATIO LIBELLI E DE AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO NA APLICAÇÃO DA QUALIFICADORA PREVISTA NO § 2º DO ARTIGO 148 DO CÓDIGO PENAL. NO MÉRITO, NÃO PROVIDOS OS RECURSOS.1. Descabido o pedido de novo interrogatório dos réus em razão de alteração legislativa, se os atos judiciais foram realizados de acordo com as regras processuais vigentes na data de sua realização. Inteligência do artigo 2º do Código de Processo Penal.2. Não é possível falar em inépcia da denúncia se a inicial acusatória descreve suficientemente o fato criminoso e suas circunstâncias, preenchendo os requisitos do artigo 41 do Código de Processo Penal, a fim de permitir o exercício do contraditório e da ampla defesa.3. A violação ao princípio da identidade física do Juiz não se caracteriza quando o magistrado que presidiu a audiência de instrução e julgamento não era mais competente para julgar o feito na data da conclusão para sentença, em razão de seu deslocamento para outro juízo.4. O julgamento do feito pelo Juiz de Direito da 8ª Vara Criminal obedeceu às diretrizes da Lei de Organização Judiciária do Distrito Federal, uma vez que é o substituto legal do Juiz da 7ª Vara Criminal. Embora o processo seja oriundo da 7ª Vara Criminal, o Juiz Titular e um Juiz substituto lotados no juízo a quo estavam em gozo de férias na data da conclusão para sentença, sendo que o Juiz substituto, que estava respondendo pela referida vara, já tinha se declarado suspeito para atuar no processo. Assim, não há falar em violação ao princípio do Juiz natural.5. As provas dos autos não excluem de forma absoluta a possibilidade de os réus terem executado a ação ilícita imaginando que a vítima seria um dos integrantes da quadrilha que praticava o golpe de duplicação de dinheiro no Distrito Federal, o que ficou corroborado pelo reconhecimento da pessoa sequestrada por outras vítimas do crime de estelionato praticado com o mesmo modus operandi. A dúvida, na hipótese, deve ser resolvida em favor dos réus (in dubio pro reo), mostrando-se correta a conclusão de que os réus cometeram o crime de exercício arbitrário das próprias razões (artigo 345 do Código Penal) em concurso com o delito de sequestro e cárcere privado qualificado (artigo 148, § 2º, do Código Penal).6. Não merece acolhida a tese defensiva de atipicidade da conduta ou de condenação apenas pelo crime de exercício arbitrário das próprias razões. As provas evidenciam que os réus tinham planejado sequestrar a vítima e levá-la para o apartamento de um deles, sendo que todos tinham ciência de que se tratava de uma ação ilegal.7. O crime de sequestro e cárcere privado, por ser mais grave, não pode ser absorvido pelo delito de exercício arbitrário das próprias razões, que é menos grave. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça. Além disso, o preceito secundário do delito de exercício arbitrário das próprias razões prevê a punição do agente pela violência praticada contra a vítima, o que na hipótese ficou configurado com o sequestro e o cárcere privado.8. A incidência da qualificadora prevista no § 2º do artigo 148 do Código Penal não violou a regra da mutatio libelli, visto que a denúncia descreve as elementares do tipo qualificado, quando narra que a vítima, já estando com as mãos algemadas para trás, foi vendada, amordaçada e amarrada, além de fisicamente agredida.9. Não há falar em violação ao artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal se o Magistrado, ao condenar os réus no tipo qualificado, expôs devidamente as razões de seu convencimento.10. A prova dos autos autoriza a incidência da qualificadora prevista no § 2º do artigo 148 do Código Penal, diante da prova de que a vítima foi localizada sem roupas, com os olhos vendados, amordaçada, algemada com as mãos para trás e amarrada em uma cadeira. Além disso, o Laudo de Lesões Corporais da vítima atesta que ela sofreu queimaduras de 1º e 2º graus, provocadas por produto químico, na região torácica (mamilo direito e abdome), na coxa direita e na região genital, além de apresentar uma equimose arroxeada e escoriação na região nasal.11. Conquanto o Juiz a quo tenha reconhecido a prática de dois delitos, extinguiu a punibilidade do crime de exercício arbitrário das próprias razões em razão da prescrição, condenando os réus apenas pelo crime de sequestro e cárcere privado. Dessa forma, não há interesse recursal no pedido de reconhecimento de concurso formal de crimes.12. O pedido de concessão de justiça gratuita deve ser formulado perante o Juízo da Execução Penal, órgão competente para verificar a condição de hipossuficiência econômica dos condenados, tendo em vista que não cabe à Turma Criminal, em sede de apelação, fazer tal avaliação.13. Indefere-se o pedido de extensão da causa da diminuição prevista no artigo 14 da Lei 9.807/1999 se o recorrente, embora tenha confessado o delito, prestou suas informações após a libertação da vítima e identificação dos demais envolvidos.14. Recursos do Ministério Público e das Defesas conhecidos. Indeferido o pedido de novo interrogatório dos réus. Rejeitadas as preliminares de inépcia da denúncia, de violação ao princípio da identidade física do Juiz, de violação ao princípio do Juiz natural, de não aplicação da regra da mutatio libelli e de ausência de fundamentação na aplicação da qualificadora prevista no § 2º do artigo 148 do Código Penal. No mérito, recursos não providos, sendo mantida a sentença que extinguiu a punibilidade dos réus pelo crime de exercício arbitrário das próprias razões e os condenou nas sanções do artigo 148, § 2º, do Código Penal, às penas de 01 (um) ano e 06 (seis) meses de reclusão para o primeiro denunciado e 02 (dois) anos de reclusão para os demais réus, em regime inicial aberto, sendo deferida a suspensão condicional da pena pelo prazo de 02 (dois) anos para todos os réus.
Ementa
APELAÇÃO CRIMINAL. EXTORSÃO MEDIANTE SEQUESTRO. SENTENÇA CONDENATÓRIA PELO CRIME DE SEQUESTRO E CÁRCERE PRIVADO. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE PELO CRIME DE EXERCÍCIO ARBITRÁRIO DAS PRÓPRIAS RAZÕES. PEDIDO DE REINTERROGATÓRIO DOS RÉUS. INDEFERIMENTO. ATO JUDICIAL REALIZADO DE ACORDO COM A NORMA PROCESSUAL VIGENTE NO MOMENTO DE SUA REALIZAÇÃO. PRELIMINARES. INÉPCIA DA DENÚNCIA. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS DO ARTIGO 41 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA IDENTIDADE FÍSICA DO JUIZ E DO JUIZ NATURAL. NÃO CONFIGURAÇÃO. RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. PEDIDO DE CONDENAÇÃO PELO CRIME DE EXTORSÃO MEDIANTE SEQUESTRO. DÚVIDA QUANTO AO FATO DE A VÍTIMA SER INTEGRANTE DE GRUPO DE ESTELIONATÁRIOS. IN DUBIO PRO REO. NULIDADE. VIOLAÇÃO À REGRA DO MUTATIO LIBELLI. GRAVE SOFRIMENTO FÍSICO E MORAL NARRADO NA DENÚNCIA. APLICAÇÃO DA EMENDATIO LIBELLI. VIOLAÇÃO AO ARTIGO 93, INCISO IX, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. INCIDÊNCIA DA QUALIFICADORA DEVIDAMENTE JUSTIFICADA NA SENTENÇA. EXCLUSÃO DO CRIME DE SEQUESTRO E CÁRCERE PRIVADO. IMPOSSIBILIDADE. CRIME MAIS GRAVE NÃO PODE SER ABSORVIDO POR DELITO MENOS GRAVE. PRECEDENTES DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. ATIPICIDADE DA CONDUTA. DOLO DE PRIVAR ILEGALMENTE A LIBERDADE DA VÍTIMA DEMONSTRADO NOS AUTOS. INCIDÊNCIA DA QUALIFICADORA COM SUPORTE NA PROVA DOS AUTOS. MANUTENÇÃO. CONCURSO FORMAL DE CRIMES. AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL. GRATUIDADE DE JUSTIÇA. COMPETÊNCIA DA VARA DE EXECUÇÕES PENAIS. EXTENSÃO A CORRÉU DA CAUSA DE DIMINUIÇÃO PREVISTA NO ARTIGO 14 DA LEI 9.807/1999. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. RECURSOS CONHECIDOS. INDEFERIDOS OS PEDIDOS DE REINTERROGATÓRIO DOS RÉUS E REJEITADAS AS PRELIMINARES DE INÉPCIA DA DENÚNCIA, DE VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA IDENTIDADE FÍSICA DO JUIZ, DE NÃO APLICAÇÃO DA REGRA DA MUTATIO LIBELLI E DE AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO NA APLICAÇÃO DA QUALIFICADORA PREVISTA NO § 2º DO ARTIGO 148 DO CÓDIGO PENAL. NO MÉRITO, NÃO PROVIDOS OS RECURSOS.1. Descabido o pedido de novo interrogatório dos réus em razão de alteração legislativa, se os atos judiciais foram realizados de acordo com as regras processuais vigentes na data de sua realização. Inteligência do artigo 2º do Código de Processo Penal.2. Não é possível falar em inépcia da denúncia se a inicial acusatória descreve suficientemente o fato criminoso e suas circunstâncias, preenchendo os requisitos do artigo 41 do Código de Processo Penal, a fim de permitir o exercício do contraditório e da ampla defesa.3. A violação ao princípio da identidade física do Juiz não se caracteriza quando o magistrado que presidiu a audiência de instrução e julgamento não era mais competente para julgar o feito na data da conclusão para sentença, em razão de seu deslocamento para outro juízo.4. O julgamento do feito pelo Juiz de Direito da 8ª Vara Criminal obedeceu às diretrizes da Lei de Organização Judiciária do Distrito Federal, uma vez que é o substituto legal do Juiz da 7ª Vara Criminal. Embora o processo seja oriundo da 7ª Vara Criminal, o Juiz Titular e um Juiz substituto lotados no juízo a quo estavam em gozo de férias na data da conclusão para sentença, sendo que o Juiz substituto, que estava respondendo pela referida vara, já tinha se declarado suspeito para atuar no processo. Assim, não há falar em violação ao princípio do Juiz natural.5. As provas dos autos não excluem de forma absoluta a possibilidade de os réus terem executado a ação ilícita imaginando que a vítima seria um dos integrantes da quadrilha que praticava o golpe de duplicação de dinheiro no Distrito Federal, o que ficou corroborado pelo reconhecimento da pessoa sequestrada por outras vítimas do crime de estelionato praticado com o mesmo modus operandi. A dúvida, na hipótese, deve ser resolvida em favor dos réus (in dubio pro reo), mostrando-se correta a conclusão de que os réus cometeram o crime de exercício arbitrário das próprias razões (artigo 345 do Código Penal) em concurso com o delito de sequestro e cárcere privado qualificado (artigo 148, § 2º, do Código Penal).6. Não merece acolhida a tese defensiva de atipicidade da conduta ou de condenação apenas pelo crime de exercício arbitrário das próprias razões. As provas evidenciam que os réus tinham planejado sequestrar a vítima e levá-la para o apartamento de um deles, sendo que todos tinham ciência de que se tratava de uma ação ilegal.7. O crime de sequestro e cárcere privado, por ser mais grave, não pode ser absorvido pelo delito de exercício arbitrário das próprias razões, que é menos grave. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça. Além disso, o preceito secundário do delito de exercício arbitrário das próprias razões prevê a punição do agente pela violência praticada contra a vítima, o que na hipótese ficou configurado com o sequestro e o cárcere privado.8. A incidência da qualificadora prevista no § 2º do artigo 148 do Código Penal não violou a regra da mutatio libelli, visto que a denúncia descreve as elementares do tipo qualificado, quando narra que a vítima, já estando com as mãos algemadas para trás, foi vendada, amordaçada e amarrada, além de fisicamente agredida.9. Não há falar em violação ao artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal se o Magistrado, ao condenar os réus no tipo qualificado, expôs devidamente as razões de seu convencimento.10. A prova dos autos autoriza a incidência da qualificadora prevista no § 2º do artigo 148 do Código Penal, diante da prova de que a vítima foi localizada sem roupas, com os olhos vendados, amordaçada, algemada com as mãos para trás e amarrada em uma cadeira. Além disso, o Laudo de Lesões Corporais da vítima atesta que ela sofreu queimaduras de 1º e 2º graus, provocadas por produto químico, na região torácica (mamilo direito e abdome), na coxa direita e na região genital, além de apresentar uma equimose arroxeada e escoriação na região nasal.11. Conquanto o Juiz a quo tenha reconhecido a prática de dois delitos, extinguiu a punibilidade do crime de exercício arbitrário das próprias razões em razão da prescrição, condenando os réus apenas pelo crime de sequestro e cárcere privado. Dessa forma, não há interesse recursal no pedido de reconhecimento de concurso formal de crimes.12. O pedido de concessão de justiça gratuita deve ser formulado perante o Juízo da Execução Penal, órgão competente para verificar a condição de hipossuficiência econômica dos condenados, tendo em vista que não cabe à Turma Criminal, em sede de apelação, fazer tal avaliação.13. Indefere-se o pedido de extensão da causa da diminuição prevista no artigo 14 da Lei 9.807/1999 se o recorrente, embora tenha confessado o delito, prestou suas informações após a libertação da vítima e identificação dos demais envolvidos.14. Recursos do Ministério Público e das Defesas conhecidos. Indeferido o pedido de novo interrogatório dos réus. Rejeitadas as preliminares de inépcia da denúncia, de violação ao princípio da identidade física do Juiz, de violação ao princípio do Juiz natural, de não aplicação da regra da mutatio libelli e de ausência de fundamentação na aplicação da qualificadora prevista no § 2º do artigo 148 do Código Penal. No mérito, recursos não providos, sendo mantida a sentença que extinguiu a punibilidade dos réus pelo crime de exercício arbitrário das próprias razões e os condenou nas sanções do artigo 148, § 2º, do Código Penal, às penas de 01 (um) ano e 06 (seis) meses de reclusão para o primeiro denunciado e 02 (dois) anos de reclusão para os demais réus, em regime inicial aberto, sendo deferida a suspensão condicional da pena pelo prazo de 02 (dois) anos para todos os réus.
Data do Julgamento
:
11/04/2013
Data da Publicação
:
22/04/2013
Órgão Julgador
:
2ª Turma Criminal
Relator(a)
:
ROBERVAL CASEMIRO BELINATI
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