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Jurisprudência


TJDF APR -Apelação Criminal-20080810042088APR

Ementa
APELAÇÃO CRIMINAL. ABORTO PROVOCADO POR TERCEIRO COM O CONSENTIMENTO DA GESTANTE, QUALIFICADO PELO RESULTADO MORTE. ARTIGOS 126 E 127 DO CÓDIGO PENAL. SENTENÇA CONDENATÓRIA. ALEGAÇÃO DE DECISÃO MANIFESTAMENTE CONTRÁRIA À PROVA DOS AUTOS. ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE PROVA DA EXISTÊNCIA DA GRAVIDEZ. PROVA DE QUE O MEDICAMENTO CYTOTEC TENHA CAUSADO O ABORTAMENTO NA FALECIDA E PROVA DO NEXO CAUSAL ENTRE O ABORTO E A MORTE DA VÍTIMA. CONJUNTO PROBATÓRIO QUE CONFORTA A DECISÃO DO CONSELHO DE SENTENÇA. PROVAS SUFICIENTES DA MATERIALIDADE E AUTORIA DO CRIME. APLICAÇÃO DA PENA. AVALIAÇÃO EQUIVOCADA DAS CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS DA CULPABILIDADE, DA PERSONALIDADE E DAS CONSEQUÊNCIAS DO CRIME. REGIME DE CUMPRIMENTO DE PENA. REPARAÇÃO DOS DANOS CAUSADOS. DELITO PRATICADO ANTES DA ENTRADA EM VIGOR DA LEI Nº 11.719, DE 20 DE JUNHO DE 2008. EXCLUSÃO. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.1. A decisão entendida como manifestamente contrária à prova dos autos é aquela em que o Conselho de Sentença despreza completamente o conjunto probatório, conduzindo a um resultado dissociado da realidade apresentada nos autos. In casu, os jurados apoiaram-se nas provas testemunhais e documentais para concluir que a vítima estava grávida e com receio de perder o emprego, razão pela qual fez o aborto. Ademais, os jurados foram devidamente esclarecidos sobre os efeitos abortivos do medicamento Cytotec, havendo provas suficientes de que tal medicamento foi ministrado pelo apelante. Quanto ao nexo causal entre a conduta praticada pelo apelante (aborto com o consentimento da gestante) e o resultado morte da vítima, os prontuários médicos acostados aos autos confirmam que a vítima foi internada com o quadro de aborto infectado, foi submetida a curetagem uterina, evoluindo para choque séptico que a levou ao óbito. Por fim, consta da certidão de óbito da vítima que a causa da morte foi falência múltipla de órgãos, choque séptico, aborto complicado. 2. Se os jurados apoiaram-se nas provas coligidas aos autos, não há que se falar em decisão manifestamente contrária à prova dos autos.3. A circunstância judicial da culpabilidade não pode ser considerada em prejuízo do agente se sua previsão já fizer parte do tipo penal. Nessa linha de raciocínio, o desrespeito à vida humana é inerente ao tipo penal incriminador, porquanto quem pratica o delito de aborto o faz desprezando a vida de outrem.4. O fato de uma pessoa ficar órfã ou viúva, com todo o sofrimento que isso traz, é consequência natural da morte da pessoa da família, ínsito, portanto, ao tipo penal incriminador do aborto qualificado pelo resultado morte.5. A avaliação negativa da personalidade do réu deve ser excluída, eis que a Magistrada não declinou os motivos pelos quais entende que o réu possui personalidade inconsequente, não servindo para tanto a alegação de que praticou o crime em comento.6. Deve ser afastada a condenação ao pagamento de indenização imposta ao réu, porque o crime em apreço foi praticado antes da edição da Lei nº 11.719/2008, que introduziu no artigo 387 do Código de Processo Penal o inciso IV, de forma que, por se tratar de lei mais gravosa, não pode retroagir para alcançar fato pretérito, pois, embora seja lei processual, também tem conteúdo de direito material.7. Recurso conhecido e parcialmente provido para, mantida a condenação do apelante por incursão nos artigos 126 e 127 do Código Penal, excluir a valoração negativa das circunstâncias judiciais da culpabilidade, da personalidade e das consequências do crime, reduzindo a pena de 05 (cinco) anos de reclusão para 03 (três) anos e 04 (quatro) meses de reclusão, fixando o regime inicial aberto e excluindo a condenação ao pagamento de indenização aos familiares da vítima.

Data do Julgamento : 05/08/2010
Data da Publicação : 18/08/2010
Classe/Assunto : Segredo de Justiça
Órgão Julgador : 2ª Turma Criminal
Relator(a) : ROBERVAL CASEMIRO BELINATI
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