TJDF APR -Apelação Criminal-20120710007528APR
APELAÇÃO CRIMINAL. ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR PRATICADO CONTRA DESCENDENTE (FILHA). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DA DEFESA. PRELIMINAR DE INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA. INAPLICABILIDADE. PRELIMINAR DE DECADÊNCIA E ILEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO. REJEITADAS. MÉRITO. DOSIMETRIA. APLICAÇÃO DA LEI VIGENTE AO TEMPO DA CONDUTA. MOTIVO. PERSONALIDADE. DECOTADOS. PRELIMINARES REJEITADAS E RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.1. Os dispositivos da Lei nº 11.340/2006 (Lei Maria da Penha) possuem natureza mista, motivo pelo qual sua aplicabilidade fica restrita aos delitos posteriores à vigência do referido diploma normativo, na medida em que são mais penosos ao autor do crime. Por via de consequência, fica afastada a competência do Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher aos delitos cometidos antes da entrada em vigor da Lei.2. Nos crimes contra a liberdade ou dignidade sexual praticados contra vítima filha do agente e menor de 18 (dezoito) anos, a ação penal é pública incondicionada, seja porque exercido com abuso de pátrio poder - artigo 225, § 1º, inciso II, do Código Penal (em sua redação original), seja porque praticado contra vítima menor de 18 anos - artigo 225, parágrafo único (com a redação dada pela Lei nº 12.015, de 2009). Assim sendo, descabe falar em decadência do direito de oferecimento da queixa ou representação, bem como de ilegitimidade do Ministério Público.3. A norma penal é irretroativa, salvo para beneficiar o réu. Aos crimes contra a dignidade sexual, praticados entre 1994 a 2001, são inaplicáveis as Leis nos. 12.015/09 (institui o artigo 217-A, estupro de vulnerável) e 11.106/05 (aumentou na metade o crime praticado por ascendente contra descendente), por serem diplomas normativos posteriores à prática delitiva e mais gravosos ao apelante.4. Difícil é a análise da personalidade de um indivíduo quando não se tem o domínio de conteúdos de psicologia, antropologia ou psiquiatria. A exasperação da pena-base pela presença desta circunstância tem sido admitida, entretanto, quando o agente do delito apresentar sentença penal condenatória transitada em julgado por crime anterior, não sendo o caso dos autos, deve ser decotada.5. Em relação ao motivo, a satisfação da lascívia com a prática de atos libidinosos diversos da conjunção carnal é elemento que integra o tipo penal do artigo 214 do CP (redação vigente à época dos fatos). O fato de a vítima ser filha do autor do fato é elemento que faz incidir a causa de aumento de pena prevista no artigo 226, inciso II, do Código Penal, sendo vedada a adoção, cumulativamente, de circunstância desfavorável na primeira fase (motivo) e terceira fase da dosimetria da pena, sob pena de incorrer no odioso bis in idem.5. Deve incidir a atenuante da confissão espontânea porque, embora tenha havido a retratação em juízo da confissão realizada na Delegacia, foi empregada na formação do convencimento judicial6. A doutrina e a jurisprudência deste egrégio Tribunal pacificaram o entendimento de que, em caso de crime continuado, deve ser adotado o critério da quantidade de delitos cometidos, ficando estabelecidas as seguintes medidas: dois crimes - acréscimo de um sexto (1/6); três delitos - acréscimo de um quinto (1/5); quatro crimes - acréscimo de um quarto (1/4); cinco delitos - acréscimo de um terço (1/3); seis crimes - acréscimo de metade (1/2); sete delitos ou mais - acréscimo de dois terços (2/3). 7. Preliminares rejeitadas e, no mérito, recurso parcialmente provido.
Ementa
APELAÇÃO CRIMINAL. ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR PRATICADO CONTRA DESCENDENTE (FILHA). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DA DEFESA. PRELIMINAR DE INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA. INAPLICABILIDADE. PRELIMINAR DE DECADÊNCIA E ILEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO. REJEITADAS. MÉRITO. DOSIMETRIA. APLICAÇÃO DA LEI VIGENTE AO TEMPO DA CONDUTA. MOTIVO. PERSONALIDADE. DECOTADOS. PRELIMINARES REJEITADAS E RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.1. Os dispositivos da Lei nº 11.340/2006 (Lei Maria da Penha) possuem natureza mista, motivo pelo qual sua aplicabilidade fica restrita aos delitos posteriores à vigência do referido diploma normativo, na medida em que são mais penosos ao autor do crime. Por via de consequência, fica afastada a competência do Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher aos delitos cometidos antes da entrada em vigor da Lei.2. Nos crimes contra a liberdade ou dignidade sexual praticados contra vítima filha do agente e menor de 18 (dezoito) anos, a ação penal é pública incondicionada, seja porque exercido com abuso de pátrio poder - artigo 225, § 1º, inciso II, do Código Penal (em sua redação original), seja porque praticado contra vítima menor de 18 anos - artigo 225, parágrafo único (com a redação dada pela Lei nº 12.015, de 2009). Assim sendo, descabe falar em decadência do direito de oferecimento da queixa ou representação, bem como de ilegitimidade do Ministério Público.3. A norma penal é irretroativa, salvo para beneficiar o réu. Aos crimes contra a dignidade sexual, praticados entre 1994 a 2001, são inaplicáveis as Leis nos. 12.015/09 (institui o artigo 217-A, estupro de vulnerável) e 11.106/05 (aumentou na metade o crime praticado por ascendente contra descendente), por serem diplomas normativos posteriores à prática delitiva e mais gravosos ao apelante.4. Difícil é a análise da personalidade de um indivíduo quando não se tem o domínio de conteúdos de psicologia, antropologia ou psiquiatria. A exasperação da pena-base pela presença desta circunstância tem sido admitida, entretanto, quando o agente do delito apresentar sentença penal condenatória transitada em julgado por crime anterior, não sendo o caso dos autos, deve ser decotada.5. Em relação ao motivo, a satisfação da lascívia com a prática de atos libidinosos diversos da conjunção carnal é elemento que integra o tipo penal do artigo 214 do CP (redação vigente à época dos fatos). O fato de a vítima ser filha do autor do fato é elemento que faz incidir a causa de aumento de pena prevista no artigo 226, inciso II, do Código Penal, sendo vedada a adoção, cumulativamente, de circunstância desfavorável na primeira fase (motivo) e terceira fase da dosimetria da pena, sob pena de incorrer no odioso bis in idem.5. Deve incidir a atenuante da confissão espontânea porque, embora tenha havido a retratação em juízo da confissão realizada na Delegacia, foi empregada na formação do convencimento judicial6. A doutrina e a jurisprudência deste egrégio Tribunal pacificaram o entendimento de que, em caso de crime continuado, deve ser adotado o critério da quantidade de delitos cometidos, ficando estabelecidas as seguintes medidas: dois crimes - acréscimo de um sexto (1/6); três delitos - acréscimo de um quinto (1/5); quatro crimes - acréscimo de um quarto (1/4); cinco delitos - acréscimo de um terço (1/3); seis crimes - acréscimo de metade (1/2); sete delitos ou mais - acréscimo de dois terços (2/3). 7. Preliminares rejeitadas e, no mérito, recurso parcialmente provido.
Data do Julgamento
:
20/03/2014
Data da Publicação
:
26/03/2014
Classe/Assunto
:
Segredo de Justiça
Órgão Julgador
:
2ª Turma Criminal
Relator(a)
:
SILVÂNIO BARBOSA DOS SANTOS
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