TJDF CCP -Conflito de Competência-20080020166802CCP
CONFLITO DE COMPETÊNCIA. PROCESSO PENAL. PRINCÍPIO DA IDENTIDADE FÍSICA DO JUIZ. ARTIGO 399, § 2º, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL, INTRODUZIDO PELA LEI Nº 11.719, DE 20/06/2008. CONFLITO DA LEI NO TEMPO. SISTEMAS QUE O RESOLVEM. SISTEMA ADOTADO PELO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. INCIDÊNCIA DO PRINCÍPIO DA IDENTIDADE FÍSICA DO JUIZ APENAS A PARTIR DA VIGÊNCIA DA LEI Nº 11.719/2008, COM A REALIZAÇÃO DA AUDIÊNCIA JÁ OBEDECENDO ÀS SUAS NORMAS. PRINCÍPIO NÃO ABSOLUTO.Três sistemas propõem resolver os problemas de direito intertemporal no que concerne à aplicação da lei processual: o sistema da unidade processual, o sistema das fases processuais e o sistema do isolamento dos atos processuais. O terceiro é o adotado no direito processual pátrio, inclusive na área penal, em que prescreve o artigo 2º do Código: 'a lei processual penal aplicar-se-á desde logo, sem prejuízo dos atos realizados sob a vigência da lei anterior'. Assim, encontrando a lei nova processo em curso, deve respeitar a eficácia dos atos processuais já constituídos, incidindo apenas quanto aos atos processuais que devam ser praticados a partir da sua vigência. É o princípio tempus regit actum, do qual resultam dois efeitos: 1º) os atos processuais realizados sob a vigência da lei anterior são válidos; 2º) as normas processuais têm aplicação imediata, disciplinando o curso restante do processo, respeitados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada (CF, art. 5º, XXXVI; LICC, art. 6º; CPP, art. 2º).Têm validade plena, assim, os atos processuais de coleta da prova oral, quais sejam, o interrogatório e a oitiva das vítimas e testemunhas, todos anteriores ao advento da Lei nº 11.719, de 20/06/2008, em vigor a partir de 24/08/2008, que introduziu, no § 2º do artigo 399 do Código de Processo Penal, o princípio da identidade física do juiz. Válidos tais atos, não podem ser desconstituídos para que se realize uma nova audiência, agora obedecendo as alterações trazidas ao processo penal pela mesma Lei nº 11.719/2008.É a concentração da coleta da prova oral em uma mesma audiência, por um só juiz, a razão determinante da introdução do princípio da identidade física do juiz no processo penal. Se, todavia, essa audiência única não foi realizada, porque então vigente o anterior procedimento, em que colhida a prova oral de forma partida, primeiro o interrogatório do réu, seguindo-se defesa prévia e sumário, em datas diversas, muitas vezes por juízes diferentes, ou ainda que pelo mesmo juiz, não há como incidir o princípio da identidade física do juiz. Seria necessário apagar os atos processuais já validamente praticados e realizar a nova audiência única. Isso implicaria aplicar retroativamente a Lei nº 11.719/2008 e ferir de morte o artigo 2º do Código de Processo Penal. O princípio da identidade física do juiz no processo penal apenas se aplica a partir da vigência da Lei nº 11.719/2008, com a realização da audiência já obedecendo às suas normas. Como, no caso, o juiz suscitante, substituto, colheu prova oral antes da vigência da Lei nº 11.719/2008, não está ele vinculado, podendo a sentença ser proferida por outro juiz qualquer, titular do juízo ou substituto nele em exercício pleno ou auxílio.No direito processual pátrio contemporâneo, o princípio da identidade física do juiz não é concebido em termos absolutos, merecendo respeito princípios outros como os da celeridade e da economia processual, que preconizam o aproveitamento dos atos processuais praticados, e o da instrumentalidade das formas, que orienta a teoria das nulidades. Não se decreta qualquer nulidade sem que tenha havido prejuízo para a parte, consoante o artigo 563 do Código de Processo Penal, incumbindo o ônus da demonstração a quem o alega. Aliás, em sede de direito processual, a alegação de prejuízo, necessariamente, deverá estar plasmada em violação aos princípios do devido processo legal, como o contraditório e a ampla defesa, porque têm as partes direito à prestação jurisdicional e não a um determinado resultado por elas perseguido.Omissa a nova lei, quanto à disciplina do princípio da identidade física do juiz, incide o artigo 132 do Código de Processo Civil. Afastado, pois, por qualquer motivo, inclusive férias, o juiz que colheu a prova em audiência, outro poderá sentenciar, repetindo, se o caso, as provas, sem ofensa ao princípio da identidade física do juiz, que, como visto, não é absoluto.Conflito julgado procedente, declarado competente para sentenciar o juiz em exercício no Juízo de Direito suscitado, o da Vara Criminal, do Tribunal do Júri e dos Delitos de Trânsito da Circunscrição Judiciária de Santa Maria, seja o seu titular, seja o juiz de direito substituto que no referido juízo esteja em exercício pleno ou auxílio, podendo, se entender necessário, repetir a prova oral.
Ementa
CONFLITO DE COMPETÊNCIA. PROCESSO PENAL. PRINCÍPIO DA IDENTIDADE FÍSICA DO JUIZ. ARTIGO 399, § 2º, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL, INTRODUZIDO PELA LEI Nº 11.719, DE 20/06/2008. CONFLITO DA LEI NO TEMPO. SISTEMAS QUE O RESOLVEM. SISTEMA ADOTADO PELO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. INCIDÊNCIA DO PRINCÍPIO DA IDENTIDADE FÍSICA DO JUIZ APENAS A PARTIR DA VIGÊNCIA DA LEI Nº 11.719/2008, COM A REALIZAÇÃO DA AUDIÊNCIA JÁ OBEDECENDO ÀS SUAS NORMAS. PRINCÍPIO NÃO ABSOLUTO.Três sistemas propõem resolver os problemas de direito intertemporal no que concerne à aplicação da lei processual: o sistema da unidade processual, o sistema das fases processuais e o sistema do isolamento dos atos processuais. O terceiro é o adotado no direito processual pátrio, inclusive na área penal, em que prescreve o artigo 2º do Código: 'a lei processual penal aplicar-se-á desde logo, sem prejuízo dos atos realizados sob a vigência da lei anterior'. Assim, encontrando a lei nova processo em curso, deve respeitar a eficácia dos atos processuais já constituídos, incidindo apenas quanto aos atos processuais que devam ser praticados a partir da sua vigência. É o princípio tempus regit actum, do qual resultam dois efeitos: 1º) os atos processuais realizados sob a vigência da lei anterior são válidos; 2º) as normas processuais têm aplicação imediata, disciplinando o curso restante do processo, respeitados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada (CF, art. 5º, XXXVI; LICC, art. 6º; CPP, art. 2º).Têm validade plena, assim, os atos processuais de coleta da prova oral, quais sejam, o interrogatório e a oitiva das vítimas e testemunhas, todos anteriores ao advento da Lei nº 11.719, de 20/06/2008, em vigor a partir de 24/08/2008, que introduziu, no § 2º do artigo 399 do Código de Processo Penal, o princípio da identidade física do juiz. Válidos tais atos, não podem ser desconstituídos para que se realize uma nova audiência, agora obedecendo as alterações trazidas ao processo penal pela mesma Lei nº 11.719/2008.É a concentração da coleta da prova oral em uma mesma audiência, por um só juiz, a razão determinante da introdução do princípio da identidade física do juiz no processo penal. Se, todavia, essa audiência única não foi realizada, porque então vigente o anterior procedimento, em que colhida a prova oral de forma partida, primeiro o interrogatório do réu, seguindo-se defesa prévia e sumário, em datas diversas, muitas vezes por juízes diferentes, ou ainda que pelo mesmo juiz, não há como incidir o princípio da identidade física do juiz. Seria necessário apagar os atos processuais já validamente praticados e realizar a nova audiência única. Isso implicaria aplicar retroativamente a Lei nº 11.719/2008 e ferir de morte o artigo 2º do Código de Processo Penal. O princípio da identidade física do juiz no processo penal apenas se aplica a partir da vigência da Lei nº 11.719/2008, com a realização da audiência já obedecendo às suas normas. Como, no caso, o juiz suscitante, substituto, colheu prova oral antes da vigência da Lei nº 11.719/2008, não está ele vinculado, podendo a sentença ser proferida por outro juiz qualquer, titular do juízo ou substituto nele em exercício pleno ou auxílio.No direito processual pátrio contemporâneo, o princípio da identidade física do juiz não é concebido em termos absolutos, merecendo respeito princípios outros como os da celeridade e da economia processual, que preconizam o aproveitamento dos atos processuais praticados, e o da instrumentalidade das formas, que orienta a teoria das nulidades. Não se decreta qualquer nulidade sem que tenha havido prejuízo para a parte, consoante o artigo 563 do Código de Processo Penal, incumbindo o ônus da demonstração a quem o alega. Aliás, em sede de direito processual, a alegação de prejuízo, necessariamente, deverá estar plasmada em violação aos princípios do devido processo legal, como o contraditório e a ampla defesa, porque têm as partes direito à prestação jurisdicional e não a um determinado resultado por elas perseguido.Omissa a nova lei, quanto à disciplina do princípio da identidade física do juiz, incide o artigo 132 do Código de Processo Civil. Afastado, pois, por qualquer motivo, inclusive férias, o juiz que colheu a prova em audiência, outro poderá sentenciar, repetindo, se o caso, as provas, sem ofensa ao princípio da identidade física do juiz, que, como visto, não é absoluto.Conflito julgado procedente, declarado competente para sentenciar o juiz em exercício no Juízo de Direito suscitado, o da Vara Criminal, do Tribunal do Júri e dos Delitos de Trânsito da Circunscrição Judiciária de Santa Maria, seja o seu titular, seja o juiz de direito substituto que no referido juízo esteja em exercício pleno ou auxílio, podendo, se entender necessário, repetir a prova oral.
Data do Julgamento
:
01/12/2008
Data da Publicação
:
08/01/2009
Classe/Assunto
:
Segredo de Justiça
Órgão Julgador
:
Câmara Criminal
Relator(a)
:
MARIO MACHADO
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