TJDF EIC - 1060766-20080110193024EIC
EMBARGOS INFRINGENTES. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. RECURSO DA RÉ. REFORMA PARCIAL DE SENTENÇA SOMENTE EM RELAÇÃO AO VALOR FIXADO SOB O TÍTULO DE INDENIZAÇÃO. CONFIRMAÇÃO POR UNANIMIDADE DA SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA DO PEDIDO. AUSÊNCIA DE PRESSUPOSTO RECURSAL. RECURSO DO AUTOR. CORRESPONDÊNCIA ENTRE O VOTO VENCIDO E A SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. CABIMENTO DO RECURSO. DIREITO CIVIL E CONSTITUCIONAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. INDENIZAÇÃO. PUBLICAÇÃO DE MATÉRIA JORNALÍSTICA. DIREITOS FUNDAMENTAIS. LIBERDADE DE IMPRENSA. DIREITOS DA PERSONALIDADE. COLISÃO. NECESSIDADE DE PONDERAÇÃO. ABUSO DE DIREITO. INOCORRÊNCIA. 1. Cabem embargos infringentes quando o acórdão não unânime houver reformado, em grau de apelação, sentença de mérito (artigo 530 do Código de Processo Civil de 1973). 2. Conforme orientação firmada pela Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, não são cabíveis embargos de infringentes quando, pela maioria dos votos proferidos no acórdão da apelação, não houve reforma da sentença de mérito, tendo sido mantido o juízo de procedência do pedido. 3. No caso, embora o Tribunal tenha majorado o valor indenizatório fixado em primeira instância, tanto a sentença quanto o acórdão de apelação mantiveram, por unanimidade, a obrigação de indenizar (dupla sucumbência), não ocorrendo, assim, efetiva modificação do juízo de procedência do pedido, além do que o quantum da indenização por danos imateriais é de fixação judicial.Ausente, portanto, o pressuposto de admissibilidadedo recurso da ré. 4. Quanto ao recurso do autor, a hipótese dos autos se enquadra perfeitamente na previsão legal: a) houve acórdão de provimento, com reforma integral da sentença de mérito para julgar improcedente o pedido indenizatório formulado na inicial e b) o acórdão não foi unânime, havendo voto vencido no sentido da manutenção da procedência do pedido indenizatório. Cabíveis, portanto, os embargos infringentes. 5. Responsabilidade civil é obrigação que a ordem jurídica impõe a uma pessoa, natural ou jurídica, de reparar danos causados a outra por ato contrário ao direito, comissivo ou omissivo, voluntário ou culposo (artigos 186, 187 e 927 do Código Civil). 6. O direito de informação e manifestação, assim como a inviolabilidade da intimidade e da vida privada, encontram-se expressos no texto constitucional, integrando o rol dos direitos fundamentais (art. 5º, incisos IV, V, IX, XIII, XIV, X e art. 220). 7. Nesse contexto de exercício de direitos qualificados que tem se intensificado o debate acerca da responsabilidade civil decorrente de publicações na imprensa. De um lado, tem-se a proteção constitucional da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das pessoas, com a garantia da devida reparação por danos decorrentes da sua violação. Do outro, a Constituição Federal também assegura a liberdade de imprensa, atividade reconhecidamente importante na construção do pluralismo de idéias e da própria democracia 8. Na colisão de direitos fundamentais, destaca-se a denominada técnica da ponderação de normas, valores e interesses, da qual o intérprete constitucional deve se valer para, à luz do caso concreto, tentar conciliar na medida do possível as pretensões em disputa, sempre buscando preservar ao máximo o conteúdo de cada uma. Para auxiliar nessa árdua tarefa, a doutrina estabelece algumas circunstâncias específicas que podem nortear o exame da razoabilidade da publicação jornalística, dentre as quais se destaca: a) a veracidade do fato, b) a licitude do meio empregado na obtenção da informação, c) a personalidade pública ou estritamente privada da pessoa objeto da notícia, d) o local e a natureza do fato noticiado e e) a existência de interesse público na divulgação, especialmente quando o fato decorra da atuação de órgãos ou entidades públicas. 9. Na hipótese dos autos, a reportagem em questão, classificada pelo embargante como ofensiva, não foi assinada pela embargada. A matéria foi levada adiante e publicada sem a identificação de profissional sob a incumbência do veículo de comunicação, o que afasta a responsabilidade direta da jornalista na condição profissional responsável pela publicação. Além disso, a pretendida responsabilização teria cabimento apenas se reconhecido o abuso no direito de informar, o que não se verifica no caso. 10. Analisando o teor da reportagem publicada e o conjunto probatório dos autos, tem-se que, conforme entendimento prevalente no acórdão embargado, a matéria veiculada possui caráter meramente informativo, atendeu o interesse social da notícia e a continência da narração, não ofendendo, por conseguinte, os direitos da personalidade do embargante. 11. Anotícia se baseou em um comunicadoencaminhado por uma advogada, conforme amplamente destacado em seu conteúdo, não havendo, ademais, a imputação de qualquer ato específico ao embargante ou a emissão de juízo de valor sobre os fatos noticiados, que foram relatados de maneira genérica, atendo-se aos limites da mera exposição. Inexiste mácula na obtenção da informação, que também não diz respeito a fato sigiloso. Destaca-se ainda a personalidade pública das pessoas objeto da notícia e a natureza dos fatos narrados que são relacionados a uma suposta atuação de autoridades públicas, o que revela o interesse público na divulgação. 12. Observa-se que a embargada procurou, dentro das suas possibilidades, ouvir todos os envolvidos (consoante narrado na própria reportagem), esclareceu ao interessado, quando solicitada, como chegou à versão publicada e, assim que procurada, dispôs-se a divulgar imediatamente ao público, com o mesmo destaque, a versão da parte contrária. Apesar de não ter suprimido, por precaução, o nome das pessoas de que não obteve resposta, essa situação não representa, por si só e para fins de responsabilização, um indispensável descaso na apuração do fato ou a difusão intencional da falsidade com o fim de manipular a opinião pública ou atingir a honra do embargante. A falta de comunicação, nesse contexto, há que ser levada em conta e flexibilizada. 13. Conforme bem definido no acórdão embargado, a narrativa não extrapolou a postura decorrente da liberdade de informação e, nessa condição, deve ser tolerada, não configurando, por conseguinte, abuso de direito, nem carregando excessos capazes de transgredir os direitos da personalidade do embargante. 14. Recurso da ré não conhecido, preliminar acolhida. Recurso do autor conhecido, preliminar rejeitada e, no mérito, desprovido.
Ementa
EMBARGOS INFRINGENTES. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. RECURSO DA RÉ. REFORMA PARCIAL DE SENTENÇA SOMENTE EM RELAÇÃO AO VALOR FIXADO SOB O TÍTULO DE INDENIZAÇÃO. CONFIRMAÇÃO POR UNANIMIDADE DA SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA DO PEDIDO. AUSÊNCIA DE PRESSUPOSTO RECURSAL. RECURSO DO AUTOR. CORRESPONDÊNCIA ENTRE O VOTO VENCIDO E A SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. CABIMENTO DO RECURSO. DIREITO CIVIL E CONSTITUCIONAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. INDENIZAÇÃO. PUBLICAÇÃO DE MATÉRIA JORNALÍSTICA. DIREITOS FUNDAMENTAIS. LIBERDADE DE IMPRENSA. DIREITOS DA PERSONALIDADE. COLISÃO. NECESSIDADE DE PONDERAÇÃO. ABUSO DE DIREITO. INOCORRÊNCIA. 1. Cabem embargos infringentes quando o acórdão não unânime houver reformado, em grau de apelação, sentença de mérito (artigo 530 do Código de Processo Civil de 1973). 2. Conforme orientação firmada pela Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, não são cabíveis embargos de infringentes quando, pela maioria dos votos proferidos no acórdão da apelação, não houve reforma da sentença de mérito, tendo sido mantido o juízo de procedência do pedido. 3. No caso, embora o Tribunal tenha majorado o valor indenizatório fixado em primeira instância, tanto a sentença quanto o acórdão de apelação mantiveram, por unanimidade, a obrigação de indenizar (dupla sucumbência), não ocorrendo, assim, efetiva modificação do juízo de procedência do pedido, além do que o quantum da indenização por danos imateriais é de fixação judicial.Ausente, portanto, o pressuposto de admissibilidadedo recurso da ré. 4. Quanto ao recurso do autor, a hipótese dos autos se enquadra perfeitamente na previsão legal: a) houve acórdão de provimento, com reforma integral da sentença de mérito para julgar improcedente o pedido indenizatório formulado na inicial e b) o acórdão não foi unânime, havendo voto vencido no sentido da manutenção da procedência do pedido indenizatório. Cabíveis, portanto, os embargos infringentes. 5. Responsabilidade civil é obrigação que a ordem jurídica impõe a uma pessoa, natural ou jurídica, de reparar danos causados a outra por ato contrário ao direito, comissivo ou omissivo, voluntário ou culposo (artigos 186, 187 e 927 do Código Civil). 6. O direito de informação e manifestação, assim como a inviolabilidade da intimidade e da vida privada, encontram-se expressos no texto constitucional, integrando o rol dos direitos fundamentais (art. 5º, incisos IV, V, IX, XIII, XIV, X e art. 220). 7. Nesse contexto de exercício de direitos qualificados que tem se intensificado o debate acerca da responsabilidade civil decorrente de publicações na imprensa. De um lado, tem-se a proteção constitucional da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das pessoas, com a garantia da devida reparação por danos decorrentes da sua violação. Do outro, a Constituição Federal também assegura a liberdade de imprensa, atividade reconhecidamente importante na construção do pluralismo de idéias e da própria democracia 8. Na colisão de direitos fundamentais, destaca-se a denominada técnica da ponderação de normas, valores e interesses, da qual o intérprete constitucional deve se valer para, à luz do caso concreto, tentar conciliar na medida do possível as pretensões em disputa, sempre buscando preservar ao máximo o conteúdo de cada uma. Para auxiliar nessa árdua tarefa, a doutrina estabelece algumas circunstâncias específicas que podem nortear o exame da razoabilidade da publicação jornalística, dentre as quais se destaca: a) a veracidade do fato, b) a licitude do meio empregado na obtenção da informação, c) a personalidade pública ou estritamente privada da pessoa objeto da notícia, d) o local e a natureza do fato noticiado e e) a existência de interesse público na divulgação, especialmente quando o fato decorra da atuação de órgãos ou entidades públicas. 9. Na hipótese dos autos, a reportagem em questão, classificada pelo embargante como ofensiva, não foi assinada pela embargada. A matéria foi levada adiante e publicada sem a identificação de profissional sob a incumbência do veículo de comunicação, o que afasta a responsabilidade direta da jornalista na condição profissional responsável pela publicação. Além disso, a pretendida responsabilização teria cabimento apenas se reconhecido o abuso no direito de informar, o que não se verifica no caso. 10. Analisando o teor da reportagem publicada e o conjunto probatório dos autos, tem-se que, conforme entendimento prevalente no acórdão embargado, a matéria veiculada possui caráter meramente informativo, atendeu o interesse social da notícia e a continência da narração, não ofendendo, por conseguinte, os direitos da personalidade do embargante. 11. Anotícia se baseou em um comunicadoencaminhado por uma advogada, conforme amplamente destacado em seu conteúdo, não havendo, ademais, a imputação de qualquer ato específico ao embargante ou a emissão de juízo de valor sobre os fatos noticiados, que foram relatados de maneira genérica, atendo-se aos limites da mera exposição. Inexiste mácula na obtenção da informação, que também não diz respeito a fato sigiloso. Destaca-se ainda a personalidade pública das pessoas objeto da notícia e a natureza dos fatos narrados que são relacionados a uma suposta atuação de autoridades públicas, o que revela o interesse público na divulgação. 12. Observa-se que a embargada procurou, dentro das suas possibilidades, ouvir todos os envolvidos (consoante narrado na própria reportagem), esclareceu ao interessado, quando solicitada, como chegou à versão publicada e, assim que procurada, dispôs-se a divulgar imediatamente ao público, com o mesmo destaque, a versão da parte contrária. Apesar de não ter suprimido, por precaução, o nome das pessoas de que não obteve resposta, essa situação não representa, por si só e para fins de responsabilização, um indispensável descaso na apuração do fato ou a difusão intencional da falsidade com o fim de manipular a opinião pública ou atingir a honra do embargante. A falta de comunicação, nesse contexto, há que ser levada em conta e flexibilizada. 13. Conforme bem definido no acórdão embargado, a narrativa não extrapolou a postura decorrente da liberdade de informação e, nessa condição, deve ser tolerada, não configurando, por conseguinte, abuso de direito, nem carregando excessos capazes de transgredir os direitos da personalidade do embargante. 14. Recurso da ré não conhecido, preliminar acolhida. Recurso do autor conhecido, preliminar rejeitada e, no mérito, desprovido.
Data do Julgamento
:
06/11/2017
Data da Publicação
:
22/10/2017
Órgão Julgador
:
1ª CÂMARA CÍVEL
Relator(a)
:
MARIA IVATÔNIA
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