TJMS 0007414-56.2011.8.12.0001
E M E N T A - APELAÇÃO CRIMINAL DEFENSIVA - FURTO SIMPLES - PRELIMINAR - NULIDADE DA PROVA ORAL COLHIDA EM JUÍZO EM RAZÃO DA PRÉVIA LEITURA DE DEPOIMENTOS PRESTADOS NO INQUÉRITO POLICIAL - INOCORRÊNCIA - AUSÊNCIA DE PREJUÍZO - MÉRITO - PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO - REFUTADO - FARTO CONJUNTO PROBATÓRIO - AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS - PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA - NÃO RECONHECIDO - RES AVALIADA EM R$80,00 (OITENTA REAIS) - VALOR QUE NÃO PODE SER TIDO COMO ÍNFIMO FRENTA À SITUAÇÃO ECONÔMICA DA VÍTIMA - DESCLASSIFICAÇÃO DO DELITO PARA A FORMA TENTADA - INVIABILIDADE - DESNECESSIDADE DE POSSE MANSA E PACÍFICA DA RES - PENA-BASE REDUZIDA AO MÍNIMO LEGAL - CONDUTA SOCIAL MAL SOPESADA - ATENUANTE DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA - RECONHECIDA - REDUÇÃO DA PENA AQUÉM DO MÍNIMO LEGAL - NÃO POSSÍVEL - SÚMULA 231 DO STJ - MINORANTE PREVISTA NO § 2º DO ARTIGO 155 DO CP MAJORADA PARA 2/3 (DOIS TERÇOS) - NECESSIDADE DE ALTERAÇÃO DA PENA RESTRITIVA DE DIREITO - PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À COMUNIDADE CABÍVEL SOMENTE EM PENAS SUPERIORES A 6 MESES - ARTIGO 46 DO CÓDIGO PENAL - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. 1. A confirmação em juízo dos depoimentos prestados na fase inquisitiva não gera nulidade do processo, mormente quando as partes tiveram a oportunidade de formular perguntas às testemunhas, efetivando-se o contraditório. 2. Não há falar em absolvição se o conjunto probatório produzido no curso da persecução penal, formado pela prisão do acusado em posse da res furtiva, por sua confissão na fase administrativa e pelos depoimentos dos policiais militares e da vítima, torna inquestionável a sua autoria no delito de furto noticiado na denúncia. 3. Para a incidência do princípio da insignificância é necessário o preenchimento de certos requisitos, a saber: a) mínima a ofensividade da conduta do agente; b) nenhuma periculosidade social da ação; c) reduzido o grau de reprovabilidade do comportamento; d) e inexpressiva a lesão jurídica provocada. Precedentes do STF. 4. Na hipótese, a conduta perpetrada não pode ser considerada irrelevante para o Direito Penal, pois revela lesividade suficiente para justificar a imposição da respectiva sanção. É que, conforme se infere dos autos, a bicicleta subtraída era usada como meio de transporte pela vítima. Também se depreende que a situação financeira desta não suporta agressões em seu patrimônio, pois é dos autos que a mesma é "do lar". Tais circunstâncias evidenciam que a ação não foi dotada de mínima lesividade, uma vez que, além de sua utilidade para a vítima, a res foi avaliada em R$ 80,00 (oitenta reais), valor que não pode ser considerado de pouca monta, principalmente se considerada a situação econômica da ofendida. Somado a isso, deve-se considerar que o recorrente já responde a outro crime de furto, o que torna temerária a conclusão de ser ele merecedor do benefício. 5. O delito de furto se consuma no momento em que o agente se torna possuidor da res subtraída, pouco importando que a posse seja ou não mansa e pacífica. Assim, caso o agente se torne possuidor, prescindível será que a res saia da esfera de vigilância da vítima, tratando-se o evento de furto consumado. 6. Impõe-se o afastamento da valoração negativa da circunstância judicial referente à conduta social, porquanto esta não recebeu fundamentação adequada na sentença. O fato de ser usuário de drogas não constitui indicativo automático de má conduta social. De igual forma, o simples fato de estar respondendo a outras ações penais não pode ser utilizado para agravar a pena-base, consoante determina a Súmula 444 do STJ. 7. A confissão extrajudicial, mesmo se retratada em juízo, quando for utilizada como fundamento para a prolação da sentença condenatória, deve autorizar o reconhecimento da atenuante prevista no artigo 65, III, d, do Código Penal. Referida circunstância, entretanto, não possui o condão de reduzir a pena aquém do mínimo legal, nos termos da Súmula 231 do STJ. 8. Embora entenda que o quantum de redução a ser aplicado pela redutora prevista no § 2º do artigo 155 do Código Penal se insira no âmbito do poder discricionário do magistrado, há de se convir que sua decisão deve ser fundamentada, tal como determina o artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal. No caso dos autos, entretanto, não se vislumbra a existência de motivação suficiente a impedir a aplicação da minorante no patamar máximo de 2/3, uma vez que o juiz a quo somente registrou "que a bicicleta foi restituída a vítima", o que, inclusive, pesa em favor do apelante. De outro turno, nada há nos autos que afaste a possibilidade de aplicação da redutora no patamar máximo, na medida em que houve a restituição do bem à vítima pouco tempo após a subtração; o valor da res, embora não possa ser considerado ínfimo, não é de grande monta; as circunstâncias judicias são integralmente favoráveis ao apelante. Por tais razões, cabível a fixação da referida minorante no patamar de 2/3 (dois terços). 9. Se a pena retificada quedou-se em 04 (quatro) meses de reclusão, não pode ser mantida a restritiva de direitos de prestação de serviços à comunidade, pois esta somente é cabível em penas superiores a 06 (seis) meses, conforme dispõe o artigo 46 do CP. Por tal razão, opera-se a alteração da restritiva de direito para a limitação de final de semana (artigo 48 do Código Penal). 10. Recurso parcialmente provido, para reduzir a pena-base para o mínimo legal, reconhecer a atenuante da confissão espontânea, e majorar a fração aplicada pela minorante prevista no § 2° do artigo 155 do CP para o patamar de 2/3, resultando, por consequência, a pena corporal em 04 (quatro) meses de reclusão e 3 (três) dias-multa, no regime inicial aberto. Por consequência, torna-se necessária a alteração da restritiva de direito de prestação de serviços à comunidade para a de limitação de fim de semana, em face da previsão contida no artigo 46 do CP.
Ementa
E M E N T A - APELAÇÃO CRIMINAL DEFENSIVA - FURTO SIMPLES - PRELIMINAR - NULIDADE DA PROVA ORAL COLHIDA EM JUÍZO EM RAZÃO DA PRÉVIA LEITURA DE DEPOIMENTOS PRESTADOS NO INQUÉRITO POLICIAL - INOCORRÊNCIA - AUSÊNCIA DE PREJUÍZO - MÉRITO - PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO - REFUTADO - FARTO CONJUNTO PROBATÓRIO - AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS - PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA - NÃO RECONHECIDO - RES AVALIADA EM R$80,00 (OITENTA REAIS) - VALOR QUE NÃO PODE SER TIDO COMO ÍNFIMO FRENTA À SITUAÇÃO ECONÔMICA DA VÍTIMA - DESCLASSIFICAÇÃO DO DELITO PARA A FORMA TENTADA - INVIABILIDADE - DESNECESSIDADE DE POSSE MANSA E PACÍFICA DA RES - PENA-BASE REDUZIDA AO MÍNIMO LEGAL - CONDUTA SOCIAL MAL SOPESADA - ATENUANTE DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA - RECONHECIDA - REDUÇÃO DA PENA AQUÉM DO MÍNIMO LEGAL - NÃO POSSÍVEL - SÚMULA 231 DO STJ - MINORANTE PREVISTA NO § 2º DO ARTIGO 155 DO CP MAJORADA PARA 2/3 (DOIS TERÇOS) - NECESSIDADE DE ALTERAÇÃO DA PENA RESTRITIVA DE DIREITO - PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À COMUNIDADE CABÍVEL SOMENTE EM PENAS SUPERIORES A 6 MESES - ARTIGO 46 DO CÓDIGO PENAL - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. 1. A confirmação em juízo dos depoimentos prestados na fase inquisitiva não gera nulidade do processo, mormente quando as partes tiveram a oportunidade de formular perguntas às testemunhas, efetivando-se o contraditório. 2. Não há falar em absolvição se o conjunto probatório produzido no curso da persecução penal, formado pela prisão do acusado em posse da res furtiva, por sua confissão na fase administrativa e pelos depoimentos dos policiais militares e da vítima, torna inquestionável a sua autoria no delito de furto noticiado na denúncia. 3. Para a incidência do princípio da insignificância é necessário o preenchimento de certos requisitos, a saber: a) mínima a ofensividade da conduta do agente; b) nenhuma periculosidade social da ação; c) reduzido o grau de reprovabilidade do comportamento; d) e inexpressiva a lesão jurídica provocada. Precedentes do STF. 4. Na hipótese, a conduta perpetrada não pode ser considerada irrelevante para o Direito Penal, pois revela lesividade suficiente para justificar a imposição da respectiva sanção. É que, conforme se infere dos autos, a bicicleta subtraída era usada como meio de transporte pela vítima. Também se depreende que a situação financeira desta não suporta agressões em seu patrimônio, pois é dos autos que a mesma é "do lar". Tais circunstâncias evidenciam que a ação não foi dotada de mínima lesividade, uma vez que, além de sua utilidade para a vítima, a res foi avaliada em R$ 80,00 (oitenta reais), valor que não pode ser considerado de pouca monta, principalmente se considerada a situação econômica da ofendida. Somado a isso, deve-se considerar que o recorrente já responde a outro crime de furto, o que torna temerária a conclusão de ser ele merecedor do benefício. 5. O delito de furto se consuma no momento em que o agente se torna possuidor da res subtraída, pouco importando que a posse seja ou não mansa e pacífica. Assim, caso o agente se torne possuidor, prescindível será que a res saia da esfera de vigilância da vítima, tratando-se o evento de furto consumado. 6. Impõe-se o afastamento da valoração negativa da circunstância judicial referente à conduta social, porquanto esta não recebeu fundamentação adequada na sentença. O fato de ser usuário de drogas não constitui indicativo automático de má conduta social. De igual forma, o simples fato de estar respondendo a outras ações penais não pode ser utilizado para agravar a pena-base, consoante determina a Súmula 444 do STJ. 7. A confissão extrajudicial, mesmo se retratada em juízo, quando for utilizada como fundamento para a prolação da sentença condenatória, deve autorizar o reconhecimento da atenuante prevista no artigo 65, III, d, do Código Penal. Referida circunstância, entretanto, não possui o condão de reduzir a pena aquém do mínimo legal, nos termos da Súmula 231 do STJ. 8. Embora entenda que o quantum de redução a ser aplicado pela redutora prevista no § 2º do artigo 155 do Código Penal se insira no âmbito do poder discricionário do magistrado, há de se convir que sua decisão deve ser fundamentada, tal como determina o artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal. No caso dos autos, entretanto, não se vislumbra a existência de motivação suficiente a impedir a aplicação da minorante no patamar máximo de 2/3, uma vez que o juiz a quo somente registrou "que a bicicleta foi restituída a vítima", o que, inclusive, pesa em favor do apelante. De outro turno, nada há nos autos que afaste a possibilidade de aplicação da redutora no patamar máximo, na medida em que houve a restituição do bem à vítima pouco tempo após a subtração; o valor da res, embora não possa ser considerado ínfimo, não é de grande monta; as circunstâncias judicias são integralmente favoráveis ao apelante. Por tais razões, cabível a fixação da referida minorante no patamar de 2/3 (dois terços). 9. Se a pena retificada quedou-se em 04 (quatro) meses de reclusão, não pode ser mantida a restritiva de direitos de prestação de serviços à comunidade, pois esta somente é cabível em penas superiores a 06 (seis) meses, conforme dispõe o artigo 46 do CP. Por tal razão, opera-se a alteração da restritiva de direito para a limitação de final de semana (artigo 48 do Código Penal). 10. Recurso parcialmente provido, para reduzir a pena-base para o mínimo legal, reconhecer a atenuante da confissão espontânea, e majorar a fração aplicada pela minorante prevista no § 2° do artigo 155 do CP para o patamar de 2/3, resultando, por consequência, a pena corporal em 04 (quatro) meses de reclusão e 3 (três) dias-multa, no regime inicial aberto. Por consequência, torna-se necessária a alteração da restritiva de direito de prestação de serviços à comunidade para a de limitação de fim de semana, em face da previsão contida no artigo 46 do CP.
Data do Julgamento
:
22/09/2014
Data da Publicação
:
23/10/2014
Classe/Assunto
:
Apelação / Furto
Órgão Julgador
:
1ª Câmara Criminal
Relator(a)
:
Des. Francisco Gerardo de Sousa
Comarca
:
Campo Grande
Comarca
:
Campo Grande