TJMS 0010573-02.2014.8.12.0001
APELAÇÃO CRIMINAL – TRÁFICO DE DROGAS - PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA POR CERCEAMENTO DE DEFESA - INDEFERIMENTO DO PEDIDO DE OITIVA DE TESTEMUNHA - DISCRICIONARIEDADE DO JUIZ – PRELIMINAR REJEITADA. MÉRITO: DESCLASSIFICAÇÃO PARA CONDUTA DO ARTIGO 28 DA LEI N.º 11.343/06 – PORTE PARA USO PRÓPRIO – ALEGAÇÃO DEFENSIVA - INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA – ART. 156 DO CPP – PROVAS SEGURAS DA DESTINAÇÃO COMERCIAL – IMPOSSIBILIDADE DE DESCLASSIFICAÇÃO. TRÁFICO PRIVILEGIADO – CAUSA ESPECIAL DE REDUÇÃO DE PENA - § 4º DO ARTIGO 33 DA LEI Nº 11.343/06 – ANTECEDENTES - SÚMULA 444 DO STJ - CONSIDERAÇÃO TANTO NA PRIMEIRA QUANTO NA TERCEIRA FASE DA DOSIMETRIA - PRESENÇA DOS REQUISITOS LEGAIS – DIREITO SUBJETIVO DO AGENTE – CONCESSÃO. PENA-BASE – PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA MOTIVAÇÃO NA INDIVIDUALIZAÇÃO - ARTS. 5.º, XLVI E 93, IX, AMBOS DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL – ANTECEDENTES, CONDUTA SOCIAL, PERSONALIDADE, MOTIVO E CONSEQUÊNCIAS – VALORAÇÃO EQUIVOCADA - DECOTE - CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME – QUANTIDADE DA DROGA (672 GRAMAS DE MACONHA) – MODULADORA PREPONDERANTE DESFAVORÁVEL - REDUÇÃO DA PENA- BASE. REGIME INICIAL - OBSERVÂNCIA DOS CRITÉRIOS DO ARTIGO 59 DO CP E 42 DA LEI 11.343/2006 – ARTIGO 33, § 2.º, 'B' DO CÓDIGO PENAL. ALTERAÇÃO DO REGIME INICIAL PARA O SEMIABERTO - SUBSTITUIÇÃO DE PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVA DE DIREITO – IMPOSSIBILIDADE - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
I – Não merece reparo a decisão que indefere, motivadamente, oitiva de testemunha que não trará esclarecimento do fato pelo qual foi o réu denunciado (tráfico de drogas), por ser possível ao juiz, dentro do sistema do livre convencimento motivado, indeferir a realização das provas que entender impertinentes (art. 184 do CPP).
II – O cerceamento de defesa capaz de anular a sentença ocorre quando se vislumbra ofensa aos princípios do contraditório e da ampla defesa. Desde que oportunizada a abordagem adequada de todos os aspectos essenciais do processo, impossível falar-se em nulidade.
III – O fato de o agente ser usuário não significa que a substância entorpecente apreendida destinava-se exclusivamente ao uso próprio, posto ser bastante comum a figura do "usuário-traficante". Por tratar-se de alegação do interesse da defesa, inverte-se o ônus da prova, nos termos do artigo 156 do CPP. Impossível a desclassificação para o crime de porte para uso pessoal, tipificado no artigo 28 da Lei n.º 11.343/06, quando as provas demonstram que a substância apreendida, pelo menos em parte, destinava-se ao comércio.
IV – De acordo com o princípio constitucional da presunção de inocência (art. 5º, LVII, da Carta Magna), registro de inquéritos policiais e ações penais em andamento não podem ser considerados para negativar os antecedentes penais (Súmula 444 do STJ). A moduladora dos antecedentes refere-se a envolvimentos anteriores do agente com fatos classificados como criminosos, e são os mesmos para a primeira e a terceira fase da dosimetria, não havendo razão para qualquer distinção pelo simples fato de a Súmula 444 referir-se expressamente apenas à primeira fase. Presentes todos os requisitos exigidos pelo § 4º do artigo 33 da Lei nº 11.343/06, o reconhecimento do tráfico privilegiado é direito subjetivo do agente.
V - O princípio Constitucional da motivação na individualização da pena, previsto nos artigos 5.º, XLVI e 93, IX, ambos da Constituição Federal, exige que cada uma das circunstâncias judiciais seja analisada à luz de elementos concretos, extraídos da prova dos autos, ainda não valorados e que não integrem o tipo penal, evitando-se assim a vedada duplicidade.
VI - Os motivos do crime são as razões de ordem subjetiva que levaram à pratica do delito. Somente aqueles que extrapolem o previsto no próprio tipo penal, e que não caracterizem circunstâncias atenuantes ou agravantes, é que devem ser considerados. O objetivo de auferir lucro constitui circunstância própria do tipo penal do narcotráfico, cuja norma visa, em última análise, impedir o enriquecimento ilícito por meio da conduta incriminada, de maneira que tal fato não pode ser empregado para valorizar negativamente tal moduladora e, consequentemente, agravar a pena-base.
VII – A moduladora das consequências do crime refere-se aos efeitos que o delito provocou na vítima, e podem ser de natureza material ou moral, que não integrem o tipo penal. No caso do delito de tráfico, são os efeitos deletérios causados à saúde pública, que já integram o tipo penal, de maneira que a mesma deve ser considerada neutra.
VIII – Para eleger o regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade deve-se harmonizar o disposto pelo artigo 33, §§ 2.º e 3.º, do Código Penal com o artigo 59, do mesmo Código. Alteração do regime inicial para o semiaberto.
IX - Para possibilitar a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direito exige-se presença cumulativa de todos os requisitos do artigo 44 do Código Penal. Incabível no caso.
X – Recurso parcialmente provido.
Ementa
APELAÇÃO CRIMINAL – TRÁFICO DE DROGAS - PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA POR CERCEAMENTO DE DEFESA - INDEFERIMENTO DO PEDIDO DE OITIVA DE TESTEMUNHA - DISCRICIONARIEDADE DO JUIZ – PRELIMINAR REJEITADA. MÉRITO: DESCLASSIFICAÇÃO PARA CONDUTA DO ARTIGO 28 DA LEI N.º 11.343/06 – PORTE PARA USO PRÓPRIO – ALEGAÇÃO DEFENSIVA - INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA – ART. 156 DO CPP – PROVAS SEGURAS DA DESTINAÇÃO COMERCIAL – IMPOSSIBILIDADE DE DESCLASSIFICAÇÃO. TRÁFICO PRIVILEGIADO – CAUSA ESPECIAL DE REDUÇÃO DE PENA - § 4º DO ARTIGO 33 DA LEI Nº 11.343/06 – ANTECEDENTES - SÚMULA 444 DO STJ - CONSIDERAÇÃO TANTO NA PRIMEIRA QUANTO NA TERCEIRA FASE DA DOSIMETRIA - PRESENÇA DOS REQUISITOS LEGAIS – DIREITO SUBJETIVO DO AGENTE – CONCESSÃO. PENA-BASE – PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA MOTIVAÇÃO NA INDIVIDUALIZAÇÃO - ARTS. 5.º, XLVI E 93, IX, AMBOS DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL – ANTECEDENTES, CONDUTA SOCIAL, PERSONALIDADE, MOTIVO E CONSEQUÊNCIAS – VALORAÇÃO EQUIVOCADA - DECOTE - CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME – QUANTIDADE DA DROGA (672 GRAMAS DE MACONHA) – MODULADORA PREPONDERANTE DESFAVORÁVEL - REDUÇÃO DA PENA- BASE. REGIME INICIAL - OBSERVÂNCIA DOS CRITÉRIOS DO ARTIGO 59 DO CP E 42 DA LEI 11.343/2006 – ARTIGO 33, § 2.º, 'B' DO CÓDIGO PENAL. ALTERAÇÃO DO REGIME INICIAL PARA O SEMIABERTO - SUBSTITUIÇÃO DE PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVA DE DIREITO – IMPOSSIBILIDADE - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
I – Não merece reparo a decisão que indefere, motivadamente, oitiva de testemunha que não trará esclarecimento do fato pelo qual foi o réu denunciado (tráfico de drogas), por ser possível ao juiz, dentro do sistema do livre convencimento motivado, indeferir a realização das provas que entender impertinentes (art. 184 do CPP).
II – O cerceamento de defesa capaz de anular a sentença ocorre quando se vislumbra ofensa aos princípios do contraditório e da ampla defesa. Desde que oportunizada a abordagem adequada de todos os aspectos essenciais do processo, impossível falar-se em nulidade.
III – O fato de o agente ser usuário não significa que a substância entorpecente apreendida destinava-se exclusivamente ao uso próprio, posto ser bastante comum a figura do "usuário-traficante". Por tratar-se de alegação do interesse da defesa, inverte-se o ônus da prova, nos termos do artigo 156 do CPP. Impossível a desclassificação para o crime de porte para uso pessoal, tipificado no artigo 28 da Lei n.º 11.343/06, quando as provas demonstram que a substância apreendida, pelo menos em parte, destinava-se ao comércio.
IV – De acordo com o princípio constitucional da presunção de inocência (art. 5º, LVII, da Carta Magna), registro de inquéritos policiais e ações penais em andamento não podem ser considerados para negativar os antecedentes penais (Súmula 444 do STJ). A moduladora dos antecedentes refere-se a envolvimentos anteriores do agente com fatos classificados como criminosos, e são os mesmos para a primeira e a terceira fase da dosimetria, não havendo razão para qualquer distinção pelo simples fato de a Súmula 444 referir-se expressamente apenas à primeira fase. Presentes todos os requisitos exigidos pelo § 4º do artigo 33 da Lei nº 11.343/06, o reconhecimento do tráfico privilegiado é direito subjetivo do agente.
V - O princípio Constitucional da motivação na individualização da pena, previsto nos artigos 5.º, XLVI e 93, IX, ambos da Constituição Federal, exige que cada uma das circunstâncias judiciais seja analisada à luz de elementos concretos, extraídos da prova dos autos, ainda não valorados e que não integrem o tipo penal, evitando-se assim a vedada duplicidade.
VI - Os motivos do crime são as razões de ordem subjetiva que levaram à pratica do delito. Somente aqueles que extrapolem o previsto no próprio tipo penal, e que não caracterizem circunstâncias atenuantes ou agravantes, é que devem ser considerados. O objetivo de auferir lucro constitui circunstância própria do tipo penal do narcotráfico, cuja norma visa, em última análise, impedir o enriquecimento ilícito por meio da conduta incriminada, de maneira que tal fato não pode ser empregado para valorizar negativamente tal moduladora e, consequentemente, agravar a pena-base.
VII – A moduladora das consequências do crime refere-se aos efeitos que o delito provocou na vítima, e podem ser de natureza material ou moral, que não integrem o tipo penal. No caso do delito de tráfico, são os efeitos deletérios causados à saúde pública, que já integram o tipo penal, de maneira que a mesma deve ser considerada neutra.
VIII – Para eleger o regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade deve-se harmonizar o disposto pelo artigo 33, §§ 2.º e 3.º, do Código Penal com o artigo 59, do mesmo Código. Alteração do regime inicial para o semiaberto.
IX - Para possibilitar a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direito exige-se presença cumulativa de todos os requisitos do artigo 44 do Código Penal. Incabível no caso.
X – Recurso parcialmente provido.
Data do Julgamento
:
27/08/2015
Data da Publicação
:
23/09/2015
Classe/Assunto
:
Apelação / Tráfico de Drogas e Condutas Afins
Órgão Julgador
:
3ª Câmara Criminal
Relator(a)
:
Des. Dorival Moreira dos Santos
Comarca
:
Campo Grande
Comarca
:
Campo Grande
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