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Jurisprudência


TJMS 0059070-86.2010.8.12.0001

Ementa
APELAÇÃO CRIMINAL - VIAS DE FATO NO ÂMBITO DOMÉSTICO - PRELIMINARES DE NULIDADE AFASTADAS - COMPROVAÇÃO DA AUTORIA - CONDENAÇÃO MANTIDA - LEGÍTIMA DEFESA - NÃO CONFIGURADA - APLICABILIDADE DA AGRAVANTE PREVISTA NO ART. 61, II, 'F', DO CP - CABÍVEL - BAGATELA IMPRÓPRIA - NÃO APLICÁVEL - SUBSTITUIÇÃO DA PENA POR RESTRITIVA DE DIREITOS - NÃO PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS - NÃO PROVIDO. Afasto a preliminar de nulidade do processo por falta de fundamentação na decisão de recebimento da denúncia. Não há qualquer prejuízo apontado pelo réu, logo, não há que se falar em nulidade, nos termos do art. 563 do CPP. O entendimento jurisprudencial é pacífico no sentido de que não há que confundir fundamentação suscinta com total ausência dessa. É a situação que se verifica no presente caso. Embora de forma suscinta, o magistrado expôs os motivos pelos quais recebia a denúncia, não havendo nulidade a ser declarada. Não há falar em nulidade da decisão que designou a audiência de instrução e julgamento, pois o magistrado fundamentadamente suspendeu a realização da audiência do art. 16 da Lei Maria da Penha, em consonância com o entendimento do TJMS e recebeu a denúncia por estarem preenchidos os requisitos do art. 41 do CPP, restando apreciadas todas as matérias suscitadas na defesa preliminar. Afasta-se, também, a preliminar de nulidade ao argumento de inexistência de realização da audiência prevista no art. 16 da Lei Maria da Penha, pois não é imprescindível, sendo o caso de realização somente quando a vítima manifesta voluntária e espontaneamente o interesse em se retratar antes do recebimento da denúncia. Referida audiência não é exigida para ratificação da representação já efetuada. No que se refere ao crime de lesão corporal, não é obrigatória a realização da audiência do artigo 16 da Lei Maria, uma vez que por ocasião do julgamento da ADIN n. 4.424, o e. Supremo Tribunal Federal entendeu que o delito de lesão corporal praticado no âmbito doméstico é crime de ação penal pública incondicionada. Não há prejuízo ao sentenciado, inexistindo nulidade a ser declarada, como prevê o art. 563 do CPP. A Lei Maria da Penha vedou expressamente a possibilidade de incidência da Lei dos Juizados Especiais Criminais. Maior rigor nos delitos relacionados à violência familiar e doméstica contra a mulher. Os fatos narrados na denúncia, bem como os documentos do inquérito policial que a embasaram, trazem todos os requisitos do art. 41 do CPP. Assim, comprovados os indícios de autoria e materialidade, bem como diante da inexistência de causa excludente de punibilidade não há falar em ausência de justa causa. Ademais, diante da superveniência de sentença penal condenatória, a alegação de ausência de justa causa para amparar a acusação e recebimento da denúncia resta prejudicada. A convenção americana dos direitos humanos (Pacto de San Jose da Costa Rica) e a Declaração Interamericana sobre a Eliminação da Violência contra a Mulher não obstam o amplo exercício do princípio constitucional da garantia do duplo grau de jurisdição. É certo que os relatos harmônicos e firmes prestados pela vítima, os quais possuem grande relevância nos casos de violência doméstica, são suficientes para manter o édito condenatório, especialmente se considerado que a versão apresentada pela ofendida é corroborada por outro testemunho, inexistindo, portanto, insuficiência do conjunto probatório. A tese do apelante de que agiu em legítima defesa putativa, não restou caracterizada. A narrativa do acontecimento isolada de qualquer prova não revela que o acusado tenha agido para se defender de uma agressão injusta, não configura necessidade, moderação e, tampouco, proporcionalidade dos meios utilizados. Quando se tratar de contravenção pena de vias de fato, esta não prevê qualquer qualificação para seu cometimento no âmbito doméstico ou familiar, devendo ser aplicada a agravante prevista no artigo 61, inciso II, alínea 'f', do CP. Inaplicável o princípio da insignificância ou de bagatela imprópria em razão da elevada ofensividade da conduta praticada pelo apelante, pois como relatou a ofendida, o réu desferiu-lhe um chute nas costas e as agressões eram constantes. Embora admita a aplicação do princípio bagatelar impróprio nas situações de violência doméstica, tal se dá quando a vítima volte conviver em harmonia com o acusado e quando manifesta o interesse em não vê-lo condenado, o que não aconteceu no caso em análise. É possível a substituição da pena em caso de violência doméstica de natureza leve ou vias de fato, pois não há vedação à substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, mas apenas na aplicação de penas pecuniárias, com o intuito de não banalizar a punição dos que cometem violência nos termos da Lei Maria da Penha, conforme dispõe o artigo 17 da Lei n. 11.340/06. Na hipótese, o agente por ser reincidente, não preenche os requisitos do art. 44 do CP. Com o parecer, rejeito as preliminares arguidas e, no mérito, nego provimento ao recurso.

Data do Julgamento : 02/06/2014
Data da Publicação : 10/06/2014
Classe/Assunto : Apelação / Violência Doméstica Contra a Mulher
Órgão Julgador : 1ª Câmara Criminal
Relator(a) : Des. Dorival Moreira dos Santos
Comarca : Campo Grande
Comarca : Campo Grande
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