TJMS 0900047-80.2017.8.12.0021
E M E N T A – APELAÇÃO CRIMINAL – CRIMES DE DESACATO – COAÇÃO NO CURSO DO PROCESSO E DENUNCIAÇÃO CALUNIOSA – ABSOLVIÇÃO APENAS QUANTO AO ÚLTIMO DELITO – PRELIMINAR DE NULIDADE AFASTADA - INIMPUTABILIDADE NÃO CONFIGURADA – PENAS-BASES PRESERVADAS - IMPOSSIBLIDADE DE SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVAS DE DIREITOS – CRIMES COMETIDOS COM GRAVE AMEAÇA – REGIME INICIAL ALTERADO – CONCESSÃO DO BENEFÍCIO DA JUSTIÇA GRATUITA – DIREITO DE RECORRER EM LIBERDADE – NÃO VERIFICADO – CONVERSÃO DA PRISÃO PREVENTIVA EM PRISÃO DOMICILIAR – SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA – PARCIALMENTE PROVIDO.
I - Não restou configurado o alegado cerceamento de defesa, pois a alegada deficiência mental do réu foi analisada nos autos de incidente de insanidade mental e não restou configurada, havendo conclusão médica pelo tratamento ambulatorial e desnecessidade de internação, cuja assistência médico-psicológica é disponível na unidade prisional em que se encontra recolhido. Preliminar afastada.
II - Acerca dos crimes de desacato e coação no curso do processo, não há como ser afastada a condenação, como analisou detidamente o juízo a quo na bem lançada sentença. O reconhecimento da inimputabilidade ou semi-imputabilidade, nos termos do art. 26 do Código Penal, exige que o agente, quando da prática da infração, não seja inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. A descrição contida no laudo pericial, demonstra que ele era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito de sua conduta, concluindo por ser portador de transtornos de personalidade instável e quadro depressivo recorrente, recomendando atendimento ambulatorial. Desta feita, não ficou comprovada a incapacidade parcial ou plena de entendimento do réu, o que levaria à inimputabilidade ou semi-imputabilidade, devendo ser mantida a condenação pelos crimes de desacato e coação no curso do processo.
III - Noutro vértice, o delito de denunciação caluniosa não está configurado. A imputação feita pelo réu à vítima consistiu em recusa de atendimento, logo, não imputou ato ilícito criminal (fato definido como crime), que seria a omissão de socorro, faltando um dos elementos normativos a configurar o delito de denunciação caluniosa. Tal é a conclusão que se extrai do acervo probatório uma vez que não sendo caso de urgência ou emergência, a profissional da área da saúde não estaria obrigada ao pronto atendimento, porquanto inexistiria dolo de perigo – elemento subjetivo necessário para suposta adequação típica do crime de omissão de socorro, embora pudesse, em tese, configurar falta funcional prevista no código de ética médica apenas. Assim, não havendo subsunção do fato imputado a conduta definida como crime, não está caracterizada a prática de denunciação caluniosa. Além disso, especificamente na hipótese, à evidência não se pode deixar de considerar a situação psico-emocional do réu, que apesar de plenamente capaz, possui transtornos de personalidade instável, de forma que a real apuração acerca do dolo resta comprometida, vez que, crê sinceramente ter sido preterido em seu direito de atendimento médico, mormente quando há receituário médico que identifica episódio de esquizofrenia, "apresenta sintomas recorrentes de impulsividade, irritabilidade excessiva, crises de fúria (explosões de humor), ansiedade intensa, insônia, sintomas físicos ansiosos, pensamentos e idéias obssessivas, sintomas depressivos recorrentes com pensamentos suicídas" – documentos acostados aos autos. Absolvição com fundamento no art. 386, III, do Código de Processo Penal, absolvo o réu quanto ao crime de denunciação caluniosa.
IV - A única circunstância judicial considerada negativa consiste nos maus antecedentes e neste ponto deve ser preservada a sentença. Tal vetor serve para exasperar a reprimenda, pois revela desvalor apto a justificar a elevação da pena-base. De forma que, observando a discricionariedade vinculada do julgador, não se identifica "os erros de apreciação, as falhas de raciocínio ou de lógica ou os demais vícios de julgamento" (Nucci, Código Penal Comentado. São Paulo: RT, 2010).
V - Expurgado o delito de denunciação caluniosa, é de ser alterado o regime prisional para os delitos de coação no curso do processo, devendo ser fixado o regime inicial semiaberto, com fundamento no art. 33, parágrafo segundo, alínea "b", do Código Penal e incidência da Súmula 269 do STJ, considerando que a única circunstância judicial favorável se referem aos antecedentes criminais.
VI - Os delitos foram praticados com ameaça à pessoa, é incabível a substituição por penas alternativos, como dispõe o art. 44 do Código Penal.
VII - É cabível a suspensão da exigibilidade enquanto perdurar o estado de pobreza, podendo assim permanecer pelo prazo de 05 anos, nos termos do art. 98 a 102 do Novo Código de Processo Civil – Lei n. 13.105/2015, considerando que a Lei nº 1060/50 não condicionou o benefício da assistência judiciária ao necessário patrocínio da causa pela Defensoria Pública e a exigência é de que o magistrado faça averiguação superficial sobre as condições financeiras da parte requerente.
VIII - Acerca do pedido de recorrer em liberdade, é rechaçado por ter respondido preso ao processo, todavia deve ser adequado ao novel regime estipulado. Quanto à conversão da prisão em domiciliar, deve ser formulado e apreciado pelo juiz da execução penal, sob pena de supressão de instância.
Em parte com o parecer, dou parcial provimento ao recurso, tão somente para o fim de absolver o réu do crime de denunciação caluniosa, por conseguinte, alterando o regime prisional inicial para os delitos de coação no curso do processo para o semiaberto e conceder a isenção das custas processuais (restam as penas definitivas em 09 meses e 10 dias de detenção pelo crime de desacato e de 03 anos, 01 mês e 10 dias de reclusão para os delitos de coação no curso do processo).
Ementa
E M E N T A – APELAÇÃO CRIMINAL – CRIMES DE DESACATO – COAÇÃO NO CURSO DO PROCESSO E DENUNCIAÇÃO CALUNIOSA – ABSOLVIÇÃO APENAS QUANTO AO ÚLTIMO DELITO – PRELIMINAR DE NULIDADE AFASTADA - INIMPUTABILIDADE NÃO CONFIGURADA – PENAS-BASES PRESERVADAS - IMPOSSIBLIDADE DE SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVAS DE DIREITOS – CRIMES COMETIDOS COM GRAVE AMEAÇA – REGIME INICIAL ALTERADO – CONCESSÃO DO BENEFÍCIO DA JUSTIÇA GRATUITA – DIREITO DE RECORRER EM LIBERDADE – NÃO VERIFICADO – CONVERSÃO DA PRISÃO PREVENTIVA EM PRISÃO DOMICILIAR – SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA – PARCIALMENTE PROVIDO.
I - Não restou configurado o alegado cerceamento de defesa, pois a alegada deficiência mental do réu foi analisada nos autos de incidente de insanidade mental e não restou configurada, havendo conclusão médica pelo tratamento ambulatorial e desnecessidade de internação, cuja assistência médico-psicológica é disponível na unidade prisional em que se encontra recolhido. Preliminar afastada.
II - Acerca dos crimes de desacato e coação no curso do processo, não há como ser afastada a condenação, como analisou detidamente o juízo a quo na bem lançada sentença. O reconhecimento da inimputabilidade ou semi-imputabilidade, nos termos do art. 26 do Código Penal, exige que o agente, quando da prática da infração, não seja inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. A descrição contida no laudo pericial, demonstra que ele era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito de sua conduta, concluindo por ser portador de transtornos de personalidade instável e quadro depressivo recorrente, recomendando atendimento ambulatorial. Desta feita, não ficou comprovada a incapacidade parcial ou plena de entendimento do réu, o que levaria à inimputabilidade ou semi-imputabilidade, devendo ser mantida a condenação pelos crimes de desacato e coação no curso do processo.
III - Noutro vértice, o delito de denunciação caluniosa não está configurado. A imputação feita pelo réu à vítima consistiu em recusa de atendimento, logo, não imputou ato ilícito criminal (fato definido como crime), que seria a omissão de socorro, faltando um dos elementos normativos a configurar o delito de denunciação caluniosa. Tal é a conclusão que se extrai do acervo probatório uma vez que não sendo caso de urgência ou emergência, a profissional da área da saúde não estaria obrigada ao pronto atendimento, porquanto inexistiria dolo de perigo – elemento subjetivo necessário para suposta adequação típica do crime de omissão de socorro, embora pudesse, em tese, configurar falta funcional prevista no código de ética médica apenas. Assim, não havendo subsunção do fato imputado a conduta definida como crime, não está caracterizada a prática de denunciação caluniosa. Além disso, especificamente na hipótese, à evidência não se pode deixar de considerar a situação psico-emocional do réu, que apesar de plenamente capaz, possui transtornos de personalidade instável, de forma que a real apuração acerca do dolo resta comprometida, vez que, crê sinceramente ter sido preterido em seu direito de atendimento médico, mormente quando há receituário médico que identifica episódio de esquizofrenia, "apresenta sintomas recorrentes de impulsividade, irritabilidade excessiva, crises de fúria (explosões de humor), ansiedade intensa, insônia, sintomas físicos ansiosos, pensamentos e idéias obssessivas, sintomas depressivos recorrentes com pensamentos suicídas" – documentos acostados aos autos. Absolvição com fundamento no art. 386, III, do Código de Processo Penal, absolvo o réu quanto ao crime de denunciação caluniosa.
IV - A única circunstância judicial considerada negativa consiste nos maus antecedentes e neste ponto deve ser preservada a sentença. Tal vetor serve para exasperar a reprimenda, pois revela desvalor apto a justificar a elevação da pena-base. De forma que, observando a discricionariedade vinculada do julgador, não se identifica "os erros de apreciação, as falhas de raciocínio ou de lógica ou os demais vícios de julgamento" (Nucci, Código Penal Comentado. São Paulo: RT, 2010).
V - Expurgado o delito de denunciação caluniosa, é de ser alterado o regime prisional para os delitos de coação no curso do processo, devendo ser fixado o regime inicial semiaberto, com fundamento no art. 33, parágrafo segundo, alínea "b", do Código Penal e incidência da Súmula 269 do STJ, considerando que a única circunstância judicial favorável se referem aos antecedentes criminais.
VI - Os delitos foram praticados com ameaça à pessoa, é incabível a substituição por penas alternativos, como dispõe o art. 44 do Código Penal.
VII - É cabível a suspensão da exigibilidade enquanto perdurar o estado de pobreza, podendo assim permanecer pelo prazo de 05 anos, nos termos do art. 98 a 102 do Novo Código de Processo Civil – Lei n. 13.105/2015, considerando que a Lei nº 1060/50 não condicionou o benefício da assistência judiciária ao necessário patrocínio da causa pela Defensoria Pública e a exigência é de que o magistrado faça averiguação superficial sobre as condições financeiras da parte requerente.
VIII - Acerca do pedido de recorrer em liberdade, é rechaçado por ter respondido preso ao processo, todavia deve ser adequado ao novel regime estipulado. Quanto à conversão da prisão em domiciliar, deve ser formulado e apreciado pelo juiz da execução penal, sob pena de supressão de instância.
Em parte com o parecer, dou parcial provimento ao recurso, tão somente para o fim de absolver o réu do crime de denunciação caluniosa, por conseguinte, alterando o regime prisional inicial para os delitos de coação no curso do processo para o semiaberto e conceder a isenção das custas processuais (restam as penas definitivas em 09 meses e 10 dias de detenção pelo crime de desacato e de 03 anos, 01 mês e 10 dias de reclusão para os delitos de coação no curso do processo).
Data do Julgamento
:
27/07/2018
Data da Publicação
:
30/07/2018
Classe/Assunto
:
Apelação / Desacato
Órgão Julgador
:
3ª Câmara Criminal
Relator(a)
:
Des. Dorival Moreira dos Santos
Comarca
:
Três Lagoas
Comarca
:
Três Lagoas
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