TJMS 4003971-61.2013.8.12.0000
APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - TRANSPORTE DE MENOR PARA A ESCOLA - PRELIMINARES DE DEFICIÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO - VIOLAÇÃO AO ARTIGO 2º DA LEI 8.437/92 DIANTE DA CONCESSÃO DA MEDIDA LIMINAR SEM OITIVA DO ENTE PÚBLICO - IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DE LIMINAR SATISFATIVA - JULGAMENTO EXTRA PETITA - AFASTADAS - MÉRITO - DIREITO DA CRIANÇA À EDUCAÇÃO - DIREITO SOCIAL DE SEGUNDA DIMENSÃO PROTEGIDO CONSTITUCIONALMENTE - RESERVA DO POSSÍVEL MITIGADA EM FAVOR DO MÍNIMO EXISTENCIAL - OBRIGAÇÃO DO PODER PÚBLICO EM COMPATIBILIDADE COM O ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO - NORMA PROGRAMÁTICA QUE EXIGE CONCRETUDE - AUSÊNCIA DE INTROMISSÃO DO JUDICIÁRIO NA ESFERA ADMINISTRATIVA - MANTIDA A GARANTIA CONSTITUCIONAL DE SEPARAÇÃO DOS PODERES - TRANSPORTE PÚBLICO INCLUÍDO NO DIREITO DO MENOR À EDUCAÇÃO - PROIBIÇÃO DO RETROCESSO - DECISÃO DE PRIMEIRO GRAU MANTIDA - RECURSO IMPROVIDO COM O PARECER. O Supremo Tribunal Federal reconheceu repercussão geral sobre o tema da violação ao artigo 93, IX da Constituição Federal necessidade de fundamentação e adotou o julgamento nos termos do artigo 543-B do Código de Processo Civil, ou seja, sua observância é obrigatória. Nesse julgado, fez referência a elementar diferença entre a ausência de fundamentação e fundamentação sucinta. No caso dos autos observa-se que o condutor do processo fundamentou a decisão, mesmo que de forma resumida, a afastar a alegação de nulidade. A ressalva insculpida no artigo 2º da Lei n. 8.437/1992 de que a liminar será concedida, quando cabível, após a audiência do representante judicial da pessoa jurídica de direito público, que deverá se pronunciar no prazo de setenta e duas horas, restrita aos casos de mandado de segurança coletivo e da ação civil pública, admite temperamentos segundo a orientação do Superior Tribunal de Justiça (STJ, MC 12.983/RS, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 18/12/2007, DJ 28/02/2008; STJ, REsp 1018614/PR, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 17/06/2008, DJe 06/08/2008). As medidas liminares são conferidas à base de cognição sumária e de juízo de verossimilhança, por isso, não representam um pronunciamento definitivo do judiciário, ou seja, se sujeitam, a qualquer tempo, a confirmação ou revogação. As medidas eminentemente satisfativas são aquelas que impossibilitam o retorno do status quo ante, de maneira que não é possível garantir a reversibilidade. Nos casos em que a tutela se revela imprescindível para resguardar o direito do reclamante e encontram-se presentes os requisitos, é de rigor o seu deferimento, em caráter excepcional, para compatibilizar o mencionado direito com a demora da prestação jurisdicional. O julgador não decidiu além do que foi pedido, mas sim estendeu os efeitos da decisão para que o Estado cumpra com o dever de fornecer educação básica a crianças carentes. Seria desarrazoado que o transporte público fosse direcionado a uma só criança quando poderia ser disponibilizado para os demais menores. O direito à educação que encontra guarida constitucional no artigo 205 é estendido a todos, principalmente, às crianças (artigos 208, IV e 227 da Constituição Federal) e enquadra-se como um dos direitos sociais de maior expressão oriundos da segunda geração/dimensão de direitos humanos o que impõe ao Poder Público a satisfação de um dever de prestação positiva, criando condições objetivas que assegurem aos titulares pleno acesso ao sistema educacional. Esse direito tem redação recente no Texto Constitucional assim como os títulos sobre a ordem econômica e social o que revela uma tendência favorável ao Estado-social, ou seja, com a finalidade voltada à justiça social e cultural dentro da democracia pluralista conquistada pela sociedade. O valor significativo do direito à educação, em especial, a infantil, torna incumbência do Poder Público torná-lo realidade por meio de medidas concretas de atendimento escolar e proporcionando, inclusive os meios necessários para sua efetivação, como por exemplo, com o fornecimento de transporte escolar, sob pena de frustrar um compromisso constitucional inafastável. O legislador constituinte previu um programa a ser implementado na educação mediante políticas públicas, cujo titular precípuo é o infante carente em injusta situação de exclusão social e desigual acesso a oportunidades de estudo. O descumprimento dessa meta traduz uma inconstitucionalidade por omissão do Poder Público, ou seja, a alegada "reserva do possível" encontra limitação no "mínimo existencial" a tornar desarrazoada a inércia governamental. É fato que no âmbito do judiciário não se encontra a competência para formular políticas públicas como venho decidindo em processos cujo tema adentra na separação dos poderes (artigo 2º da Constituição Federal) porque este ônus pertence aos poderes legislativo e executivo, representantes do povo, escolhidos por voto. Excepcionalmente, o Poder Judiciário poderá incumbir-se desse encargo quando houver nítida violação à eficácia e integridade dos direitos coletivos e mesmo individuais como acontece no caso sub judice.
Ementa
APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - TRANSPORTE DE MENOR PARA A ESCOLA - PRELIMINARES DE DEFICIÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO - VIOLAÇÃO AO ARTIGO 2º DA LEI 8.437/92 DIANTE DA CONCESSÃO DA MEDIDA LIMINAR SEM OITIVA DO ENTE PÚBLICO - IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DE LIMINAR SATISFATIVA - JULGAMENTO EXTRA PETITA - AFASTADAS - MÉRITO - DIREITO DA CRIANÇA À EDUCAÇÃO - DIREITO SOCIAL DE SEGUNDA DIMENSÃO PROTEGIDO CONSTITUCIONALMENTE - RESERVA DO POSSÍVEL MITIGADA EM FAVOR DO MÍNIMO EXISTENCIAL - OBRIGAÇÃO DO PODER PÚBLICO EM COMPATIBILIDADE COM O ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO - NORMA PROGRAMÁTICA QUE EXIGE CONCRETUDE - AUSÊNCIA DE INTROMISSÃO DO JUDICIÁRIO NA ESFERA ADMINISTRATIVA - MANTIDA A GARANTIA CONSTITUCIONAL DE SEPARAÇÃO DOS PODERES - TRANSPORTE PÚBLICO INCLUÍDO NO DIREITO DO MENOR À EDUCAÇÃO - PROIBIÇÃO DO RETROCESSO - DECISÃO DE PRIMEIRO GRAU MANTIDA - RECURSO IMPROVIDO COM O PARECER. O Supremo Tribunal Federal reconheceu repercussão geral sobre o tema da violação ao artigo 93, IX da Constituição Federal necessidade de fundamentação e adotou o julgamento nos termos do artigo 543-B do Código de Processo Civil, ou seja, sua observância é obrigatória. Nesse julgado, fez referência a elementar diferença entre a ausência de fundamentação e fundamentação sucinta. No caso dos autos observa-se que o condutor do processo fundamentou a decisão, mesmo que de forma resumida, a afastar a alegação de nulidade. A ressalva insculpida no artigo 2º da Lei n. 8.437/1992 de que a liminar será concedida, quando cabível, após a audiência do representante judicial da pessoa jurídica de direito público, que deverá se pronunciar no prazo de setenta e duas horas, restrita aos casos de mandado de segurança coletivo e da ação civil pública, admite temperamentos segundo a orientação do Superior Tribunal de Justiça (STJ, MC 12.983/RS, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 18/12/2007, DJ 28/02/2008; STJ, REsp 1018614/PR, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 17/06/2008, DJe 06/08/2008). As medidas liminares são conferidas à base de cognição sumária e de juízo de verossimilhança, por isso, não representam um pronunciamento definitivo do judiciário, ou seja, se sujeitam, a qualquer tempo, a confirmação ou revogação. As medidas eminentemente satisfativas são aquelas que impossibilitam o retorno do status quo ante, de maneira que não é possível garantir a reversibilidade. Nos casos em que a tutela se revela imprescindível para resguardar o direito do reclamante e encontram-se presentes os requisitos, é de rigor o seu deferimento, em caráter excepcional, para compatibilizar o mencionado direito com a demora da prestação jurisdicional. O julgador não decidiu além do que foi pedido, mas sim estendeu os efeitos da decisão para que o Estado cumpra com o dever de fornecer educação básica a crianças carentes. Seria desarrazoado que o transporte público fosse direcionado a uma só criança quando poderia ser disponibilizado para os demais menores. O direito à educação que encontra guarida constitucional no artigo 205 é estendido a todos, principalmente, às crianças (artigos 208, IV e 227 da Constituição Federal) e enquadra-se como um dos direitos sociais de maior expressão oriundos da segunda geração/dimensão de direitos humanos o que impõe ao Poder Público a satisfação de um dever de prestação positiva, criando condições objetivas que assegurem aos titulares pleno acesso ao sistema educacional. Esse direito tem redação recente no Texto Constitucional assim como os títulos sobre a ordem econômica e social o que revela uma tendência favorável ao Estado-social, ou seja, com a finalidade voltada à justiça social e cultural dentro da democracia pluralista conquistada pela sociedade. O valor significativo do direito à educação, em especial, a infantil, torna incumbência do Poder Público torná-lo realidade por meio de medidas concretas de atendimento escolar e proporcionando, inclusive os meios necessários para sua efetivação, como por exemplo, com o fornecimento de transporte escolar, sob pena de frustrar um compromisso constitucional inafastável. O legislador constituinte previu um programa a ser implementado na educação mediante políticas públicas, cujo titular precípuo é o infante carente em injusta situação de exclusão social e desigual acesso a oportunidades de estudo. O descumprimento dessa meta traduz uma inconstitucionalidade por omissão do Poder Público, ou seja, a alegada "reserva do possível" encontra limitação no "mínimo existencial" a tornar desarrazoada a inércia governamental. É fato que no âmbito do judiciário não se encontra a competência para formular políticas públicas como venho decidindo em processos cujo tema adentra na separação dos poderes (artigo 2º da Constituição Federal) porque este ônus pertence aos poderes legislativo e executivo, representantes do povo, escolhidos por voto. Excepcionalmente, o Poder Judiciário poderá incumbir-se desse encargo quando houver nítida violação à eficácia e integridade dos direitos coletivos e mesmo individuais como acontece no caso sub judice.
Data do Julgamento
:
01/10/2013
Data da Publicação
:
04/12/2013
Classe/Assunto
:
Agravo de Instrumento / Liminar
Órgão Julgador
:
1ª Câmara Cível
Relator(a)
:
Des. Divoncir Schreiner Maran
Comarca
:
Costa Rica
Comarca
:
Costa Rica
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