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Jurisprudência


TJPA 0000020-83.1984.8.14.0012

Ementa
PROCESSO Nº 0000020-83.1984.8.14.0012 ÓRGÃO JULGADOR: 2ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA RECURSO: APELAÇÃO COMARCA: CAMETÁ APELANTE: ESTADO DO PARÁ Procurador do Estado: Dr. Jair Marocco APELADO: JOSÉ GONÇALVES PANTOJA RELATORA: DESA. CÉLIA REGINA DE LIMA PINHEIRO Apelação Cível. Direito Tributário. Execução Fiscal. ICMS. Remissão por Decreto do Governador do Estado. Impossibilidade. Ausência de Lei específica. Aplicação do art. 557, §1º-A, do CPC. 1. O Decreto do Governador do Estado concessivo de Remissão de crédito tributário do ICMS não pode ser expedido sem lei específica que o autorize e que regule exclusivamente a matéria, sob pena de estar ferindo disposição expressa contida no art. 150, §6º da Constituição Federal. 2. Recurso conhecido e provido, nos termos do §1ª-A do art. 557, do CPC. RELATÓRIO        A EXMA. DESEMBARGADORA CÉLIA REGINA DE LIMA PINHEIRO (RELATORA):        Trata-se de recurso de Apelação Cível (fls. 13-15) interposto pelo ESTADO DO PARÁ contra r. sentença (fls. 11) do Juízo de Direito da 2ª Vara da Comarca de Cametá que, nos autos da Ação de Execução Fiscal proposta contra JOSÉ GONÇALVES PANTOJA, julgou extinto o processo nos termos do art. 598 c/c art. 267, VI, todos do Código de Processo Civil, tendo em vista que houve remissão da dívida por aplicação do Decreto nº 1.194/2008.        Em suas razões, o Exequente/Apelante aduz que o Juízo não poderia, de ofício, sem antes intimar a Fazenda Pública, reconhecer a remissão, uma vez que deve ser considerado o total de débitos existentes em face do executado.        Requer o conhecimento e provimento do recurso.        Apelação recebida no efeito devolutivo (fl. 18).        RELATADO. DECIDO.        A sentença recorrida foi publicada antes do dia 18/03/2016, portanto, antes da entrada em vigor do Código de Processo Civil de 2015.        Destarte, devem ser observados os pressupostos de admissibilidade previstos na norma revogada, com processamento recursal também pela norma vigente ao tempo da publicação da sentença. Por consectário, inaplicáveis as regras do CPC de 2015.        Cuida-se de Apelação Cível interposto pelo ESTADO DO PARÁ contra r. sentença (fls. 11) do Juízo de Direito da 2ª Vara da Comarca de Cametá que, nos autos da Ação de Execução Fiscal julgou extinta a Execução Fiscal, em razão da remissão dos débitos tributários, instituída pelo Decreto nº 1.194, de 18/08/2008, de lavra da Governadora do Estado do Pará.        Em análise dos autos, verifico que a decisão recorrida está em manifesto confronto com a jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal, motivo pelo qual passo a decidir monocraticamente, na forma do §1ª-A, do art. 557, do Código de Processo Civil.        Ricardo Alexandre (in Direito Tributário Esquematizado, 3ª ed. p. 432) define remissão como ¿a dispensa gratuita da dívida, feita pelo credor em benefício do devedor. Tratando-se de crédito tributário, devido ao princípio da indisponibilidade do patrimônio público a remissão somente pode ser com fundamento em lei específica.¿        A Constituição Federal de 1988, no seu art. 150, § 6º, com a redação que lhe deu a Emenda Constitucional n. 3, de 17/03/1993, efetivamente prevê que "sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: §6º. Qualquer subsídio ou isenção, redução da base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão, relativos a impostos, taxas ou contribuições, só poderá ser concedido mediante lei específica, federal, estadual ou municipal, que regule exclusivamente as matérias acima enumeradas ou o correspondente tributo ou contribuição, sem prejuízo do disposto no art. 155, § 2º, XII, g."        O art. 215 da Constituição Estadual assim dispõe: ¿Art. 215. A lei poderá isentar, reduzir, remir, anistiar ou agravar tributos, com a finalidade extrafiscal de favorecer atividades úteis ou de conter atividades inconvenientes ao interesse público observada a alínea "g", inciso XII do art. 155, da Constituição da República e a legislação federal.¿ (grifei)        Misabel Abreu Machado Derzi, atualizadora da memorável obra de ALIOMAR BALEEIRO, referindo-se ao art. 150, § 6º, da Constituição Federal de 1988, ensina que "a Constituição consagra o princípio da exclusividade da lei tributária de modo que leis diversas, reguladoras de matéria estranha, como de Direito Civil, de Direito Administrativo, Comercial ou mesmo de Direito Tributário - mas que trate de tributo diferente daquele para o qual se dá a isenção ou a redução - não podem conceder remissões, anistias, incentivos fiscais e outros benefícios tributários" (Direito Tributário Brasileiro. 11. ed., Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 932).        No presente caso, o Juízo a quo julgou extinta a Execução Fiscal sob o fundamento de que o valor cobrado, inscrito em dívida ativa, está remido por força do Decreto nº 1.194, de 18/08/2008, expedido pela Governadora do Estado do Pará. Todavia, tal fundamento não pode prosperar, pois o Decreto Governamental concessivo de remissão de crédito tributário do ICMS não pode ser emitido sem o respaldo de lei específica sobre a matéria, em atendimento ao princípio da reserva legal, instituída na Constituição Federal, art. 150, §6º.        Assim, este ato administrativo padece de nulidade, não gerando os efeitos jurídicos necessários para perdoar os créditos tributários cobrados nesta executiva fiscal.        O Supremo Tribunal Federal firmou orientação quanto à aplicabilidade da regra da legalidade à concessão de benefícios ou incentivos fiscais, de modo que é inconstitucional a delegação pura e simples de competência legislativa ao Executivo para dispor normativamente sobre matéria tributária, conforme ADI 1.296-MC e ADI 1.247-MC, ambas sob relatoria do Ministro Celso de Mello, Pleno, Dj. 10/08/1995 e 08/09/1995 respectivamente.        Neste sentido transcrevo aresto da Suprema Corte: ¿AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. MEDIDA LIMINAR. TRIBUTÁRIO. AUTORIZAÇÃO LEGISLATIVA QUE DÁ AO PODER EXECUTIVO A PRERROGATIVA DE CONCEDER, POR REGULAMENTO, OS BENEFÍCIOS FISCAIS DA REMISSÃO E DA ANISTIA. PRINCÍPIOS DA SEPARAÇÃO DOS PODERES E DA RESERVA ABSOLUTA DE LEI FORMAL. ART. 150, § 6º DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. 1. Ocorrência, no caso, de atuação ultra vires do Poder Legislativo, consubstanciada na abdicação de sua competência institucional em favor do Poder Executivo, facultando a este, mediante ato próprio, a prerrogativa de inovar na ordem jurídica em assunto (liberalidade estatal em matéria tributária) na qual a Constituição Federal impõe reserva absoluta de lei em sentido formal. Precedentes: ADI 1.247-MC, DJ 08.09.95 e ADI 1.296-MC, DJ 10.08.95, ambas de relatoria do Ministro Celso de Mello. 2. Presença de plausibilidade jurídica na tese de inconstitucionalidade e de conveniência na suspensão da eficácia do dispositivo atacado. 3. Medida liminar concedida¿ (ADI nº 3.462/PA-MC, Tribunal Pleno, Relatora a Ministra Ellen Gracie, DJ de 21/10/05).        Alicerçado por estes entendimentos o Excelso Pretório vem negando seguimento aos Recursos Extraordinários que aludem a questão ora debatida, como se pode observar pelos seguintes julgados: RE nº 592.197/RN, Rel. Min. Celso de Mello, publicado em 23/03/2010; RE nº 601.753/RN, Rel. Min. Carmen Lúcia, publicado 22/02/2010; RE nº 471.883/RN, Rel. Min. Joaquim Barbosa, publicado 04/02/2010, e RE nº 586.560/RN, Rel. Min. Eros Grau, publicado 09/12/2009.        Portanto, a decisão que extingue a execução fiscal, com fundamento em Decreto Governamental que decretou a remissão de débitos tributários de ICMS até o valor de R$3.600,00 (três mil e seiscentos reais) sem existência de lei específica que a autorize, é nula, pois o decreto está em dissonância com o princípio da legalidade, nos termos do §6º, do art. 150 da Constituição Federal.        Neste sentido, é o julgado das Câmaras Cíveis reunidas deste E. Tribunal de Justiça: ¿ EMBARGOS INFRINGENTES. ACÓRDÃO, NÃO UNÂNIME, QUE ANULA, DE OFÍCIO, SENTENÇA SOB O ARGUMENTO DE INCONSTITUCIONALIDADE DE DECRETO GOVERNAMENTAL CONCESSÓRIO DE REMISSÃO. INCONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA. PRECEDENTES DO STF. I - Com a entrada em vigor da alteração introduzida pela EC nº 03/93, ao parágrafo 6º do art. 150 da CF, resta pacificado que a ratificação de convênio emanado do CONFAZ, referentes a favores fiscais para o ICMS, somente poderá ocorrer mediante lei formal, sendo certo que antes da mudança referida, a confirmação poderia ocorrer por intermédio do decreto. II - Após a vigência das alterações introduzidas ao texto constitucional pela EC nº 03/93, para a concessão de benefícios fiscais de ICMS, são cumulativas as exigências contidas nos arts. 155, §2º, XII, g, e 150, §6º, da CF. III - Precedentes do STF. EMBARGOS INFRINGENTES IMPROVIDOS.¿ (Embargos Infringentes nº 2011.3.005235-5 - Câmaras Cíveis Reunidas - Embargante: MERCANTIL CACIQUE COMÉRCIO LTDA.; Embargado: ESTADO DO PARÁ - FAZENDA ESTADUAL; Relator: De. Roberto Gonçalves de Moura, julgado em 06/08/2013, publicado no DJ em 08/08/2013).        Por derradeiro, para que não se alegue Cláusula de Reserva de Plenário, a presente inconstitucionalidade não necessita ser apreciada pelo E. Tribunal Pleno, uma vez que já existe pronunciamento do Plenário do Supremo Tribunal acerca da questão, em perfeita consonância com o parágrafo único do artigo 481 do CPC.        Pelo exposto, estando a decisão vergastada em manifesto confronto com a jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal, dou provimento ao recurso de Apelação, nos termos do §1º-A, do art. 557, do Código de Processo Civil, declarando-a nula e consequentemente determino o retorno da Execução Fiscal ao Juízo de origem para o seu devido prosseguimento.        Publique-se. Intime-se.        Belém, 16 de agosto de 2016. Desembargadora CÉLIA REGINA DE LIMA PINHEIRO Relatora II (2016.03289206-58, Não Informado, Rel. CELIA REGINA DE LIMA PINHEIRO, Órgão Julgador 2ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA, Julgado em 2016-08-19, Publicado em 2016-08-19)
Decisão
DECISÃO MONOCRÁTICA

Data do Julgamento : 19/08/2016
Data da Publicação : 19/08/2016
Órgão Julgador : 2ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA
Relator(a) : CELIA REGINA DE LIMA PINHEIRO
Número do documento : 2016.03289206-58
Tipo de processo : Apelação
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