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Jurisprudência


TJPA 0000085-63.2016.8.14.0000

Ementa
SECRETARIA DAS CÂMARAS CÍVEIS REUNIDAS COMARCA DA CAPITAL MANDADO DE SEGURANÇA N. 0000085-63.2015.814.0000 IMPETRANTE: JEOVANIR BARBOSA DE LIMA AUTORIDADE APONTADA COMO COATORA: JUIZ DE DIREITO DA DÉCIMA SEGUNDA VARA CÍVEL DE BELÉM RELATOR: DES. LEONARDO DE NORONHA TAVARES PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. direito líquido e certo. AUSENTE. condição da ação. PETIÇÃO INICIAL INDEFERIDA. PROCESSO EXTINTO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. 1.     ¿O direito líquido e certo é condição especial da ação de mandado de segurança, estabelecida na Constituição Federal art. 5º, LXIX. Desfigurada, carecendo o impetrante do direito de ação, contempla-se a extinção do processo.¿ Precedente do STJ. 2. Petição Inicial indeferida. Art. 10 da Lei n.º 12.016/2009. Processo extinto sem resolução de mérito, na forma do art. 267, I, do Código de Processo Civil. D E C I S Ã O M O N O C R Á T I C A             O EXMO. SR. DESEMBARGADOR LEONARDO DE NORONHA TAVARES (RELATOR):            Trata-se de MANDADO DE SEGURANÇA, com pedido de liminar, impetrado por JEOVANIR BARBOSA DE LIMA contra decisão do Exmo. Sr. Juiz de Direito da 12ª Vara Cível da Comarca de Belém/PA, proferida nos autos da ação n º 0110343-47.2015.814.0301, que não atendeu o pedido formulado em CARTA ARBITRAL, determinando o seu arquivamento.            Narrou na exordial que interpôs junto ao ¿Tribunal Arbitral do Pará¿, ação de prestação de contas, em desfavor de Gisele Barros Damasceno, com a qual é sócia da empresa Office Service Terceirização de Mão-de-Obra Ltda. - EPP (CNPJ nº 16.887.298/0001-33), visando compelir a ré a demonstrar os resultados da empresa e ao final pagar a parte do lucro devido à sócia autora.            Ponderou que durante a tramitação do processo, o juízo arbitral deferiu medida cautelar, no sentido de bloquear cautelarmente o patrimônio da empresa, até o julgamento final da ação, ficando o árbitro nomeado pelas partes incumbido, neste ínterim, em autorizar os gastos necessários ao funcionamento da empresa, sem que a sócia demandada tivesse acesso aos valores.            Afirmou que foi expedida a Carta Arbitral de nº 0110343-47.2015.814.0301, a qual solicita providências ao Poder Judiciário, no sentido de bloquear via Bancejud todos os valores disponíveis nas contas bancárias da empresa, objeto da ação de prestação de contas ajuizada junto ao Tribunal Arbitral do Pará.            Declinou que foi distribuída a referida Carta Arbitral ao Juízo de Direito da 12ª Vara Cível, este se recusou a dar cumprimento ao que foi solicitado pelo juízo arbitral, e ao determinar o arquivamento dos autos, o juiz impetrado, declinou o seu convencimento, qual seja: entendeu que é incabível a solicitação de transferência de valores a serem bloqueados para a conta bancária vinculada ao Juízo Arbitral, uma vez que, tal pedido contrapõem-se as disposições contidas na Lei Estadual nº 8.213/2015, que determina o repasse dos depósitos judiciais deste Tribunal de Justiça ao Poder Executivo do Estado, para posterior devolução, quando o seu levantamento for autorizado. E mais, o Juízo não vislumbrou as condições adequadas ao atendimento das providências solicitadas, haja vista, a não indicação dos valores a serem bloqueados, a fim de que o Sistema Bancejud assim receba e processe a ordem.            Irresignada, a autora, ora impetrante, impetrou o presente mandamus, inicialmente, considerações sobre a arbitragem e a medida cautelar nela deferida, discorrendo, ainda, sobre a Carta Arbitral, prevista no art. 22-C da Lei nº 9.307/96 que dispõe que: ¿O árbitro ou o tribunal arbitral poderá expedir carta arbitral para que o órgão jurisdicional nacional pratique ou determine o cumprimento, na área de sua competência territorial, de ato solicitado pelo árbitro.¿            Aludiu que a recusa do magistrado em dar cumprimento ao que foi solicitado na Carta Arbitral ofende o citado artigo, configurando-se em uma decisão teratológica.            Sustentou que a Carta Arbitral é uma medida de vanguarda que visa desafogar o Judiciário por meio da arbitragem, que vem prevista no novo CPC de 2015 nos arts. 67, 69 § 1º e seguintes), sendo o referido instituto equiparado ao mesmo nível procedimental de uma Carta Precatória, Rogatória, ou de Ordem, onde o Juízo deprecado não deve adentrar no mérito da decisão do juízo deprecante, mas tão somente dar cumprimento à diligência solicitada. Transcreve o art. 237, incisos I, II, II, IV, do NCPC/2015. Faz um estudo comparativo entre a Carta Arbitral e as Cartas Precatória, Rogatória, ou de Ordem.            Defendeu, assim, o cabimento do Mandado de Segurança para a reforma da decisão do Juiz que não cumpre a Carta Arbitral, asseverando: 1) A ilegalidade do ato praticado, pois entende que a decisão do magistrado é teratológica, ofendendo o já citado art. 22-C da Lei nº 9.307/96; 2) O abuso de poder da autoridade impetrada, porque interfere no poder que a lei confere ao árbitro; 3) Inexistência de outro remédio, uma vez que a decisão proferida na Carta Arbitral não é sentença, já que não se trata de uma ação, mas uma carta de outra autoridade competente, requisitando a realização de certas diligências, tal como ocorre nos procedimentos de carta precatória, que não é sentenciada pelo juízo deprecado, cabendo ao Juiz apenas devolver a carta ao Juiz deprecante, certificando o resultado do cumprimento; e 4) O direito líquido e certo da impetrante de ver processada e cumprida a Carta Arbitral, na forma prevista no art. 22-C da Lei 9.307/96, estando pré-constituído e independe de dilação probatória, sendo, portanto, líquido e certo, tendo em vista que a convenção de arbitragem foi firmada pelas partes e a nomeação do árbitro se deu de forma regular.            Discorreu também sobre o mérito da decisão arbitral e sobre as diligências requeridas na Carta Arbitral, justificando quais sejam: 1) Realização de bloqueio via Bancejud de todos os valores depositados em contas bancárias de titularidade das requeridas; 2) Após a efetivação da tentativa de bloqueio via Bancejud, que sejam identificadas quais as instituições bancárias com que as Requeridas mantenham relacionamento, ainda que estejam sem saldo, e que seja expedido ofício para os bancos, para que realizem o bloqueio de todo e qualquer valor que venha a ser creditado nas contas; 3) Expedição de ofício pela autoridade judicial, direcionada às empresas e aos órgãos públicos listados na carta arbitral, para que se abstenham de realizar qualquer pagamento diretamente às requeridas, e para que depositem todos os créditos vencidos e vincendos em um conta judicial; 4) Intimação judicial das Requeridas, com ordem para que se abstenham de realizar qualquer débito, despesa, contratação, ou alienação de patrimônio, sem autorização prévia do árbitro julgador da ação de prestação de contas, bem como para que depositem todos os créditos vencidos e vincendos, que venham a receber, em uma conta judicial.            Salientou que os fundamentos adotados pelo Juízo de piso para negar cumprimento a Carta Arbitral não se justificam. Quanto ao primeiro fundamento que foi porque não foi informado o valor para realização do Bacenjud, afirma que: poderia ser suprido pelo juízo impetrado que poderia solicitar informações complementares ao juízo arbitral; que a eventual impossibilidade de cumprimento de um dos diversos pedidos requisitados na Carta Arbitral não deve implicar o descumprimento de todos; e que é possível a utilização do sistema Bacenjud para bloqueio de valor total pelo que tiver depositado, bastando inserir ordem de bloqueio em valo alto, que o próprio sistema confirmará o quanto foi possível bloquear. Já com relação ao segundo fundamento, qual seja, da impossibilidade de transferência para conta do juízo arbitral, assevera que isso não é pedido na Carta Arbitral, mas sim consta o pedido de que os valores bloqueados fossem mantidos na conta judicial vinculada ao processo de Carta Arbitral, ou seja, ficaria depositado em conta do Poder Judiciário, à disposição do Juízo arbitral para ser liberado conforme a decisão final e ulterior do arbitro. E, por fim, afirma que o terceiro fundamento da decisão tida por ilegal - discordância quanto ao mérito da medida cautelar, configura abuso de poder por parte do magistrado, pois usurpa a competência do árbitro.            Ponderou que estão presentes os requisitos para a concessão de medida liminar, sendo no caso, a fumaça do bom direito a decisão teratológica que está prejudicando os direitos da impetrante, tratando-se de questões exclusivamente de direito que ostentam o caráter de matéria de ordem pública. Enquanto que o perigo na demora decorre do fato de que a tramitação regular da presente ação pode esvaziar o objeto pretendido na cautelar e na carta arbitral, uma vez que a cada dia que passa a impetrante vê seu patrimônio dilapidado e cada vez mais reduzida a possibilidade de ver saciado o crédito decorrente da divisão de lucros, porquanto se a ordem for concedida apenas no julgamento final da ação, o cumprimento da Carta Arbitral já será inócuo, pois não haverá mais valores para ser bloqueado, uma vez que a empresa já está em fase de término de suas operações.            Requer a concessão de liminar para determinar a autoridade impetrada que dê imediato prosseguimento a tramitação da Carta Arbitral, com o cumprimento das medidas solicitadas pelo árbitro; ou, ad argumentandum, requer, subsidiariamente, a concessão de liminar para determinar o afastamento da sócio Gisele Barros Damasceno da administração da empresa em questão, para ser administrada provisoriamente pela impetrante, até o julgamento final deste mandado de segurança. Pugna também, que os autos tramitem em segredo de justiça, a teor do art. 22-C, parágrafo único, da Lei 9.307/96.            Ao final requereu a concessão da segurança para confirmar os termos da liminar.            Acostou documentos (fls. 22/314).             DECIDO.            Trata-se de writ no qual pretende o impetrante combater decisão do Juízo 12ª Vara Cível e Empresarial de Belém que deixou de praticar os atos solicitados em Carta Arbitral expedida por Árbitro, nos moldes da Lei nº 9.307/96.            Contudo em análise rigorosa e acurada nas razões mandamentais, verifico que o impetrante não detém direito líquido e certo, conforme sustenta, pois fora acertada a decisão do juízo de direito.            Vejamos a redação do art. 22- C: ¿Art. 22-C - O árbitro ou o tribunal arbitral poderá expedir carta arbitral para que o órgão jurisdicional nacional pratique ou determine o cumprimento, na área de sua competência territorial, de ato solicitado pelo árbitro.¿            O árbitro solicitou o ¿a realização de bloqueio via BACENJUD de todos os valores depositados em contas bancárias de titularidade das requeridas, com respectiva transferência dos valores para uma conta judicial vinculada ao processo de carta arbitral, onde devem ficar depositados e à disposição do juízo arbitral, até ulterior deliberação.¿.            O art. 655-A do Código de Processo Civil que regulamenta o bacenjud preceitua: ¿Art. 655-A.  Para possibilitar a penhora de dinheiro em depósito ou aplicação financeira, o juiz, a requerimento do exeqüente, requisitará à autoridade supervisora do sistema bancário, preferencialmente por meio eletrônico, informações sobre a existência de ativos em nome do executado, podendo no mesmo ato determinar sua indisponibilidade, ATÉ o valor indicado na execução.¿            Por uma simples leitura depreende-se que não é possível o bloqueio indiscriminado de valores como solicitou o árbitro, bem como não é possível que os valores sejam transferidos para a conta a ser gerida pela Corte Arbitral, pois a Lei Estadual nº 8.213/2015 preceitua os valores depositados em conta judicial serão de titularidade do Poder Judiciário, sendo repassado 70% (setenta por cento), destes valores ao Poder Executivo, quadrimestralmente.            Assim não há como prosperar o entendimento que o impetrante possui direito líquido e certo de ver cumprida a Carta Arbitral.            Acerca do Mandado de Segurança a Constituição Federal de 1988 estabeleceu: ¿conceder-se-á mandado de segurança para proteger DIREITO LÍQUIDO E CERTO, não amparado por habeas-corpus ou habeas-data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público.¿ (CF/88, art. 5º, LXIX).            A Lei 12.016/2009 que disciplina o Mandado de Segurança: ¿Art. 1o  Conceder-se-á mandado de segurança para proteger DIREITO LÍQUIDO E CERTO, não amparado por habeas corpus ou habeas data, sempre que, ilegalmente ou com abuso de poder, qualquer pessoa física ou jurídica sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça.¿            O saudoso Prof. Hely Lopes Meirelles em sua obra Mandado de Segurança e Ações Constitucionais vaticina acerca do Direito Líquido e Certo: ¿Direito líquido e certo é o que se apresenta manifesto na sua existência, delimitando na sua extensão e apto a ser exercitado no momento da impetração. Por outras palavras, o direito invocado para ser amparável por mandado de segurança, há de vir expresso em norma legal e trazer em si todos os requisitos e condições de sua aplicação ao impetrante: se sua existência for duvidosa; se sua extensão ainda não tiver delimitada; se seu exercício depender de situações e fatos ainda indeterminados, não rende ensejo à segurança, embora possa ser defendido por outros meios judiciais.¿            Desta forma, não há como processar o mandamus, em face de inexistência de liquidez ou certeza em suas alegações.            Sobre as condições da ação, Luiz Rodrigues Wambier1 leciona que: ¿o interesse processual nasce, portanto, da necessidade da tutela jurisdicional do Estado, invocada pelo meio adequado, que determinará o resultado útil pretendido, do ponto de vista processual. É importante esclarecer que a presença do interesse processual não determina a procedência do pedido, mas viabiliza a apreciação do mérito, permitindo que o resultado seja útil, tanto nesse sentido quanto no sentido oposto, de improcedência. A utilidade do resultado se afere diante do tipo de providência requerida.¿ (sem grifos no original).             Conclui-se, portanto, que resta manifestamente ausente uma das condições da ação, uma vez que o impetrante não possui direito líquido e certo.             Em face de todo o exposto, INDEFIRO a petição inicial, nos termos do art. 10 da Lei N.º 12.016/2009.             Logo, JULGO EXTINTO o feito, sem resolução de mérito, nos termos do art. 267, inciso I, do mesmo codex.             Sem honorários, na forma do art. 25 da Lei n.º 12.016/2009.            Publique-se. Intime-se. Após o trânsito em julgado do decisum, arquivem-se os autos.            À Secretaria para as devidas providências. Belém (PA), 14 de janeiro de 2015. LEONARDO DE NORONHA TAVARES RELATOR 1 Luiz Rodrigues Wambier. Curso Avançado de Processo Civil. 3ª edição. Editora dos Tribunais, p: 137. (2016.00109392-35, Não Informado, Rel. LEONARDO DE NORONHA TAVARES, Órgão Julgador CÂMARAS CÍVEIS REUNIDAS, Julgado em 2016-01-19, Publicado em 2016-01-19)
Decisão
DECISÃO MONOCRÁTICA

Data do Julgamento : 19/01/2016
Data da Publicação : 19/01/2016
Órgão Julgador : CÂMARAS CÍVEIS REUNIDAS
Relator(a) : LEONARDO DE NORONHA TAVARES
Número do documento : 2016.00109392-35
Tipo de processo : Mandado de Segurança
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