TJPA 0000173-23.2010.8.14.0047
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ PROCESSO Nº 0000173-23.2010.8.14.0047 ÓRGÃO JULGADOR: 2ª TURMA DE DIREITO PÚBLICO RECURSO: APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA COMARCA: RIO MARIA (VARA ÚNICA DE RIO MARIA) APELANTE/APELADO/SENTENCIADO: FRANCINEIDE E SILVA DE SOUZA (ADVOGADO CÍCERO SALES DA SILVA- OAB/PA N.º 10.802) APELANTE/APELADO/SENTENCIADO: ESTADO DO PARÁ (PROCURADOR DO ESTADO MARLON AURÉLIO TAPAJÓS ARAÚJO - OAB/PA n.º 12.183) RELATOR: DES. LUIZ GONZAGA DA COSTA NETO EMENTA: APELAÇÃO CIVIL E REMESSA NECESSÁRIA. FUNDO DE GARANTIA POR TEMPO DE SERVIÇO. CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA DE SERVIDOR PÚBLICO. NULIDADE DO CONTRATO. RECONHECIMENTO DO DIREITO A VERBA FUNDIÁRIA E SALÁRIO. LIMITAÇÃO AO QUINQUÊNIO ANTERIOR À PROPOSITURA DA AÇÃO. APELAÇÕES IMPROVIDAS. EM REEXAME NECESSÁRIO REFORMA PARCIAL DA DECISÃO DE PRIMEIRO GRAU. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA A SEREM APURADOS NA FORMA LEGAL NA EXECUÇÃO DO DECISUM. DECISÃO MONOCRÁTICA Cuidam-se de APELAÇÕES CÍVEIS interpostas por FRANCINEIDE E SILVA DE SOUSA e ESTADO DO PARÁ, em face da decisão proferida pelo Juízo de Direito da Vara Única de Rio Maria, nos autos da Ação de Cobrança movida por FRANCINEIDE E SILVA DE SOUSA. Por meio da decisão apelada, o magistrado sentenciante deu procedência à ação, condenando o apelante Estado do Pará ao pagamento dos depósitos relacionados ao Fundo de Garantia por Tempo de Serviço - FGTS, inclusive multa de 40%, a que o recorrido teria direito durante à vigência do contrato temporário firmado entre as partes, bem como ao pagamento de férias proporcionais acrescidas de 1/3 e 13º salário proporcional, respeitada a prescrição quinquenal. Irresignada, a apelante Francineide e Silva de Sousa impugna a determinação da sentença acerca da observância da prescrição quinquenal, entendendo que, em caso de FGTS, a prescrição é trintenária. Pediu, também, majoração do percentual da verba honorária para 20%. Colacionou jurisprudência em abono de sua tese. Por sua vez, em seu apelo, o Estado do Pará, suscita, inicialmente, a impossibilidade jurídica do pedido, considerando administrativa da contratação temporária. Suscita a prescrição bienal com base no art. 206, §2º, do Código Civil. Diz que é indevida a condenação do ente público ao recolhimento de FGTS durante o pacto laboral e da inaplicabilidade das decisões do STF ao caso em debate. Pede a redução da verba honorária em razão de sucumbência recíproca. O apelo foi recebido em seu duplo efeito (fl. 257). Instados a se manifestarem, apenas o Estado do Pará apresentou contrarrazões (fls. 245/249). A recorrida Francineide e Silva de Sousa não apresentou resposta ao apelo do Estado do Pará (certidão de fls. 252). Processo inicialmente distribuído ao Des. José Maria do Rosário em 02.12.14, que firmou suspeição em 02.05.16 (fl. 271), após relatório e manifestação do MP. Feito redistribuído à Desª Nazaré Saavedra em 22.07.16. Em razão da alteração de competência e modificação dos órgãos fracionários do TJPA (Emenda Regimental nº 05/16), coube-me a relatoria do feito (fls. 275). MP deixa de se manifestar em razão da ausência de interesse público primário (fls. 269/270). É o relatório. Decido. Os recursos preenchem os requisitos para sua admissibilidade, principalmente porque apresentam-se tempestivos e de acordo com a hipótese prevista na lei processual civil, razão pela qual, conheço dos recursos e passo a decidir. Compulsando os autos, entendo que os apelos comportam julgamento monocrático, conforme estabelece o artigo 133, XI, d, do RITJPA, por se encontrarem as razões recursais em confronto com jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal, como passo a demonstrar. As preliminares suscitadas pelos Recorridos, por abarcarem questões meritórias, serão analisadas juntamente com este, mesmo porque, como sabido, as temáticas postas nas preliminares, quais sejam: prescrição trintenária ou quinquenal, possibilidade jurídica do pedido; já foram devidamente dirimidas pelo STF em recursos com repercussão geral. O Supremo Tribunal Federal, ao julgar os Recursos Extraordinários prefalados, responsáveis pelos temas 191 e 308 da repercussão geral, respectivamente, reconheceu o direito aos depósitos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) aos trabalhadores que tiveram o contrato de trabalho com a Administração Pública declarado nulo em função de inobservância da regra do art. 37, §2º, da Constituição Federal, que estabelece prévia aprovação em concurso público, restando, ao final, assentado o entendimento pelo direito tão somente ao FGTS e ao saldo de salário a esses contratos considerados nulos. As ementas dos recursos antes mencionados têm o seguinte teor: ¿Recurso extraordinário. Direito Administrativo. Contrato nulo. Efeitos. Recolhimento do FGTS. Artigo 19-A da Lei nº 8.036/90. Constitucionalidade. 1. É constitucional o art. 19-A da Lei nº 8.036/90, o qual dispõe ser devido o depósito do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço na conta de trabalhador cujo contrato com a Administração Pública seja declarado nulo por ausência de prévia aprovação em concurso público, desde que mantido o seu direito ao salário. 2. Mesmo quando reconhecida a nulidade da contratação do empregado público, nos termos do art. 37, § 2º, da Constituição Federal, subsiste o direito do trabalhador ao depósito do FGTS quando reconhecido ser devido o salário pelos serviços prestados. 3. Recurso extraordinário ao qual se nega provimento. (STF. Recurso Extraordinário nº 596.478/RR. Redator para acórdão MINISTRO DIAS TOFFOLI. Julgado em 13/07/2012)¿ ¿EMENTA: CONSTITUCIONAL E TRABALHO. CONTRATAÇÃO DE PESSOAL PELA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA SEM CONCURSO. NULIDADE. EFEITOS JURÍDICOS ADMISSÍVEIS EM RELAÇÃO A EMPREGADOS: PAGAMENTO DE SALDO SALARIAL E LEVANTAMENTO DE FGTS (RE 596.478 - REPERCUSSÃO GERAL). INEXIGIBILIDADE DE OUTRAS VERBAS, MESMO A TÍTULO INDENIZATÓRIO. 1. Conforme reiteradamente afirmado pelo Supremo Tribunal Federal, a Constituição de 1988 reprova severamente as contratações de pessoal pela Administração Pública sem a observância das normas referentes à indispensabilidade da prévia aprovação em concurso público, cominando a sua nulidade e impondo sanções à autoridade responsável (CF, art. 37, § 2º). 2. No que se refere a empregados, essas contratações ilegítimas não geram quaisquer efeitos jurídicos válidos, a não ser o direito à percepção dos salários referentes ao período trabalhado e, nos termos do art. 19-A da Lei 8.036/90, ao levantamento dos depósitos efetuados no Fundo de Garantia por Tempo de Serviço - FGTS. 3. Recurso extraordinário desprovido. (STF. Recurso Extraordinário nº 705.140/RS. Relator MINISTRO TEORI ZAVASCKI. Julgado em 28/08/2014)¿ Acerca da matéria, bem elucidativo é o voto proferido pelo Ministro TEORI ZAVASCKI, nos autos do RExt nº 705.140/RS, nestes termos: ¿A Constituição de 1988 comina de nulidade as contratações de pessoal pela Administração Pública sem a observância das normas referentes à indispensabilidade da prévia aprovação em concurso público (CF, art. 37, § 2º), não gerando, essas contratações, quaisquer efeitos jurídicos válidos em relação aos empregados contratados, a não ser o direito à percepção dos salários referentes ao período trabalhado e, nos termos do art. 19-A da Lei 8.036/90, ao levantamento dos depósitos efetuados no Fundo de Garantia por Tempo de Serviço - FGTS.¿ Destarte, restou reconhecida a constitucionalidade do art. 19-A da Lei n° 8.036/1990, com a redação dada pela Medida Provisória (MP) 2.164-41/2001, que prevê o referido pagamento. Assim, entendeu-se que o contrato nulo produz efeitos até que seja decretada a sua nulidade, sendo, portanto, o dispositivo mencionado, regra de transição a qual deve ser aplicada de maneira a não prejudicar a parte que agiu de boa-fé ao ser contratada, que prestou diligentemente seus serviços, prestigiando-se a dignidade da pessoa humana e o valor social do trabalho (art. 1º, III e IV, da CRFB). Ressalto, por oportuno, que as decisões do STF, nos Recursos Extraordinários n° 596.478 e 705.140, fazem referência à pessoa contratada pela Administração Pública sem concurso público, não delimitando a questão constitucional no regime de contratação, se celetista ou estatutário. Assim como, não o fez com relação a quem contratou, se a Administração Pública Direta ou Indireta. Portanto, a tese jurídica restou fixada de forma ampla, sobretudo porque considerou as características da decisão prolatada sob a sistemática da repercussão geral, a saber: os efeitos vinculantes, erga omnes e de transcendência subjetiva ao interesse das partes. Deve ser ressaltado, porém, que o resultado dos julgamentos dos Recursos Extraordinários n° 596.478 e 705.140 garantiram às pessoas contratadas, sem concurso público, pela Administração Pública, apenas o direito ao depósito/levantamento do FGTS, previsto no Art. 19-A da Lei 8.036/90 e ao saldo de salário, considerando, para tanto, a nulidade do contrato por violação das hipóteses contidas no art.37, §2º da CF/88, a exemplo do que já fora antes deliberado nos precedentes do STF: AG. REG. NO RE 830.962/MG; AG. REG. NO RE COM AG. 736.523/MS; AG. REG. NO RE 863.125/MG; ARE 867.655/MS e RE 863125/MG. Sobre o tema tratado, inclusive, pacificando a questão de uma vez por todas no âmbito deste Tribunal, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 960.708/PA, em caso específico do Estado do Pará, de relatoria da MIN. CÁRMEN LÚCIA, decidiu que: reconhecida a nulidade da contratação temporária do recorrido, na linha da jurisprudência deste Supremo Tribunal, deve aplicar o art. 19-A da Lei nº 8.036/1990 e assegurar o pagamento do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço. Eis a ementa do julgado: ¿EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. PRESCRIÇÃO. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA N. 282 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA. DIREITO AO DEPÓSITO DO FUNDO DE GARANTIA POR TEMPO DE SERVIÇO. PRECEDENTES. CONTRARRAZÕES NÃO APRESENTADAS. MAJORAÇÃO DA VERBA HONORÁRIA: IMPOSSIBILIDADE. AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO. (AG.REG no Recurso Extraordinário 960.708/PA. Relatoria MIN. CARMEN LUCIA. Julgado em 09/08/2016, Publicado no DJE de 29/08/2016)¿ No caso dos autos, denota-se que a ora apelante foi contratada como serviço temporário, a partir de 26.03.1993, para prestação de serviço como secretária, tendo sido dispensada em 31.01.2009. A presente ação foi aforada em 02.03.2010. Depreende-se, assim, que é nulo o contrato firmado entre as partes, diante da ocupação de cargo público sem a necessária aprovação em prévio concurso público, e, sendo o posicionamento da nossa mais alta Corte de Justiça o reconhecimento do direito, apenas, ao recebimento do FGTS e do saldo de salário, entendo que a sentença deve ser reformada para se adequar ao entendimento esposado pelo STF, notadamente no que pertine ao fato de que somente é devido pelo Estado do Pará à Sra. Francineide e Silva de Sousa, o depósito do FGTS e eventual saldo de salário, não se incluindo neste qualquer multa e outros consectários de verba trabalhista, tipo: férias proporcionais ou não, acrescidas de 1/3 e 13º proporcional. Logo, para manifestação acerca da possibilidade jurídica do pedido, que não mais subsiste como condição da ação no CPC/2015, parece pertinente que o STF entendeu, sim, pela possibilidade jurídica do pedido da autora. De outro lado, há a observância do prazo prescricional quinquenal, fato, aliás, considerado na sentença recorrida. Mas, reforço isto porque, após a prolação da sentença apelada, o Supremo Tribunal Federal, ao julgar o ARE nº 709.212/DF, de relatoria do Min. Gilmar Mendes, com repercussão geral reconhecida, definiu que o prazo prescricional aplicável para a cobrança das contribuições ao FGTS não depositadas tempestivamente pelos empregadores e tomadores de serviço seria de 05 (cinco) anos e não mais de 30 (trinta) anos. Nesse sentido, verbis: ¿RECURSO EXTRAORDINÁRIO. DIREITO DO TRABALHO. FUNDO DE GARANTIA POR TEMPO DE SERVIÇO (FGTS). COBRANÇA DE VALORES NÃO PAGOS. PRAZO PRESCRICIONAL. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. ART. 7º, XXIX, DA CONSTITUIÇÃO. SUPERAÇÃO DE ENTENDIMENTO ANTERIOR SOBRE PRESCRIÇÃO TRINTENÁRIA. INCONSTITUCIONALIDADE DOS ARTS. 23, § 5º, DA LEI 8.036/1990 E 55 DO REGULAMENTO DO FGTS APROVADO PELO DECRETO 99.684/1990. SEGURANÇA JURÍDICA. NECESSIDADE DE MODULAÇÃO DOS EFEITOS DA DECISÃO. ART. 27 DA LEI 9.868/1999. DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE COM EFEITOS EX NUNC. RECURSO EXTRAORDINÁRIO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.¿ A definição da prescrição quinquenal, em razão da manifestação vinculada do STF, afasta qualquer discussão sobre o tema, elidindo as razões dos recorrentes. Acrescente-se, ainda, que o percebimento do FGTS referente ao período trabalhado não atingido pela prescrição, não sofrerá qualquer acréscimo de multa, conforme restou assentado no RExt nº 705.140/RS, segundo o qual as contraprestações sem concurso pela Administração Pública não geram quaisquer efeitos jurídicos válidos, a não ser o direito à percepção dos salários do período trabalhado (AgRg no ARE 897.969, rel. Min. Mendes) e ao levantamento dos depósitos efetuados no FGTS. Por fim, ressalvo o meu entendimento pessoal deste Relator, uma vez que há algum tempo venho me posicionado no sentido de ser incabível, em caso de vínculo temporário, o recolhimento do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço - FGTS, dado o regime jurídico dos servidores contratados ser de natureza eminentemente administrativa, conforme estabelece a LC n.º 07/1991. Porém, diante do posicionamento adotado pelo Colendo Supremo Tribunal Federal no bojo do AgRg no RE n.º 960.708/PA, no qual restou consignado ser devido o depósito do FGTS em caso de contratação temporária na situação específica do Estado do Pará, mesmo diante do que prevê a Lei Complementar antes mencionada, outra saída não há senão a de reconhecer o direito ao pagamento da verba fundiária. Acerca da verba honorária fixada, entendo correta e razoável o percentual fixado pelo juízo 'a quo' mesmo porque não houve, na decisão recorrida, sucumbência recíproca. E tampouco nesta decisão recursal. Portanto, diante da fundamentação exposta e das decisões proferidas pelo Colendo Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE n.º 596.478/RR-RG, sob a sistemática da repercussão geral, e do AgRgRE n.º 960.708/PA, entendo necessário observar os artigos 932, IV, b do CPC/2015 e 133, XI, b e d do Regimento Interno deste Tribunal. Ante o exposto, com fulcro no artigo 932, inciso IV, alínea b, do CPC/2015 e artigo 133, inciso XI, alíneas b e d, do RITJE/PA, nego provimento aos recursos de apelação interpostos pelos litigantes. Em sede de reexame necessário, reformo parcialmente a decisão apelada no sentido de afastar a incidência de qualquer outra verba que não seja o depósito do FGTS e saldo de salário, reconhecendo, portanto, devido o FGTS e salário ou saldo deste, conforme RE 596.478/RR (Tema 191) e RE 705.140/RS (Tema 308), e ainda reforçar a incidência do prazo prescricional de 5 (cinco) anos nos moldes do art. 7º, inciso XXIX, da CF/88 (ARE nº 709.212/DF). Mantida a verba honorária fixada em 10% Juros e correção monetária a serem apurados na forma legal a quando da execução do julgado. Após o decurso do prazo recursal sem qualquer manifestação, certifique-se o trânsito em julgado e dê-se a baixa no LIBRA. Belém, 08 de janeiro de 2018. Des. LUIZ GONZAGA DA COSTA NETO Relator
(2018.00023450-34, Não Informado, Rel. LUIZ GONZAGA DA COSTA NETO, Órgão Julgador 2ª TURMA DE DIREITO PÚBLICO, Julgado em 2018-01-16, Publicado em 2018-01-16)
Ementa
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ PROCESSO Nº 0000173-23.2010.8.14.0047 ÓRGÃO JULGADOR: 2ª TURMA DE DIREITO PÚBLICO RECURSO: APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA COMARCA: RIO MARIA (VARA ÚNICA DE RIO MARIA) APELANTE/APELADO/SENTENCIADO: FRANCINEIDE E SILVA DE SOUZA (ADVOGADO CÍCERO SALES DA SILVA- OAB/PA N.º 10.802) APELANTE/APELADO/SENTENCIADO: ESTADO DO PARÁ (PROCURADOR DO ESTADO MARLON AURÉLIO TAPAJÓS ARAÚJO - OAB/PA n.º 12.183) RELATOR: DES. LUIZ GONZAGA DA COSTA NETO APELAÇÃO CIVIL E REMESSA NECESSÁRIA. FUNDO DE GARANTIA POR TEMPO DE SERVIÇO. CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA DE SERVIDOR PÚBLICO. NULIDADE DO CONTRATO. RECONHECIMENTO DO DIREITO A VERBA FUNDIÁRIA E SALÁRIO. LIMITAÇÃO AO QUINQUÊNIO ANTERIOR À PROPOSITURA DA AÇÃO. APELAÇÕES IMPROVIDAS. EM REEXAME NECESSÁRIO REFORMA PARCIAL DA DECISÃO DE PRIMEIRO GRAU. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA A SEREM APURADOS NA FORMA LEGAL NA EXECUÇÃO DO DECISUM. DECISÃO MONOCRÁTICA Cuidam-se de APELAÇÕES CÍVEIS interpostas por FRANCINEIDE E SILVA DE SOUSA e ESTADO DO PARÁ, em face da decisão proferida pelo Juízo de Direito da Vara Única de Rio Maria, nos autos da Ação de Cobrança movida por FRANCINEIDE E SILVA DE SOUSA. Por meio da decisão apelada, o magistrado sentenciante deu procedência à ação, condenando o apelante Estado do Pará ao pagamento dos depósitos relacionados ao Fundo de Garantia por Tempo de Serviço - FGTS, inclusive multa de 40%, a que o recorrido teria direito durante à vigência do contrato temporário firmado entre as partes, bem como ao pagamento de férias proporcionais acrescidas de 1/3 e 13º salário proporcional, respeitada a prescrição quinquenal. Irresignada, a apelante Francineide e Silva de Sousa impugna a determinação da sentença acerca da observância da prescrição quinquenal, entendendo que, em caso de FGTS, a prescrição é trintenária. Pediu, também, majoração do percentual da verba honorária para 20%. Colacionou jurisprudência em abono de sua tese. Por sua vez, em seu apelo, o Estado do Pará, suscita, inicialmente, a impossibilidade jurídica do pedido, considerando administrativa da contratação temporária. Suscita a prescrição bienal com base no art. 206, §2º, do Código Civil. Diz que é indevida a condenação do ente público ao recolhimento de FGTS durante o pacto laboral e da inaplicabilidade das decisões do STF ao caso em debate. Pede a redução da verba honorária em razão de sucumbência recíproca. O apelo foi recebido em seu duplo efeito (fl. 257). Instados a se manifestarem, apenas o Estado do Pará apresentou contrarrazões (fls. 245/249). A recorrida Francineide e Silva de Sousa não apresentou resposta ao apelo do Estado do Pará (certidão de fls. 252). Processo inicialmente distribuído ao Des. José Maria do Rosário em 02.12.14, que firmou suspeição em 02.05.16 (fl. 271), após relatório e manifestação do MP. Feito redistribuído à Desª Nazaré Saavedra em 22.07.16. Em razão da alteração de competência e modificação dos órgãos fracionários do TJPA (Emenda Regimental nº 05/16), coube-me a relatoria do feito (fls. 275). MP deixa de se manifestar em razão da ausência de interesse público primário (fls. 269/270). É o relatório. Decido. Os recursos preenchem os requisitos para sua admissibilidade, principalmente porque apresentam-se tempestivos e de acordo com a hipótese prevista na lei processual civil, razão pela qual, conheço dos recursos e passo a decidir. Compulsando os autos, entendo que os apelos comportam julgamento monocrático, conforme estabelece o artigo 133, XI, d, do RITJPA, por se encontrarem as razões recursais em confronto com jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal, como passo a demonstrar. As preliminares suscitadas pelos Recorridos, por abarcarem questões meritórias, serão analisadas juntamente com este, mesmo porque, como sabido, as temáticas postas nas preliminares, quais sejam: prescrição trintenária ou quinquenal, possibilidade jurídica do pedido; já foram devidamente dirimidas pelo STF em recursos com repercussão geral. O Supremo Tribunal Federal, ao julgar os Recursos Extraordinários prefalados, responsáveis pelos temas 191 e 308 da repercussão geral, respectivamente, reconheceu o direito aos depósitos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) aos trabalhadores que tiveram o contrato de trabalho com a Administração Pública declarado nulo em função de inobservância da regra do art. 37, §2º, da Constituição Federal, que estabelece prévia aprovação em concurso público, restando, ao final, assentado o entendimento pelo direito tão somente ao FGTS e ao saldo de salário a esses contratos considerados nulos. As ementas dos recursos antes mencionados têm o seguinte teor: ¿Recurso extraordinário. Direito Administrativo. Contrato nulo. Efeitos. Recolhimento do FGTS. Artigo 19-A da Lei nº 8.036/90. Constitucionalidade. 1. É constitucional o art. 19-A da Lei nº 8.036/90, o qual dispõe ser devido o depósito do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço na conta de trabalhador cujo contrato com a Administração Pública seja declarado nulo por ausência de prévia aprovação em concurso público, desde que mantido o seu direito ao salário. 2. Mesmo quando reconhecida a nulidade da contratação do empregado público, nos termos do art. 37, § 2º, da Constituição Federal, subsiste o direito do trabalhador ao depósito do FGTS quando reconhecido ser devido o salário pelos serviços prestados. 3. Recurso extraordinário ao qual se nega provimento. (STF. Recurso Extraordinário nº 596.478/RR. Redator para acórdão MINISTRO DIAS TOFFOLI. Julgado em 13/07/2012)¿ ¿ CONSTITUCIONAL E TRABALHO. CONTRATAÇÃO DE PESSOAL PELA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA SEM CONCURSO. NULIDADE. EFEITOS JURÍDICOS ADMISSÍVEIS EM RELAÇÃO A EMPREGADOS: PAGAMENTO DE SALDO SALARIAL E LEVANTAMENTO DE FGTS (RE 596.478 - REPERCUSSÃO GERAL). INEXIGIBILIDADE DE OUTRAS VERBAS, MESMO A TÍTULO INDENIZATÓRIO. 1. Conforme reiteradamente afirmado pelo Supremo Tribunal Federal, a Constituição de 1988 reprova severamente as contratações de pessoal pela Administração Pública sem a observância das normas referentes à indispensabilidade da prévia aprovação em concurso público, cominando a sua nulidade e impondo sanções à autoridade responsável (CF, art. 37, § 2º). 2. No que se refere a empregados, essas contratações ilegítimas não geram quaisquer efeitos jurídicos válidos, a não ser o direito à percepção dos salários referentes ao período trabalhado e, nos termos do art. 19-A da Lei 8.036/90, ao levantamento dos depósitos efetuados no Fundo de Garantia por Tempo de Serviço - FGTS. 3. Recurso extraordinário desprovido. (STF. Recurso Extraordinário nº 705.140/RS. Relator MINISTRO TEORI ZAVASCKI. Julgado em 28/08/2014)¿ Acerca da matéria, bem elucidativo é o voto proferido pelo Ministro TEORI ZAVASCKI, nos autos do RExt nº 705.140/RS, nestes termos: ¿A Constituição de 1988 comina de nulidade as contratações de pessoal pela Administração Pública sem a observância das normas referentes à indispensabilidade da prévia aprovação em concurso público (CF, art. 37, § 2º), não gerando, essas contratações, quaisquer efeitos jurídicos válidos em relação aos empregados contratados, a não ser o direito à percepção dos salários referentes ao período trabalhado e, nos termos do art. 19-A da Lei 8.036/90, ao levantamento dos depósitos efetuados no Fundo de Garantia por Tempo de Serviço - FGTS.¿ Destarte, restou reconhecida a constitucionalidade do art. 19-A da Lei n° 8.036/1990, com a redação dada pela Medida Provisória (MP) 2.164-41/2001, que prevê o referido pagamento. Assim, entendeu-se que o contrato nulo produz efeitos até que seja decretada a sua nulidade, sendo, portanto, o dispositivo mencionado, regra de transição a qual deve ser aplicada de maneira a não prejudicar a parte que agiu de boa-fé ao ser contratada, que prestou diligentemente seus serviços, prestigiando-se a dignidade da pessoa humana e o valor social do trabalho (art. 1º, III e IV, da CRFB). Ressalto, por oportuno, que as decisões do STF, nos Recursos Extraordinários n° 596.478 e 705.140, fazem referência à pessoa contratada pela Administração Pública sem concurso público, não delimitando a questão constitucional no regime de contratação, se celetista ou estatutário. Assim como, não o fez com relação a quem contratou, se a Administração Pública Direta ou Indireta. Portanto, a tese jurídica restou fixada de forma ampla, sobretudo porque considerou as características da decisão prolatada sob a sistemática da repercussão geral, a saber: os efeitos vinculantes, erga omnes e de transcendência subjetiva ao interesse das partes. Deve ser ressaltado, porém, que o resultado dos julgamentos dos Recursos Extraordinários n° 596.478 e 705.140 garantiram às pessoas contratadas, sem concurso público, pela Administração Pública, apenas o direito ao depósito/levantamento do FGTS, previsto no Art. 19-A da Lei 8.036/90 e ao saldo de salário, considerando, para tanto, a nulidade do contrato por violação das hipóteses contidas no art.37, §2º da CF/88, a exemplo do que já fora antes deliberado nos precedentes do STF: AG. REG. NO RE 830.962/MG; AG. REG. NO RE COM AG. 736.523/MS; AG. REG. NO RE 863.125/MG; ARE 867.655/MS e RE 863125/MG. Sobre o tema tratado, inclusive, pacificando a questão de uma vez por todas no âmbito deste Tribunal, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 960.708/PA, em caso específico do Estado do Pará, de relatoria da MIN. CÁRMEN LÚCIA, decidiu que: reconhecida a nulidade da contratação temporária do recorrido, na linha da jurisprudência deste Supremo Tribunal, deve aplicar o art. 19-A da Lei nº 8.036/1990 e assegurar o pagamento do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço. Eis a ementa do julgado: ¿ AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. PRESCRIÇÃO. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA N. 282 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA. DIREITO AO DEPÓSITO DO FUNDO DE GARANTIA POR TEMPO DE SERVIÇO. PRECEDENTES. CONTRARRAZÕES NÃO APRESENTADAS. MAJORAÇÃO DA VERBA HONORÁRIA: IMPOSSIBILIDADE. AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO. (AG.REG no Recurso Extraordinário 960.708/PA. Relatoria MIN. CARMEN LUCIA. Julgado em 09/08/2016, Publicado no DJE de 29/08/2016)¿ No caso dos autos, denota-se que a ora apelante foi contratada como serviço temporário, a partir de 26.03.1993, para prestação de serviço como secretária, tendo sido dispensada em 31.01.2009. A presente ação foi aforada em 02.03.2010. Depreende-se, assim, que é nulo o contrato firmado entre as partes, diante da ocupação de cargo público sem a necessária aprovação em prévio concurso público, e, sendo o posicionamento da nossa mais alta Corte de Justiça o reconhecimento do direito, apenas, ao recebimento do FGTS e do saldo de salário, entendo que a sentença deve ser reformada para se adequar ao entendimento esposado pelo STF, notadamente no que pertine ao fato de que somente é devido pelo Estado do Pará à Sra. Francineide e Silva de Sousa, o depósito do FGTS e eventual saldo de salário, não se incluindo neste qualquer multa e outros consectários de verba trabalhista, tipo: férias proporcionais ou não, acrescidas de 1/3 e 13º proporcional. Logo, para manifestação acerca da possibilidade jurídica do pedido, que não mais subsiste como condição da ação no CPC/2015, parece pertinente que o STF entendeu, sim, pela possibilidade jurídica do pedido da autora. De outro lado, há a observância do prazo prescricional quinquenal, fato, aliás, considerado na sentença recorrida. Mas, reforço isto porque, após a prolação da sentença apelada, o Supremo Tribunal Federal, ao julgar o ARE nº 709.212/DF, de relatoria do Min. Gilmar Mendes, com repercussão geral reconhecida, definiu que o prazo prescricional aplicável para a cobrança das contribuições ao FGTS não depositadas tempestivamente pelos empregadores e tomadores de serviço seria de 05 (cinco) anos e não mais de 30 (trinta) anos. Nesse sentido, verbis: ¿RECURSO EXTRAORDINÁRIO. DIREITO DO TRABALHO. FUNDO DE GARANTIA POR TEMPO DE SERVIÇO (FGTS). COBRANÇA DE VALORES NÃO PAGOS. PRAZO PRESCRICIONAL. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. ART. 7º, XXIX, DA CONSTITUIÇÃO. SUPERAÇÃO DE ENTENDIMENTO ANTERIOR SOBRE PRESCRIÇÃO TRINTENÁRIA. INCONSTITUCIONALIDADE DOS ARTS. 23, § 5º, DA LEI 8.036/1990 E 55 DO REGULAMENTO DO FGTS APROVADO PELO DECRETO 99.684/1990. SEGURANÇA JURÍDICA. NECESSIDADE DE MODULAÇÃO DOS EFEITOS DA DECISÃO. ART. 27 DA LEI 9.868/1999. DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE COM EFEITOS EX NUNC. RECURSO EXTRAORDINÁRIO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.¿ A definição da prescrição quinquenal, em razão da manifestação vinculada do STF, afasta qualquer discussão sobre o tema, elidindo as razões dos recorrentes. Acrescente-se, ainda, que o percebimento do FGTS referente ao período trabalhado não atingido pela prescrição, não sofrerá qualquer acréscimo de multa, conforme restou assentado no RExt nº 705.140/RS, segundo o qual as contraprestações sem concurso pela Administração Pública não geram quaisquer efeitos jurídicos válidos, a não ser o direito à percepção dos salários do período trabalhado (AgRg no ARE 897.969, rel. Min. Mendes) e ao levantamento dos depósitos efetuados no FGTS. Por fim, ressalvo o meu entendimento pessoal deste Relator, uma vez que há algum tempo venho me posicionado no sentido de ser incabível, em caso de vínculo temporário, o recolhimento do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço - FGTS, dado o regime jurídico dos servidores contratados ser de natureza eminentemente administrativa, conforme estabelece a LC n.º 07/1991. Porém, diante do posicionamento adotado pelo Colendo Supremo Tribunal Federal no bojo do AgRg no RE n.º 960.708/PA, no qual restou consignado ser devido o depósito do FGTS em caso de contratação temporária na situação específica do Estado do Pará, mesmo diante do que prevê a Lei Complementar antes mencionada, outra saída não há senão a de reconhecer o direito ao pagamento da verba fundiária. Acerca da verba honorária fixada, entendo correta e razoável o percentual fixado pelo juízo 'a quo' mesmo porque não houve, na decisão recorrida, sucumbência recíproca. E tampouco nesta decisão recursal. Portanto, diante da fundamentação exposta e das decisões proferidas pelo Colendo Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE n.º 596.478/RR-RG, sob a sistemática da repercussão geral, e do AgRgRE n.º 960.708/PA, entendo necessário observar os artigos 932, IV, b do CPC/2015 e 133, XI, b e d do Regimento Interno deste Tribunal. Ante o exposto, com fulcro no artigo 932, inciso IV, alínea b, do CPC/2015 e artigo 133, inciso XI, alíneas b e d, do RITJE/PA, nego provimento aos recursos de apelação interpostos pelos litigantes. Em sede de reexame necessário, reformo parcialmente a decisão apelada no sentido de afastar a incidência de qualquer outra verba que não seja o depósito do FGTS e saldo de salário, reconhecendo, portanto, devido o FGTS e salário ou saldo deste, conforme RE 596.478/RR (Tema 191) e RE 705.140/RS (Tema 308), e ainda reforçar a incidência do prazo prescricional de 5 (cinco) anos nos moldes do art. 7º, inciso XXIX, da CF/88 (ARE nº 709.212/DF). Mantida a verba honorária fixada em 10% Juros e correção monetária a serem apurados na forma legal a quando da execução do julgado. Após o decurso do prazo recursal sem qualquer manifestação, certifique-se o trânsito em julgado e dê-se a baixa no LIBRA. Belém, 08 de janeiro de 2018. Des. LUIZ GONZAGA DA COSTA NETO Relator
(2018.00023450-34, Não Informado, Rel. LUIZ GONZAGA DA COSTA NETO, Órgão Julgador 2ª TURMA DE DIREITO PÚBLICO, Julgado em 2018-01-16, Publicado em 2018-01-16)Decisão
DECISÃO MONOCRÁTICA
Data do Julgamento
:
16/01/2018
Data da Publicação
:
16/01/2018
Órgão Julgador
:
2ª TURMA DE DIREITO PÚBLICO
Relator(a)
:
LUIZ GONZAGA DA COSTA NETO
Número do documento
:
2018.00023450-34
Tipo de processo
:
Apelação
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