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Jurisprudência


TJPA 0000197-59.2003.8.14.0035

Ementa
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ PROCESSO Nº 00001975920038140035 ÓRGÃO JULGADOR: 2ª TURMA DE DIREITO PÚBLICO RECURSO: APELAÇÃO COMARCA: ÓBIDOS (VARA ÚNICA) APELANTE: MUNICÍPIO DE ÓBIDOS (ADVOGADO: MÁRCIO LUIZ DE ANDRADE CARDOSO - OAB/PA Nº 13.028) APELADO: JOSÉ SOARES GUIMARÃES (ADVOGADA: GLÁUCIA MEDEIROS DA COSTA - OAB/PA Nº 9596) RELATOR: DES. LUIZ GONZAGA DA COSTA NETO APELAÇÃO CIVEL. PAGAMENTO DE VERBAS RESCISÓRIAS A SERVIDOR TEMPORÁRIO. RECONHECIMENTO DA NULIDADE DO CONTRATO. DECISÃO EM PARTE CONTRÁRIA AO ENTENDIMENTO DO STF PELA SISTEMÁTICA DA REPERCUSSÃO GERAL (RE 705.140, RE 596.478 e RE 765.320). DIREITO APENAS AO FGTS E SALDO DE SALÁRIO. REFORMA DA CONDENAÇÃO AO PAGAMENTO DE 13º SALÁRIO. RECONHECIMENTO DA SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS EM LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. 1. O contrato nulo firmado entre a Administração Pública e servidor temporário por sofrer prorrogações sucessivas e não ser precedido de concurso público não produz efeitos quanto ao pagamento de férias e 13º salário, sendo devido tão somente o pagamento do salário correspondente aos dias trabalhados. 2. Decisão em parte contrária ao entendimento do Supremo Tribunal Federal, no julgamento vinculante dos Recursos Extraordinários 705.140 (Tema 308) e 596.478 (Tema 191), pela sistemática da repercussão geral, nos quais restou fixada a tese de que os únicos efeitos jurídicos decorrentes da declaração de nulidade da contratação de pessoal pela Administração são o direto ao FGTS e ao saldo de salário. Deste modo, indevida a condenação ao pagamento de 13º salário do ano de 2000. 3. Decisão mais recente do C. STF, também, pela sistemática da Repercussão Geral, no julgamento do RE 765.320 (Tema 916), publicada no DJE de 23/09/2016, reafirmou a jurisprudência para reconhecer tão somente o direito à percepção dos salários referentes ao período trabalhado ao trabalhador temporário com contrato nulo. 4. Pedido de inversão do ônus da sucumbência não acolhido. Reconhecimento da sucumbência recíproca ante a reforma parcial do julgado. Os honorários advocatícios deverão ser fixados de maneira proporcional na liquidação desta decisão, com fundamento no art. 85, §4º, II, do CPC/2015. 5. Apelação conhecida e parcialmente provida. DECISÃO MONOCRÁTICA            Trata-se de APELAÇÃO CÍVEL interposta pelo MUNICÍPIO DE ÓBIDOS, nos autos da ação de cobrança ajuizada por JOSÉ SOARES GUIMARÃES, contra decisão do juízo da vara única da comarca de Óbidos, que julgou parcialmente procedente o pedido, nos termos do seguinte dispositivo: ¿Diante do exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE os pedidos constantes petição inicial proposta por JOSÉ SOARES GUIMARÃES, para em consequência condenar o MUNICÍPIO DE ÓBIDOS a pagar às parcelas remuneratórias pleiteadas em juízo, descontados a contribuição previdenciária e IR, consistente em pagamento dos salários dos meses de novembro e dezembro de 2000, correspondente ao valor de R$ 906,00 (novecentos e seis reais), assim como o 13º salário do ano de 2000, totalizando o valor de R$ 1.359,00 (mil trezentos e cinquenta e nove reais), acrescidos de correção monetária e juros moratórios, para cada um dos autores. (...) Fixo honorários advocatícios em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da condenação, patamar que se mostra adequado a remunerar o trabalho desenvolvido, atendendo, assim, aos critérios estabelecidos no art. 20, §§ 3º e 4º do CPC¿.            Por meio da decisão apelada, o magistrado sentenciante afastou a competência da justiça trabalhista para julgamento da demanda, e, no mérito, entendeu que no caso em tela o contrato de trabalho celebrado com o apelado sem concurso público deve produzir efeitos regulares até a decretação de sua nulidade, sendo devidas todas as verbas salariais e os consectários legais, restando provado que o apelante não realizou os pagamentos devidos.            Em seu apelo, o Município de Óbidos sustenta a necessidade de reforma da sentença, sob o fundamento de que a nulidade do contrato de trabalho celebrado entre as partes possui efeitos ex tunc, com o pagamento apenas dos dias efetivamente trabalhados, sendo incabível, pois, o pagamento de toda e qualquer verba adicional, em especial à postulada na inicial e reconhecida na sentença referente ao pagamento de 13º salário.            Diante dessas razões, requer o conhecimento e provimento do apelo, a fim de reformar a sentença de 1º grau, julgando totalmente improcedente a ação, haja vista a existência de contrato nulo, com a inversão do ônus da sucumbência, condenando o Recorrido nas custas, despesas e honorários advocatícios na base de 10% (dez por cento) sobre o valor da causa.            Contrarrazões apresentadas às fls. 93/95. O apelo foi recebido no duplo efeito (fl. 96).            Regularmente distribuído o feito à minha relatoria, determinei a remessa ao Ministério Público de 2º Grau que na manifestação de fls. 103/105 entendeu desnecessária sua intervenção.            É o relatório. Decido.            O recurso preenche os requisitos para sua admissibilidade, razão pela qual, conheço e passo a decidir.            Compulsando os autos, verifico que merece parcial provimento o apelo, eis que a sentença apelada, no que tange à condenação ao pagamento de 13º salário do ano de 2000, se apresenta contrária ao entendimento do Supremo Tribunal Federal em julgamento vinculante pela sistemática da Repercussão Geral.             O C. STF ao julgar os Recursos Extraordinários nºs 596.478/RR e 705.140/RS, responsáveis pelos temas 191 e 308 da repercussão geral, respectivamente, reconheceu o direito aos depósitos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) aos trabalhadores que tiveram o contrato de trabalho com a Administração Pública declarado nulo em função de inobservância da regra do art. 37, §2º, da Constituição Federal, que estabelece a necessidade de prévia aprovação em concurso público, restando, ao final, assentado o entendimento pelo direito tão somente ao FGTS e ao saldo de salário a esses contratos considerados nulos.            As ementas dos recursos antes mencionados têm o seguinte teor: ¿Recurso extraordinário. Direito Administrativo. Contrato nulo. Efeitos. Recolhimento do FGTS. Artigo 19-A da Lei nº 8.036/90. Constitucionalidade. 1. É constitucional o art. 19-A da Lei nº 8.036/90, o qual dispõe ser devido o depósito do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço na conta de trabalhador cujo contrato com a Administração Pública seja declarado nulo por ausência de prévia aprovação em concurso público, desde que mantido o seu direito ao salário. 2. Mesmo quando reconhecida a nulidade da contratação do empregado público, nos termos do art. 37, § 2º, da Constituição Federal, subsiste o direito do trabalhador ao depósito do FGTS quando reconhecido ser devido o salário pelos serviços prestados. 3. Recurso extraordinário ao qual se nega provimento. (STF. Recurso Extraordinário nº 596.478/RR. Redator para acórdão MINISTRO DIAS TOFFOLI. Julgado em 13/07/2012)¿ ¿ CONSTITUCIONAL E TRABALHO. CONTRATAÇÃO DE PESSOAL PELA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA SEM CONCURSO. NULIDADE. EFEITOS JURÍDICOS ADMISSÍVEIS EM RELAÇÃO A EMPREGADOS: PAGAMENTO DE SALDO SALARIAL E LEVANTAMENTO DE FGTS (RE 596.478 - REPERCUSSÃO GERAL). INEXIGIBILIDADE DE OUTRAS VERBAS, MESMO A TÍTULO INDENIZATÓRIO. 1. Conforme reiteradamente afirmado pelo Supremo Tribunal Federal, a Constituição de 1988 reprova severamente as contratações de pessoal pela Administração Pública sem a observância das normas referentes à indispensabilidade da prévia aprovação em concurso público, cominando a sua nulidade e impondo sanções à autoridade responsável (CF, art. 37, § 2º). 2. No que se refere a empregados, essas contratações ilegítimas não geram quaisquer efeitos jurídicos válidos, a não ser o direito à percepção dos salários referentes ao período trabalhado e, nos termos do art. 19-A da Lei 8.036/90, ao levantamento dos depósitos efetuados no Fundo de Garantia por Tempo de Serviço - FGTS. 3. Recurso extraordinário desprovido. (STF. Recurso Extraordinário nº 705.140/RS. Relator MINISTRO TEORI ZAVASCKI. Julgado em 28/08/2014)¿            Acerca da matéria, bem elucidativo é o voto proferido pelo Ministro TEORI ZAVASCKI, nos autos do RExt nº 705.140/RS, nestes termos: ¿A Constituição de 1988 comina de nulidade as contratações de pessoal pela Administração Pública sem a observância das normas referentes à indispensabilidade da prévia aprovação em concurso público (CF, art. 37, § 2º), não gerando, essas contratações, quaisquer efeitos jurídicos válidos em relação aos empregados contratados, a não ser o direito à percepção dos salários referentes ao período trabalhado e, nos termos do art. 19-A da Lei 8.036/90, ao levantamento dos depósitos efetuados no Fundo de Garantia por Tempo de Serviço - FGTS.¿            Assim, entendeu-se que o contrato nulo produz efeitos até que seja decretada a sua nulidade, sendo, portanto, o dispositivo mencionado, regra de transição a qual deve ser aplicada de maneira a não prejudicar a parte que agiu de boa-fé ao ser contratada, que prestou diligentemente seus serviços, prestigiando-se a dignidade da pessoa humana e o valor social do trabalho (art. 1º, III e IV, da CRFB).            Ressalto, por oportuno, que as decisões do STF, nos Recursos Extraordinários n° 596.478 e 705.140, fazem referência à pessoa contratada pela Administração Pública sem concurso público, não delimitando a questão constitucional no regime de contratação, se celetista ou estatutário. Assim como, não o fez com relação a quem contratou, se a Administração Pública Direta ou Indireta.            Portanto, a tese jurídica restou fixada de forma ampla, sobretudo porque considerou as características da decisão prolatada sob a sistemática da repercussão geral, a saber: os efeitos vinculantes, erga omnes e de transcendência subjetiva ao interesse das partes.            Deve ser ressaltado, porém, que o resultado dos julgamentos dos Recursos Extraordinários n° 596.478 e 705.140 garantiram às pessoas contratadas, sem concurso público, pela Administração Pública, apenas o direito ao depósito/levantamento do FGTS, previsto no Art. 19-A da Lei 8.036/90 e ao saldo de salário, considerando, para tanto, a nulidade do contrato por violação das hipóteses contidas no art.37, §2º da CF/88, a exemplo do que já fora antes deliberado nos precedentes do STF: AG. REG. NO RE 830.962/MG; AG. REG. NO RE COM AG. 736.523/MS; AG. REG. NO RE 863.125/MG; ARE 867.655/MS e RE 863125/MG.            Ademais, sobre o tema, em decisão mais recente, também, pela sistemática da Repercussão Geral, no julgamento do RE 765.320 (Tema 916), publicada no DJE de 23/09/2016, reafirmou sua jurisprudência para reconhecer tão somente o direito à percepção dos salários referentes ao período trabalhado, nos termos da seguinte ¿ ADMINISTRATIVO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. SERVIDOR PÚBLICO CONTRATADO POR TEMPO DETERMINADO PARA ATENDIMENTO DE NECESSIDADE TEMPORÁRIA DE EXCEPCIONAL INTERESSE PÚBLICO. REQUISITOS DE VALIDADE (RE 658.026, REL. MIN. DIAS TOFFOLI, DJE DE 31/10/2014, TEMA 612). DESCUMPRIMENTO. EFEITOS JURÍDICOS. DIREITO À PERCEPÇÃO DOS SALÁRIOS REFERENTES AO PERÍODO TRABALHADO E, NOS TERMOS DO ART. 19-A DA LEI 8.036/1990, AO LEVANTAMENTO DOS DEPÓSITOS EFETUADOS NO FUNDO DE GARANTIA DO TEMPO DE SERVIÇO - FGTS. 1. Reafirma-se, para fins de repercussão geral, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal no sentido de que a contratação por tempo determinado para atendimento de necessidade temporária de excepcional interesse público realizada em desconformidade com os preceitos do art. 37, IX, da Constituição Federal não gera quaisquer efeitos jurídicos válidos em relação aos servidores contratados, com exceção do direito à percepção dos salários referentes ao período trabalhado e, nos termos do art. 19-A da Lei 8.036/1990, ao levantamento dos depósitos efetuados no Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS. 2. Recurso extraordinário a que se dá parcial provimento, com o reconhecimento da repercussão geral do tema e a reafirmação da jurisprudência sobre a matéria.  (RE 765320 RG, Relator(a): Min. TEORI ZAVASCKI, julgado em 15/09/2016, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-203 DIVULG 22-09-2016 PUBLIC 23-09-2016)¿            No caso dos autos, denota-se que o apelado foi contratado como servidor temporário para o cargo de agente administrativo e que não recebeu algumas parcelas referentes ao período de 1999 a 2000. A presente ação foi aforada em 01/10/2003, requerendo o pagamento de salários atrasados de novembro e dezembro de 2000 (em dobro) e 13º salário de 2000 (em dobro).            Depreende-se, assim, que é nulo o contrato firmado entre as partes, diante da ocupação de cargo público sem a necessária aprovação em prévio concurso público e fora dos ditames legais acerca da contratação temporária, e, sendo o posicionamento da nossa mais alta Corte de Justiça pelo reconhecimento do direito apenas ao recebimento do FGTS e do saldo de salário, a decisão apelada está, nesse ponto, em dissonância com os precedentes do STF sobre o tema.            Verifico, também, que não houve pedido referente ao FGTS na inicial, ressalvando-se, no entanto, que já está assentado pelo STF o direito do temporário cujo contrato é nulo ao depósito de FGTS e saldo de salário (RE Nº 596.478/RR-RG (TEMA 191) e RE Nº 705.140/RS-RG (TEMA 308).            Desse modo, considerando que a contratação do autor se estendeu ao longo dos anos, não tendo sido observados os permissivos constitucionais do art. 37, IX da CF, deve ser mantida a declaração de nulidade de sua contratação temporária, porém entendo que a sentença deve ser em parte reformada, excluindo-se da condenação o pagamento de 13º salário de 2000, conforme entendimento firmado no RE nº 705140 e RE nº 596.478.            Verifico, também, que o Juízo de 1º Grau condenou o apelante ao pagamento de honorários advocatícios em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da condenação, contudo, ante o reconhecimento da nulidade do contrato e a consequente reforma da sentença para exclusão da condenação ao pagamento de 13º salário, subsistindo apenas a condenação ao pagamento de salários retidos, deve ser reconhecida a ocorrência de sucumbência recíproca, incidindo no caso, o art. 85, §4º, II e §14, do CPC/2015, que dispõe:  ¿Art. 85.  A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor. (...) § 3o Nas causas em que a Fazenda Pública for parte, a fixação dos honorários observará os critérios estabelecidos nos incisos I a IV do § 2o e os seguintes percentuais: (...) § 4o Em qualquer das hipóteses do § 3o: (...) II - não sendo líquida a sentença, a definição do percentual, nos termos previstos nos incisos I a V, somente ocorrerá quando liquidado o julgado; (...) § 14. Os honorários constituem direito do advogado e têm natureza alimentar, com os mesmos privilégios dos créditos oriundos da legislação do trabalho, sendo vedada a compensação em caso de sucumbência parcial. ¿            Assim, diante da existência de sucumbência recíproca, ambas partes devem arcar com os honorários advocatícios, cujo percentual deve ser fixado na fase de liquidação desta decisão.             Portanto, diante da fundamentação exposta e das decisões proferidas pelo Colendo Supremo Tribunal Federal no julgamento dos REs n.º 596.478, 705.140 e 765.320, sob a sistemática da repercussão geral, entendo necessário observar os artigos 932, V, b do CPC/2015 e 133, XII, b e d do RITJEPA.            Ante o exposto, com fulcro no artigo 932, inciso V, alínea b, do CPC/2015 e artigo 133, inciso XII, alíneas b e d, do RITJE/PA, conheço do recurso de apelação e dou parcial provimento para afastar a condenação ao pagamento do 13º salário do ano de 2000, bem como para reconhecer, via de consequência a ocorrência da sucumbência recíproca para que os honorários sejam fixados em fase de liquidação da decisão, nos termos da fundamentação.          Após o decurso do prazo recursal sem qualquer manifestação, certifique-se o trânsito em julgado e dê-se a baixa no LIBRA.          Belém, 03 de agosto de 2018.             Des. LUIZ GONZAGA DA COSTA NETO             Relator (2018.03225151-65, Não Informado, Rel. LUIZ GONZAGA DA COSTA NETO, Órgão Julgador 2ª TURMA DE DIREITO PÚBLICO, Julgado em 2018-08-14, Publicado em 2018-08-14)
Decisão
DECISÃO MONOCRÁTICA

Data do Julgamento : 14/08/2018
Data da Publicação : 14/08/2018
Órgão Julgador : 2ª TURMA DE DIREITO PÚBLICO
Relator(a) : LUIZ GONZAGA DA COSTA NETO
Número do documento : 2018.03225151-65
Tipo de processo : Apelação
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