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Jurisprudência


TJPA 0000423-46.2012.8.14.0301

Ementa
DECISÃO MONOCRÁTICA            Trata-se de APELAÇÃO CÍVEL, interposta por MÔNACO MOTOCENTER COMERCIAL LTDA, devidamente representada por seu advogado habilitado nos autos, com fundamento nos art. 513 e s.s. do CPC, contra sentença prolatada pelo Douto Juízo de direito da 8ª Vara Cível e Empresarial de Belém, consoante as fls. 138/148, que nos autos da Ação de Rescisão de Contrato C/C Indenização Por Danos Morais, processo nº 0000423-46.2012.8.14.0301, movida por RAIDELENE SALES ABDON.            Em síntese, na exordial, a autora aduziu ter firmado contrato de compra e venda com a requerida para aquisição da motocicleta especificada nos autos. Contudo, após mais de 15 (quinze) dias de firmado o negócio a requerente foi informada que a empresa não dispunha naquela ocasião de uma motocicleta com as características desejadas, e por esta razão estava sendo-lhe oferecida nova proposta de um produto similar, porém com especificações diversas.            Após mais de 30 dias de espera sem receber a motocicleta, a autora compareceu a loja da empresa ré para desfazer o negócio jurídico firmado, sendo então, de pronto, ressarcida do montante pago a título de ¿sinal¿, no valor de R$ 700,00 (setecentos reais), com a promessa de que o contrato seria cancelado. Todavia, em que pese ter sido desfeito o negócio pelo não cumprimento do que fora contratado, a autora passou a ser cobrada pela instituição financeira os valores do contrato, fato este ensejou a negativação do seu nome junto ao SPC e SERASA, como também a propositura de uma ação de busca e apreensão em seu desfavor.            Em sentença de fls. 138/148, o juízo monocrático julgou procedente o pedido formulado na inicial, na forma do art. 269, I, do CPC, declarando a rescisão do contrato de compra e venda firmado e fixando o pagamento de R$ 8.000,00 (oito mil reais) a título de indenização por danos morais.             Irresignado com a sentença, a Mônaco Motocenter interpôs o presente recurso (fls. 151/154), argumentando em síntese, que não houve ato ilícito da empresa requerida, uma vez que o contrato foi validado com a entrega do veículo, contradizendo o sustentado na inicial, pelo que não haveria dano moral a ser indenizado. Pleiteou ao final, a reforma da decisão, ou, caso haja entendimento diverso, requereu a minoração do valor definido, acreditando ser este exorbitante e ultrapassar o caráter punitivo ao causador da ofensa, bem como, requereu a minoração do valor arbitrado a título de honorários advocatícios.             A apelação foi recebida em seu duplo efeito às fls. 166.             Não houve contrarrazões. (fls. 168)            Coube-me a relatoria do feito por distribuição. (fls. 171)            É o Relatório do essencial.            DECIDO            Consigno que o presente recurso será analisado com base no Código de Processo Civil de 1973, nos termos do art. 14 do CPC/2015 e entendimento firmado no Enunciado 1, deste Egrégio Tribunal.            Isto posto, presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço o recurso e passo a decidi-lo monocraticamente, com espeque no art. 557, do CPC.              O inconformismo da parte recorrente refere-se ao fato de ter sido responsabilizada civilmente pela prática de ato ilícito, qual seja a negativação indevida da parte recorrida no cadastro de inadimplentes, bem como, deferida a rescisão contratual do contrato de compra e venda.            Em se tratando de responsabilidade civil, o Código Civil de 2002 assim regula a matéria em seus arts. 186 e 927, os quais colaciono ''in verbis'': Art. 186. Aquele que por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito. Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.             No caso em tela, não verifico razões para reforma da sentença atacada, uma vez que o autor demonstrou o direito alegado, com a apresentação dos documentos na inicial, que demonstram que seu nome foi negativado nos cadastros de proteção ao crédito, sofrendo inclusive ação de busca e apreensão de um bem que nunca chegou a possuir.             De outra ponta, deferido o pedido de inversão do ônus da prova à consumidora, o que é perfeitamente aplicável no caso, por se tratar de típica relação consumerista, onde constata-se a falha na prestação de um serviço oferecido pela empresa requerida. Assim, tratando-se de relação de consumo, o CDC estabelece a responsabilidade objetiva dos fornecedores de serviço pelos danos causados ao consumidor pela má prestação de seus serviços.             In casu, a empresa requerida não conseguiu desincumbir-se do ônus de provar a existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor, nos termos do inciso II, do art. 333, do CPC.             A apelante deixou de demonstrar, principalmente, que a motocicleta objeto do contrato de financiamento foi entregue para a apelada. Embora a empresa requerida, tenha comprovado que realizou todos os tramites atinentes ao contrato e a liberação do veículo, como emplacamento (realizado dentro da própria concessionária), não conseguiu provar algo simples e de extrema relevância para a solução da lide, que seria a entrega da motocicleta para a proprietária.             De outra ponta, embora tenha sido garantido pelo preposto da empresa requerida, que cancelaria o contrato de compra e venda e por, consequência, o contrato de financiamento, a autora, desde 29/09/2009, vem recebendo correspondências de cobrança, notificações de inclusão do seu nome nos cadastros de proteção ao crédito (fls. 19,20,32), e tornou-se ré na ação de busca e apreensão de veículo o qual demonstrou nunca ter tido a posse (processo nº 0055129-60.2009.8.14.0301, que tramitou perante a 8ª Vara Cível de Belém)             A respaldar os fatos narrados pela autora, não contraditados pela requerida, constam nos autos o registro do depoimento do Sr. Luiz Carlos Pardal Filho, supervisor de vendas da Mônaco Motocenter na época, prestados perante a autoridade policial, onde afirmou estar ciente que o vendedor Michel havia devolvido para a Sra. Raidelene o valor dado a título de entrada para o financiamento e que a mesma não chegou a ter posse da moto.             Tais declarações perante a autoridade policial, somente solidificam a falha no serviço prestado, pois o contrato de financiamento deveria ter sido cancelado no momento da desistência da consumidora, ante o não cumprimento do avençado pelas partes, porém não o foi, gerando as cobranças indevidas.             De outro modo, o Apelante, ao juntar aos autos os documentos de fls. 70/91 conseguiu apenas demonstrar a intenção inicial das partes em firmar o negócio jurídico, sem, contudo, provar a inocorrência dos fatos aludidos, ou a inexistência de nexo de causalidade.             Ao que se sabe, é de praxe que empresas como a recorrente, Mônaco Motocenter, ao fazer a cessão do bem avençado mediante contrato de compra e venda, solicite assinatura do adquirente ao tempo da entrega confirmando que o objeto em questão encontra-se em perfeito estado, sem avarias, ou quaisquer danos que por ventura possam ocorrer. Esta prática muito comum respalda o cedente ou o vendedor de eventuais ações indenizatórias, como no presente caso.             Acrescente-se, que a demanda ora em apreciação é de índole consumerista e, como tal, a responsabilidade civil é objetiva e regida pelo art. 14, do Código de Defesa do Consumidor, em se tratando de prestação de serviços: Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.             Assim, não há dúvidas quanto o direito da autora em ter rescindido o contrato, nos termos do art. 475, do CC (a parte lesada pelo inadimplemento pode pedir a resolução do contrato, se não preferir exigir-lhe o cumprimento, cabendo, em qualquer dos casos, indenização por perdas e danos.), pois desde o início da avença a empresa requerida é inadimplente, tendo a autora aguardado por mais de 30 dias sem que o contrato fosse cumprido, requerendo por isso, o cancelamento do negócio, o que não foi efetivado pelo apelante.             Verifica-se, portanto, a culpa exclusiva da apelante, que não pode cobrar da apelada o implemento de obrigações, se jamais cumpriu a sua, que seria de entregar a motocicleta, é caso de aplicação do princípio da exceptio non rite adimpleti contractus, nos termos do art. 476, do CC, que dispõe: Art. 476. Nos contratos bilaterais, nenhum dos contratantes, antes de cumprida a sua obrigação, pode exigir o implemento da do outro.             Assim, acertou a sentença de primeiro grau em declarar rescindido o contrato de compra e venda firmado entre as partes.             Nesse sentido: CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE CONHECIMENTO. CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE VEÍCULO E DE FINANCIAMENTO DE VEÍCULO. EXISTÊNCIA DE GRAVAME ANTERIORMENTE REGISTRADO EM FAVOR DE TERCEIRO. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA ENTRE A REVENDEDORA E A INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA. DESFAZIMENTO DO NEGÓCIO JURÍDICO. RESTITUIÇÃO DOS VALORES PAGOS PELA ADQUIRENTE DO BEM. 1. Tendo em vista que o contrato de financiamento e o contrato de compra e venda de veículo automotor guardam relação de interdependência, deve a instituição financeira responder solidariamente com a concessionária pelos vícios do produto, nos termos do artigo 18, caput, da Lei 8.078/90. 2. Tendo em vista que o negócio jurídico foi rescindido por falha na prestação dos serviços por parte da revendedora e da instituição financeira, mostra-se correta a imposição da obrigação de restituir o montante pago pela parte autora, sem quaisquer ônus, corrigido monetariamente e acrescido de juros de mora. (TJDF - 20070710200358APC (0006983-81.2007.8.07.0007); 3ª TURMA CÍVEL; Desembargadora NÍDIA CORRÊA LIMA; Acórdão: 817387; Publicação: 10/09/2014) APELAÇÃO. COMPRA E VENDA DE VEÍCULO ZERO QUILÔMETRO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL E LUCROS CESSANTES. ATRASO INJUSTIFICADO NA ENTREGA DO VEÍCULO, CONTRARIANDO A TRATATIVA DE NEGOCIAÇÃO FORMULADA EM PROPOSTA ACEITA PELA AUTORA. DECLARAÇÃO DE VONTADE QUE TEM FORÇA VINCULATÓRIA. INTELIGÊNCIA DO ART. 427 DO CC. RECURSOS IMPROVIDOS. (TJSP - APL 1006406-53.2013.8.26.0361; Relator: Adilson de Araújo; Julgamento: 24/03/2015; 31ª Câmara de Direito Privado) CONTRATO DE COMPRA E VENDA. VEÍCULO. INADIMPLEMENTO. ATRASO NA ENTREGA. DESISTÊNCIA. MULTA. I - A multa prevista no contrato para a hipótese de desistência ou cancelamento não é atribuível à autora, pois a ré foi culpada pelo inadimplemento contratual por não ter entregado o veículo no prazo convencionado. II - Apelação desprovida. (TJDF - APC 20130110308113, Relatora: VERA ANDRIGHI; Julgamento: 25/03/2015; 6ª Turma Cível)             No que tange ao dever de indenizar, restou claro que houve a injusta negativação do nome da recorrida nos cadastros de serviços de proteção ao crédito.             Como se sabe, em se tratando de responsabilidade objetiva, não se perquire o elemento subjetivo da culpa do agente, cabendo ao autor o ônus de provar a existência de relação de causalidade entre o dano experimentado por si e o ato do agente para que o Estado-juiz possa imputar ao perpetrador do dano o dever de indenizar, pelo que o ato ilícito cometido pelo banco configura caso de dano moral ''in re ipsa'' (prescinde da prova de culpa).             Seguindo as mesmas premissas acima expostas, o Superior Tribunal de Justiça já assentou o posicionamento no sentido de que a inscrição indevida em cadastro negativo de crédito, por si só, configura dano in re ipsa, conforme julgado representativo que colaciono a seguir: AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS. DANOS CAUSADOS POR FRAUDES OU DELITOS PRATICADOS POR TERCEIROS. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. INSCRIÇÃO INDEVIDA EM CADASTRO DE INADIMPLENTES. DANO IN RE IPSA. QUANTUM INDENIZATÓRIO. RAZOABILIDADE. AGRAVO IMPROVIDO. 1. No julgamento do Recurso Especial Repetitivo nº 1.197.929/PR (Rel. Min. Luis Felipe Salomão, DJe de 12/9/2011), processado nos moldes do art. 543-C do CPC, foi firmado o entendimento de que ''as instituições bancárias respondem objetivamente pelos danos causados por fraudes ou delitos praticados por terceiros - como, por exemplo, abertura de conta-corrente ou recebimento de empréstimos mediante fraude ou utilização de documentos falsos -, porquanto tal responsabilidade decorre do risco do empreendimento, caracterizando-se como fortuito interno". 2. Está pacificado nesta eg. Corte que a inscrição indevida em cadastro negativo de crédito, por si só, configura dano in re ipsa. 3. É pacífico o entendimento desta eg. Corte de Justiça de que o valor estabelecido pelas instâncias ordinárias pode ser revisto nas hipóteses em que a condenação se revelar irrisória ou exorbitante, distanciando-se dos padrões de razoabilidade, o que não se verifica no presente caso, em que foi fixado o montante de R$ 10.000,00, a título de danos morais, decorrente de inscrição indevida em cadastro de inadimplentes. 4. Agravo regimental improvido (grifo nosso). AgRg no AREsp 722226 / MG, AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL 2015/0132978-7; Relator(a): Ministro RAUL ARAÚJO (1143); Órgão Julgador: T4 - QUARTA TURMA; Data do Julgamento: 17/03/2016; Data da Publicação/Fonte DJe 12/04/2016.             Assim, constatado o dano moral causado a autora, a de se verificar se o quantum arbitrado pelo magistrado de piso, satisfaz não só o objetivo de compensação da vítima pelos abalos suportados, mas também a intenção de punição do agressor (caráter pedagógico e desestimulador da ocorrência de novos ilícitos pelo agente causador do dano).             O caráter pedagógico e desestimulador do ilícito tem sido largamente utilizado e reconhecido pelos Tribunais pátrios diante da premente necessidade de inibir a reiteração de condutas semelhantes.             A ideia inserta nisso tudo é a de que fornecedor de serviços/empresas/empresários reflitam e desenvolvam mecanismos que, se não puderem evitar a falha ocorrida no serviço prestado, ao menos permita que ela não se maximize tanto, ao ponto de desaguar no Poder Judiciário. Certamente, um melhor serviço de atendimento ao consumidor e a adoção de medidas conciliatórias e preventivas do conflito, evitariam inúmeras demandas nesta esfera de Poder.             Adotando-se as premissas axiológicas acima descritas, entendo que o ''quantum'' indenizatório arbitrado a título de dano moral no montante de R$ 8.000,00 (seis mil reais) foi escorreito, já que tal valor não tem o condão de conduzir ao enriquecimento ilícito da beneficiada e serve ainda, para desestimular a conduta do banco requerido.             Relativamente à condenação da parte requerida ao pagamento de 20% (vinte por cento) do valor da condenação a título de honorários advocatícios, a sentença recorrida também não merece qualquer reparo, dada a manutenção das condenações acima expostas e porque o quantum fora arbitrado de forma equitativa pelo juízo de primeiro grau. Aliás, trata-se de causa cuja a condenação não é deveras vultosa a ponto de tornar desarrazoado o valor fixado, e ante o fato de estar o advogado diligenciando e acompanhando o referido processo há aproximadamente 5 (cinco) anos. Pelo que entendo, que o valor fixado está de acordo com as diretrizes elencadas nos §§ 3º e 4º, do art. 20 do CPC, não havendo razões para sua reforma.             ANTE O EXPOSTO, CONHEÇO DO RECURSO, porém NEGO-LHE SEGUIMENTO, para manter a sentença recorrida em sua totalidade, tudo nos termos e limites da fundamentação lançada, que passa a integrar o presente dispositivo como se nele estivesse totalmente transcrita.            P.R.I            Servirá a presente decisão como mandado/ofício, nos termos da Portaria nº 3.731/2015-GP.  Belém (PA), 09 de junho de 2016.   Desembargadora EZILDA PASTANA MUTRAN Relatora (2016.02272711-57, Não Informado, Rel. EZILDA PASTANA MUTRAN, Órgão Julgador 2ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA, Julgado em 2016-06-15, Publicado em 2016-06-15)
Decisão
DECISÃO MONOCRÁTICA

Data do Julgamento : 15/06/2016
Data da Publicação : 15/06/2016
Órgão Julgador : 2ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA
Relator(a) : EZILDA PASTANA MUTRAN
Número do documento : 2016.02272711-57
Tipo de processo : Apelação
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