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Jurisprudência


TJPA 0000427-39.2006.8.14.0035

Ementa
3ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA ORIGEM: VARA ÚNICA DE OBIDOS APELAÇÃO CÍVEL Nº 0000427-39.2006.814.0035 APELANTE: MUNICÍPIO DE OBIDOS APELADO: MANOEL JOSÉ SEIXAS ASSUNÇÃO RELATORA: DES. MARIA FILOMENA DE ALMEIDA BUARQUE APELAÇÃO CÍVEL SERVIDOR PÚBLICO CONTRATADO DE FORMA TEMPORÁRIA. POSSIBILIDADE DE CONDENAÇÃO AO PAGAMENTO DOS DEPÓSITOS DE FGTS. CONSTITUCIONALIDADE DO ART. 19-A DA LEI N° 8.036/1990. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. - A discussão de mérito cinge-se à possibilidade de condenação ao pagamento dos depósitos de FGTS a servidor público contratado de forma temporária. - O STF assentou a constitucionalidade do art. 19-A da Lei n° 8.036/1990, com a redação dada pela Medida Provisória (MP) 2.164-41/2001, que prevê o referido pagamento. - APELO IMPROVIDO DECISÃO MONOCRÁTICA            Trata-se de APELAÇÃO CÍVEL interposta por MUNICÍPIO DE OBIDOS, nos autos da Ação Ordinária de Cobrança de Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, movida por MANOEL JOSÉ SEIXAS ASSUNÇÃO, em face da sentença de fls. 101/103 que julgou procedente em parte os pedidos formulados na inicial, para condenar o réu ao pagamento das verbas atinentes aos depósitos no FGTS relativos ao período de em que o contratado prestou serviços ao Poder Público municipal.            Em suas razões (fls.106/110), o Município de Óbidos sustenta que a investidura da parte apelada no serviço público municipal está eivada de vícios, eis que efetivada sem a prévia aprovação em concurso público.            Aduz que a referida contratação é causa de nulidade absoluta e insanável, produzindo como único efeito o pagamento dos dias efetivamente trabalhados, sendo indevido o pagamento de quaisquer verbas adicionais, tais quais o pagamento de FGTS, férias e 13º salário.            Por fim, requer o provimento do recurso e a improcedência da ação proposta.            A parte apelada apresentou contrarrazões (fls. 115/117), alegando que a sentença merece ser mantida integralmente por seus próprios fundamentos, pois as provas constantes nos autos demonstram a procedência do pleito autoral. Pugna pela improcedência do apelo.            Instado a manifestar-se o representante do parquet deixa de emitir parecer (fls. 123/127).            É o relatório.            Decido.            Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso e passo ao exame da matéria em apreço.                         O cerne da demanda gira em torno do cabimento da cobrança de crédito relativo a FGTS contra a Fazenda Pública quando da contratação de servidores temporários.                         No caso dos autos, as provas demonstram que a contratação da parte autora não se deu por concurso público, mas através de contrato temporário em 02/06/2003, pelo prazo de 7 (sete) meses, tendo sido o contrato temporário renovado, sucessivamente, até a sua extinção em 30/09/2005 (fls. 28).                         Inicialmente, cumpre ressaltar que o ingresso no serviço público, segundo o art. 37, II, da Constituição Federal, deve ocorrer por meio de aprovação em concurso público de provas ou de provas e títulos de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração.                         Excepcionalmente, a Administração pode firmar contratos temporários, nos seguintes termos:   IX - A lei estabelecerá os casos de contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público.              Ressalto que a contratação nos termos do inciso IX do art. 37 da Carta Magna, deve ser efetivamente temporária, pois do contrário a prorrogação sucessiva dos referidos contratos desvirtua a excepcionalidade do serviço, violando os princípios que devem reger a Administração Pública.                         Deste modo, em que pese o caráter excepcional da contratação temporária, as provas juntadas aos autos demonstram que o contrato de trabalho da apelante, foi sucessivamente renovado do ano de 2003 até o ano de 2005, ou seja, a contratação temporária, que por essência deveria ser precária ou efêmera, tornou-se, na prática, efetiva.                         Sem dúvida, o expediente adotado pelo apelado é censurável, pois viola os princípios constitucionais que devem governar a atuação administrativa, porquanto é fato inconteste que, regra geral, o acesso ao serviço público deve dar-se pela via do concurso público (art. 37, inc. II, da Constituição Federal).                         Destarte, considerando o desvirtuamento da contratação temporária, haja vista a permanência da parte autora a título precário por mais de 2 anos e meio no serviço público sem a prévia aprovação em concurso público, tem-se que o contrato temporário firmado está eivado de nulidade, merecendo, portanto, o amparo do art. 19-A da Lei n. 8.036/1990.                         Contudo, a despeito de tal irregularidade, não se pode negar ao trabalhador os direitos provenientes do labor realizado, pois aceitar isso seria prestigiar e favorecer aquele que deu causa à ilicitude, em prejuízo ao servidor que, de boa-fé, desempenhou fielmente seu trabalho. E mais, estar-se-ia diante do locupletamento ilícito por parte da Administração Pública caso o ente político deixe de promover a contraprestação pecuniária devida.                         Com efeito, o Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento do RE n. 596.478/RR, reconheceu a existência de repercussão geral da questão atinente à constitucionalidade do art. 19-A, da Lei n. 8.036/90, acrescido pela MP n. 2.164-41, que assegura, ao contratado pela Administração, cujo contrato tenha sido declarado nulo, o direito ao recebimento do FGTS.              Senão vejamos:   Art. 19-A. É devido o depósito do FGTS na conta vinculada do trabalhador cujo contrato de trabalho seja declarado nulo nas hipóteses previstas no art. 37, § 2.º, da Constituição Federal, quando mantido o direito ao salário.              A despeito da matéria, o Supremo Tribunal Federal, em julgamento do Recurso Extraordinário 596.478/RR, após reconhecer a repercussão geral do tema, reconheceu o direito aos depósitos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) aos trabalhadores que tiveram o contrato de trabalho com a Administração Pública declarado nulo em função de inobservância da regra constitucional que estabelece prévia aprovação em concurso público.   RECURSO EXTRAORDINÁRIO. DIREITO ADMINISTRATIVO. CONTRATO NULO. EFEITOS. RECOLHIMENTO DO FGTS. ARTIGO 19-A DA LEI Nº 8.036/90. CONSTITUCIONALIDADE. 1. É constitucional o art. 19-A da Lei nº 8.036/90, o qual dispõe ser devido o depósito do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço na conta de trabalhador cujo contrato com a Administração Pública seja declarado nulo por ausência de prévia aprovação em concurso público, desde que mantido o seu direito ao salário. 2. Mesmo quando reconhecida a nulidade da contratação do empregado público, nos termos do art. 37, § 2º, da Constituição Federal, subsiste o direito do trabalhador ao depósito do FGTS quando reconhecido ser devido o salário pelos serviços prestados. 3. Recurso extraordinário ao qual se nega provimento. (RE 596478, Relator (a): Min. ELLEN GRACIE, Relator (a) p/ Acórdão: Min. DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 13/06/2012, REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-040 DIVULG 28-02-2013 PUBLIC 01-03-2013 EMENT VOL-02679-01 PP-00068).              Assim, entendeu-se que o contrato nulo produz efeitos até que seja decretada a sua nulidade, sendo portanto o dispositivo mencionado, regra de transição a qual deve ser aplicada de maneira a não prejudicar a parte que agiu de boa-fé ao ser contratada, e que prestou diligentemente serviços à administração pública, prestigiando-se o preceituado na Carta Magna referente a dignidade da pessoa humana e o valor social do trabalho (art. 1º, III e IV/CRFB).                         Ratificando este posicionamento, acerca da possibilidade do servidor público contratado temporariamente pela administração pública, sob a égide do regime estatutário, receber FGTS após a declaração de nulidade do contrato, ante as sucessivas prorrogações deste, em função da inobservância da regra constitucional que estabelece prévia aprovação em concurso público, já está sendo decidido monocraticamente pelo Supremo Tribunal Federal, conforme os julgados realizados no ARE 859082 AgR, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, julgado em 24/08/2015, publicado em PROCESSO ELETRÔNICO DJe-173 DIVULG 02/09/2015 PUBLIC 03/09/2015 e no RE 897047, Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA, julgado em 31/08/2015, publicado em DJe-173 DIVULG 02/09/2015 PUBLIC 03/09/2015 e ARE 867655 AgR, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Segunda Turma, julgado em 04/08/2015, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-174 DIVULG 03-09-2015 PUBLIC 04/09/2015.                         Por fim, destaco que o Supremo Tribunal Federal, em recente julgamento do Recurso Extraordinário nº 960.708/PA, interposto pelo Estado do Pará, reconheceu a incidência do art. 19-A da Lei 8.036/1990 e o direito ao recebimento do FGTS quando a contratação temporária for considerada nula devida a sucessivas prorrogações. Senão vejamos: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. PRESCRIÇÃO. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA N. 282 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA NULA. FGTS. INCIDÊNCIA DO ART. 19-A DA LEI N. 8.036/1990. PRECEDENTES. RECURSO EXTRAORDINÁRIO AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO. (RE 960.708, Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA, julgado em 04/05/2016, publicado em PROCESSO ELETRÔNICO DJe-PUBLIC 05/05/2016).            No mesmo sentido, foi o julgamento perante o Superior Tribunal de Justiça do Recurso Especial nº 1.526.043 interposto pelo Estado do Pará.            Assim sendo, resta patente o direito que possui da parte autora ao pagamento dos depósitos de FGTS, ante a declarada constitucionalidade do art. 19-A da Lei n° 8.036/1990.                         A despeito do tema, seguindo a linha de entendimento do C. STF, colaciono os recentes julgados deste E. Tribunal de Justiça, onde reconheceu-se o direito dos trabalhadores temporários, que tiverem seus contratos declarados nulos, ao recebimento da verba de FGTS:              CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO TEMPORÁRIO. CONTRATO POR TEMPO DETERMINADO. ART. 37, IX, DA CF/88. CONSTITUCIONALIDADE DO ART. 19-A DA LEI 8.036/90. RE Nº. 596.478/RR. DIREITO AO RECOLHIMENTO DO FGTS. CONTRATAÇÃO NULA. ART. 37, § 2º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. PRAZO PRESCRICIONAL QUINQUENAL. DECRETO Nº. 20.910/32. AUSÊNCIA DE PRÉVIA APROVAÇÃO EM CONCURSO PÚBLICO. SUCESSIVAS PRORROGAÇÕES. PERMANÊNCIA IRREGULAR NO SERVIÇO PÚBLICO. RELAÇÃO JURÍDICO-ADMINISTRATIVA. FATOR DE DISTINÇÃO (DISTINGUISHING). INSUBSISTÊNCIA. TEORIA DOS PRECEDENTES. RECURSO DE APELAÇÃO CONHECIDO E NEGADO SEGUIMENTO. APLICAÇÃO DO ART. 557, DO CPC.(2015.03608316-70, Não Informado, Rel. CONSTANTINO AUGUSTO GUERREIRO, Órgão Julgador 5ª CAMARA CIVEL ISOLADA, Julgado em 2015-09-28, Publicado em 2015-09-28). APELAÇÃO EM AÇÃO DE COBRANÇA: A NULIDADE DA CONTRATAÇÃO NÃO OBSTA O PAGAMENTO DAS VERBAS SALARIAIS VENCIDAS E NÃO PAGAS - RECONHECIMENTO DO DIREITO AO FGTS - REPERCUSSÃO GERAL NO ÂMBITO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL - JURISPRUDÊNCIA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA - PRESCRIÇÃO NOS MOLDES DO ARE 709212 - PROVIMENTO MONOCRÁTICO - ART. 557, §1°, CPC - DECISÃO MONOCRÁTICA. (2015.03099847-55, Não Informado, Rel. MARIA DE NAZARE SAAVEDRA GUIMARAES, Órgão Julgador 4ª CAMARA CIVEL ISOLADA, Julgado em 2015-08-27, Publicado em 2015-08-27). PROCESSO CIVIL ? ADMINISTRATIVO. CONTRATO TEMPORÁRIO. DISPENSA. ATO DISCRICIONÁRIO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. DIREITO AO DEPÓSITO DO FUNDO DE GARANTIA DO TEMPO DE SERVIÇO. APELAÇÕES IMPROVIDAS 1- A contratação temporária é um ato discricionário da Administração Pública, que verifica a conveniência e a oportunidade, em obediência ao acima descrito. Do mesmo modo, a rescisão do contrato também é um ato discricionário, quando a Administração não vislumbra mais a necessidade de receber os serviços do contratado temporariamente. 2- O Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS é devido aos servidores temporários. (2015.02710683-55, 149.056, Rel. HELENA PERCILA DE AZEVEDO DORNELLES, Órgão Julgador 2ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA, Julgado em 2015-07-27, Publicado em 2015-07-30).                           Ante o exposto, CONHEÇO do presente recurso e NEGO-LHE PROVIMENTO, com fulcro no art. 932, IV, do CPC, para manter inalterada a sentença combatida.                         P.R.I.C.            Belém/PA, 08 de agosto de 2016.   MARIA FILOMENA DE ALMEIDA BUARQUE Desembargadora Relatora (2016.03011376-27, Não Informado, Rel. MARIA FILOMENA DE ALMEIDA BUARQUE, Órgão Julgador 3ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA, Julgado em 2016-08-24, Publicado em 2016-08-24)
Decisão
DECISÃO MONOCRÁTICA

Data do Julgamento : 24/08/2016
Data da Publicação : 24/08/2016
Órgão Julgador : 3ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA
Relator(a) : MARIA FILOMENA DE ALMEIDA BUARQUE
Número do documento : 2016.03011376-27
Tipo de processo : Apelação
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