TJPA 0000430-75.2010.8.14.0068
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ Gabinete da Desa. Vera Araújo de Souza PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ ACÓRDÃO Nº SECRETARIA DA 1ª CÂMARA CRIMINAL ISOLADA. APELA Ç Ã O PENAL PROCESSO Nº 2012.3.026256-5 APELANTE: ANTÔNIO DA SILVA FERREIRA (DEFENSOR PÚBLICO: FRANCISCO JOSÉ PINHO VIEIRA) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO PROCURADORIA DE JUSTIÇA: HEZEDEQUIAS MESQUITA DA COSTA RELATORA: DESª. VERA ARAÚJO DE SOUZA EMENTA: APELAÇÃO CRIMINAL. HOMICÍDIO. ART. 121, §2º, I DO CP. ALEGAÇÃO DE DECISÃO CONTRÁRIA À PROVA DOS AUTOS. IMPROCEDÊNCIA. DECISÃO QUE ENCONTRA ARRIMO NAS PROVAS PRODUZIDAS EM JUÍZO. O ART. 593, INCISO III, ALÍNEA D DO CPP DEVE SER INTERPRETADO COMO REGRA EXCEPCIONAL, CABÍVEL SOMENTE QUANDO NÃO HOUVER, AO SENSO COMUM, MATERIAL PROBATÓRIO SUFICIENTE PARA SUSTENTAR A DECISÃO DOS JURADOS. PREVALECERÁ, CONTUDO, A DECISÃO POPULAR, PARA QUE FIQUE INTEIRAMENTE PRESERVADA A SOBERANIA DOS VEREDICTOS, QUANDO AMPARADA EM UMA DAS VERSÕES RESULTANTES DO CONJUNTO PROBATÓRIO. NÃO ACOLHIMENTO DA ALEGAÇÃO DEFENSIVA. PEDIDO DE FIXAÇÃO DA PENA BASE NO PATAMAR MÍNIMO. ACOLHIMENTO. PENA FIXADA DE FORMA NÃO ESCORREITA PELO MAGISTRADO DE PISO. REANÁLISE DA DOSIMETRIA COM O REDIMENSIONAMENTO DA PENA. RECURSO CONHECIDO E, NO MÉRITO, PARCIALMENTE PROVIDA A PRETENSÃO RECURSAL, PROCEDENDO-SE NOVA DOSIMETRIA DA PENA PARA 12 (DOZE) ANOS DE RECLUSÃO A SER CUMPRIDA EM REGIME INICIALMENTE FECHADO, CONFORME ARTIGO 33, §2º, ¿A¿ E §3º DO CP, PELA PRÁTICA DO CRIME TIPIFICADO NO ART. 121, §2º, I DO ESTATUTO REPRESSIVO. DECISÃO UNÂNIME. Vistos e etc... Acordam os Excelentíssimos Senhores Desembargadores componentes da 1ª Câmara Criminal Isolada, por unanimidade, em conhecer do recurso e dar-lhe parcial provimento, nos termos do voto da Desembargadora Relatora. Sala das Sessões do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, aos dezesseis dias do mês de dezembro de dois mil e quatorze. Julgamento presidido pela Excelentíssima Senhora Desembargadora Vânia Silveira. Belém, 16 de dezembro de 2014. Relatora Desª. VERA ARAÚJO DE SOUZA DESEMBARGADORA SECRETARIA DA 1ª CÂMARA CRIMINAL ISOLADA. APELA Ç ÃO PENAL PROCESSO Nº 2012.3.026256-5 APELANTE: ANTÔNIO DA SILVA FERREIRA (DEFENSOR PÚBLICO: FRANCISCO JOSÉ PINHO VIEIRA) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO PROCURADORIA DE JUSTIÇA: HEZEDEQUIAS MESQUITA DA COSTA RELATORA: DESª. VERA ARAÚJO DE SOUZA R E L A T Ó R I O Trata-se de Apelação Penal interposta por ANTÔNIO DA SILVA FERREIRA, por intermédio da Defensoria Pública, objetivando reformar a sentença proferida pelo Tribunal do Júri da Comarca de Augusto Corrêa/PA (fls. 328/334) que o condenou à pena de 14 (quatorze) anos de reclusão em regime inicialmente fechado pela prática do crime tipificado no artigo 121, parágrafo 2º, inciso I do Código Penal. Narrou à denúncia, bem como o aditamento, que o ora apelante, no dia 11/03/2010, por volta das 20 horas, teria ordenado a morte da vítima (Sr. José Carlos Guimarães do Rosário) por ter-lhe furtado uma certa quantidade de entorpecentes. Explicitou que como vingança, o ora apelante teria mandado ceifar a vida da vítima sob a recompensa de R$ 900 (novecentos reais) prometida aos outros denunciados. Relatou que a vítima fora atingida por tiros, bem como golpes de terçados, vindo posteriormente a óbito. Assim, o Ministério Público Estadual pugnou pela condenação do ora apelante como incurso nas sanções punitivas do artigo 121, parágrafo 2º, incisos I, III e IV do Código Penal. Sentença condenatória prolatada prolata pelo Júri Popular da Comarca de Augusto Corrêa /PA (fls. 328/334), julgando parcialmente procedente a pretensão punitiva estatal , condenando o ora apelante pela prática do crime tipificado no art. 121, §2, inciso I do CPB a pena de 1 4 ( quatorze ) anos de reclusão a ser cumprida inicialmente em regime fechado. Em sede de razões recursais (fls. 371/377), o ora apelante pugnou pela submissão a novo julgamento por ter sido a decisão proferida manifestamente contrária as provas dos autos. Subsidiariamente, requereu a revisão da dosimetria com a fixação da pena base em seu patamar mínimo. Em contrarrazões (fls. 385/389), o Ministério Público requereu a manutenção da sentença objurgada em todos os seus termos. Nesta instância superior, o Procurador de Justiça, Dr. Hezedequias Mesquita da Costa, opinou pelo conhecimento do recurso por preencher os requisitos de admissibilidade, mas, no mérito, pelo seu improvimento (fls. 400/407). É o relatório. Revisão pela Exma. Desa. Vânia Silveira. Passo a proferir o voto. V O T O Atendidos os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso interposto, mormente em relação à adequação e à tempestividade. Não havendo questões preliminares, adentro na análise do mérito recursal. Como tido alhures, trata-se de Apelação Penal interposta por ANTÔNIO DA SILVA FERREIRA, objetivando reformar a sentença proferida pelo Tribunal do Júri da Comarca de Augusto Corrêa/PA (fls. 328/334) que o condenou à pena de 14 (quatorze) anos de reclusão em regime inicialmente fechado pela prática do crime tipificado no artigo 121, parágrafo 2º, inciso I do Código Penal. 1.DA ALEGAÇÃO DE DECISÃO CONTRÁRIA ÀS PROVAS DOS AUTOS: No caso em tela, a pretensão recursal consiste no pedido de novo julgamento face à decisão contrária às provas dos autos. O apelante, com fundamento no art. 593, inciso III, alínea ¿d¿, do Código de Processo Penal, pugnou pela anulação da decisão tomada pelo Tribunal do Júri, uma vez que prolatada, segundo a visão da defesa, de forma contrária à prova dos autos. Eis o teor da norma jurídica testilhada: Art. 593. Caberá apelação no prazo de 5 (cinco) dias: (...) III - das decisões do Tribunal do Júri, quando: (...) d) for a decisão dos jurados manifestamente contrária à prova dos autos O artigo ora em análise autoriza que em sendo a decisão manifestamente contrária à prova dos autos, ou seja, quando os jurados decidirem arbitrariamente dissociando-se de toda e qualquer evidência probatória, seja o réu submetido a novo julgamento pelo Tribunal Popular. É cediço que uma vez procedido o juízo positivo de constatação sobre a existência de suporte fático para arrimar a decisão tomada pelo Conselho de Sentença, a conclusão firmada no âmbito do Tribunal do Júri deve ser respeitada em grau recursal, pois os jurados decidem sob a égide da sua íntima convicção: não lhes é exigida motivação sobre as suas conclusões, visto que a Constituição da República de 1988, em seu art. 5º, XXXVIII, alíneas ¿b¿ e ¿c¿, consagrou a soberania dos veredictos e o sigilo das votações no Tribunal do Júri, erigindo, assim, exceção ao dever de fundamentação das decisões judiciais, preconizada no art. 93, IX, da Carta Magna. Trago à baila o entendimento jurisprudencial assentado no âmbito do Superior Tribunal de Justiça por ocasião do julgamento da ação de Habeas Corpus nº 143.419/RJ, relatada pelo Ministro Jorge Mussi, cujo acórdão fora publicado em 29/02/2012, no sentido de que ¿ (...) interposto recurso de apelação contra a sentença proferida pelo Tribunal do Júri sob o fundamento desta ter sido manifestamente contrária à prova dos autos, ao órgão recursal se permite apenas a realização de um juízo de constatação acerca da existência ou não de suporte probatório para a decisão tomada pelos jurados integrantes do Conselho de Sentença, somente se admitindo a cassação do veredicto caso este seja flagrantemente desprovido de elementos mínimos de prova capazes de sustentá-lo (...)¿. Portanto, a única providência passível de ser adotada pelo Tribunal de Apelação, caso constatada a decisão dos jurados manifestamente contrária à prova produzida nos autos, é a anulação do primeiro julgamento, determinando que a outro seja o acusado submetido, formando-se, para tanto, um novo Conselho de Sentença. Em outras palavras, no âmbito do Tribunal do Júri, prevalece o sistema de valoração de provas da íntima convicção dos jurados, de tal sorte que em 2º grau de jurisdição cabe verificar tão somente a conformidade da decisão dos jurados com os elementos de convicção existentes nos autos, consoante assenta a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça , a saber: HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO QUALIFICADO. CONDENAÇÃO COM BASE EM ELEMENTOS COLETADOS EXCLUSIVAMENTE DURANTE O INQUÉRITO POLICIAL. ART. 155 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. 1. SIGILO DAS VOTAÇÕES. PRINCÍPIO DA ÍNTIMA CONVICÇÃO. IMPOSSIBILIDADE DE IDENTIFICAÇÃO DOS ELEMENTOS UTILIZADOS PELOS JURADOS PARA CONDENAR A PACIENTE. 2. APELAÇÃO. ART. 593, INCISO III, ALÍNEA D, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. JUÍZO DE CONSTATAÇÃO. DECISÃO QUE ENCONTRA ARRIMO NAS PROVAS PRODUZIDAS EM JUÍZO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL. INEXISTÊNCIA. 3. ORDEM DENEGADA. (...). 2. Os jurados julgam de acordo com sua convicção, não necessitando fundamentar suas decisões. Em consequência, é impossível identificar quais elementos foram considerados pelo conselho de sentença para condenar ou absolver o acusado, o que torna inviável analisar se o veredicto baseou-se exclusivamente em elementos coletados durante a investigação criminal ou nas provas produzidas em juízo. 3. O art. 593, inciso III, alínea d, do código de processo penal deve ser interpretado como regra excepcional, cabível somente quando não houver, ao senso comum, material probatório suficiente para sustentar a decisão dos jurados. De efeito, em casos de decisões destituídas de qualquer apoio na prova produzida em juízo, permite o legislador um segundo julgamento. Prevalecerá, contudo, a decisão popular, para que fique inteiramente preservada a soberania dos veredictos, quando amparada em uma das versões resultantes do conjunto probatório. (...) [STJ. HC 173965/PE. 5ª T. MIN. REL. MARCO AURÉLIO BELLIZZE. DJE: 29/03/2012] (...) TRIBUNAL DO JÚRI. APELAÇÃO CRIMINAL. VEREDICTO MANIFESTAMENTE CONTRÁRIO À PROVA PRODUZIDA NOS AUTOS. DESCONSIDERAÇÃO DO DEPOIMENTO PRESTADO EM JUÍZO POR UMA DAS TESTEMUNHAS. CONDENAÇÃO COM BASE EM PROVA COLHIDA EXCLUSIVAMENTE NA FASE INQUISITORIAL. ART. 155 DO CPP. TRIBUNAL DO JÚRI. SOBERANIA DOS VEREDICTOS. SIGILO DAS VOTAÇÕES. ÍNTIMA CONVICÇÃO DOS JURADOS. DESNECESSIDADE DE FUNDAMENTAÇÃO DA DECISÃO. IMPOSSIBILIDADE DE IDENTIFICAÇÃO DE QUAIS PROVAS FORAM UTILIZADAS PELA CORTE POPULAR AO DECIDIR PELA CONDENAÇÃO DO PACIENTE. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO EVIDENCIADO. ORDEM DENEGADA. (...) 4. A Constituição Federal, em seu art. 5º, inciso XXXVIII, alíneas "b" e "c", conferiu ao Tribunal do Júri a soberania dos seus Veredictos e o sigilo das votações, tratando-se de exceção à regra contida no inciso IX do art. 93, razão pela qual não se exige motivação ou fundamentação das decisões do Conselho de Sentença, fazendo prevalecer, portanto, como sistema de avaliação das provas produzidas a íntima convicção dos jurados. (...) [STJ. HC 143419/RJ. 5ª T. REL. MIN. JORGE MUSSI. DJe: 29/02/2012] Consoante essas asserções não é possível anular a decisão do Júri Popular, sob o pálio de contrariedade ao acervo probatório, pois, in casu, a versão acatada pelos jurados não se mostra inverossímil ou destoante das provas colhidas. Assim sendo, submeter o réu a novo julgamento, sob o fundamento de que a decisão do Tribunal do Júri fora manifestamente contrária às provas dos autos, somente porque não acolheu a tese defensiva, implicaria em inaceitável afronta ao princípio constitucional da soberania de seus veredictos (art. 5º, inciso XXXVIII, letra c, da Constituição Federal), não havendo, portanto, que se falar em julgamento contrário a evidência dos autos, restando inviável acolher a tese defensiva para anular julgamento que se mostra irretocável e cuja decisão baseou-se em caderno processual regularmente formado. Ao optar pela condenação do ora apelante pela prática do crime tipificado no artigo 121, §2, incisos I d o CPB, os jurados, com base no acervo probatório acostado aos autos, nada mais fizeram do que optar por uma das versões possíveis, sendo a jurisprudência pátria pacífica quanto à higidez de tal tipo de decisão, senão vejamos: RECURSO ESPECIAL. ANULAÇÃO DO JULGAMENTO PROFERIDO PELO TRIBUNAL DO JÚRI. NÃO CONFIGURAÇÃO DA HIPÓTESE PREVISTA NO ART. 593, III, "D", DO CPP. OFENSA À SOBERANIA DOS VEREDICTOS. VEDAÇÃO. 1. As circunstâncias qualificadoras, devidamente reconhecidas pelo plenário do júri, somente podem ser excluídas, em sede de apelação, com base no art. 593, iii, "d", do código de processo penal, quando absolutamente improcedentes, sem amparo nos elementos dos autos, o que não se verifica na espécie. 2. Nunca é demais lembrar que "manifestamente contrária à prova dos autos é a decisão arbitrária, dissociada do conjunto fático-probatório produzido, não aquela que apenas diverge do entendimento firmado pelo órgão julgador a respeito da matéria." (REsp 212.619/PR, Relator Ministro Edson Vidigal, DJ 4/9/2000) 3. No caso, reconhecida a qualificadora do motivo torpe pelo tribunal do júri em conformidade com os fatos apresentados, não poderia o tribunal de origem, via recurso de apelação, desconstituir a escolha dos jurados, procedendo interpretação que, sob sua ótica, se coaduna melhor à hipótese dos autos. 4. Recurso a que se dá provimento para, cassando o acórdão impugnado, restabelecer a decisão proferida pelo tribunal do júri. [STJ. RESP 785.122/SP, 6ª T. REL. MIN. OG FERNANDES, DJE 22/11/2010]. GRIFO NOSSO PENAL E PROCESSUAL PENAL. RECURSO ESPECIAL. HOMICÍDIO QUALIFICADO. DECISÃO DO JÚRI CONTRÁRIA À PROVA DOS AUTOS. INOCORRÊNCIA. VERSÃO ACOLHIDA PELOS JURADOS QUE ENCONTRA AMPARO NA PROVA AMEALHADA. DUAS TESES. OPÇÃO POR UMA DELAS. I - Não se revela contrária à prova dos autos a decisão tomada pelo conselho de sentença que resta apoiada - conforme bem destacado no reprochado acórdão - em provas robustas. II - Ademais, da mesma forma, não se qualifica como manifestamente contrária à prova dos autos a decisão dos jurados que se filia a uma das versões para o crime, em detrimento de outra, ambas apresentadas em plenário, desde que a tese privilegiada esteja amparada em provas idôneas, como ocorreu na espécie. (Precedentes). Recurso Especial Provido. [STJ. RESP 1114474/SP, 5ª T. REL. MIN. FELIX FISCHER, DJe: 16/11/2009] GRIFO NOSSO. No mesmo sentido entende esta Egrégia Corte de Justiça, senão vejamos: APELAÇÃO PENAL. HOMICÍDIO QUALIFICADO. ABSOLVIÇÃO. DECISÃO CONTRÁRIA Á PROVA DOS AUTOS. NÃO CARACTERIZADA. VERSÃO VEROSSÍMIL AO CRIME. SOBERANIA DOS VEREDICTOS. CONSAGRAÇÃO DO PRINCÍPIO IN DUBIO PRO REO. RECURSO DE APELAÇÃO CONHECIDO E DESPROVIDO. I. O acolhimento pelo conselho de sentença de uma das versões apresentadas durante o tribunal do júri e devidamente alicerçada por elementos probatórios dos autos não infirma a decisão soberana do júri. II. Vige em termos de tribunal do júri, o princípio basilar e constitucional da soberania dos veredictos, diante do qual, a decisão tomada pelos jurados é soberana sobre qualquer outra. III. Lado outro, pelo acervo probatório dos autos, resta evidente a dúvida, o que implica na aplicação do princípio in dubio pro reo. IV. Recurso de apelação conhecido e desprovido. [TJ/PA, ACÓRDÃO Nº 104.818, REL. JUÍZA CONVOCADA NADJA COBRA MEDA, DJe 01/03/2012] No caso ora em comento alegou o recorrente que a decisão do Egrégio Conselho de Sentença não encontraria subsídio nas provas existentes nos autos. Contudo, entendo incabível tal alegação diante da existência de suporte probatório suficiente para amparar a decisão dos jurados, que, ressalte-se, decidem com base no princípio da íntima convicção. No que tange à alegação de que o Ministério Público não teria comprovado que o ora apelante seria o mandante do crime narrado nos autos, uma vez que o contratado seria semi-imputável, entendo que razão não assiste à defesa. In casu, como bem ponderou o douto representante do Órgão Acusador em sede de Contrarrazões à s fl s . 388 /389 dos autos, ¿ com relação ao desenvolvimento mental do corréu José Maria Correa d Silva, a defesa se limitou a alegar que ele sofre de retardamento mental que o desabilita a comprovar qualquer situação. Sendo o fato afirmado pela defesa, cabia a esta a prova do mesmo, nos termos do art. 156 do CPP. Na verdade, como se verifica na cópia do Laudo Psiquiátrico Legal que segue anexa, o corréu em questão sofre apenas de Retardo Mental Leve ¿ CID 10 F 70, o que significa ter amplitude aproximada de QI entre 50 e 69 (em adultos, idade mental de 9 a menos de 12 anos). Dessa condição, decorrem dificuldades de aprendizado na escola, mas não há impedimento para o trabalho, para a manutenção de relacionamento social satisfatório e de contribuir para a sociedade. Portanto, é evidente que o corréu não estava desabilitado a confirmar que foi contratado pelo apelante para matar a vítima¿. Registre-se, por oportuno, que a corrente soberanamente acolhida pelos jurados representou uma opção embasada na discussão das provas dos autos, conforme a prerrogativa constitucional da plenitude de defesa (letra 'a' do inciso XXXVIII do art. 5° da CF/88), não havendo como possa ser considerada manifestamente contrária ao conjunto probatório colhido. O Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento quanto a este assunto no julgado abaixo transcrito: HABEAS CORPUS. DIREITO PROCESSUAL PENAL. HOMICÍDIO QUALIFICADO. JÚRI. SOBERANIA DE VEREDICTOS. VERTENTES ALTERNATIVAS DA VERDADE DOS FATOS. PROVA. INDEMONSTRAÇÃO. ORDEM DENEGADA. 1. À instituição do júri, por força do que dispõe o artigo 5º, inciso XXXVIII, alínea "c", da Constituição da República, é assegurada a soberania de seus veredictos. 2. O artigo 593, inciso III, alínea "d", do Código de Processo Penal autoriza que, em sendo a decisão manifestamente contrária à prova dos autos, ou seja, quando os jurados decidam arbitrariamente, dissociando-se de toda e qualquer evidência probatória, seja o réu submetido a novo julgamento pelo Tribunal Popular. 3. Oferecidas aos jurados vertentes alternativas da verdade dos fatos, fundadas pelo conjunto da prova, mostra-se inadmissível que o Tribunal de Justiça, quer em sede de apelação, quer em sede de revisão criminal, desconstitua a opção do Tribunal do Júri - porque manifestamente contrária à prova dos autos - sufragando, para tanto, tese contrária. 4. Não basta, todavia, a evitar seja o réu submetido a novo julgamento pelo Tribunal Popular, a alegação simples da existência de vertentes alternativas da prova da verdade dos fatos, impondo-se que se a demonstre objetivamente nos autos, particularizando as provas de que exsurge a versão outra que permitiu a convicção diversa dos jurados. 5. Ordem denegada. (HC Nº 58.295/MS, Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, DJe 26/05/2008) No mesmo sentido, entendimento jurisprudencial dessa Egrégia Corte de Justiça: Não é manifestamente contrária à prova dos autos a decisão dos jurados que acolheu a tese de homicídio qualificado por motivo fútil, qual seja, ciúmes, visto que livre o Conselho de Sentença na escolha, aceitação e valoração da prova, pois havendo duas linhas de interpretação para o fato, não há como impedir que os Jurados optem por uma delas, ainda que não seja a melhor sob a ótica técnico-jurídica, entre as teses suscitadas no processo. Esse procedimento decorre do princípio da convicção íntima, corolário do primado constitucional de soberania do Júri Popular, previsto no art. 5º, inc. XXXVII, da CF Arbitramento de valor à título de reparação dos danos causados pela infração. (Acórdão Nº 92.098, Rel. Desa. Vânia Fortes Bitar, DJ 19/10/2010) Confiram-se, a propósito, as seguintes lições doutrinárias: Admite, finalmente, o Código apelação contra a decisão dos jurados que for manifestamente contrária à prova dos autos (art. 593, III, d), podendo o Tribunal determinar novo julgamento (art. 593, § 3º). Com isso o legislador permitiu, em casos de decisões destituídas de qualquer apoio na prova produzida, um segundo julgamento. Prevalecerá, contudo, a decisão popular, para que fique inteiramente preservada a soberania dos veredictos, quando estiver amparada em uma das versões resultantes do conjunto probatório. Se o Tribunal de Justiça, apesar de haver sustentáculo na prova para a tese vencedora, ainda que não seja robusta, determinar erroneamente novo julgamento, será cabível recurso especial ou habeas corpus, para o fim de subsistir a vontade do Conselho de Sentença e ser assegurada a soberania de seus veredictos. (GRINOVER, Ada Pellegrini; GOMES FILHO, Antonio Magalhães; FERNANDES, Antonio Scarance. Recursos no Processo Penal. p. 103) Trata-se de hipótese em que se fere justamente o mérito de causa, em que o error in judicando é reconhecido somente quando a decisão é arbitrária, porque se dissocia integralmente da prova dos autos, é contrária 'manifestamente' à verdade apurada no processo e representa uma distorção da função judicante do Conselho de Sentença. Assim, não é qualquer dissonância entre o veredicto e os elementos de convicção colhidos na instrução que autorizam a cassação do julgamento. Unicamente, a decisão dos jurados, que nenhum arrimo encontra na prova dos autos, e que pode ser invalidada. É lícito ao Júri optar por uma das versões verossímeis dos autos, numa interpretação razoável dos dados instrutórios, devendo ser mantida a decisão quando isso ocorrer. (MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo Penal, p. 683) Assim, entendo que a decisão do Conselho Popular condenando o ora apelante como autor do crime tipificado no artigo 121, §2, inciso I d o CPB , está de acordo com o acervo probatório coligido aos autos, não se justificando, pois, a anulação do julgamento máxime, por ser soberano. E ainda, na análise da insurgência, a instância recursal deve se abster de emitir qualquer juízo de valor sobre a justiça da decisão tomada pelo Tribunal do Júri ou sobre a força probatória de determinados elementos de prova produzido nos autos, sob pena de estar influenciando no próprio mérito do édito popular. Entendo quando o legislador fez uso do advérbio ¿manifestamente¿ abriu a possibilidade de exceção da soberania do júri apenas quando não existir elemento algum que confira sustentação a decisão tomada pelos jurados, ou seja, quando inequívoca, indubitável a contrariedade ao conjunto probatório dos autos. Entretanto, se existir uma outra tese plausível, ainda que frágil e questionável e os jurados optarem por ela, deve-se respeitar tal decisum, visto que não se pode questionar a interpretação dada aos fatos pelos jurados, a não ser que inexista elemento que a corrobore, conforme já decidido pelo Pretório Excelso: JÚRI. ACOLHIMENTO DE TESE DA DEFESA. DECISÃO MANIFESTAMENTE CONTRÁRIA À PROVA DOS AUTOS. INOCORRÊNCIA. (...). Decisão dos jurados que acolheu a tese do homicídio privilegiado, com base no histórico de discussões entre vítima e réu e no depoimento de testemunha que afirmou ter escutado vozes em tom exaltado momentos antes do crime. Inexistência de decisão arbitrária ou inverossímil. Em verdade, o Tribunal de Justiça considerou a prova de acusação mais sólida do que a de defesa, avaliação esta, entretanto, que é reservada ao Tribunal do Júri, juízo natural da causa, com base no critério da íntima convicção. Assim, por não caber à Justiça togada, nos estreitos limites da apelação contra veredicto do Tribunal do Júri, desqualificar prova idônea produzida sob o crivo do contraditório, a decisão é ilegal. Ordem concedida para cassar a determinação de realização de novo julgamento pelo Júri, com base no art. 593, III, d, do Código de Processo Penal. (HC Nº 85.904, Rel. Min. Joaquim Barbosa, DJe 29/06/2007) Adoto, como razões de decidir os bem lançados fundamentos constantes no parecer de fls. 404/405, de lavra do Procurador de Justiça, Dr. Hezedequias Mesquita da Costa, integrando-os ao presente, com a devida vênia, in verbis: (...). Assim, em que pese a defesa ter a vergastado a validade dos esclarecimentos fornecidos em nome do Sr. José Maria por ser ele semi-imputável, não se incomodou em produzir provas nesse sentido, isto é, provar a terminante invalidade das palavras do próprio executor do crime (conforme alude o artigo 156 do Código de Processo Penal); este último dato é um tanto contraditório e fantasioso, ora, se a defesa, parte do pressuposto que José Maria seria um dos autores executores do delito, não se importando em apontar um outro motivo que ¿Radé¿ praticasse o crime, que não à mando do ora apelante (por vingança gerada em função de uma furto de substâncias entorpecentes), torna tal tentativa de macular a decisão do ínclito Conselho de Sentença, portanto, inócua. (...). Pelo exposto, não acolho a tese ora em análise. 2. DO PEDIDO DE FIXAÇÃO DA PENA EM SEU PATAMAR MÍNIMO: A defesa requereu, de forma subsidiária, o redimensionamento da pena em concreto para o seu patamar mínimo por ter sido dosada de forma desproporcional em sede do decisum objurgado. Entendo que merece acolhimento tal irresignação defensiva, restando imperioso dar-se parcial provimento ao recurso do ora apelante. Cediço que o juiz ao fixar a pena deve utilizar o modelo trifásico de Nelson Hungria, e na primeira fase, qual seja, a fixação da pena base, deve-se levar em conta vários critérios, quais sejam, à culpabilidade, os antecedentes, a conduta social, dentre outros, como assevera o artigo 59 do Código Penal Brasileiro, cabendo ao magistrado fixar a pena aplicável em quantidade que for necessária e suficiente para reprovação e prevenção do delito. Além do que é salutar mencionar, antes mesmo de adentrar no mérito da dosimetria da pena, que é o objetivo maior desta, deve permanecer em fiel acordo com a proporcionalidade entre as condições do delito e o indivíduo que o praticou, a fim de ensejar uma melhor individualização da pena assim como melhor eficácia da mesma. Nesse sentido diz a jurisprudência: A EFICÁCIA DA PENA APLICADA ESTÁ DIRETAMENTE LIGADA AO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE, A FIM DE ASSEGURAR A INDIVIDUALIZAÇÃO, POIS QUANTO MAIS O JUIZ SE APROXIMAR DAS CONDIÇÕES QUE ENVOLVEM O FATO, DA PESSOA DO ACUSADO, POSSIBILITANDO APLICAÇÃO DA SANÇÃO MAIS ADEQUADA, TANTO MAIS TERÁ CONTRIBUÍDO PARA A EFICÁCIA DA PUNIÇÃO (TACRSP; RJDTACRIM 29/152) Impende nesse momento explicitar que a dosimetria da pena privativa de liberdade baseia-se em um critério trifásico: primeiro, é fixada a pena base, examinando-se as circunstâncias judiciais previstas no artigo supracitado e, em seguida, passa-se à análise sobre a existência de circunstâncias agravantes e atenuantes genéricas e, por fim, verifica-se a presença das causas de aumento e diminuição de pena. Insta destacar que, no que concerne à aplicação da pena base, é inegável que ao sentenciante é reservada uma larga margem de discricionariedade. Entretanto, não se trata de discricionariedade livre, e sim, vinculada, devendo guiar-se pelos 08 (oito) fatores indicativos relacionados no caput do artigo supracitado, fixando, dessa forma, a reprimenda básica conforme seja suficiente para a reprovação e prevenção do delito denunciado. Conforme sustenta o ora recorrente, o magistrado de piso não teria examinado de forma escorreita as circunstâncias judiciais do artigo 59 do Código Penal, fixando a pena base do crime em questão de forma não razoável. In casu, a pena do ora apelante fora fixada pelo juízo a quo nos seguintes termos, in verbis: (...). Em face da decisão soberana dos senhores jurados, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a pretensão punitiva estatal e CONDENO O RÉU, ANTÔNIO DA SILVA FERREIRA, nas penas do art. 121, §2º, I do CP. A sanção aplicável ao réu, dentro dos limites fixados em lei, resultará das circunstâncias previstas no art. 59 do CP. Infere-se dos autos que o réu é primário, sem antecedentes criminais registrados; sua conduta social anterior revela atividade criminosa (possível tráfico de drogas); sua personalidade, manifestada por ocasião do crime e depois deste, revela que ser um homem perigoso. Intensividade do dolo alta, motivos reprováveis, circunstâncias desfavoráveis ao réu. Acrescentam-se as irremediáveis consequências do crime, representadas pela eliminação prematura de uma vida humana, enlutando para sempre os lares de seus parentes. Todas essas circunstâncias que envolveram os fatos imputados ao réu e reconhecidos pelo Júri, recomendam uma resposta penal suficiente e necessária para reprovação e prevenção do crime, consoante preconiza o art. 59 do CP, justificando a fixação da pena base acima do mínimo legal, em que pese sua primariedade e ausência de antecedentes. Em face disso, entendo ser necessária e suficiente para a reprovação e prevenção do crime, segundo as diretrizes do art. 59 do CP estabelecer a pena base em 14 (quatorze) anos de reclusão. Não existem causas de aumento ou diminuição da pena. Também não existem circunstâncias atenuantes ou de agravamento genéricas, ou causas de aumento de pena. Razão pela qual torno definitiva a pena base fixada de 14 (quatorze) anos de reclusão. (...). O regime de cumprimento inicial da pena, atendendo ao disposto no art. 2º§1º da Lei Nº 8.072/90, será o fechado. (...). GRIFEI. Dessa forma, faz-se necessário, primeiramente, revolver as circunstâncias do artigo 59 do CP com o fito de analisar os critérios utilizados pelo magistrado a quo para fixação da pena base. In casu, após análise minuciosa da sentença objurgada, verifiquei que o magistrado de piso não examinou de forma escorreita as circunstâncias judiciais do artigo 59 do Código Penal, fixando a pena base do crime em questão de forma não razoável. Com efeito, o agir do recorrente, embora condenável, não foge ao corriqueiramente observado na espécie, sendo, portanto desproporcional a valoração contida no édito condenatório no que tange à dosagem da pena base e em homenagem ao princípio da individualização da pena (artigo 5º, inciso XLVI, CF/88), o redimensionamento da pena base é medida que se impõe ao final do presente voto, de modo a encontrar a quantidade de pena necessária e suficiente para a reprovação e prevenção do crime, conforme dispõe a parte final do artigo 59 do Código Penal, mantendo a coerência com a decisão de minha relatoria quando do julgamento da Apelação Penal Nº 2012.3.008728-6 (Acórdão Nº 110.323, publicação: 02/08/2012), quando redimensionei a dosimetria da pena em voto assim ementado, senão vejamos: APELAÇÃO PENAL. (...). PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE E DA INDIVIDUALIZAÇÃO DA PENA. (...). DOSIMETRIA DA PENA. REDIMENSIONAMENTO. REANÁLISE DAS CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS DO ARTIGO 59 DO CÓDIGO PENAL VALORADAS ERRONEAMENTE PELO JUÍZO A QUO. (...). RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO (...). UNANIMIDADE. Compulsando a sentença penal condenatória, nota-se que na 1ª fase da dosimetria da pena o magistrado singular, em observância ao disposto no artigo 59 do Código Penal , fixou a pena base em 1 4 anos de reclusão , exasperando a pena do mínimo legal em razão da valoração negativa das seguintes circunstâncias judiciais: c onduta social, personalidade, motivos, circunstância e consequências do crime. É de conhecimento comum que no primeiro estágio da individualização da pena privativa de liberdade o julgador dispõe da chamada discricionariedade juridicamente vinculada: sem desprender-se do dever de motivação da sua decisão, concretiza a pena-base com relativa subjetividade, sem poder, contudo, desbordar da quantidade mínima e máxima abstratamente cominada no tipo legal, consoante leciona Guilherme de Souza Nucci (Código Penal Comentado. 11ª Edição. Editora Revista dos Tribunais: p. 414) : Trata-se de um processo judicial de discricionariedade juridicamente vinculada visando a suficiência para prevenção e reprovação da infração penal. O juiz, dentro dos limites estabelecidos pelo legislador (mínimo e máximo, abstratamente fixados para a pena), deve eleger o quantum ideal, valendo-se do seu livre convencimento (discricionariedade), embora com fundamentada exposição do seu raciocínio (juridicamente vinculada) (...). Segundo o doutrinador Guilherme de Souza Nucci (Código Penal Comentado, 11ª Edição, Editora Revista dos Tribunais, 2012, p. 418) , in verbis: ¿é defeso ao magistrado deixar de levar em consideração as oito circunstâncias judiciais existentes no art. 59, caput, para a fixação da pena-base. Apenas se todas forem favoráveis, tem cabimento a aplicação da pena no mínimo¿. No mesmo sentido, Cleber Masson (Direito Penal Esquematizado, 2ª Edição, Editora Método: p. 592) , ensina, in verbis: ¿Somente quando todas as circunstâncias forem favoráveis ao réu a pena deve ser fixada no mínimo legal (...)¿. No presente caso, porém, verifico que o juízo singular incidira em error in judicando no que tange à valoração negativa d as circunstâncias judiciais supracitadas, pois enfrentou algumas destas de forma absolutamente genérica, sem fazer referência mínima aos elementos concretos extraídos dos autos, consoante determina o artigo 93, inciso IX da Constituição da República de 1988 (dever de fundamentação dos pronunciamentos jurisdicionais). Ao julgador de piso, na 1ª fase da individualização da pena, não é dada a possibilidade de exasperar a pena-base com espeque em referências vagas e genéricas. O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Habeas Corpus Nº 191734/PE, distribuído para a relatoria da Ministra Laurita Vaz, com Acórdão publicado no Diário de Justiça em 26/9/2012, assentou, in verbis: ¿(...) Não pode o magistrado sentenciante majorar a pena-base fundando-se, tão somente, em referências vagas, genéricas, desprovidas de fundamentação objetiva para justificar a exasperação, tais como, ¿tinha consciência de que agia em desacordo com a lei¿ (culpabilidade) e ¿vítima em nada contribui para o crime¿ (comportamento da vítima) (...)¿. Ressalto que a mera indicação genérica e abstrata de circunstâncias judiciais para o fim de majorar a pena-base revela-se intolerável no sistema jurídico, conforme destaca o doutrinador Rogério Greco (Curso de Direito Penal Parte Geral. 14ª Edição. Editora Impetus: p. p. 555/556) , in verbis: ¿(...) se o juiz fixou a pena-base acima do mínimo legal é direito do réu saber o porquê dessa decisão (...)¿ . Ao exasperar a pena-base o magistrado deve reportar-se aos elementos concretos existentes nos autos sob o risco de configurar excesso de pena e violação ao princípio da proporcionalidade . Sobre o tema, colaciono a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça , a saber: PENA: INDIVIDUALIZAÇÃO E REGIME INICIAL DE CUMPRIMENTO: AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO: NULIDADE. NÃO RESPONDE A EXIGÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO DE INDIVIDUALIZAÇÃO DA PENA-BASE E DA DETERMINAÇÃO DO REGIME INICIAL DA EXECUÇÃO DA PENA A SIMPLES MENÇÃO AOS CRITÉRIOS ENUMERADOS EM ABSTRATO PELO ART. 59 C. PEN., QUANDO A SENTENÇA NÃO PERMITE IDENTIFICAR OS DADOS OBJETIVOS E SUBJETIVOS QUE A ELES SE ADEQUARIAM, NO FATO CONCRETO, EM DESFAVOR DO CONDENADO. [STF. HC 68.751. Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE. Publicação: 1º/11/1991] AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. PENAL. CRIME DE FURTO. DOSIMETRIA DA PENA. ILEGALIDADE. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA PARA EXASPERAÇÃO DA PENA-BASE. REDUÇÃO AO MÍNIMO LEGAL QUE SE IMPÕE. (...). HABEAS CORPUS CONCEDIDO. DECISÃO MANTIDA PELOS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. AGRAVO DESPROVIDO. (...) 2. A valoração negativa das circunstâncias judiciais foi feita com considerações vagas, genéricas, sem fundamentação objetiva, portanto inadequadas para justificar a exasperação, pois o Magistrado não indicou nenhum fato concreto que justificasse a valorização negativa das circunstâncias. [STJ. AgRg no HC 202233 / ES. Relª. Minª. Laurita Vaz. Publicação: 28/5/2013] PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ESPECIAL INTERPOSTO. (...) AUSÊNCIA DE MOTIVAÇÃO. INOCORRÊNCIA. DOSIMETRIA. PENA-BASE ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. FUNDAMENTAÇÃO INADEQUADA. CULPABILIDADE, MOTIVOS E CONSEQUÊNCIAS DO CRIME. REFERÊNCIAS GENÉRICAS. CONSTRANGIMENTO ILEGAL. OCORRÊNCIA. ORDEM DENEGADA. REFORMA DO ACÓRDÃO E NOVA DOSIMETRIA DA PENA. HABEAS CORPUS CONCEDIDO DE OFÍCIO. (...) VI. A viabilidade do exame da dosimetria da pena, por meio de habeas corpus, somente se faz possível caso evidenciado eventual desacerto na consideração de circunstância judicial ou errônea aplicação do método trifásico, se daí resultar flagrante ilegalidade e prejuízo ao réu - hipótese dos autos. (...) VIII. Apesar de terem sido desfavoravelmente sopesadas, a culpabilidade, os motivos e as consequências do crime se encontram desvinculadas de fatores concretos que os conectem à hipótese dos autos, tendo sido indevidamente citados de modo genérico. IX. Denego a ordem, face à impetração, mas concedo habeas corpus de ofício para que seja reformado o acórdão recorrido no tocante à dosimetria da pena imposta aos pacientes, a fim de que outra seja procedida, mantendo-se a condenação, nos termos do voto do Relator. [HC 202632/MG. Rel. Min. GILSON DIPP. Publicação: 04/09/2012) Os tribunais brasileiros também decidem no mesmo sentido, senão vejamos: PENAL. LEI DE DROGAS. TRÁFICO. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. REDUÇÃO DA PENA-BASE. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS FAVORÁVEIS. (...). Se as circunstâncias judiciais da culpabilidade, motivos e circunstâncias do crime foram todas inerentes ao tipo penal, mostra-se necessária a redução da pena-base (...). [TJDFT. APEL. 20120110449442APR. Rel. Des. ESDRAS NEVES. Publicação: 13/11/2012] Por conseguinte, acolho à alegação ora em comento. 3. DO REDMENSIONAMENTO DA PENA: Não havendo mais teses a serem enfrentadas, passo, nesse momento, ao redimensionamento da dosimetria da pena, analisando, primeiramente, as circunstâncias judiciais do artigo 59 do Código Penal: a) Culpabilidade: normal ao tipo; b) Antecedentes criminais: tecnicamente primário, nos moldes da Súmula 444 do Superior Tribunal de Justiça; c) Conduta social: sem dados; d) Personalidade: nada restou apurado nos autos sobre o perfil psicológico do agente, por isso, atribuo valoração neutra ao fator em apreço; e) Motivos do crime: específicos do tipo penal; f) Circunstâncias do crime: valorada de forma neutra; g) Consequências do crime: também comum à espécie do delito ora em análise, cuja gravidade é própria ao tipo penal, pois embora a dor e sofrimento da família ante a perda de um ente querido sejam presumíveis os traumas psicológicos efetivos experimentados pelos parentes mais próximos do de cujus não restaram atestados nos autos ; h) Comportamento da vítima: incabível a análise no presente caso. Fixo a pena base em 12 (doze) anos de reclusão. Na segunda fase, não verifico agravantes nem atenuantes. Na terceira fase, inexistentes causas de diminuição e aumento de pena, motivo pelo qual fixo a pena definitivamente em 12 (doze) anos de reclusão. Por tais razões de decidir, torno concreta, definitiva e final a reprimenda, condenando o recorrente à pena privativa de liberdade de 12 (doze) anos de reclusão de reclusão em regime inicial fechado para cumprimento da reprimenda, conforme artigo 33, §2º, ¿a¿ e §3º do Estatuto Repressivo pela prática do crime tipificado no artigo art. 121, §2º, I do CP. Por tais razões de decidir, CONHEÇO do presente recurso de Apelação e, no mérito, DOU PARCIAL PROVIMENTO à pretensão recursal a fim de reconhecer o error in judicando na individualização da pena por violação ao princípio da fundamentação, redimensionando a pena para 12 (doze) anos de reclusão, mantidas as demais cominações da sentença vergastada. É como voto. Belém/PA, 16 de dezembro de 2014. Relatora Desª. Vera Araújo de Souza Desembargadora 1
(2014.04801885-70, 141.802, Rel. VERA ARAUJO DE SOUZA, Órgão Julgador 1ª TURMA DE DIREITO PENAL, Julgado em 2014-12-16, Publicado em 2014-12-18)
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PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ Gabinete da Desa. Vera Araújo de Souza PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ ACÓRDÃO Nº SECRETARIA DA 1ª CÂMARA CRIMINAL ISOLADA. APELA Ç Ã O PENAL PROCESSO Nº 2012.3.026256-5 APELANTE: ANTÔNIO DA SILVA FERREIRA (DEFENSOR PÚBLICO: FRANCISCO JOSÉ PINHO VIEIRA) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO PROCURADORIA DE JUSTIÇA: HEZEDEQUIAS MESQUITA DA COSTA RELATORA: DESª. VERA ARAÚJO DE SOUZA APELAÇÃO CRIMINAL. HOMICÍDIO. ART. 121, §2º, I DO CP. ALEGAÇÃO DE DECISÃO CONTRÁRIA À PROVA DOS AUTOS. IMPROCEDÊNCIA. DECISÃO QUE ENCONTRA ARRIMO NAS PROVAS PRODUZIDAS EM JUÍZO. O ART. 593, INCISO III, ALÍNEA D DO CPP DEVE SER INTERPRETADO COMO REGRA EXCEPCIONAL, CABÍVEL SOMENTE QUANDO NÃO HOUVER, AO SENSO COMUM, MATERIAL PROBATÓRIO SUFICIENTE PARA SUSTENTAR A DECISÃO DOS JURADOS. PREVALECERÁ, CONTUDO, A DECISÃO POPULAR, PARA QUE FIQUE INTEIRAMENTE PRESERVADA A SOBERANIA DOS VEREDICTOS, QUANDO AMPARADA EM UMA DAS VERSÕES RESULTANTES DO CONJUNTO PROBATÓRIO. NÃO ACOLHIMENTO DA ALEGAÇÃO DEFENSIVA. PEDIDO DE FIXAÇÃO DA PENA BASE NO PATAMAR MÍNIMO. ACOLHIMENTO. PENA FIXADA DE FORMA NÃO ESCORREITA PELO MAGISTRADO DE PISO. REANÁLISE DA DOSIMETRIA COM O REDIMENSIONAMENTO DA PENA. RECURSO CONHECIDO E, NO MÉRITO, PARCIALMENTE PROVIDA A PRETENSÃO RECURSAL, PROCEDENDO-SE NOVA DOSIMETRIA DA PENA PARA 12 (DOZE) ANOS DE RECLUSÃO A SER CUMPRIDA EM REGIME INICIALMENTE FECHADO, CONFORME ARTIGO 33, §2º, ¿A¿ E §3º DO CP, PELA PRÁTICA DO CRIME TIPIFICADO NO ART. 121, §2º, I DO ESTATUTO REPRESSIVO. DECISÃO UNÂNIME. Vistos e etc... Acordam os Excelentíssimos Senhores Desembargadores componentes da 1ª Câmara Criminal Isolada, por unanimidade, em conhecer do recurso e dar-lhe parcial provimento, nos termos do voto da Desembargadora Relatora. Sala das Sessões do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, aos dezesseis dias do mês de dezembro de dois mil e quatorze. Julgamento presidido pela Excelentíssima Senhora Desembargadora Vânia Silveira. Belém, 16 de dezembro de 2014. Relatora Desª. VERA ARAÚJO DE SOUZA DESEMBARGADORA SECRETARIA DA 1ª CÂMARA CRIMINAL ISOLADA. APELA Ç ÃO PENAL PROCESSO Nº 2012.3.026256-5 APELANTE: ANTÔNIO DA SILVA FERREIRA (DEFENSOR PÚBLICO: FRANCISCO JOSÉ PINHO VIEIRA) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO PROCURADORIA DE JUSTIÇA: HEZEDEQUIAS MESQUITA DA COSTA RELATORA: DESª. VERA ARAÚJO DE SOUZA R E L A T Ó R I O Trata-se de Apelação Penal interposta por ANTÔNIO DA SILVA FERREIRA, por intermédio da Defensoria Pública, objetivando reformar a sentença proferida pelo Tribunal do Júri da Comarca de Augusto Corrêa/PA (fls. 328/334) que o condenou à pena de 14 (quatorze) anos de reclusão em regime inicialmente fechado pela prática do crime tipificado no artigo 121, parágrafo 2º, inciso I do Código Penal. Narrou à denúncia, bem como o aditamento, que o ora apelante, no dia 11/03/2010, por volta das 20 horas, teria ordenado a morte da vítima (Sr. José Carlos Guimarães do Rosário) por ter-lhe furtado uma certa quantidade de entorpecentes. Explicitou que como vingança, o ora apelante teria mandado ceifar a vida da vítima sob a recompensa de R$ 900 (novecentos reais) prometida aos outros denunciados. Relatou que a vítima fora atingida por tiros, bem como golpes de terçados, vindo posteriormente a óbito. Assim, o Ministério Público Estadual pugnou pela condenação do ora apelante como incurso nas sanções punitivas do artigo 121, parágrafo 2º, incisos I, III e IV do Código Penal. Sentença condenatória prolatada prolata pelo Júri Popular da Comarca de Augusto Corrêa /PA (fls. 328/334), julgando parcialmente procedente a pretensão punitiva estatal , condenando o ora apelante pela prática do crime tipificado no art. 121, §2, inciso I do CPB a pena de 1 4 ( quatorze ) anos de reclusão a ser cumprida inicialmente em regime fechado. Em sede de razões recursais (fls. 371/377), o ora apelante pugnou pela submissão a novo julgamento por ter sido a decisão proferida manifestamente contrária as provas dos autos. Subsidiariamente, requereu a revisão da dosimetria com a fixação da pena base em seu patamar mínimo. Em contrarrazões (fls. 385/389), o Ministério Público requereu a manutenção da sentença objurgada em todos os seus termos. Nesta instância superior, o Procurador de Justiça, Dr. Hezedequias Mesquita da Costa, opinou pelo conhecimento do recurso por preencher os requisitos de admissibilidade, mas, no mérito, pelo seu improvimento (fls. 400/407). É o relatório. Revisão pela Exma. Desa. Vânia Silveira. Passo a proferir o voto. V O T O Atendidos os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso interposto, mormente em relação à adequação e à tempestividade. Não havendo questões preliminares, adentro na análise do mérito recursal. Como tido alhures, trata-se de Apelação Penal interposta por ANTÔNIO DA SILVA FERREIRA, objetivando reformar a sentença proferida pelo Tribunal do Júri da Comarca de Augusto Corrêa/PA (fls. 328/334) que o condenou à pena de 14 (quatorze) anos de reclusão em regime inicialmente fechado pela prática do crime tipificado no artigo 121, parágrafo 2º, inciso I do Código Penal. 1.DA ALEGAÇÃO DE DECISÃO CONTRÁRIA ÀS PROVAS DOS AUTOS: No caso em tela, a pretensão recursal consiste no pedido de novo julgamento face à decisão contrária às provas dos autos. O apelante, com fundamento no art. 593, inciso III, alínea ¿d¿, do Código de Processo Penal, pugnou pela anulação da decisão tomada pelo Tribunal do Júri, uma vez que prolatada, segundo a visão da defesa, de forma contrária à prova dos autos. Eis o teor da norma jurídica testilhada: Art. 593. Caberá apelação no prazo de 5 (cinco) dias: (...) III - das decisões do Tribunal do Júri, quando: (...) d) for a decisão dos jurados manifestamente contrária à prova dos autos O artigo ora em análise autoriza que em sendo a decisão manifestamente contrária à prova dos autos, ou seja, quando os jurados decidirem arbitrariamente dissociando-se de toda e qualquer evidência probatória, seja o réu submetido a novo julgamento pelo Tribunal Popular. É cediço que uma vez procedido o juízo positivo de constatação sobre a existência de suporte fático para arrimar a decisão tomada pelo Conselho de Sentença, a conclusão firmada no âmbito do Tribunal do Júri deve ser respeitada em grau recursal, pois os jurados decidem sob a égide da sua íntima convicção: não lhes é exigida motivação sobre as suas conclusões, visto que a Constituição da República de 1988, em seu art. 5º, XXXVIII, alíneas ¿b¿ e ¿c¿, consagrou a soberania dos veredictos e o sigilo das votações no Tribunal do Júri, erigindo, assim, exceção ao dever de fundamentação das decisões judiciais, preconizada no art. 93, IX, da Carta Magna. Trago à baila o entendimento jurisprudencial assentado no âmbito do Superior Tribunal de Justiça por ocasião do julgamento da ação de Habeas Corpus nº 143.419/RJ, relatada pelo Ministro Jorge Mussi, cujo acórdão fora publicado em 29/02/2012, no sentido de que ¿ (...) interposto recurso de apelação contra a sentença proferida pelo Tribunal do Júri sob o fundamento desta ter sido manifestamente contrária à prova dos autos, ao órgão recursal se permite apenas a realização de um juízo de constatação acerca da existência ou não de suporte probatório para a decisão tomada pelos jurados integrantes do Conselho de Sentença, somente se admitindo a cassação do veredicto caso este seja flagrantemente desprovido de elementos mínimos de prova capazes de sustentá-lo (...)¿. Portanto, a única providência passível de ser adotada pelo Tribunal de Apelação, caso constatada a decisão dos jurados manifestamente contrária à prova produzida nos autos, é a anulação do primeiro julgamento, determinando que a outro seja o acusado submetido, formando-se, para tanto, um novo Conselho de Sentença. Em outras palavras, no âmbito do Tribunal do Júri, prevalece o sistema de valoração de provas da íntima convicção dos jurados, de tal sorte que em 2º grau de jurisdição cabe verificar tão somente a conformidade da decisão dos jurados com os elementos de convicção existentes nos autos, consoante assenta a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça , a saber: HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO QUALIFICADO. CONDENAÇÃO COM BASE EM ELEMENTOS COLETADOS EXCLUSIVAMENTE DURANTE O INQUÉRITO POLICIAL. ART. 155 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. 1. SIGILO DAS VOTAÇÕES. PRINCÍPIO DA ÍNTIMA CONVICÇÃO. IMPOSSIBILIDADE DE IDENTIFICAÇÃO DOS ELEMENTOS UTILIZADOS PELOS JURADOS PARA CONDENAR A PACIENTE. 2. APELAÇÃO. ART. 593, INCISO III, ALÍNEA D, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. JUÍZO DE CONSTATAÇÃO. DECISÃO QUE ENCONTRA ARRIMO NAS PROVAS PRODUZIDAS EM JUÍZO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL. INEXISTÊNCIA. 3. ORDEM DENEGADA. (...). 2. Os jurados julgam de acordo com sua convicção, não necessitando fundamentar suas decisões. Em consequência, é impossível identificar quais elementos foram considerados pelo conselho de sentença para condenar ou absolver o acusado, o que torna inviável analisar se o veredicto baseou-se exclusivamente em elementos coletados durante a investigação criminal ou nas provas produzidas em juízo. 3. O art. 593, inciso III, alínea d, do código de processo penal deve ser interpretado como regra excepcional, cabível somente quando não houver, ao senso comum, material probatório suficiente para sustentar a decisão dos jurados. De efeito, em casos de decisões destituídas de qualquer apoio na prova produzida em juízo, permite o legislador um segundo julgamento. Prevalecerá, contudo, a decisão popular, para que fique inteiramente preservada a soberania dos veredictos, quando amparada em uma das versões resultantes do conjunto probatório. (...) [STJ. HC 173965/PE. 5ª T. MIN. REL. MARCO AURÉLIO BELLIZZE. DJE: 29/03/2012] (...) TRIBUNAL DO JÚRI. APELAÇÃO CRIMINAL. VEREDICTO MANIFESTAMENTE CONTRÁRIO À PROVA PRODUZIDA NOS AUTOS. DESCONSIDERAÇÃO DO DEPOIMENTO PRESTADO EM JUÍZO POR UMA DAS TESTEMUNHAS. CONDENAÇÃO COM BASE EM PROVA COLHIDA EXCLUSIVAMENTE NA FASE INQUISITORIAL. ART. 155 DO CPP. TRIBUNAL DO JÚRI. SOBERANIA DOS VEREDICTOS. SIGILO DAS VOTAÇÕES. ÍNTIMA CONVICÇÃO DOS JURADOS. DESNECESSIDADE DE FUNDAMENTAÇÃO DA DECISÃO. IMPOSSIBILIDADE DE IDENTIFICAÇÃO DE QUAIS PROVAS FORAM UTILIZADAS PELA CORTE POPULAR AO DECIDIR PELA CONDENAÇÃO DO PACIENTE. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO EVIDENCIADO. ORDEM DENEGADA. (...) 4. A Constituição Federal, em seu art. 5º, inciso XXXVIII, alíneas "b" e "c", conferiu ao Tribunal do Júri a soberania dos seus Veredictos e o sigilo das votações, tratando-se de exceção à regra contida no inciso IX do art. 93, razão pela qual não se exige motivação ou fundamentação das decisões do Conselho de Sentença, fazendo prevalecer, portanto, como sistema de avaliação das provas produzidas a íntima convicção dos jurados. (...) [STJ. HC 143419/RJ. 5ª T. REL. MIN. JORGE MUSSI. DJe: 29/02/2012] Consoante essas asserções não é possível anular a decisão do Júri Popular, sob o pálio de contrariedade ao acervo probatório, pois, in casu, a versão acatada pelos jurados não se mostra inverossímil ou destoante das provas colhidas. Assim sendo, submeter o réu a novo julgamento, sob o fundamento de que a decisão do Tribunal do Júri fora manifestamente contrária às provas dos autos, somente porque não acolheu a tese defensiva, implicaria em inaceitável afronta ao princípio constitucional da soberania de seus veredictos (art. 5º, inciso XXXVIII, letra c, da Constituição Federal), não havendo, portanto, que se falar em julgamento contrário a evidência dos autos, restando inviável acolher a tese defensiva para anular julgamento que se mostra irretocável e cuja decisão baseou-se em caderno processual regularmente formado. Ao optar pela condenação do ora apelante pela prática do crime tipificado no artigo 121, §2, incisos I d o CPB, os jurados, com base no acervo probatório acostado aos autos, nada mais fizeram do que optar por uma das versões possíveis, sendo a jurisprudência pátria pacífica quanto à higidez de tal tipo de decisão, senão vejamos: RECURSO ESPECIAL. ANULAÇÃO DO JULGAMENTO PROFERIDO PELO TRIBUNAL DO JÚRI. NÃO CONFIGURAÇÃO DA HIPÓTESE PREVISTA NO ART. 593, III, "D", DO CPP. OFENSA À SOBERANIA DOS VEREDICTOS. VEDAÇÃO. 1. As circunstâncias qualificadoras, devidamente reconhecidas pelo plenário do júri, somente podem ser excluídas, em sede de apelação, com base no art. 593, iii, "d", do código de processo penal, quando absolutamente improcedentes, sem amparo nos elementos dos autos, o que não se verifica na espécie. 2. Nunca é demais lembrar que "manifestamente contrária à prova dos autos é a decisão arbitrária, dissociada do conjunto fático-probatório produzido, não aquela que apenas diverge do entendimento firmado pelo órgão julgador a respeito da matéria." (REsp 212.619/PR, Relator Ministro Edson Vidigal, DJ 4/9/2000) 3. No caso, reconhecida a qualificadora do motivo torpe pelo tribunal do júri em conformidade com os fatos apresentados, não poderia o tribunal de origem, via recurso de apelação, desconstituir a escolha dos jurados, procedendo interpretação que, sob sua ótica, se coaduna melhor à hipótese dos autos. 4. Recurso a que se dá provimento para, cassando o acórdão impugnado, restabelecer a decisão proferida pelo tribunal do júri. [STJ. RESP 785.122/SP, 6ª T. REL. MIN. OG FERNANDES, DJE 22/11/2010]. GRIFO NOSSO PENAL E PROCESSUAL PENAL. RECURSO ESPECIAL. HOMICÍDIO QUALIFICADO. DECISÃO DO JÚRI CONTRÁRIA À PROVA DOS AUTOS. INOCORRÊNCIA. VERSÃO ACOLHIDA PELOS JURADOS QUE ENCONTRA AMPARO NA PROVA AMEALHADA. DUAS TESES. OPÇÃO POR UMA DELAS. I - Não se revela contrária à prova dos autos a decisão tomada pelo conselho de sentença que resta apoiada - conforme bem destacado no reprochado acórdão - em provas robustas. II - Ademais, da mesma forma, não se qualifica como manifestamente contrária à prova dos autos a decisão dos jurados que se filia a uma das versões para o crime, em detrimento de outra, ambas apresentadas em plenário, desde que a tese privilegiada esteja amparada em provas idôneas, como ocorreu na espécie. (Precedentes). Recurso Especial Provido. [STJ. RESP 1114474/SP, 5ª T. REL. MIN. FELIX FISCHER, DJe: 16/11/2009] GRIFO NOSSO. No mesmo sentido entende esta Egrégia Corte de Justiça, senão vejamos: APELAÇÃO PENAL. HOMICÍDIO QUALIFICADO. ABSOLVIÇÃO. DECISÃO CONTRÁRIA Á PROVA DOS AUTOS. NÃO CARACTERIZADA. VERSÃO VEROSSÍMIL AO CRIME. SOBERANIA DOS VEREDICTOS. CONSAGRAÇÃO DO PRINCÍPIO IN DUBIO PRO REO. RECURSO DE APELAÇÃO CONHECIDO E DESPROVIDO. I. O acolhimento pelo conselho de sentença de uma das versões apresentadas durante o tribunal do júri e devidamente alicerçada por elementos probatórios dos autos não infirma a decisão soberana do júri. II. Vige em termos de tribunal do júri, o princípio basilar e constitucional da soberania dos veredictos, diante do qual, a decisão tomada pelos jurados é soberana sobre qualquer outra. III. Lado outro, pelo acervo probatório dos autos, resta evidente a dúvida, o que implica na aplicação do princípio in dubio pro reo. IV. Recurso de apelação conhecido e desprovido. [TJ/PA, ACÓRDÃO Nº 104.818, REL. JUÍZA CONVOCADA NADJA COBRA MEDA, DJe 01/03/2012] No caso ora em comento alegou o recorrente que a decisão do Egrégio Conselho de Sentença não encontraria subsídio nas provas existentes nos autos. Contudo, entendo incabível tal alegação diante da existência de suporte probatório suficiente para amparar a decisão dos jurados, que, ressalte-se, decidem com base no princípio da íntima convicção. No que tange à alegação de que o Ministério Público não teria comprovado que o ora apelante seria o mandante do crime narrado nos autos, uma vez que o contratado seria semi-imputável, entendo que razão não assiste à defesa. In casu, como bem ponderou o douto representante do Órgão Acusador em sede de Contrarrazões à s fl s . 388 /389 dos autos, ¿ com relação ao desenvolvimento mental do corréu José Maria Correa d Silva, a defesa se limitou a alegar que ele sofre de retardamento mental que o desabilita a comprovar qualquer situação. Sendo o fato afirmado pela defesa, cabia a esta a prova do mesmo, nos termos do art. 156 do CPP. Na verdade, como se verifica na cópia do Laudo Psiquiátrico Legal que segue anexa, o corréu em questão sofre apenas de Retardo Mental Leve ¿ CID 10 F 70, o que significa ter amplitude aproximada de QI entre 50 e 69 (em adultos, idade mental de 9 a menos de 12 anos). Dessa condição, decorrem dificuldades de aprendizado na escola, mas não há impedimento para o trabalho, para a manutenção de relacionamento social satisfatório e de contribuir para a sociedade. Portanto, é evidente que o corréu não estava desabilitado a confirmar que foi contratado pelo apelante para matar a vítima¿. Registre-se, por oportuno, que a corrente soberanamente acolhida pelos jurados representou uma opção embasada na discussão das provas dos autos, conforme a prerrogativa constitucional da plenitude de defesa (letra 'a' do inciso XXXVIII do art. 5° da CF/88), não havendo como possa ser considerada manifestamente contrária ao conjunto probatório colhido. O Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento quanto a este assunto no julgado abaixo transcrito: HABEAS CORPUS. DIREITO PROCESSUAL PENAL. HOMICÍDIO QUALIFICADO. JÚRI. SOBERANIA DE VEREDICTOS. VERTENTES ALTERNATIVAS DA VERDADE DOS FATOS. PROVA. INDEMONSTRAÇÃO. ORDEM DENEGADA. 1. À instituição do júri, por força do que dispõe o artigo 5º, inciso XXXVIII, alínea "c", da Constituição da República, é assegurada a soberania de seus veredictos. 2. O artigo 593, inciso III, alínea "d", do Código de Processo Penal autoriza que, em sendo a decisão manifestamente contrária à prova dos autos, ou seja, quando os jurados decidam arbitrariamente, dissociando-se de toda e qualquer evidência probatória, seja o réu submetido a novo julgamento pelo Tribunal Popular. 3. Oferecidas aos jurados vertentes alternativas da verdade dos fatos, fundadas pelo conjunto da prova, mostra-se inadmissível que o Tribunal de Justiça, quer em sede de apelação, quer em sede de revisão criminal, desconstitua a opção do Tribunal do Júri - porque manifestamente contrária à prova dos autos - sufragando, para tanto, tese contrária. 4. Não basta, todavia, a evitar seja o réu submetido a novo julgamento pelo Tribunal Popular, a alegação simples da existência de vertentes alternativas da prova da verdade dos fatos, impondo-se que se a demonstre objetivamente nos autos, particularizando as provas de que exsurge a versão outra que permitiu a convicção diversa dos jurados. 5. Ordem denegada. (HC Nº 58.295/MS, Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, DJe 26/05/2008) No mesmo sentido, entendimento jurisprudencial dessa Egrégia Corte de Justiça: Não é manifestamente contrária à prova dos autos a decisão dos jurados que acolheu a tese de homicídio qualificado por motivo fútil, qual seja, ciúmes, visto que livre o Conselho de Sentença na escolha, aceitação e valoração da prova, pois havendo duas linhas de interpretação para o fato, não há como impedir que os Jurados optem por uma delas, ainda que não seja a melhor sob a ótica técnico-jurídica, entre as teses suscitadas no processo. Esse procedimento decorre do princípio da convicção íntima, corolário do primado constitucional de soberania do Júri Popular, previsto no art. 5º, inc. XXXVII, da CF Arbitramento de valor à título de reparação dos danos causados pela infração. (Acórdão Nº 92.098, Rel. Desa. Vânia Fortes Bitar, DJ 19/10/2010) Confiram-se, a propósito, as seguintes lições doutrinárias: Admite, finalmente, o Código apelação contra a decisão dos jurados que for manifestamente contrária à prova dos autos (art. 593, III, d), podendo o Tribunal determinar novo julgamento (art. 593, § 3º). Com isso o legislador permitiu, em casos de decisões destituídas de qualquer apoio na prova produzida, um segundo julgamento. Prevalecerá, contudo, a decisão popular, para que fique inteiramente preservada a soberania dos veredictos, quando estiver amparada em uma das versões resultantes do conjunto probatório. Se o Tribunal de Justiça, apesar de haver sustentáculo na prova para a tese vencedora, ainda que não seja robusta, determinar erroneamente novo julgamento, será cabível recurso especial ou habeas corpus, para o fim de subsistir a vontade do Conselho de Sentença e ser assegurada a soberania de seus veredictos. (GRINOVER, Ada Pellegrini; GOMES FILHO, Antonio Magalhães; FERNANDES, Antonio Scarance. Recursos no Processo Penal. p. 103) Trata-se de hipótese em que se fere justamente o mérito de causa, em que o error in judicando é reconhecido somente quando a decisão é arbitrária, porque se dissocia integralmente da prova dos autos, é contrária 'manifestamente' à verdade apurada no processo e representa uma distorção da função judicante do Conselho de Sentença. Assim, não é qualquer dissonância entre o veredicto e os elementos de convicção colhidos na instrução que autorizam a cassação do julgamento. Unicamente, a decisão dos jurados, que nenhum arrimo encontra na prova dos autos, e que pode ser invalidada. É lícito ao Júri optar por uma das versões verossímeis dos autos, numa interpretação razoável dos dados instrutórios, devendo ser mantida a decisão quando isso ocorrer. (MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo Penal, p. 683) Assim, entendo que a decisão do Conselho Popular condenando o ora apelante como autor do crime tipificado no artigo 121, §2, inciso I d o CPB , está de acordo com o acervo probatório coligido aos autos, não se justificando, pois, a anulação do julgamento máxime, por ser soberano. E ainda, na análise da insurgência, a instância recursal deve se abster de emitir qualquer juízo de valor sobre a justiça da decisão tomada pelo Tribunal do Júri ou sobre a força probatória de determinados elementos de prova produzido nos autos, sob pena de estar influenciando no próprio mérito do édito popular. Entendo quando o legislador fez uso do advérbio ¿manifestamente¿ abriu a possibilidade de exceção da soberania do júri apenas quando não existir elemento algum que confira sustentação a decisão tomada pelos jurados, ou seja, quando inequívoca, indubitável a contrariedade ao conjunto probatório dos autos. Entretanto, se existir uma outra tese plausível, ainda que frágil e questionável e os jurados optarem por ela, deve-se respeitar tal decisum, visto que não se pode questionar a interpretação dada aos fatos pelos jurados, a não ser que inexista elemento que a corrobore, conforme já decidido pelo Pretório Excelso: JÚRI. ACOLHIMENTO DE TESE DA DEFESA. DECISÃO MANIFESTAMENTE CONTRÁRIA À PROVA DOS AUTOS. INOCORRÊNCIA. (...). Decisão dos jurados que acolheu a tese do homicídio privilegiado, com base no histórico de discussões entre vítima e réu e no depoimento de testemunha que afirmou ter escutado vozes em tom exaltado momentos antes do crime. Inexistência de decisão arbitrária ou inverossímil. Em verdade, o Tribunal de Justiça considerou a prova de acusação mais sólida do que a de defesa, avaliação esta, entretanto, que é reservada ao Tribunal do Júri, juízo natural da causa, com base no critério da íntima convicção. Assim, por não caber à Justiça togada, nos estreitos limites da apelação contra veredicto do Tribunal do Júri, desqualificar prova idônea produzida sob o crivo do contraditório, a decisão é ilegal. Ordem concedida para cassar a determinação de realização de novo julgamento pelo Júri, com base no art. 593, III, d, do Código de Processo Penal. (HC Nº 85.904, Rel. Min. Joaquim Barbosa, DJe 29/06/2007) Adoto, como razões de decidir os bem lançados fundamentos constantes no parecer de fls. 404/405, de lavra do Procurador de Justiça, Dr. Hezedequias Mesquita da Costa, integrando-os ao presente, com a devida vênia, in verbis: (...). Assim, em que pese a defesa ter a vergastado a validade dos esclarecimentos fornecidos em nome do Sr. José Maria por ser ele semi-imputável, não se incomodou em produzir provas nesse sentido, isto é, provar a terminante invalidade das palavras do próprio executor do crime (conforme alude o artigo 156 do Código de Processo Penal); este último dato é um tanto contraditório e fantasioso, ora, se a defesa, parte do pressuposto que José Maria seria um dos autores executores do delito, não se importando em apontar um outro motivo que ¿Radé¿ praticasse o crime, que não à mando do ora apelante (por vingança gerada em função de uma furto de substâncias entorpecentes), torna tal tentativa de macular a decisão do ínclito Conselho de Sentença, portanto, inócua. (...). Pelo exposto, não acolho a tese ora em análise. 2. DO PEDIDO DE FIXAÇÃO DA PENA EM SEU PATAMAR MÍNIMO: A defesa requereu, de forma subsidiária, o redimensionamento da pena em concreto para o seu patamar mínimo por ter sido dosada de forma desproporcional em sede do decisum objurgado. Entendo que merece acolhimento tal irresignação defensiva, restando imperioso dar-se parcial provimento ao recurso do ora apelante. Cediço que o juiz ao fixar a pena deve utilizar o modelo trifásico de Nelson Hungria, e na primeira fase, qual seja, a fixação da pena base, deve-se levar em conta vários critérios, quais sejam, à culpabilidade, os antecedentes, a conduta social, dentre outros, como assevera o artigo 59 do Código Penal Brasileiro, cabendo ao magistrado fixar a pena aplicável em quantidade que for necessária e suficiente para reprovação e prevenção do delito. Além do que é salutar mencionar, antes mesmo de adentrar no mérito da dosimetria da pena, que é o objetivo maior desta, deve permanecer em fiel acordo com a proporcionalidade entre as condições do delito e o indivíduo que o praticou, a fim de ensejar uma melhor individualização da pena assim como melhor eficácia da mesma. Nesse sentido diz a jurisprudência: A EFICÁCIA DA PENA APLICADA ESTÁ DIRETAMENTE LIGADA AO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE, A FIM DE ASSEGURAR A INDIVIDUALIZAÇÃO, POIS QUANTO MAIS O JUIZ SE APROXIMAR DAS CONDIÇÕES QUE ENVOLVEM O FATO, DA PESSOA DO ACUSADO, POSSIBILITANDO APLICAÇÃO DA SANÇÃO MAIS ADEQUADA, TANTO MAIS TERÁ CONTRIBUÍDO PARA A EFICÁCIA DA PUNIÇÃO (TACRSP; RJDTACRIM 29/152) Impende nesse momento explicitar que a dosimetria da pena privativa de liberdade baseia-se em um critério trifásico: primeiro, é fixada a pena base, examinando-se as circunstâncias judiciais previstas no artigo supracitado e, em seguida, passa-se à análise sobre a existência de circunstâncias agravantes e atenuantes genéricas e, por fim, verifica-se a presença das causas de aumento e diminuição de pena. Insta destacar que, no que concerne à aplicação da pena base, é inegável que ao sentenciante é reservada uma larga margem de discricionariedade. Entretanto, não se trata de discricionariedade livre, e sim, vinculada, devendo guiar-se pelos 08 (oito) fatores indicativos relacionados no caput do artigo supracitado, fixando, dessa forma, a reprimenda básica conforme seja suficiente para a reprovação e prevenção do delito denunciado. Conforme sustenta o ora recorrente, o magistrado de piso não teria examinado de forma escorreita as circunstâncias judiciais do artigo 59 do Código Penal, fixando a pena base do crime em questão de forma não razoável. In casu, a pena do ora apelante fora fixada pelo juízo a quo nos seguintes termos, in verbis: (...). Em face da decisão soberana dos senhores jurados, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a pretensão punitiva estatal e CONDENO O RÉU, ANTÔNIO DA SILVA FERREIRA, nas penas do art. 121, §2º, I do CP. A sanção aplicável ao réu, dentro dos limites fixados em lei, resultará das circunstâncias previstas no art. 59 do CP. Infere-se dos autos que o réu é primário, sem antecedentes criminais registrados; sua conduta social anterior revela atividade criminosa (possível tráfico de drogas); sua personalidade, manifestada por ocasião do crime e depois deste, revela que ser um homem perigoso. Intensividade do dolo alta, motivos reprováveis, circunstâncias desfavoráveis ao réu. Acrescentam-se as irremediáveis consequências do crime, representadas pela eliminação prematura de uma vida humana, enlutando para sempre os lares de seus parentes. Todas essas circunstâncias que envolveram os fatos imputados ao réu e reconhecidos pelo Júri, recomendam uma resposta penal suficiente e necessária para reprovação e prevenção do crime, consoante preconiza o art. 59 do CP, justificando a fixação da pena base acima do mínimo legal, em que pese sua primariedade e ausência de antecedentes. Em face disso, entendo ser necessária e suficiente para a reprovação e prevenção do crime, segundo as diretrizes do art. 59 do CP estabelecer a pena base em 14 (quatorze) anos de reclusão. Não existem causas de aumento ou diminuição da pena. Também não existem circunstâncias atenuantes ou de agravamento genéricas, ou causas de aumento de pena. Razão pela qual torno definitiva a pena base fixada de 14 (quatorze) anos de reclusão. (...). O regime de cumprimento inicial da pena, atendendo ao disposto no art. 2º§1º da Lei Nº 8.072/90, será o fechado. (...). GRIFEI. Dessa forma, faz-se necessário, primeiramente, revolver as circunstâncias do artigo 59 do CP com o fito de analisar os critérios utilizados pelo magistrado a quo para fixação da pena base. In casu, após análise minuciosa da sentença objurgada, verifiquei que o magistrado de piso não examinou de forma escorreita as circunstâncias judiciais do artigo 59 do Código Penal, fixando a pena base do crime em questão de forma não razoável. Com efeito, o agir do recorrente, embora condenável, não foge ao corriqueiramente observado na espécie, sendo, portanto desproporcional a valoração contida no édito condenatório no que tange à dosagem da pena base e em homenagem ao princípio da individualização da pena (artigo 5º, inciso XLVI, CF/88), o redimensionamento da pena base é medida que se impõe ao final do presente voto, de modo a encontrar a quantidade de pena necessária e suficiente para a reprovação e prevenção do crime, conforme dispõe a parte final do artigo 59 do Código Penal, mantendo a coerência com a decisão de minha relatoria quando do julgamento da Apelação Penal Nº 2012.3.008728-6 (Acórdão Nº 110.323, publicação: 02/08/2012), quando redimensionei a dosimetria da pena em voto assim ementado, senão vejamos: APELAÇÃO PENAL. (...). PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE E DA INDIVIDUALIZAÇÃO DA PENA. (...). DOSIMETRIA DA PENA. REDIMENSIONAMENTO. REANÁLISE DAS CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS DO ARTIGO 59 DO CÓDIGO PENAL VALORADAS ERRONEAMENTE PELO JUÍZO A QUO. (...). RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO (...). UNANIMIDADE. Compulsando a sentença penal condenatória, nota-se que na 1ª fase da dosimetria da pena o magistrado singular, em observância ao disposto no artigo 59 do Código Penal , fixou a pena base em 1 4 anos de reclusão , exasperando a pena do mínimo legal em razão da valoração negativa das seguintes circunstâncias judiciais: c onduta social, personalidade, motivos, circunstância e consequências do crime. É de conhecimento comum que no primeiro estágio da individualização da pena privativa de liberdade o julgador dispõe da chamada discricionariedade juridicamente vinculada: sem desprender-se do dever de motivação da sua decisão, concretiza a pena-base com relativa subjetividade, sem poder, contudo, desbordar da quantidade mínima e máxima abstratamente cominada no tipo legal, consoante leciona Guilherme de Souza Nucci (Código Penal Comentado. 11ª Edição. Editora Revista dos Tribunais: p. 414) : Trata-se de um processo judicial de discricionariedade juridicamente vinculada visando a suficiência para prevenção e reprovação da infração penal. O juiz, dentro dos limites estabelecidos pelo legislador (mínimo e máximo, abstratamente fixados para a pena), deve eleger o quantum ideal, valendo-se do seu livre convencimento (discricionariedade), embora com fundamentada exposição do seu raciocínio (juridicamente vinculada) (...). Segundo o doutrinador Guilherme de Souza Nucci (Código Penal Comentado, 11ª Edição, Editora Revista dos Tribunais, 2012, p. 418) , in verbis: ¿é defeso ao magistrado deixar de levar em consideração as oito circunstâncias judiciais existentes no art. 59, caput, para a fixação da pena-base. Apenas se todas forem favoráveis, tem cabimento a aplicação da pena no mínimo¿. No mesmo sentido, Cleber Masson (Direito Penal Esquematizado, 2ª Edição, Editora Método: p. 592) , ensina, in verbis: ¿Somente quando todas as circunstâncias forem favoráveis ao réu a pena deve ser fixada no mínimo legal (...)¿. No presente caso, porém, verifico que o juízo singular incidira em error in judicando no que tange à valoração negativa d as circunstâncias judiciais supracitadas, pois enfrentou algumas destas de forma absolutamente genérica, sem fazer referência mínima aos elementos concretos extraídos dos autos, consoante determina o artigo 93, inciso IX da Constituição da República de 1988 (dever de fundamentação dos pronunciamentos jurisdicionais). Ao julgador de piso, na 1ª fase da individualização da pena, não é dada a possibilidade de exasperar a pena-base com espeque em referências vagas e genéricas. O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Habeas Corpus Nº 191734/PE, distribuído para a relatoria da Ministra Laurita Vaz, com Acórdão publicado no Diário de Justiça em 26/9/2012, assentou, in verbis: ¿(...) Não pode o magistrado sentenciante majorar a pena-base fundando-se, tão somente, em referências vagas, genéricas, desprovidas de fundamentação objetiva para justificar a exasperação, tais como, ¿tinha consciência de que agia em desacordo com a lei¿ (culpabilidade) e ¿vítima em nada contribui para o crime¿ (comportamento da vítima) (...)¿. Ressalto que a mera indicação genérica e abstrata de circunstâncias judiciais para o fim de majorar a pena-base revela-se intolerável no sistema jurídico, conforme destaca o doutrinador Rogério Greco (Curso de Direito Penal Parte Geral. 14ª Edição. Editora Impetus: p. p. 555/556) , in verbis: ¿(...) se o juiz fixou a pena-base acima do mínimo legal é direito do réu saber o porquê dessa decisão (...)¿ . Ao exasperar a pena-base o magistrado deve reportar-se aos elementos concretos existentes nos autos sob o risco de configurar excesso de pena e violação ao princípio da proporcionalidade . Sobre o tema, colaciono a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça , a saber: PENA: INDIVIDUALIZAÇÃO E REGIME INICIAL DE CUMPRIMENTO: AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO: NULIDADE. NÃO RESPONDE A EXIGÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO DE INDIVIDUALIZAÇÃO DA PENA-BASE E DA DETERMINAÇÃO DO REGIME INICIAL DA EXECUÇÃO DA PENA A SIMPLES MENÇÃO AOS CRITÉRIOS ENUMERADOS EM ABSTRATO PELO ART. 59 C. PEN., QUANDO A SENTENÇA NÃO PERMITE IDENTIFICAR OS DADOS OBJETIVOS E SUBJETIVOS QUE A ELES SE ADEQUARIAM, NO FATO CONCRETO, EM DESFAVOR DO CONDENADO. [STF. HC 68.751. Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE. Publicação: 1º/11/1991] AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. PENAL. CRIME DE FURTO. DOSIMETRIA DA PENA. ILEGALIDADE. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA PARA EXASPERAÇÃO DA PENA-BASE. REDUÇÃO AO MÍNIMO LEGAL QUE SE IMPÕE. (...). HABEAS CORPUS CONCEDIDO. DECISÃO MANTIDA PELOS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. AGRAVO DESPROVIDO. (...) 2. A valoração negativa das circunstâncias judiciais foi feita com considerações vagas, genéricas, sem fundamentação objetiva, portanto inadequadas para justificar a exasperação, pois o Magistrado não indicou nenhum fato concreto que justificasse a valorização negativa das circunstâncias. [STJ. AgRg no HC 202233 / ES. Relª. Minª. Laurita Vaz. Publicação: 28/5/2013] PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ESPECIAL INTERPOSTO. (...) AUSÊNCIA DE MOTIVAÇÃO. INOCORRÊNCIA. DOSIMETRIA. PENA-BASE ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. FUNDAMENTAÇÃO INADEQUADA. CULPABILIDADE, MOTIVOS E CONSEQUÊNCIAS DO CRIME. REFERÊNCIAS GENÉRICAS. CONSTRANGIMENTO ILEGAL. OCORRÊNCIA. ORDEM DENEGADA. REFORMA DO ACÓRDÃO E NOVA DOSIMETRIA DA PENA. HABEAS CORPUS CONCEDIDO DE OFÍCIO. (...) VI. A viabilidade do exame da dosimetria da pena, por meio de habeas corpus, somente se faz possível caso evidenciado eventual desacerto na consideração de circunstância judicial ou errônea aplicação do método trifásico, se daí resultar flagrante ilegalidade e prejuízo ao réu - hipótese dos autos. (...) VIII. Apesar de terem sido desfavoravelmente sopesadas, a culpabilidade, os motivos e as consequências do crime se encontram desvinculadas de fatores concretos que os conectem à hipótese dos autos, tendo sido indevidamente citados de modo genérico. IX. Denego a ordem, face à impetração, mas concedo habeas corpus de ofício para que seja reformado o acórdão recorrido no tocante à dosimetria da pena imposta aos pacientes, a fim de que outra seja procedida, mantendo-se a condenação, nos termos do voto do Relator. [HC 202632/MG. Rel. Min. GILSON DIPP. Publicação: 04/09/2012) Os tribunais brasileiros também decidem no mesmo sentido, senão vejamos: PENAL. LEI DE DROGAS. TRÁFICO. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. REDUÇÃO DA PENA-BASE. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS FAVORÁVEIS. (...). Se as circunstâncias judiciais da culpabilidade, motivos e circunstâncias do crime foram todas inerentes ao tipo penal, mostra-se necessária a redução da pena-base (...). [TJDFT. APEL. 20120110449442APR. Rel. Des. ESDRAS NEVES. Publicação: 13/11/2012] Por conseguinte, acolho à alegação ora em comento. 3. DO REDMENSIONAMENTO DA PENA: Não havendo mais teses a serem enfrentadas, passo, nesse momento, ao redimensionamento da dosimetria da pena, analisando, primeiramente, as circunstâncias judiciais do artigo 59 do Código Penal: a) Culpabilidade: normal ao tipo; b) Antecedentes criminais: tecnicamente primário, nos moldes da Súmula 444 do Superior Tribunal de Justiça; c) Conduta social: sem dados; d) Personalidade: nada restou apurado nos autos sobre o perfil psicológico do agente, por isso, atribuo valoração neutra ao fator em apreço; e) Motivos do crime: específicos do tipo penal; f) Circunstâncias do crime: valorada de forma neutra; g) Consequências do crime: também comum à espécie do delito ora em análise, cuja gravidade é própria ao tipo penal, pois embora a dor e sofrimento da família ante a perda de um ente querido sejam presumíveis os traumas psicológicos efetivos experimentados pelos parentes mais próximos do de cujus não restaram atestados nos autos ; h) Comportamento da vítima: incabível a análise no presente caso. Fixo a pena base em 12 (doze) anos de reclusão. Na segunda fase, não verifico agravantes nem atenuantes. Na terceira fase, inexistentes causas de diminuição e aumento de pena, motivo pelo qual fixo a pena definitivamente em 12 (doze) anos de reclusão. Por tais razões de decidir, torno concreta, definitiva e final a reprimenda, condenando o recorrente à pena privativa de liberdade de 12 (doze) anos de reclusão de reclusão em regime inicial fechado para cumprimento da reprimenda, conforme artigo 33, §2º, ¿a¿ e §3º do Estatuto Repressivo pela prática do crime tipificado no artigo art. 121, §2º, I do CP. Por tais razões de decidir, CONHEÇO do presente recurso de Apelação e, no mérito, DOU PARCIAL PROVIMENTO à pretensão recursal a fim de reconhecer o error in judicando na individualização da pena por violação ao princípio da fundamentação, redimensionando a pena para 12 (doze) anos de reclusão, mantidas as demais cominações da sentença vergastada. É como voto. Belém/PA, 16 de dezembro de 2014. Relatora Desª. Vera Araújo de Souza Desembargadora 1
(2014.04801885-70, 141.802, Rel. VERA ARAUJO DE SOUZA, Órgão Julgador 1ª TURMA DE DIREITO PENAL, Julgado em 2014-12-16, Publicado em 2014-12-18)
Data do Julgamento
:
16/12/2014
Data da Publicação
:
18/12/2014
Órgão Julgador
:
1ª TURMA DE DIREITO PENAL
Relator(a)
:
VERA ARAUJO DE SOUZA
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