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Jurisprudência


TJPA 0000470-50.2012.8.14.0000

Ementa
SECRETARIA JUDICIÁRIA CONFLITO DE COMPETÊNCIA nº 2012.3.010843-8 Suscitante: JUÍZO DA 2ª VARA DO JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL DO IDOSO DA CAPITAL Suscitado: JUÍZO DA 2ª VARA DE JUIZADO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER DA CAPITAL Procurador-Geral de Justiça: ANTÔNIO EDUARDO BARLETA DE ALMEIDA Relatora: Desa. BRÍGIDA GONÇALVES DOS SANTOS Vistos etc. Trata-se de Conflito Negativo de Competência, suscitado pelo JUÍZO DA 2ª VARA DO JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL DO IDOSO, em face do JUÍZO DE DIREITO DA 2ª VARA DE JUIZADO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER, ambos da Capital, nos Autos de Medidas Protetivas de Urgência formulado por RAIMUNDA CAETANO DE LIMA contra RAFAEL CAETANO LIMA. Consta do feito que, no dia 11.05.2011, o requerido RAFAEL LIMA ofendeu moralmente sua mãe de criação, a Sra. RAIMUNDA DE LIMA, idosa, com 68 anos de idade à época dos fatos, em razão da ofendida ter reclamado com o requerido porque o mesmo havia ameaçado a neta daquela com uma faca. Os autos foram distribuídos, no dia 12.05.2011, à 2ª VARA DE JUIZADO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER DA CAPITAL. No dia 18.05.11, o referido Juízo entendeu que a vítima e o agressor são parentes, estando, portanto, caracterizada a violência doméstica. Todavia, sustenta que a ofendida é idosa e que o delito não ocorreu em razão da mesma pertencer ao gênero mulher, mas por sua condição de pessoa idosa, não havendo, para aquele Juízo, motivação de gênero in casu, pelo que entendeu ser absolutamente incompetente em razão da matéria para apreciar e julgar o caso, remetendo o feito a uma das Varas do Juizado Especial Criminal do Idoso de Belém (fls. 09/19). Os autos foram redistribuídos, no dia 16.09.11, à 2ª VARA DO JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL DO IDOSO DA CAPITAL, tendo o Juízo, no dia 26.10.11, declinado de sua competência, por entender que o caso se amolda à relação de violência doméstica e familiar contra a mulher, ainda que a ofendida seja idosa. Assim, suscitou o presente Conflito (fl. 22). O Incidente foi distribuído a esta Relatora em 16.05.12. A Procuradoria Geral de Justiça manifestou-se pela declaração de competência do Juízo de Direito da 2ª VARA DE JUIZADO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER DE BELÉM para processar e julgar o feito (fl. 28/31). É o relatório. Funda-se o Conflito em verificar se as medidas protetivas de urgência requeridas por RAIMUNDA CAETANO DE LIMA em face de RAFAEL CAETANO LIMA devem ser analisadas pelo JUÍZO DA 2ª VARA DO JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL DO IDOSO DA CAPITAL ou pelo JUÍZO DA 2ª VARA DE JUIZADO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER DE BELÉM-PA, vez que se trata de suposta ofensa moral praticada contra mulher idosa no ambiente familiar. Os autos relatam que a vítima foi agredida moralmente por seu filho de criação, que é usuário de drogas e fica provocando confusão dentro da residência da ofendida. O feito narra, ainda, que a requerente criou o requerido desde criança, mas o mesmo não a respeita como sua mãe e constantemente pratica violência doméstica contra a mesma. Sobre o tema da violência doméstica, a Lei nº 11.340/06, conhecida com Lei Maria da Penha, dispõe em seu art. 5º que: configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial, seja no ambiente doméstico, familiar ou em qualquer relação íntima de afeto. Oportuno registrar os ensinamentos da Eminente Desembargadora do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, MARIA BERENICE DIAS, sobre a matéria, ao sustentar que somente o citado dispositivo legal não é suficiente para conceituar violência doméstica e familiar contra a mulher, sendo imperiosa a interpretação conjunta dos artigos 5º e 7º, da Lei Maria da Penha. Assim, a jurista define violência doméstica como: qualquer das ações elencadas no art. 7º (violência física, psicológica, sexual, patrimonial ou moral) praticada contra a mulher em razão de vínculo de natureza familiar ou afetiva. (In A Lei Maria da Penha na justiça: a efetividade da Lei 11.340/2006 de combate à violência doméstica e familiar contra a mulher. São Paulo: Editora RT, 2007, p. 40). Por sua vez, ROGÉRIO SANCHES CUNHA e RONALDO BATISTA PINTO conceituam violência doméstica como sendo: a agressão contra a mulher, num determinado ambiente (doméstico, familiar ou de intimidade), com finalidade específica de objetá-la, isto é, dela retirar direitos, aproveitando da sua hipossuficiência. (In Violência Doméstica (Lei Maria da Penha): Lei 11.340/2006. Comentada artigo por artigo. São Paulo: Editora RT, 2007, p. 29). Desse modo, constata-se que o espírito da Lei 11.340/06 foi o de salvaguardar, coibir e reprimir as agressões (física, psicológica, sexual, patrimonial ou moral) sofridas pela mulher no âmbito doméstico, familiar ou de afeto íntimo, independentemente da idade da vítima, vez que nessas hipóteses a mesma se encontra em situação de vulnerabilidade, fragilidade e hipossuficiência em relação ao agente. In casu, houve uma suposta ofensa moral praticada por um filho contra sua mãe, pessoa idosa, no âmbito familiar, o que em nada desnatura a situação de vulnerabilidade e fragilidade da vítima em relação ao infrator no ambiente doméstico e familiar, vez que o delito em tese perpetrado, baseou-se no gênero mulher e não na condição de idosa da vítima. A propósito, este Colendo Tribunal de Justiça já pacificou o entendimento nessa direção em casos semelhantes: CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA - ART. 65 DA LEI DE CONTRAVENÇÕES PENAIS - DELITO COMETIDO CONTRA MULHER IDOSA NO ÂMBITO FAMILIAR - COMPETÊNCIA DO JUIZADO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR. 1. A perturbação de tranquilidade tem por base o gênero, ou seja, a condição de mulher da vítima e não a condição de idosa, e neste caso, a inquietação fora perpetrada no âmbito familiar e em razão de difícil convivência familiar entre a vítima e o agressor, uma vez que o indiciado é usuário de drogas. 2. Constatado que a conduta delituosa se deu em virtude da hipossuficiência e inferioridade física da vítima, somada a relação íntima de afeto que esta possui com o agressor, pelo que a situação se amolda perfeitamente ao disposto no art. 5 da Lei 11.340/2006. Decisão unânime. (TJPA, ACÓRDÃO 110713, Rel. Desa. MARIA DE NAZARÉ SILVA GOUVEIA DOS SANTOS, TRIBUNAL PLENO, julgado em 13/08/2012, DJe 16/08/2012). (Grifei). CONFLITO NEGATIVO DE JURISDIÇÃO. FEITO COM DENÚNCIA AINDA NÃO OFERECIDA. REVISÃO DA TESE DE CONFIGURAÇÃO DE CONFLITO DE ATRIBUIÇÕES ENTRE MEMBROS DO MINISTÉRIO PÚBLICO. COTEJO ENTRE O ESTATUTO DO IDOSO E A LEI MARIA DA PENHA: PREVALÊNCIA DESTA ÚLTIMA. COMPETÊNCIA DO JUIZADO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA MULHER. DECISÃO UNÂNIME. (...) II No auto de prisão em flagrante, foram imputados ao agente os crimes de violência doméstica, ameaça e dano, perpetrados contra sua avó idosa. Verifica-se, em tese, tanto a incidência da Lei n. 10.741, de 2003 (Estatuto do Idoso), quanto da Lei n. 11.340, de 2006 (Lei Maria da Penha), que preveem a criação da varas privativas e prioridade de julgamento. III Percebe-se, contudo, que a tutela oferecida pela Lei Maria da Penha é muito mais ampla do que a do Estatuto do Idoso, em qualidade e quantidade de instrumentos de proteção às vítimas. A par disso, não se investiga nos autos nenhum delito tipificado na lei dos idosos, razão pela qual se declara a competência em favor da 2ª Vara de Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher Belém, o que não trará qualquer prejuízo à proteção dos interesses da vítima. IV Competência declarada em decisão unânime. (TJPA, ACÓRDÃO 110585, Rel. Des. JOÃO JOSÉ DA SILVA MAROJA, TRIBUNAL PLENO, julgado em 08/08/2012, DJe 13/08/2012). (Grifei). Conflito Negativo de Competência - Juízo de Direito da 2ª Vara do Juizado Especial Cível e Criminal do Idoso da Comarca de Belém e Juízo de Direito da 3ª Vara de Violência Doméstica e Familiar contra Mulher da Capital - Ameaça e agressão moral contra vítima idosa e hipossuficiente - Situação de vulnerabilidade - Incidência da Lei nº 11.340/06 - Tratando-se de ameaça e agressão do filho contra a sua mãe idosa, havendo, pois, vínculo afetivo entre ambos, que coabitam a mesma residência, bem como a situação de vulnerabilidade, hipossuficiência e inferioridade física da vítima de 76 anos em relação ao seu filho, caracterizada resulta a hipótese de incidência da Lei Maria da Penha, enquadrando-se a questão na relação de gênero, pois o delito em tese foi cometido em razão de aspectos familiares, vislumbrando-se a tentativa de dominação do agressor em detrimento da vítima, que além de mulher, é idosa - Conflito conhecido e declarada a competência do Juízo de Direito da 3ª Vara de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher da Capital - Decisão unânime. (TJPA, ACÓRDÃO 109902, Rel. Desa. VANIA FORTES BITAR, TRIBUNAL PLENO, julgado em 11/07/2012, DJe 12/07/2012). (Grifei). Ante tais fundamentos e na esteira dos precedentes deste E. Tribunal de Justiça, conheço monocraticamente do presente Conflito para DECLARAR A COMPETÊNCIA do JUÍZO DE DIREITO DA 2ª VARA DE JUIZADO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER DA CAPITAL para processar e julgar o feito, em conformidade com o princípio da economia processual. Remetam-se os autos ao Juízo Suscitado incontinênti e cópia da decisão ao Juízo Suscitante para conhecimento. À Secretária para os procedimentos legais pertinentes. Belém, 17 de outubro de 2012. Desembargadora BRÍGIDA GONÇALVES DOS SANTOS Relatora (2012.03461455-32, Não Informado, Rel. BRIGIDA GONCALVES DOS SANTOS, Órgão Julgador TRIBUNAL PLENO, Julgado em 2012-10-17, Publicado em 2012-10-17)
Decisão
DECISÃO MONOCRÁTICA

Data do Julgamento : 17/10/2012
Data da Publicação : 17/10/2012
Órgão Julgador : TRIBUNAL PLENO
Relator(a) : BRIGIDA GONCALVES DOS SANTOS
Número do documento : 2012.03461455-32
Tipo de processo : Conflito de Jurisdição
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