TJPA 0000519-27.2013.8.14.0301
SECRETARIA DA 3ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA COMARCA DE BELÉM APELAÇÃO CÍVEL Nº. 0000519-27.2013.8.14.0301 SENTENCIANTE: 3ª VARA DA FAZENDA DE BELÉM APELANTE: MUNICÍPIO DE BELÉM APELADO: J.D.C.A. REPRESENTANTE: IRACY CALDAS DOMINGUES RELATORA: DESA. MARIA FILOMENA DE ALMEIDA BUARQUE APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO À SAÚDE. AUTORA NECESSITA DE FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO PARA INSUFICIÊNCIA RENAL CRÔNICA E BEXIGA NEUROGÊNICA. LEGITIMIDADE PASSIVA DO MUNICÍPIO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES DA FEDERAÇÃO. A CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA ASSEGURA A TODOS O DIREITO À SAÚDE. PRECEDENTES DO STJ, RECURSO REPETITIVO. NEGADO PROVIMENTO À APELAÇÃO. 1. Havendo responsabilidade concorrente entre a União, Estados e Municípios, em relação ao implemento do direito à saúde, constitucionalmente previsto, a parte poderá demandar qualquer dos entes da Federação. 2. O artigo 196, da Constituição da República, garante o direito à saúde, impondo ao Estado o dever de provê-la, não se tratando de norma apenas programática. Dispõe também a Carta Magna, no artigo 198, inciso II, sobre a universalidade da cobertura e do atendimento integral, como diretrizes das ações e serviços públicos de Saúde. 3. Outrossim, o recorrente impugna a cominação de astreinte, porém, entendo que não assiste razão ao insurgente, na medida em que a Jurisprudência alinha-se no sentido da possibilidade de cominação de multa por descumprimento de decisão. 4. Apelação cível que se conhece e nega provimento. DECISÃO MONOCRÁTICA Trata-se de APELAÇÃO CÍVEL interposta pelo MUNICÍPIO DE BELÉM em face da sentença prolatada pelo Juízo da 3ª Vara da Fazenda de Belém nos autos do MANDADO DE SEGURANÇA, impetrado por J.D.C.A., representada por sua genitora IRACY CALDAS DOMINGUES, a qual concedeu a segurança pleiteada, vejamos: ¿Diante de todo o exposto CONFIRMO A LIMINAR CONCEDIDA às fls. 18/24, com fundamento no art. 269, I do CPC e CONCEDO A SEGURANÇA pleiteada, pelo que determino ao impetrado que forneça a quantidade mensal de 180 (cento e oitenta) sondas uretrais nº 10 e 03 (três) tubos de xylocaína geleia, enquanto se fizer necessário o tratamento, sob pena de multa diária arbitrada em R$ 5.000,00 (cinco mil reais), para a hipótese de descumprimento.¿ Em suas razões (fls. 73/86), o MUNICÍPIO DE BELÉM sustentou preliminarmente o chamamento da União Federal e do Estado do Pará para compor a lide com a sua exclusão, argumentando que não é responsabilidade do Município de Belém a obrigação em prestar assistência médica da qual a apelada necessita. Aduz que deve-se entender com restrições a possibilidade dos entes federativos, na competência comum, de atuarem num mesmo campo, senão se configurará a invasão de competência. Alegou ainda a ausência de responsabilidade do ente municipal, em virtude da natureza programática da norma que consagra o direito a saúde. Ademais, sustentou a falta de dotação orçamentária para custear o tratamento pleiteado e a impossibilidade de cominação de multa em caso de descumprimento da decisão. Com base nestas considerações, requereu o conhecimento e provimento do Recurso. A apelação foi recebida apenas no seu efeito devolutivo. A Apelada apresentou contrarrazões às fls. 89/96. Os autos foram remetidos a este E. Tribunal, onde foram distribuídos à minha relatoria. É o relatório. Decido. Presentes os pressupostos de admissibilidade, CONHEÇO DA APELAÇÃO CÍVEL. Verifico, que se trata de situação que pode e deve ser apreciada e julgada de imediato, com fulcro no art. 932, inciso IV, alínea ¿b¿, do NCPC, que, assim, dispõe: Art. 932. Incumbe ao relator: (...) IV - negar provimento a recurso que for contrário a: (...) b) acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos; (...) Sustenta o Apelante a sua ausência de responsabilidade para custear o tratamento da Autora, suscitando a sua ilegitimidade passiva, bem como a impossibilidade dos entes federativos atuarem no mesmo campo, sob pena de restar configurada a invasão de competência. Por fim, alega que a norma que consagra o direito a saúde possui natureza programática e que o Município de Belém não possui dotação orçamentária para custear o tratamento. O Sistema Único de Saúde - SUS é organizado de forma descentralizada, regido pelo princípio da cogestão, em que se partilha, entre os entes da Federação, a responsabilidade de garantir aos cidadãos o direito constitucional à saúde, nos moldes da Lei n. 8.080, de 1990, sendo incontroverso que devem agir simultaneamente, possibilitando a realização das ações e serviços de saúde. Face à responsabilidade solidária dos entes componentes da Federação, que se dá verticalmente, e com direção única do SUS em cada esfera de governo, cabe tanto ao Município como ao Estado e União garantir a todos o direito à saúde. Nesse sentido, o cidadão, a princípio, pode escolher e exigir assistência à saúde de qualquer dos entes públicos, ou de todos conjuntamente. No que tange a legitimidade passiva da demanda, é cediço que o art. 23, inciso II, da Constituição da República, estabelece a competência concorrente da União, Estados e Municípios no que concerne a saúde e assistência pública, razão pela qual a responsabilidade entre os integrantes do sistema é solidária. A par disso, poderá a parte buscar assistência médica em qualquer dos entes, sendo imposto a cada um deles suprir eventual impossibilidade de fornecimento do outro, vez que se trata de dever constitucional, conjunto e solidário. Dessa forma, não pode o Município se eximir da responsabilidade de fornecer o tratamento médico ao paciente. Ademais, em razão da solidariedade entre os integrantes do SUS, nada impediria que o apelante atendesse ao pleito, podendo, se assim entender cabível, buscar o ressarcimento perante o outro ente público que detém a atribuição. Registre-se que esta tese segue o entendimento firmado pelo STJ, no Recurso Especial Repetitivo n. 1.203.244 - SC. Por oportuno, cito o referido precedente: PROCESSUAL CIVIL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. AÇÃO MOVIDA CONTRA O ESTADO. CHAMAMENTO DA UNIÃO AO PROCESSO. ART. 77, III, DO CPC. DESNECESSIDADE. Controvérsia submetida ao rito do art. 543-C do CPC 1. O chamamento ao processo da União com base no art. 77, III, do CPC, nas demandas propostas contra os demais entes federativos responsáveis para o fornecimento de medicamentos ou prestação de serviços de saúde, não é impositivo, mostrando-se inadequado opor obstáculo inútil à garantia fundamental do cidadão à saúde. Precedentes do STJ. 2. A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal entende que "o recebimento de medicamentos pelo Estado é direito fundamental, podendo o requerente pleiteá-los de qualquer um dos entes federativos, desde que demonstrada sua necessidade e a impossibilidade de custeá-los com recursos próprios", e "o ente federativo deve se pautar no espírito de solidariedade para conferir efetividade ao direito garantido pela Constituição, e não criar entraves jurídicos para postergar a devida prestação jurisdicional", razão por que "o chamamento ao processo da União pelo Estado de Santa Catarina revela-se medida meramente protelatória que não traz nenhuma utilidade ao processo, além de atrasar a resolução do feito, revelando-se meio inconstitucional para evitar o acesso aos remédios necessários para o restabelecimento da saúde da recorrida" (RE 607.381 AgR, Relator Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, DJ 17.6.2011). Outrossim, a compensação de gastos entre os gestores do SUS é prevista no artigo 35, inciso VII, da Lei nº. 8.080/1990: Art. 35. Para o estabelecimento de valores a serem transferidos a Estados, Distrito Federal e Municípios, será utilizada a combinação dos seguintes critérios, segundo análise técnica de programas e projetos: (...) VII - ressarcimento do atendimento a serviços prestados para outras esferas de governo. (...) Ressalte-se que a divisão administrativa apenas amplia a esfera de possibilidades do requerente, vez que estabelece competência concorrente entre a União, os Estados e o Município. Neste sentido, é o entendimento jurisprudencial: ADMINISTRATIVO. DIREITO À SAÚDE. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERATIVOS PELO FUNCIONAMENTO DO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE. INEXISTÊNCIA DE LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO. LEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM DO ESTADO. LEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO. CERCEAMENTO DE DEFESA. REVISÃO. SÚMULA 7/STJ. 1. A presente divergência (legitimidade passiva do Estado para integrar a lide e legitimidade ativa do Ministério Público, que pretende o fornecimento de medicamentos à menor cuja provedora não dispõe de recursos para custear o tratamento médico) não guarda similitude com a matéria submetida ao procedimento do art. 543-C do CPC no REsp 1.102.457/RJ. 2. O funcionamento do Sistema Único de Saúde é de responsabilidade solidária da União, dos Estados e dos Municípios, de modo que qualquer um desses entes tem legitimidade ad causam para figurar no polo passivo de demanda que objetiva a garantia do acesso a medicamentos para tratamento de problema de saúde. Precedentes. 3. O Ministério Público possui legitimidade ativa para ajuizar ação civil pública que visa ao fornecimento de medicamento a pessoa que não tem condições financeiras de arcar com o tratamento médico, por se tratar de direito indisponível. Precedentes. 4. Reavaliar a necessidade, ou não, da prova pericial requerida, a fim de verificar a existência de cerceamento de defesa, exige análise de provas e fatos, o que atrai para o recurso especial o óbice da Súmula 07/STJ. 5. Agravo regimental não provido (STJ - AgRg no REsp: 1297893 SE 2011/0269581-3, Relator: Ministro CASTRO MEIRA, Data de Julgamento: 25/06/2013, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 05/08/2013) ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL ? FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS ? TRATAMENTO MÉDICO ? SUS ? RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERATIVOS. 1. O funcionamento do Sistema Único de Saúde - SUS é de responsabilidade solidária da União, Estados-membros e Municípios, de modo que, qualquer dessas entidades têm legitimidade ad causam para figurar no pólo passivo de demanda que objetiva a garantia do acesso à medicação para pessoas desprovidas de recursos financeiros. 2. Recurso especial provido. Retorno dos autos ao Tribunal de origem para a continuidade do julgamento (STJ - REsp: 771537 RJ 2005/0128311-4, Relator: Ministra ELIANA CALMON, Data de Julgamento: 15/09/2005, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJ 03.10.2005 p. 237). AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. ADMINISTRATIVO. TRATAMENTO MÉDICO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERADOS. ACÓRDÃO EM CONFORMIDADE COM A JURISPRUDÊNCIA DESTE TRIBUNAL. 1. O tratamento médico adequado aos necessitados se insere no rol dos deveres do Estado, sendo responsabilidade solidária dos entes federados, podendo figurar no polo passivo qualquer um deles em conjunto ou isoladamente. Precedentes: AI 822.882-AgR, Rel. Min. Roberto Barroso, Primeira Turma, DJe 6/8/2014, e ARE 803.274-AgR, Rel. Min. Teroi Zavascki, Segunda Turma, DJe 28/5/2014. 2. In casu, o acórdão recorrido assentou, in verbis: ?REEXAME NECESSÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL EM MANDADO DE SEGURANÇA. INTERNAÇÃO EM UTI TRATAMENTO MÉDICO ? RECUSA ? IMPOSSIBILIDADE ? DIREITO SUBJETIVO PÚBLICO?. 3. Agravo regimental DESPROVIDO. (STF - ARE: 815854 MG , Relator: Min. LUIZ FUX, Data de Julgamento: 09/09/2014, Primeira Turma, Data de Publicação: ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-185 DIVULG 23-09-2014 PUBLIC 24-09-2014) O artigo 196, da Constituição da República, garante o direito à saúde, impondo ao Estado o dever de provê-la, não se tratando de norma apenas programática. Dispõe também a Carta Magna, no artigo 198, inciso II, sobre a universalidade da cobertura e do atendimento integral, como diretrizes das ações e serviços públicos de Saúde. Ademais, os cidadãos acometidos de doenças graves, que necessitam de tratamento médico, não podem esperar pela vontade política dos governantes, nem ficar submisso a uma excessiva burocracia. Assim sendo, quando se configura a inércia da administração pública, incumbe ao Poder Judiciário quando provocado, assegurar o implemento do direito constitucionalmente previsto à saúde, determinando o fornecimento dos insumos necessários a melhoria da qualidade de vida do paciente, não configurando afronta ao princípio da separação dos poderes. E mais, a alegação de que o atendimento à saúde está condicionado à ¿reserva do possível¿, e que, para o acolhimento do pleito do recorrente há necessidade de prévia previsão orçamentária, não merece guarida, pois compete ao ente federativo a reserva de verbas públicas para atendimento de demanda referente à saúde. Sobre o tema, a jurisprudência pacífica do STJ se manifesta da seguinte forma: ADMINISTRATIVO - CONTROLE JUDICIAL DE POLÍTICAS PÚBLICAS -POSSIBILIDADE EM CASOS EXCEPCIONAIS - DIREITO À SAÚDE - FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS - MANIFESTA NECESSIDADE - OBRIGAÇÃO DO PODER PÚBLICO - AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES - NÃO OPONIBILIDADE DA RESERVA DO POSSÍVEL AO MÍNIMO EXISTENCIAL. 1. Não podem os direitos sociais ficar condicionados à boa vontade do Administrador, sendo de fundamental importância que o Judiciário atue como órgão controlador da atividade administrativa. Seria uma distorção pensar que o princípio da separação dos poderes, originalmente concebido com o escopo de garantia dos direitos fundamentais, pudesse ser utilizado justamente como óbice à realização dos direitos sociais, igualmente fundamentais. 2. Tratando-se de direito fundamental, incluso no conceito de mínimo existencial, inexistirá empecilho jurídico para que o Judiciário estabeleça a inclusão de determinada política pública nos planos orçamentários do ente político, mormente quando não houver comprovação objetiva da incapacidade econômico-financeira da pessoa estatal. 3. In casu, não há empecilho jurídico para que a ação, que visa a assegurar o fornecimento de medicamentos, seja dirigida contra o município, tendo em vista a consolidada jurisprudência desta Corte, no sentido de que "o funcionamento do Sistema Único de Saúde (SUS) é de responsabilidade solidária da União, Estados-membros e Municípios, de modo que qualquer dessas entidades têm legitimidade ad causam para figurar no pólo passivo de demanda que objetiva a garantia do acesso à medicação para pessoas desprovidas de recursos financeiros" (REsp 771.537/RJ, Rel. Min. Eliana Calmon, Segunda Turma, DJ 3.10.2005). Agravo regimental improvido. (STJ - AgRg no REsp: 1136549 RS 2009/0076691-2, Relator: Ministro HUMBERTO MARTINS, Data de Julgamento: 08/06/2010, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 21/06/2010). No mesmo sentido, colaciono a seguinte jurisprudência pátria: APELAÇÃO - AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER/DAR COM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA - FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS PELO SUS - RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA ENTRE OS ENTES DA FEDERAÇÃO - REMÉDIOS PRESCRITOS POR MÉDICO VINCULADO AO SUS - AUSÊNCIA DE AFRONTA AO PRINCIPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES - JUDICIALIZAÇAO DO DIREITO À SAÚDE - NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DE PLANO DO PREJUÍZO AO ORÇAMENTO PÚBLICO - SENTENÇA MANTIDA. 1. A repartição inter-federativa de atribuições não repercute na legitimidade ou na obrigação da prestação de assistência à saúde, como vem reiteradamente decidindo o STJ (REsps 999.693 e 996.058). Isso porque não se pode exigir do cidadão que navegue o tortuoso caminho da repartição de competências entre os entes federados para obter a prestação de que necessita. Assim, tratando-se de obrigação solidária da qual o cidadão é credor, à luz da eficácia que se busca dar aos direitos e garantias fundamentais, a discussão da repartição de atribuições não pode embaraçar a prestação de serviço de elevada relevância social. 2. Especificamente, como forma de consecução da política pública de saúde, estabelece a Lei Federal nº. 8.080/90 a sua instituição de forma padronizada, de modo a atender a critérios de igualdade e racionalização da utilização dos recursos. Daí a formulação de listas de medicamentos à disposição dos cidadãos a fim de orientar a prestação da assistência farmacêutica. Inobstante, é certo que haverá situações em que o fármaco disponibilizado pelo Estado não será o mais adequado ao quadro clínico do cidadão, o que dá ensejo a demandas como esta. No entanto, não deve o direito à saúde ser obstaculizado somente em razão de o remédio necessitado pelo paciente não constar na lista do SUS. 3. Quando clara a injustificável inércia estatal, deve o Poder Judiciário, se provocado, garantir o meios inerentes ao acesso à saúde, determinando que o Poder Público forneça os medicamentos necessários à melhoria da qualidade de vida do paciente, quando este lograr em comprovar a efetiva necessidade do medicamento, bem como sua insuficiência de recursos. 4. A decisão que determina que o Poder Público forneça gratuitamente um medicamento a um paciente não pode ser interpretada como um tratamento privilegiado em relação a outras pessoas que padecem do mesmo mal. No caso em tese, a parte não teve outra alternativa que não a provocação do Poder Judiciário para ter garantida a integral e gratuita assistência à sua saúde, direito este garantido constitucionalmente. Qualquer outra pessoa que passe pela mesma situação pode também recorrer ao Poder Judiciário para ter acesso a medicamento de que precise e pelo qual não pode pagar. 5. A mera alegação de que o fornecimento da medicação requerida pela autora onera os cofres públicos a ponto de sacrificar outros interesses fundamentais não deve ser levada adiante, uma vez que destituída de comprovação. (Apelação Cível nº 1.0024.10.204259-5/001 - Rel. Des. Elpídio Donizetti - Data da publicação 29/05/2012). Outrossim, o recorrente impugna a cominação de astreinte, porém, entendo que não assiste razão ao insurgente, na medida em que a Jurisprudência alinha-se no sentido da possibilidade de cominação de multa por descumprimento de decisão. Neste sentido: PROCESSUAL CIVIL. ASTREINTES. ART. 461, § 4º, DO CPC. REDIRECIONAMENTO A QUEM NÃO FOI PARTE NO PROCESSO. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES. 1. Na origem, foi ajuizada Ação Civil Pública para compelir o Estado de Sergipe ao fornecimento de alimentação a presos provisórios recolhidos em Delegacias, tendo sido deferida antecipação de tutela com fixação de multa diária ao Secretário de Estado da Justiça e Cidadania, tutela essa confirmada na sentença e na Apelação Cível, que foi provida apenas para redirecionar as astreintes ao Secretário de Segurança Pública. 2. Na esteira do entendimento pacífico do Superior Tribunal de Justiça, admite-se a aplicação da sanção prevista no art. 461, § 4º do CPC à Fazenda Pública para assegurar o cumprimento da obrigação, não sendo possível, todavia, estendê-la ao agente político que não participara do processo e, portanto, não exercitara seu constitucional direito de ampla defesa. Precedentes. 3. In casu, a Ação Civil Pública fora movida contra o Estado de Sergipe - e não contra o Secretário de Estado -, de modo que, nesse contexto, apenas o ente público demandado está legitimado a responder pela multa cominatória. 4. Recurso Especial provido. (STJ, T2 - Segunda Turma, REsp 1315719 / SE, RECURSO ESPECIAL 2012/0058150-5, rel. Min. Herman Benjamin, 27/08/2013). [grifei] ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO DE SENTENÇA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. APLICAÇÃO DE MULTA PREVISTA NO ART. 461, §§ 4º E 5º, DO CPC. IMPOSSIBILIDADE DE REDIRECIONAMENTO AO GESTOR PÚBLICO POR NÃO SER PARTE NO FEITO. 1. Nos termos da jurisprudência pacífica desta Corte, em se tratando de obrigação de fazer, é permitido ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, a imposição de multa cominatória ao devedor (astreintes), mesmo contra a Fazenda Pública. 2. Não é possível, contudo, a extensão ao agente político de sanção coercitiva aplicada à Fazenda Pública em decorrência da sua não participação efetiva no processo. Entendimento contrário acabaria por violar os princípios do contraditório e da ampla defesa. Agravo regimental improvido. (AgRg no AREsp 196.946/SE, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 02/05/2013, DJe 16/05/2013) [grifei] Quanto ao montante fixado, o STJ entende que o valor atribuído à multa diária por descumprimento de ordem judicial deve ser razoável e proporcional ao valor da obrigação principal, admitindo-se, todavia, redução do montante que afeiçoar-se despropositado. (AgRg no AREsp 363280 / RS AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL 2013/0204806-2, rel. Min. João Otávio de Noronha, 19/11/2013). Pelas razões acima expostas, CONHEÇO e NEGO PROVIMENTO à Apelação Cível, consubstanciada no art. 932, IV, ¿b¿ do NCPC. Belém (PA), 03 de maio de 2016. MARIA FILOMENA DE ALMEIDA BUARQUE Desembargadora Relatora
(2016.01620861-87, Não Informado, Rel. MARIA FILOMENA DE ALMEIDA BUARQUE, Órgão Julgador 3ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA, Julgado em 2016-05-11, Publicado em 2016-05-11)
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SECRETARIA DA 3ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA COMARCA DE BELÉM APELAÇÃO CÍVEL Nº. 0000519-27.2013.8.14.0301 SENTENCIANTE: 3ª VARA DA FAZENDA DE BELÉM APELANTE: MUNICÍPIO DE BELÉM APELADO: J.D.C.A. REPRESENTANTE: IRACY CALDAS DOMINGUES RELATORA: DESA. MARIA FILOMENA DE ALMEIDA BUARQUE APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO À SAÚDE. AUTORA NECESSITA DE FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO PARA INSUFICIÊNCIA RENAL CRÔNICA E BEXIGA NEUROGÊNICA. LEGITIMIDADE PASSIVA DO MUNICÍPIO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES DA FEDERAÇÃO. A CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA ASSEGURA A TODOS O DIREITO À SAÚDE. PRECEDENTES DO STJ, RECURSO REPETITIVO. NEGADO PROVIMENTO À APELAÇÃO. 1. Havendo responsabilidade concorrente entre a União, Estados e Municípios, em relação ao implemento do direito à saúde, constitucionalmente previsto, a parte poderá demandar qualquer dos entes da Federação. 2. O artigo 196, da Constituição da República, garante o direito à saúde, impondo ao Estado o dever de provê-la, não se tratando de norma apenas programática. Dispõe também a Carta Magna, no artigo 198, inciso II, sobre a universalidade da cobertura e do atendimento integral, como diretrizes das ações e serviços públicos de Saúde. 3. Outrossim, o recorrente impugna a cominação de astreinte, porém, entendo que não assiste razão ao insurgente, na medida em que a Jurisprudência alinha-se no sentido da possibilidade de cominação de multa por descumprimento de decisão. 4. Apelação cível que se conhece e nega provimento. DECISÃO MONOCRÁTICA Trata-se de APELAÇÃO CÍVEL interposta pelo MUNICÍPIO DE BELÉM em face da sentença prolatada pelo Juízo da 3ª Vara da Fazenda de Belém nos autos do MANDADO DE SEGURANÇA, impetrado por J.D.C.A., representada por sua genitora IRACY CALDAS DOMINGUES, a qual concedeu a segurança pleiteada, vejamos: ¿Diante de todo o exposto CONFIRMO A LIMINAR CONCEDIDA às fls. 18/24, com fundamento no art. 269, I do CPC e CONCEDO A SEGURANÇA pleiteada, pelo que determino ao impetrado que forneça a quantidade mensal de 180 (cento e oitenta) sondas uretrais nº 10 e 03 (três) tubos de xylocaína geleia, enquanto se fizer necessário o tratamento, sob pena de multa diária arbitrada em R$ 5.000,00 (cinco mil reais), para a hipótese de descumprimento.¿ Em suas razões (fls. 73/86), o MUNICÍPIO DE BELÉM sustentou preliminarmente o chamamento da União Federal e do Estado do Pará para compor a lide com a sua exclusão, argumentando que não é responsabilidade do Município de Belém a obrigação em prestar assistência médica da qual a apelada necessita. Aduz que deve-se entender com restrições a possibilidade dos entes federativos, na competência comum, de atuarem num mesmo campo, senão se configurará a invasão de competência. Alegou ainda a ausência de responsabilidade do ente municipal, em virtude da natureza programática da norma que consagra o direito a saúde. Ademais, sustentou a falta de dotação orçamentária para custear o tratamento pleiteado e a impossibilidade de cominação de multa em caso de descumprimento da decisão. Com base nestas considerações, requereu o conhecimento e provimento do Recurso. A apelação foi recebida apenas no seu efeito devolutivo. A Apelada apresentou contrarrazões às fls. 89/96. Os autos foram remetidos a este E. Tribunal, onde foram distribuídos à minha relatoria. É o relatório. Decido. Presentes os pressupostos de admissibilidade, CONHEÇO DA APELAÇÃO CÍVEL. Verifico, que se trata de situação que pode e deve ser apreciada e julgada de imediato, com fulcro no art. 932, inciso IV, alínea ¿b¿, do NCPC, que, assim, dispõe: Art. 932. Incumbe ao relator: (...) IV - negar provimento a recurso que for contrário a: (...) b) acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos; (...) Sustenta o Apelante a sua ausência de responsabilidade para custear o tratamento da Autora, suscitando a sua ilegitimidade passiva, bem como a impossibilidade dos entes federativos atuarem no mesmo campo, sob pena de restar configurada a invasão de competência. Por fim, alega que a norma que consagra o direito a saúde possui natureza programática e que o Município de Belém não possui dotação orçamentária para custear o tratamento. O Sistema Único de Saúde - SUS é organizado de forma descentralizada, regido pelo princípio da cogestão, em que se partilha, entre os entes da Federação, a responsabilidade de garantir aos cidadãos o direito constitucional à saúde, nos moldes da Lei n. 8.080, de 1990, sendo incontroverso que devem agir simultaneamente, possibilitando a realização das ações e serviços de saúde. Face à responsabilidade solidária dos entes componentes da Federação, que se dá verticalmente, e com direção única do SUS em cada esfera de governo, cabe tanto ao Município como ao Estado e União garantir a todos o direito à saúde. Nesse sentido, o cidadão, a princípio, pode escolher e exigir assistência à saúde de qualquer dos entes públicos, ou de todos conjuntamente. No que tange a legitimidade passiva da demanda, é cediço que o art. 23, inciso II, da Constituição da República, estabelece a competência concorrente da União, Estados e Municípios no que concerne a saúde e assistência pública, razão pela qual a responsabilidade entre os integrantes do sistema é solidária. A par disso, poderá a parte buscar assistência médica em qualquer dos entes, sendo imposto a cada um deles suprir eventual impossibilidade de fornecimento do outro, vez que se trata de dever constitucional, conjunto e solidário. Dessa forma, não pode o Município se eximir da responsabilidade de fornecer o tratamento médico ao paciente. Ademais, em razão da solidariedade entre os integrantes do SUS, nada impediria que o apelante atendesse ao pleito, podendo, se assim entender cabível, buscar o ressarcimento perante o outro ente público que detém a atribuição. Registre-se que esta tese segue o entendimento firmado pelo STJ, no Recurso Especial Repetitivo n. 1.203.244 - SC. Por oportuno, cito o referido precedente: PROCESSUAL CIVIL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. AÇÃO MOVIDA CONTRA O ESTADO. CHAMAMENTO DA UNIÃO AO PROCESSO. ART. 77, III, DO CPC. DESNECESSIDADE. Controvérsia submetida ao rito do art. 543-C do CPC 1. O chamamento ao processo da União com base no art. 77, III, do CPC, nas demandas propostas contra os demais entes federativos responsáveis para o fornecimento de medicamentos ou prestação de serviços de saúde, não é impositivo, mostrando-se inadequado opor obstáculo inútil à garantia fundamental do cidadão à saúde. Precedentes do STJ. 2. A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal entende que "o recebimento de medicamentos pelo Estado é direito fundamental, podendo o requerente pleiteá-los de qualquer um dos entes federativos, desde que demonstrada sua necessidade e a impossibilidade de custeá-los com recursos próprios", e "o ente federativo deve se pautar no espírito de solidariedade para conferir efetividade ao direito garantido pela Constituição, e não criar entraves jurídicos para postergar a devida prestação jurisdicional", razão por que "o chamamento ao processo da União pelo Estado de Santa Catarina revela-se medida meramente protelatória que não traz nenhuma utilidade ao processo, além de atrasar a resolução do feito, revelando-se meio inconstitucional para evitar o acesso aos remédios necessários para o restabelecimento da saúde da recorrida" (RE 607.381 AgR, Relator Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, DJ 17.6.2011). Outrossim, a compensação de gastos entre os gestores do SUS é prevista no artigo 35, inciso VII, da Lei nº. 8.080/1990: Art. 35. Para o estabelecimento de valores a serem transferidos a Estados, Distrito Federal e Municípios, será utilizada a combinação dos seguintes critérios, segundo análise técnica de programas e projetos: (...) VII - ressarcimento do atendimento a serviços prestados para outras esferas de governo. (...) Ressalte-se que a divisão administrativa apenas amplia a esfera de possibilidades do requerente, vez que estabelece competência concorrente entre a União, os Estados e o Município. Neste sentido, é o entendimento jurisprudencial: ADMINISTRATIVO. DIREITO À SAÚDE. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERATIVOS PELO FUNCIONAMENTO DO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE. INEXISTÊNCIA DE LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO. LEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM DO ESTADO. LEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO. CERCEAMENTO DE DEFESA. REVISÃO. SÚMULA 7/STJ. 1. A presente divergência (legitimidade passiva do Estado para integrar a lide e legitimidade ativa do Ministério Público, que pretende o fornecimento de medicamentos à menor cuja provedora não dispõe de recursos para custear o tratamento médico) não guarda similitude com a matéria submetida ao procedimento do art. 543-C do CPC no REsp 1.102.457/RJ. 2. O funcionamento do Sistema Único de Saúde é de responsabilidade solidária da União, dos Estados e dos Municípios, de modo que qualquer um desses entes tem legitimidade ad causam para figurar no polo passivo de demanda que objetiva a garantia do acesso a medicamentos para tratamento de problema de saúde. Precedentes. 3. O Ministério Público possui legitimidade ativa para ajuizar ação civil pública que visa ao fornecimento de medicamento a pessoa que não tem condições financeiras de arcar com o tratamento médico, por se tratar de direito indisponível. Precedentes. 4. Reavaliar a necessidade, ou não, da prova pericial requerida, a fim de verificar a existência de cerceamento de defesa, exige análise de provas e fatos, o que atrai para o recurso especial o óbice da Súmula 07/STJ. 5. Agravo regimental não provido (STJ - AgRg no REsp: 1297893 SE 2011/0269581-3, Relator: Ministro CASTRO MEIRA, Data de Julgamento: 25/06/2013, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 05/08/2013) ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL ? FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS ? TRATAMENTO MÉDICO ? SUS ? RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERATIVOS. 1. O funcionamento do Sistema Único de Saúde - SUS é de responsabilidade solidária da União, Estados-membros e Municípios, de modo que, qualquer dessas entidades têm legitimidade ad causam para figurar no pólo passivo de demanda que objetiva a garantia do acesso à medicação para pessoas desprovidas de recursos financeiros. 2. Recurso especial provido. Retorno dos autos ao Tribunal de origem para a continuidade do julgamento (STJ - REsp: 771537 RJ 2005/0128311-4, Relator: Ministra ELIANA CALMON, Data de Julgamento: 15/09/2005, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJ 03.10.2005 p. 237). AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. ADMINISTRATIVO. TRATAMENTO MÉDICO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERADOS. ACÓRDÃO EM CONFORMIDADE COM A JURISPRUDÊNCIA DESTE TRIBUNAL. 1. O tratamento médico adequado aos necessitados se insere no rol dos deveres do Estado, sendo responsabilidade solidária dos entes federados, podendo figurar no polo passivo qualquer um deles em conjunto ou isoladamente. Precedentes: AI 822.882-AgR, Rel. Min. Roberto Barroso, Primeira Turma, DJe 6/8/2014, e ARE 803.274-AgR, Rel. Min. Teroi Zavascki, Segunda Turma, DJe 28/5/2014. 2. In casu, o acórdão recorrido assentou, in verbis: ?REEXAME NECESSÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL EM MANDADO DE SEGURANÇA. INTERNAÇÃO EM UTI TRATAMENTO MÉDICO ? RECUSA ? IMPOSSIBILIDADE ? DIREITO SUBJETIVO PÚBLICO?. 3. Agravo regimental DESPROVIDO. (STF - ARE: 815854 MG , Relator: Min. LUIZ FUX, Data de Julgamento: 09/09/2014, Primeira Turma, Data de Publicação: ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-185 DIVULG 23-09-2014 PUBLIC 24-09-2014) O artigo 196, da Constituição da República, garante o direito à saúde, impondo ao Estado o dever de provê-la, não se tratando de norma apenas programática. Dispõe também a Carta Magna, no artigo 198, inciso II, sobre a universalidade da cobertura e do atendimento integral, como diretrizes das ações e serviços públicos de Saúde. Ademais, os cidadãos acometidos de doenças graves, que necessitam de tratamento médico, não podem esperar pela vontade política dos governantes, nem ficar submisso a uma excessiva burocracia. Assim sendo, quando se configura a inércia da administração pública, incumbe ao Poder Judiciário quando provocado, assegurar o implemento do direito constitucionalmente previsto à saúde, determinando o fornecimento dos insumos necessários a melhoria da qualidade de vida do paciente, não configurando afronta ao princípio da separação dos poderes. E mais, a alegação de que o atendimento à saúde está condicionado à ¿reserva do possível¿, e que, para o acolhimento do pleito do recorrente há necessidade de prévia previsão orçamentária, não merece guarida, pois compete ao ente federativo a reserva de verbas públicas para atendimento de demanda referente à saúde. Sobre o tema, a jurisprudência pacífica do STJ se manifesta da seguinte forma: ADMINISTRATIVO - CONTROLE JUDICIAL DE POLÍTICAS PÚBLICAS -POSSIBILIDADE EM CASOS EXCEPCIONAIS - DIREITO À SAÚDE - FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS - MANIFESTA NECESSIDADE - OBRIGAÇÃO DO PODER PÚBLICO - AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES - NÃO OPONIBILIDADE DA RESERVA DO POSSÍVEL AO MÍNIMO EXISTENCIAL. 1. Não podem os direitos sociais ficar condicionados à boa vontade do Administrador, sendo de fundamental importância que o Judiciário atue como órgão controlador da atividade administrativa. Seria uma distorção pensar que o princípio da separação dos poderes, originalmente concebido com o escopo de garantia dos direitos fundamentais, pudesse ser utilizado justamente como óbice à realização dos direitos sociais, igualmente fundamentais. 2. Tratando-se de direito fundamental, incluso no conceito de mínimo existencial, inexistirá empecilho jurídico para que o Judiciário estabeleça a inclusão de determinada política pública nos planos orçamentários do ente político, mormente quando não houver comprovação objetiva da incapacidade econômico-financeira da pessoa estatal. 3. In casu, não há empecilho jurídico para que a ação, que visa a assegurar o fornecimento de medicamentos, seja dirigida contra o município, tendo em vista a consolidada jurisprudência desta Corte, no sentido de que "o funcionamento do Sistema Único de Saúde (SUS) é de responsabilidade solidária da União, Estados-membros e Municípios, de modo que qualquer dessas entidades têm legitimidade ad causam para figurar no pólo passivo de demanda que objetiva a garantia do acesso à medicação para pessoas desprovidas de recursos financeiros" (REsp 771.537/RJ, Rel. Min. Eliana Calmon, Segunda Turma, DJ 3.10.2005). Agravo regimental improvido. (STJ - AgRg no REsp: 1136549 RS 2009/0076691-2, Relator: Ministro HUMBERTO MARTINS, Data de Julgamento: 08/06/2010, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 21/06/2010). No mesmo sentido, colaciono a seguinte jurisprudência pátria: APELAÇÃO - AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER/DAR COM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA - FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS PELO SUS - RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA ENTRE OS ENTES DA FEDERAÇÃO - REMÉDIOS PRESCRITOS POR MÉDICO VINCULADO AO SUS - AUSÊNCIA DE AFRONTA AO PRINCIPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES - JUDICIALIZAÇAO DO DIREITO À SAÚDE - NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DE PLANO DO PREJUÍZO AO ORÇAMENTO PÚBLICO - SENTENÇA MANTIDA. 1. A repartição inter-federativa de atribuições não repercute na legitimidade ou na obrigação da prestação de assistência à saúde, como vem reiteradamente decidindo o STJ (REsps 999.693 e 996.058). Isso porque não se pode exigir do cidadão que navegue o tortuoso caminho da repartição de competências entre os entes federados para obter a prestação de que necessita. Assim, tratando-se de obrigação solidária da qual o cidadão é credor, à luz da eficácia que se busca dar aos direitos e garantias fundamentais, a discussão da repartição de atribuições não pode embaraçar a prestação de serviço de elevada relevância social. 2. Especificamente, como forma de consecução da política pública de saúde, estabelece a Lei Federal nº. 8.080/90 a sua instituição de forma padronizada, de modo a atender a critérios de igualdade e racionalização da utilização dos recursos. Daí a formulação de listas de medicamentos à disposição dos cidadãos a fim de orientar a prestação da assistência farmacêutica. Inobstante, é certo que haverá situações em que o fármaco disponibilizado pelo Estado não será o mais adequado ao quadro clínico do cidadão, o que dá ensejo a demandas como esta. No entanto, não deve o direito à saúde ser obstaculizado somente em razão de o remédio necessitado pelo paciente não constar na lista do SUS. 3. Quando clara a injustificável inércia estatal, deve o Poder Judiciário, se provocado, garantir o meios inerentes ao acesso à saúde, determinando que o Poder Público forneça os medicamentos necessários à melhoria da qualidade de vida do paciente, quando este lograr em comprovar a efetiva necessidade do medicamento, bem como sua insuficiência de recursos. 4. A decisão que determina que o Poder Público forneça gratuitamente um medicamento a um paciente não pode ser interpretada como um tratamento privilegiado em relação a outras pessoas que padecem do mesmo mal. No caso em tese, a parte não teve outra alternativa que não a provocação do Poder Judiciário para ter garantida a integral e gratuita assistência à sua saúde, direito este garantido constitucionalmente. Qualquer outra pessoa que passe pela mesma situação pode também recorrer ao Poder Judiciário para ter acesso a medicamento de que precise e pelo qual não pode pagar. 5. A mera alegação de que o fornecimento da medicação requerida pela autora onera os cofres públicos a ponto de sacrificar outros interesses fundamentais não deve ser levada adiante, uma vez que destituída de comprovação. (Apelação Cível nº 1.0024.10.204259-5/001 - Rel. Des. Elpídio Donizetti - Data da publicação 29/05/2012). Outrossim, o recorrente impugna a cominação de astreinte, porém, entendo que não assiste razão ao insurgente, na medida em que a Jurisprudência alinha-se no sentido da possibilidade de cominação de multa por descumprimento de decisão. Neste sentido: PROCESSUAL CIVIL. ASTREINTES. ART. 461, § 4º, DO CPC. REDIRECIONAMENTO A QUEM NÃO FOI PARTE NO PROCESSO. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES. 1. Na origem, foi ajuizada Ação Civil Pública para compelir o Estado de Sergipe ao fornecimento de alimentação a presos provisórios recolhidos em Delegacias, tendo sido deferida antecipação de tutela com fixação de multa diária ao Secretário de Estado da Justiça e Cidadania, tutela essa confirmada na sentença e na Apelação Cível, que foi provida apenas para redirecionar as astreintes ao Secretário de Segurança Pública. 2. Na esteira do entendimento pacífico do Superior Tribunal de Justiça, admite-se a aplicação da sanção prevista no art. 461, § 4º do CPC à Fazenda Pública para assegurar o cumprimento da obrigação, não sendo possível, todavia, estendê-la ao agente político que não participara do processo e, portanto, não exercitara seu constitucional direito de ampla defesa. Precedentes. 3. In casu, a Ação Civil Pública fora movida contra o Estado de Sergipe - e não contra o Secretário de Estado -, de modo que, nesse contexto, apenas o ente público demandado está legitimado a responder pela multa cominatória. 4. Recurso Especial provido. (STJ, T2 - Segunda Turma, REsp 1315719 / SE, RECURSO ESPECIAL 2012/0058150-5, rel. Min. Herman Benjamin, 27/08/2013). [grifei] ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO DE SENTENÇA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. APLICAÇÃO DE MULTA PREVISTA NO ART. 461, §§ 4º E 5º, DO CPC. IMPOSSIBILIDADE DE REDIRECIONAMENTO AO GESTOR PÚBLICO POR NÃO SER PARTE NO FEITO. 1. Nos termos da jurisprudência pacífica desta Corte, em se tratando de obrigação de fazer, é permitido ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, a imposição de multa cominatória ao devedor (astreintes), mesmo contra a Fazenda Pública. 2. Não é possível, contudo, a extensão ao agente político de sanção coercitiva aplicada à Fazenda Pública em decorrência da sua não participação efetiva no processo. Entendimento contrário acabaria por violar os princípios do contraditório e da ampla defesa. Agravo regimental improvido. (AgRg no AREsp 196.946/SE, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 02/05/2013, DJe 16/05/2013) [grifei] Quanto ao montante fixado, o STJ entende que o valor atribuído à multa diária por descumprimento de ordem judicial deve ser razoável e proporcional ao valor da obrigação principal, admitindo-se, todavia, redução do montante que afeiçoar-se despropositado. (AgRg no AREsp 363280 / RS AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL 2013/0204806-2, rel. Min. João Otávio de Noronha, 19/11/2013). Pelas razões acima expostas, CONHEÇO e NEGO PROVIMENTO à Apelação Cível, consubstanciada no art. 932, IV, ¿b¿ do NCPC. Belém (PA), 03 de maio de 2016. MARIA FILOMENA DE ALMEIDA BUARQUE Desembargadora Relatora
(2016.01620861-87, Não Informado, Rel. MARIA FILOMENA DE ALMEIDA BUARQUE, Órgão Julgador 3ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA, Julgado em 2016-05-11, Publicado em 2016-05-11)Decisão
DECISÃO MONOCRÁTICA
Data do Julgamento
:
11/05/2016
Data da Publicação
:
11/05/2016
Órgão Julgador
:
3ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA
Relator(a)
:
MARIA FILOMENA DE ALMEIDA BUARQUE
Número do documento
:
2016.01620861-87
Tipo de processo
:
Apelação
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