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Jurisprudência


TJPA 0000960-70.2004.8.14.0401

Ementa
Vistos etc... Trata-se de Conflito Negativo de Competência em que figura como suscitante a Juíza de Direito da 4ª Vara Penal da Comarca de Belém, e como suscitada, a Juíza de Direito da Vara de Crimes Contra Crianças e Adolescentes da Capital. Consta na exordial acusatória, apresentada perante o Juízo da Vara de Crimes Contra a Criança e Adolescente da Comarca da Capital, que no dia 20 de outubro de 2003, por volta das 18:30 horas, a vítima Jeferson José Braga Marques, adolescente de 15 anos, subia em um ônibus de Placa JUC 2086, pertencente à Empresa de Transporte Nova Marambaia Ltda, na Av. Almirante Barroso em frente a SESAN, quando teve o braço esmagado pela porta dianteira do referido veículo, o que levou o adolescente a cair no asfalto, ocasionando-lhe lesões no braço, cabeça e escoriações pelo corpo. Após o acidente a vítima foi socorrida por uma ambulância 192 e conduzida ao Pronto Socorro Municipal, onde ficou em observação, sendo liberada no dia seguinte. O motorista do coletivo, por seu turno, se dirigiu à unidade policial do Marco para relatar o ocorrido. Os autos foram distribuídos à Vara Especializada de Crimes Contra Crianças e Adolescentes da Capital, e estando o processo na fase de instrução criminal, qual seja, audiência de instrução e julgamento, a MM.ª Juíza de Direito daquela vara, em decisão interlocutória datada de 18 de março de 2014, acostada às fls. 89/96, chamou o processo a ordem e declinou de sua competência para processar e julgar o feito, por entender não se tratar de crime previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente, nem, tampouco, dos crimes previstos nos arts. 217-A, 218, 218-A e 218-B, todos do CP, que dispõem, de forma expressa, sobre os crimes praticados contra menores de 18 anos, cujo dolo é direcionado especificamente à essas vítimas, pois o caso narrado na denúncia, se refere a um crime de lesão corporal culposa no trânsito, no exercício da atividade de transporte de passageiro praticado por um maior de 18 anos contra vítima que seria menor de idade na data do ilícito, crime esse comum e que pode ser cometido contra qualquer pessoa. Redistribuídos os autos ao Juízo da 4ª Vara Penal da Comarca de Belém, este suscitou o presente conflito negativo de competência, após acolher o parecer ministerial, no sentido de que o fato da vítima ser menor de idade faz com que a competência seja da Vara Especializada, independente do crime que tenha sido contra ela praticado, determinando, por conseguinte, a remessa dos autos à este Egrégio Tribunal. É o relatório. Decido. O fulcro da questão que envolve o presente Conflito de Competência diz respeito à definição do órgão jurisdicional competente para processar e julgar o crime de lesão corporal previsto no art. 303, parágrafo único, inciso IV, da Lei n.º 9.503/97 cometido por Antônio Afonso Moreira Pereira contra uma vítima adolescente, pois a Juíza de Direito da Vara de Crimes Contra Crianças e Adolescentes da Capital, entendeu não ser competente para atuar no feito, alegando não se tratar de crime tipificado no ECA, ou nos arts. 217-A, 218, 218-A e 218-B, todos do CP, que dispõem expressamente sobre os crimes praticados contra vítimas menores de 18 anos e que têm o dolo direcionado a esse tipo de vítima, enquanto que a Juíza de Direito da 4ª Vara Penal de Belém entendeu que o fato da vítima ser menor de idade, faz com que a competência seja da Vara Especializada, independentemente do crime que tenha sido contra ela praticado. Antes de mais nada, faz-se necessário a exposição de alguns fatos para melhor subsidiar a solução deste conflito, senão vejamos: Consta na exordial acusatória, que no dia 20 de outubro de 2003, por volta das 18:30 horas, a vítima Jeferson José Braga Marques, adolescente de 15 anos, subia em um ônibus de Placa JUC 2086, pertencente à Empresa de Transporte Nova Marambaia Ltda., na Av. Almirante Barroso em frente a SESAN, quando teve o braço esmagado pela porta dianteira do referido veículo, o que levou o adolescente a cair no asfalto, ocasionando-lhe lesões no braço, cabeça e escoriações pelo corpo. Após o acidente a vítima foi socorrida por uma ambulância 192 e conduzida ao Pronto Socorro Municipal, onde ficou em observação, sendo liberado no dia seguinte. O motorista do coletivo, por seu turno, se dirigiu à unidade policial do Marco para relatar o ocorrido. Como cediço, a Lei nº 8.069/90, conhecida como Estatuto da Criança e do Adolescente, dispõe, a partir de seu art. 225, dos crimes praticados contra a criança e o adolescente, seja por ação ou por omissão, cujo dolo é direcionado especificamente à condição de ser criança ou adolescente, sem prejuízo do disposto na legislação penal comum, tanto é que há previsão de crimes cujas vítimas são crianças e adolescentes no Código Penal, nos arts. 217-A, 218, 218-A e 218-B. Assim, visando o melhor processamento e a garantia dos direitos constitucionais assegurados aos menores de idade, foi criada, por meio da Lei Estadual nº 6.709/05, na Comarca de Belém, a Vara Criminal Privativa para o processamento e julgamento dos crimes contra crianças e adolescentes, ex-vi o art. 1º, da referida Lei. Ocorre, entretanto, que com o passar do tempo, a competência da referida vara foi desvirtuada, como muito bem asseverou a juíza suscitada, pois todo e qualquer crime que fosse praticado tendo como vítima uma criança ou adolescente, era redistribuído à mesma, o que fez com que a carga processual em trâmite na citada vara crescesse vertiginosamente, a ponto de prejudicar o seu regular funcionamento e, consequentemente, a garantia dos direitos assegurados aos menores de idade. É a hipótese dos autos, já que o crime em tese praticado foi o de lesão corporal culposa, cujo bem jurídico tutelado é a integridade física ou a vida da vítima, a qual pode ser qualquer pessoa, pouco importando a sua idade, que, in casu, ocasionalmente teve como vítima um adolescente de 18 (dezoito) anos de idade. Logo, não se tratando de crime especificamente direcionado à condição de criança e/ou adolescente, previstos no ECA e nos artigos 217-A/ 218, 218-A e 218-B, do CP, há de ser declarada a competência da Vara Comum, qual seja, da 4ª Vara Penal de Belém, para o processamento e julgamento do feito. Nesse sentido, várias foram as decisões deste Egrégio Tribunal de Justiça, verbis: TJPA: CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. JUÍZO DA 8ª VARA CRIMINAL DA CAPITAL/PA E JUÍZO DA VARA DE CRIMES CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES. TENTATIVA DE ROUBO. VÍTIMA MENOR DE IDADE. FATO PURAMENTE OCASIONAL. INOCORRÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL NO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. CONFLITO CONHECIDO PARA DECLARAR A COMPETÊNCIA DO JUÍZO SUSCITANTE. DECISÃO UNÂNIME. 1. No rol da competência da Vara da Infância e da Juventude estabelecido no art. 148 do ECA, não está inserido o julgamento dos crimes contra o menor previstos no Código Penal, como ocorre no caso em exame, em que o delito a ser apurado é o de tentativa de roubo. 2. Da denúncia constante dos autos, é possível verificar que o fato de ter havido um menor de idade como vítima foi situação puramente acidental, não tendo sido o crime intencionalmente dirigido contra um adolescente. 3. Conflito conhecido, à unanimidade, para fixar a competência do Juízo de Direito da 8ª Vara Criminal da Comarca da Capital/PA para processar e julgar o feito. (201430006557, 130961, Rel. VANIA LUCIA SILVEIRA, Órgão Julgador TRIBUNAL PLENO, Julgado em 19/03/2014, Publicado em 24/03/2014). TJPA: CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. JUÍZO DA 8ª VARA CRIMINAL DA CAPITAL/PA E JUÍZO DA VARA DE CRIMES CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES. FURTO. VÍTIMA MENOR DE IDADE. FATO PURAMENTE OCASIONAL. INOCORRÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL NO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. CONFLITO CONHECIDO PARA DECLARAR A COMPETÊNCIA DO JUÍZO SUSCITANTE. DECISÃO UNÂNIME. 1. No rol da competência da Vara da Infância e da Juventude estabelecido no art. 148 do ECA, não está inserido o julgamento dos crimes contra o menor previstos no Código Penal, como ocorre no caso em exame, em que o delito a ser apurado é o de furto. 2. Da denúncia constante dos autos, é possível verificar que o fato de ter havido um menor de idade como vítima foi situação puramente acidental, não tendo sido o crime intencionalmente dirigido contra um adolescente. 3. Conflito conhecido, à unanimidade, para fixar a competência do Juízo de Direito da 8ª Vara Criminal da Comarca da Capital/PA para processar e julgar o feito. (201430005567, 130960, Rel. VANIA LUCIA SILVEIRA, Órgão Julgador TRIBUNAL PLENO, Julgado em 19/03/2014, Publicado em 24/03/2014). TJPA: CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA - JUÍZO DE DIREITO DA 12a VARA PENAL DA CAPITAL E JUÍZO DA VARA DE CRIMES CONTRA A CRIANÇA E ADOLESCENTE - CRIME DE FURTO DE BICICLETA COMETIDO CONTRA ADOLESCENTE - NÃO SE VISLUMBRA NO PRESENTE CASO QUE A IDADE DA VÍTIMA TENHA SIDO CIRCUNSTÂNCIA DETERMINANTE PARA O COMETIMENTO DO DELITO - INCOMPETÊNCIA DA VARA ESPECIALIZADA. 1. Esta Corte de Justiça firmou entendimento de que a idade da vítima não deve servir unicamente como parâmetro para fixar a competência da Vara Especializada, sendo indispensável que esta tenha sido fator preponderante para a prática delitiva, o que não se vislumbra no presente caso, em que a subtração da bicicleta da vítima pelo agente ocorreu quando esta se encontrava na porta da residência de sua avó, demonstrando ser a idade do dono do bem indiferente para o cometimento do crime; 2. CONFLITO DIRIMIDO, DETERMINANDO A COMPETÊNCIA DO JUÍZO DA 12a VARA PENAL DA CAPITAL, para processar e julgar o feito. Decisão Unânime. (201330331038, 130759, Rel. MARIA DE NAZARE SILVA GOUVEIA DOS SANTOS, Órgão Julgador TRIBUNAL PLENO, Julgado em 13/03/2014, Publicado em 18/03/2014). TJPA: Conflito negativo de jurisdição suscitante - juízo de direito da 5ª vara criminal de Belém suscitado - juízo de direito da vara de crimes contra crianças e adolescentes de Belém crime de roubo cometido casualmente contra menor de idade vítima que pode ser qualquer pessoa - ausência de intenção específica de atacar pessoa vulnerável - incompetência da vara especializada - atribuição específica à proteção de crianças e adolescentes - inaplicabilidade da tutela do estatuto da criança e do adolescente ao caso - competência declarada em favor da 5ª vara penal de Belém, decisão unânime. I. É competente a Vara Especializada de Crimes Contra a Criança e Adolescente toda vez que a condição de menor seja determinante para a prática delituosa, ou seja, em todos aqueles crimes definidos ou não no ECA, que tenham como vítima necessariamente o menor, hipótese a qual não foi verificada nos autos. Precedentes do TJ/PA; II. A competência da Vara Especializada não deve prevalecer em razão do sujeito passivo do crime, quando o delito tenha sido cometido apenas casualmente contra criança ou adolescente, como no caso em apreço, em que estamos diante do crime de roubo, cometido por acaso contra um menor de idade; III. A competência, neste caso, seria em razão da matéria, de modo a atrair o processo para a Vara Especializada apenas diante de tipos penais disciplinados no ECA ou mesmo no CPB, mas que exijam do sujeito passivo a condição de menor como algo determinante no crime. Caso contrário, todo e qualquer crime cometido contra menor atrairia a competência da Vara Especializada o que não condiz com o espírito do legislador estadual, quando criou a Vara de Crimes Contra a Criança e Adolescente, por meio da Lei Estadual 6.709/2005; IV. Resolvido o presente conflito de jurisdição, a fim de declarar como competente o MM. Juízo de Direito da 5ª Vara Criminal de Belém. (201430011621, 130294, Rel. RÔMULO JOSÉ FERREIRA NUNES, Órgão Julgador TRIBUNAL PLENO, Julgado em 26/02/2014, Publicado em 06/03/2014). Impõe ressaltar, por oportuno, que o entendimento esposado nos julgados acima transcritos encontra-se, atualmente, pacificado com a edição da Súmula de nº 13, desta Egrégia Corte, que dispõe, verbis: a Vara de Crimes contra Crianças e Adolescentes é competente para julgar delitos praticados com o dolo de abusar da situação de vulnerabilidade do menor, e não simplesmente contra vítimas menores de 18 anos, critério objetivo que dificulta a efetiva prestação da tutela jurisdicional especializada. Logo, não há dúvidas que a competência para julgar o presente feito é do Juízo de Direito da 4ª Vara Penal da Comarca de Belém, ora Suscitante, e, como visto, a questão versada nestes autos já foi inclusive dirimida pelo Pleno deste Sodalício, razão pela qual determino o retorno dos autos ao referido juízo, para que a magistrada a ele vinculada proceda como de direito. À Secretária para os procedimentos legais pertinentes. Belém/PA, 19 de maio de 2014. Desa. VANIA FORTES BITAR Relatora (2014.04538871-17, Não Informado, Rel. VANIA VALENTE DO COUTO FORTES BITAR CUNHA, Órgão Julgador TRIBUNAL PLENO, Julgado em 2014-05-21, Publicado em 2014-05-21)
Decisão
DECISÃO MONOCRÁTICA

Data do Julgamento : 21/05/2014
Data da Publicação : 21/05/2014
Órgão Julgador : TRIBUNAL PLENO
Relator(a) : VANIA VALENTE DO COUTO FORTES BITAR CUNHA
Número do documento : 2014.04538871-17
Tipo de processo : Conflito de Jurisdição
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