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Jurisprudência


TJPA 0001228-06.2015.8.14.0006

Ementa
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ 2ª TURMA DE DIREITO PÚBLICO - REMESSA NECESSÁRIA E APELAÇÃO CÍVEL Nº 0001228-06.2015.8.14.0006 RELATORA: DESEMBARGADORA LUZIA NADJA GUIMARÃES NASCIMENTO APELANTE: MUNICÍPIO DE ANANINDEUA PROCURADOR MUNICIPAL: ANTÔNIO ROBERTO VICENTE DA SILVA (OAB/PA 13.081) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO PROMOTORA DE JUSTIÇA: PATRÍCIA DE FÁTIMA DE CARVALHO ARAÚJO PROCURADORA DE JUSTIÇA: MARIA DA CONCEIÇÃO DE MATTOS SOUSA REMESSA NECESSÁRIA E APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. FORNECIMENTO DO MEDICAMENTO - FÓRMULA PREGOMIMPEPTE OU ALFARRE. MENOR. LAUDOS MÉDICOS COMPROBATÓRIOS DA NECESSIDADE DO MEDICAMENTO. DIREITO CONSTITUCIONAL À SAÚDE. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERADOS PELO DEVER DE PRESTAR ASSISTÊNCIA À SAÚDE. MATÉRIA DECIDIDA EM SEDE DE REPERCUSSÃO GERAL NO STF (RE 855178). RECURSO IMPROVIDO. ASTREINTES REVISADAS EM SEDE DE REMESSA NECESSÁRIA. DECISÃO MONOCRÁTICA        Trata-se de apelação cível de insurgência do MUNICÍPIO DE ANANINDEUA em face sentença proferida pelo juízo da Vara da Infância e Juventude de Ananindeua que, confirmando liminar, determinou ao apelante e ao Estado do Pará o fornecimento de medicamento nos autos da ação civil pública movida pelo Ministério Público do Estado.        O decisum combatido, confirmando a antecipação da tutela jurisdicional (fls. 34-36), entendeu que a menor M.E.M.M., portadora de alergia alimentar à proteína do leite, necessitava fazer uso da fórmula pregomimpepte ou alfarre para garantia de sua saúde, pelo que determinou ao apelante e ao Estado do Pará, solidariamente, o fornecimento do medicamento necessário de forma contínua, gratuita e enquanto durar o processo alérgico, sob pena de multa diária de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a partir do sexto dia de descumprimento;        O apelante alega (fls. 91-101) a necessidade de exclusão da demanda do Município de Ananindeua, visto que atua somente em caráter suplementar em relação ao fornecimento do medicamento em questão, bem como a ausência de comprovação da necessidade extrema e do risco de vida à menor. Ao final, pugna pelo total provimento recursal.        Apelação recebida somente no efeito devolutivo. Decisão mantida pelo juízo a quo (fls. 109, 148).        Em sede de contrarrazões (fls. 111-133), o apelado Ministério Público refuta as teses recursais e pugna pelo improvimento da presente apelação; e o Estado do Pará (fls. 142-145) aponta a responsabilidade do Município de Ananindeua no atendimento da presente demanda, pelo que requer o improvimento recursal.        Regularmente redistribuído, coube-me a relatoria do feito (fls. 159).        Na qualidade de custus legis, o Ministério Público opinou pelo conhecimento e improvimento recursal (fls. 154-157).        É o relatório. Decido.        Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso. Não obstante, no mérito, não merece acolhimento.        Inicialmente, não prospera a alegação de perda de objeto diante da concessão de tutela antecipada, visto que esta é espécie de tutela de urgência, portanto, para que produza efeitos deve ser confirmada por meio de julgamento de mérito, garantindo à menor a concessão do tratamento médico necessário.        É dever do Estado, no sentido ¿lato¿, a garantia do direito fundamental à saúde a todos os cidadãos mediante políticas sociais e econômicas.        A Constituição da República atribui à União, aos Estados e aos Municípios competência para ações de saúde pública, devendo cooperar técnica e financeiramente entre si por meio de descentralização de suas atividades, com direção única em cada esfera de governo (Lei Federal nº 8.080 de 19/09/1990, art. 7º, IX e XI) executando os serviços e prestando atendimento direto e imediato aos cidadãos (art. 30, VII da Constituição da República).        Dessa feita, a obrigação constitucional de prestar serviços de assistência à saúde traz o princípio da cogestão, que implica em participação simultânea dos entes estatais dos três níveis (Federal, Estadual e Municipal), existindo, em decorrência, responsabilidade solidária entre si. Assim sendo, Estado, Município e União são legitimados passivos solidários na garantia da saúde pública, podendo ser demandados em conjunto ou isoladamente, dada a existência da solidariedade entre eles.        Nesse sentido, o Supremo Tribunal Federal já fixou entendimento, em repercussão geral, quanto à existência de responsabilidade solidária dos entes federados em promover o tratamento médico necessário à saúde no seguinte julgado: ¿RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. DIREITO À SAÚDE. TRATAMENTO MÉDICO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERADOS. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. REAFIRMAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. O tratamento médico adequado aos necessitados se insere no rol dos deveres do Estado, porquanto responsabilidade solidária dos entes federados. O polo passivo pode ser composto por qualquer um deles, isoladamente, ou conjuntamente.¿ (RE 855178 RG, Relator(a): Min. LUIZ FUX, julgado em 05/03/2015, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-050 DIVULG 13-03-2015 PUBLIC 16-03-2015)        Ademais, o Estatuto da Criança e do Adolescente impõe a obrigação de dar atendimento integral às crianças que apresentem problemas de saúde, como a representada, de acordo com os artigos 4º ¿É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, (...)¿, 7º ¿A criança e o adolescente têm direito a proteção à vida e à saúde, (...)¿ e, mais especificamente, 11 ¿É assegurado atendimento integral à saúde da criança e do adolescente, por intermédio do Sistema Único de Saúde, garantido o acesso universal e igualitário às ações e serviços para promoção, proteção e recuperação da saúde¿.        Restou comprovado o dever do apelante e do Estado do Pará de assegurar o provimento à menor do medicamento necessário à manutenção de sua existência e desenvolvimento dignos, já que demonstrada pelas provas trazidas aos autos a imprescindibilidade do fornecimento.        Os laudos e receituários médicos apresentados são provas pré-constituídas suficientes ao atendimento do pedido, tendo sido a medicação/fórmula prescrita por profissionais capacitados e vinculados ao SUS, com opção pelo mais indicado tecnicamente ao caso em questão.        Em sede de remessa necessária, no entanto, verifico que a multa diária arbitrada merece revisão.        As astreintes restaram consagradas no direito processual civil brasileiro como multa com a finalidade de dar eficácia à concretização de um direito declarado por tutela antecipada ou sentença, visando a coerção do devedor ao cumprimento da obrigação.        O artigo 537 do CPC traz a previsão sobre a imposição da multa e dispõe sobre a possibilidade de alteração de seu valor ou periodicidade de ofício pelo magistrado. A doutrina preleciona que a multa diária é uma das diversas técnicas executivas com viés coercitivo que objetiva compelir o réu a cumprir a obrigação na forma específica, e deve atender aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade.1        O valor das astreintes não pode ser demasiadamente reduzido, sob pena de deixar de cumprir sua função inibitória e de servir de exemplo a outros casos análogos. Não deve, de outro lado, ser desproporcional ou desarrazoado a ponto de levar o demandante a enriquecer sem causa.        Além da periodicidade de incidência da multa, devem ser observados os princípios da proporcionalidade e razoabilidade, de modo que o valor da multa, fixado unitariamente ou apurado em sua totalidade, se destine a coagir, e não a punir o devedor e, tampouco, a compensar o credor pelo inadimplemento.        A preocupação de que o valor da multa fixada seja adequado ao seu fim coercitivo é tão relevante que justificou a inserção do §1º no art. 537 do CPC, autorizando o juiz, de ofício, a modificar o valor ou a periodicidade da multa, caso verifique que se tornou insuficiente ou excessiva, de maneira que o caráter mutável das astreintes é plenamente reconhecido pela doutrina e jurisprudência, considerando-se, ainda, que a imutabilidade da coisa julgada recai sobre a pretensão que foi acolhida (para se obter determinado resultado específico), mas não sobre o valor da multa ou sua imposição. ¿Não há definitividade, outrossim, na imposição e arbitramento da astreinte, mesmo porque não se trata de verba que integra originalmente o crédito da parte, mas de simples instrumento legal de coerção utilizável em apoio à prestação jurisdicional executiva. É por isso que não há de pensar-se em coisa julgada na decisão que a impõe ou que lhe define o valor, ou lhe determina a periodicidade (o § 4º fala em ¿multa diária¿, já o § 5º, em ¿multa por tempo de atraso¿, o que indica a possibilidade de o juiz adotar a periodicidade que não seja a diária). E é em consequência desse feitio apenas coercitivo da multa que o § 6º do art. 461 autoriza o juiz, a qualquer tempo, e de ofício, a modificar o valor ou a periodicidade da astreinte caso verifique que se tornou insuficiente ou excessiva. (THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil, vol. II, 44ª ed, Rio de Janeiro: Forense, 2009, p. 31)        Veja-se, por oportuno, o entendimento do C. Superior Tribunal de Justiça no REsp nº 705.914, da relatoria do Ministro Gomes de Barros, 3ª Turma, j. em 15.12.05, DJU 06.03.06: ¿A multa poderá, mesmo depois de transitada em julgado a sentença, ser modificada, para mais ou para menos, conforme seja insuficiente ou excessiva. O dispositivo indica que o valor da astreinte não faz coisa julgada material, pois pode ser revista mediante a verificação de insuficiência ou excessividade.¿        Compulsando os autos, verifico a exorbitância da multa arbitrada por ocasião da sentença, no importe de R$ 5.000,00 (dois mil reais) por dia, a partir do 6º dia de inadimplemento, merecendo reforma tal item.        Ante o exposto e na companhia do parecer ministerial, com fulcro no que dispõe o art. 932, incisos IV, b e VIII do CPC/2015 c/c 133, XI, b e d, do RITJPA, nos termos do acórdão do e. STF proferido do RE 855.178 RG/PE em sede de Repercussão Geral, conheço e nego provimento à apelação e, em remessa necessária, limito o valor da multa diária em R$ 500,00 (quinhentos reais) a partir do 6º dia de inadimplemento, até o limite de R$ 30.000,00 (trinta mil reais), mantendo a sentença nos demais termos.        Servirá a presente decisão, por cópia digitalizada, como MANDADO DE CITAÇÃO/INTIMAÇÃO/NOTIFICAÇÃO.        P.R.I.C.        Belém, 24 de agosto de 2018.        Desa. LUZIA NADJA GUIMARÃES NASCIMENTO        Relatora 1 BUENO, Cassio Scarpinella. Manual de direito processual civil: inteiramente estruturado à luz do novo CPC, de acordo com a Lei n. 13.256, de 4-2-2016. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 470. NERY JUNIOR, Nelson. NERY, Rosa Maria de Andrade. Comentários ao Código de Processo Civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015, p. 1348. Página de 7 (2018.03439572-09, Não Informado, Rel. LUZIA NADJA GUIMARAES NASCIMENTO, Órgão Julgador 2ª TURMA DE DIREITO PÚBLICO, Julgado em 2018-08-30, Publicado em 2018-08-30)
Decisão
DECISÃO MONOCRÁTICA

Data do Julgamento : 30/08/2018
Data da Publicação : 30/08/2018
Órgão Julgador : 2ª TURMA DE DIREITO PÚBLICO
Relator(a) : LUZIA NADJA GUIMARAES NASCIMENTO
Número do documento : 2018.03439572-09
Tipo de processo : Apelação / Remessa Necessária
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