main-banner

Jurisprudência


TJPA 0001270-05.2017.8.14.0000

Ementa
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ 2ª TURMA DE DIREITO PÚBLICO - AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 0001270-05.2017.8.14.0000 RELATORA: DESEMBARGADORA LUZIA NADJA GUIMARÃES NASCIMENTO. AGRAVANTE: ESTADO DO PARÁ ADVOGADO: RICARDO NASSER SEFER (PROCURADOR) AGRAVADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARÁ REPRESENTANTE: NADILSON PORTILHO GOMES DECISÃO MONOCRÁTICA        Vistos,        Agravo de instrumento interposto contra a decisão liminar que deferiu tutela requerida pelo Ministério Público para determinar ao Estado do Pará que: providencie aos alunos e funcionários da ESCOLA ESTADUAL DE ENSINO FUNDAMENTAL E MÉDIO JOÃO PAULO I a manutenção do serviço em local adequado, seguro, limpo, em totais condições para aprendizagem e trabalho no prazo de 30 dias e construir prédio novo no prazo de 06 meses; que contrate funcionários (secretários e técnicos pedagógico); que providencie a regularização da junto ao Conselho Estadual de Educação; que se abstenha de utilizar tendas para aulas dos alunos em prazo superior a 30 dias.        Irresignado com a decisão interpôs o presente agravo e argumenta que a ESCOLA ESTADUAL DE ENSINO FUNDAMENTAL E MÉDIO JOÃO PAULO I em Quatipuru está sendo alvo de análise para soluções efetivas e já teriam adotado as seguintes medidas: a instalação da escola em outros imóveis até que sejam finalizadas as medidas para construção de novo prédio; realização de concurso público para provimento dos cargos necessários (Concurso C-125 e C-173). Conclui afirmando que não está inerte em relação ao problema.        Discorre sobre políticas públicas na área de educação. Critica o que define como ¿excesso de obrigações judicialmente atribuídas ao Estado¿. Afirma a impossibilidade de interferência do Judiciário no mérito administrativo. Alega impossibilidade de realização de despesa sem orçamento e da necessidade de realização prévia de licitação. Recorre a teoria da reserva do possível. Aponta a destruição parcial da escola decore de caso fortuito (ação da natureza - maré). Reclama de periculum in mora inverso e que a decisão esgota o objeto da ação.        Pede ao final a concessão de efeito suspensivo e o provimento do recurso para cassar a decisão agravada.        É o essencial a relatar. Examino.        Tempestivo a adequado, mas não comporta o efeito requerido.        O direito pleiteado pelo Ministério Público na presente ACP é garantido pela Constituição Federal.        A educação básica é o primeiro dos direitos sociais elencados no art. 6º da Constituição Federal. O art. 205 da CF dispõe que, além de ser dever da família, a educação é dever do Estado e deve ser promovida com vistas ao pleno desenvolvimento da pessoa, preparando-a para o exercício da cidadania e qualificando-a para o trabalho. O art. 206 (caput e I), por seu turno, prevê que o ensino será ministrado tendo por base o princípio da igualdade de condições para o acesso e permanência na escola.        Há registro nos autos que em março de 2016 a escola sofreu significativos abalos provocados pelo avanço do mar sobre a área edificada e que em 14 de setembro de 2016 ainda não teria sido concluído o 1º semestre letivo por falta de espaço adequado. Colhe-se também a informação que existiria uma obra para construção de uma nova escola no município a qual estaria paralisada desde o ano de 2009 e, ainda, que uma das soluções pensadas pelo corpo diretivo da SEDUC seria a instalação de tendas onde algumas turmas seriam alocadas.        Trata-se de política pública que se vincula a normas constitucionais e legais, cabendo ao administrador cumpri-las. A discricionariedade administrativa, no caso, é mitigada e não comporta o não realizar. Dessa forma, o Poder Judiciário, atuando em sua função típica de controlar a constitucionalidade de atos administrativos vinculados, tem o dever de imputar ao Estado a obrigação de adequar-se aos termos da Constituição.        Ao Judiciário cabe, tanto quanto aos demais poderes, o dever de garantir a máxima efetivação dos direitos fundamentais, especialmente os sociais. Ada Pelegrini Grinover1, citando pensamento de Tércio Sampaio Ferraz Junior, afirma que ¿no Estado democrático de direito, o Judiciário, como forma de expressão do poder estatal, deve estar alinhado com os escopos do próprio Estado, não se podendo mais falar numa neutralização de sua atividade. Ao contrário, o Poder Judiciário encontra-se constitucionalmente vinculado à política estatal¿.        Consigne-se que o direito à educação compõe o núcleo de direitos que se convencionou chamar de 'mínimo existencial'2. Neste campo, a teoria da reserva do possível não se presta a justificar a omissão, salvo se cabalmente demonstrada a exaustão orçamentária.        Kazuo Watanabe3 diferencia três espécies de direitos fundamentais sociais sob a perspectiva da possibilidade de tutela jurisdicional: ¿I) os que correspondem ao núcleo básico do princípio da dignidade da pessoa humana e configuram o chamado 'mínimo existencial'; II) os que, embora não estejam referidos ao 'mínimo existencial, estão previstos em normas constitucionais de 'densidade suficiente' e por isto não são dependentes, para a judicialização, de prévia ponderação do Legislativo ou do Executivo por meio de política pública específica; III) os demais direitos fundamentais sociais, previstos em normas constitucionais de cunho programático¿.        Afirma que somente os direitos fundamentais sociais pertencentes às duas primeiras categorias são imediatamente judicializáveis. É o que ocorre no presente caso, pois a demanda se insere na primeira classificação do autor.        No caso, em vez de invasão da seara administrativa e, por consequência, da separação de poderes, o que existe é o cumprimento do princípio da inafastabilidade da jurisdição (art. 5º, inciso XXXV, CF). Ainda que concorra ao Poder Executivo a administração das políticas públicas de educação, a garantia do cumprimento das disposições legais não pode ser afastada do controle judiciário. Assim, não basta que o Executivo seja o responsável por manter o funcionamento da Rede Estadual de Ensino, faz-se imprescindível que se faça de acordo com os princípios constitucionais, com o mínimo de dignidade.        Assim, o orçamento estatal deve adaptar-se para que seja melhorada a política pública já em curso, afinal, há tempos o conceito de orçamento público ganhou contornos que se alinham ao modelo social de Estado, que é o adotado pela República brasileira. Trata-se do orçamento programa, voltado para a realização dos fins estatais.        No mais, o pedido não se mostra irrazoável e considerando o interregno entre o fato, a decisão interlocutória recorrida e esta decisão monocrática, com a indispensável prudência que neste momento milita a favor da sociedade, estou por negar o efeito suspensivo requerido, para ouvir a parte agravada que certamente poderá atualizar as informações sobre as providências adotadas pelo Estado.      Intime-se para o contraditório. Colha-se a manifestação do Parquet de 2º grau. Retornem conclusos para julgamento.      Servirá a presente decisão, por cópia digitalizada, como MANDADO DE CITAÇÃO/INTIMAÇÃO/NOTIFICAÇÃO.      P.R.I.C.        Belém,    DESA. LUZIA NADJA GUIMARÃES NASCIMENTO   Relatora 1 GRINOVER, Ada Pellegrini. O controle de políticas públicas pelo Poder Judiciário. Revista de Processo, São Paulo, n. 164, out./2008, p.12. 2 ¿Consiste em o mínimo existencial de um complexo de interesses ligados à preservação da vida, à fruição concreta da liberdade e à dignidade da pessoa humana. Tais direitos assumem, intuitivamente, um status axiológico superior, e isto por serem essenciais à fruição dos direitos de liberdade. Sem direitos sociais mínimos, os direitos de liberdade permanecem um mero esquema formal.¿ (GOUVÊA, Marcos Maselli. Controle das omissões administrativas: novas perspectivas de implementação dos direitos prestacionais, Rio de Janeiro: Forense, 2003, p.257). 3 WATNABE, Kazuo. Controle jurisdicional das políticas públicas. In: GRINOVER, Ada Pellegrini. WATANABE, Kazuo (Coord.). O controle jurisdicional de políticas públicas, 'mínimo existencial' e demais direitos fundamentais imediatamente judicializáveis, 2.ed, Rio de Janeiro: Forense, 2013, p.224. Página de 5 (2017.02885163-26, Não Informado, Rel. LUZIA NADJA GUIMARAES NASCIMENTO, Órgão Julgador 2ª TURMA DE DIREITO PÚBLICO, Julgado em 2017-07-11, Publicado em 2017-07-11)
Decisão
DECISÃO MONOCRÁTICA

Data do Julgamento : 11/07/2017
Data da Publicação : 11/07/2017
Órgão Julgador : 2ª TURMA DE DIREITO PÚBLICO
Relator(a) : LUZIA NADJA GUIMARAES NASCIMENTO
Número do documento : 2017.02885163-26
Tipo de processo : Agravo de Instrumento
Mostrar discussão