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Jurisprudência


TJPA 0001479-80.2013.8.14.0301

Ementa
1ª TURMA DE DIREITO PRIVADO APELAÇÃO CÍVEL N° 0001479-80.2013.8.14.0301 APELANTE/APELADA: RÉGIA MARIA DE SOUSA SANTOS APELADA/APELANTE: REAL ENGENHARIA E COMERCIO LTDA RELATORA: DESª. MARIA FILOMENA DE ALMEIDA BUARQUE APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL. PROMESSA DE COMPRA E VENDA. DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL. ATRASO NA CONCLUSÃO DO EMPREENDIMENTO. DEVIDA A DEVOLUÇÃO TOTAL DOS VALORES PAGOS PELA AUTORA. CULPA EXCLUSIVA DA CONSTRUTORA. INTELIGÊNCIA DA SÚMULA 543 DO STJ. ALEGAÇÃO PELA CONSTRUTORA DE COMPENSAÇÃO NO VALOR A SER DEVOLVIDO COM AS PARCELAS PAGAS EM ATRASO. IMPOSSIBILIDADE. APELAÇÃO DA AUTORA PARA QUE SEJA MAJORADO O QUANTUM A SER DEVOLVIDO. NÃO COMPROVAÇÃO DO PAGAMENTO DE OUTRAS PARCELAS QUE ENSEJE A MAJORAÇÃO. DANOS MORAIS DECORRENTE DO ATRASO NA OBRA. POSSIBILIDADE. DEFERIMENTO. INOCORRÊNCIA DE SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. I - Sendo constatada a culpa exclusiva da construtora pela rescisão contratual, não tem ela direito à retenção de qualquer percentual, devendo ser devolvido o valor total pago, conforma súmula 543 do STJ. II - Incorreria em bis in idem a aplicação da cláusula 8.9 do contrato, o qual prevê compensação dos valores a serem devolvidos com as parcelas pagas em atraso, uma vez que o Adquirente, em caso de atraso no pagamento das prestações contratuais, já arca com juros de mora e multa, pelo que não cabe qualquer compensação. III - Constato no contrato firmado que a forma de pagamento do imóvel a ser realizada seria o sinal, o qual foi R$10.000,00 (dez mil reais) pagos pela Adquirente, 12 (doze) parcelas no valor de R$2.413,08 (dois mil quatro centos e treze reais e oito centavos) também quitadas pela mesma e mais uma parcela no valor de R$179.233,04 (cento e setenta e nove mil duzentos e trinta e três reais e quatro centavos), havendo somente o comprovante de pagamento do valor de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), logo, o valor efetivamente pago pela Autora à construtora ora Requerida entendeu ser R$58.956,96 (cinquenta e oito mil, novecentos e cinquenta e seis reais e noventa e seis centavos), tal como lançado pelo Juízo de piso, não merecendo, desta forma, alteração da sentença ora vergastada para majorar o valor a ser devolvido. IV - Quanto aos danos morais, considero que na espécie, a inexecução do contrato de compra e venda da unidade habitacional perdurou por quase um ano após a data de entrega prevista no contrato, fato este que causou, indubitavelmente, angústia ao comprador, frustrando suas justas expectativas e superando os meros aborrecimentos da vida cotidiana. Não se trata de simples inadimplemento contratual, mas de total desrespeito ao consumidor, pelo que fixo os danos morais em R$ 10.000,00 (dez mil reais). V - Face o deferimento dos danos morais, por consequência lógica, não prospera a sucumbência recíproca, devendo o Réu arcar com as custas processuais e honorários. VI - APELAÇÃO DA EMPRESA RÉ CONHECIDA E IMPROVIDA; APELAÇÃO DA AUTORA CONHECIDA E PARCIALMENTE PROVIDA. DECISÃO MONOCRÁTICA            Tratam os autos de APELAÇÕES CÍVEIS interpostas por REAL ENGENHARIA E COMERCIO LTDA (Ré) e RÉGIA MARIA DE SOUSA SANTOS (Autora), respectivamente, contra sentença proferida pelo Juízo da 10ª Vara Cível de Belém, nos autos da Ação de Rescisão Contratual c/c Indenização por Danos Morais e Materiais, que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados pela autora.            A autora Régia Maria de Sousa Santos ingressou com Ação de Rescisão Contratual c/c Indenização por Danos morais e materiais e em sua petição inicial alegou ser promitente compradora da unidade 602, do Ed. Real Seasons - Winter, localizado na Rua Bernal do Couto nº 901, Umarizal, Belém/PA, consoante o contrato de promessa de compra e venda celebrado em 31/10/2008, com a previsão de entrega para junho de 2009.            Em decorrência do descumprimento contratual por parte da construtora ré, a autora ingressou em juízo pleiteando a rescisão do pacto arguindo a culpa exclusiva da construtora e pleiteando a total devolução dos valores pagos, bem como indenização por danos morais.            Em contestação de fls. 97/116, a Ré aduz a regularidade das cláusulas contratuais que preveem a tolerância de 180 dias para a entrega da obra, da rescisão unilateral do contrato em caso de inadimplemento pela adquirente, bem como a inexistência de danos morais, pugnando pela improcedência dos pedidos.            Às fls. 134/135 o Juízo de 1º grau deferiu parcialmente a tutela antecipada, determinando que a Ré deposite o valor incontroverso.            Sobreveio a sentença combatida (fls. 166/169) lavrada nos seguintes termos: ¿(...) Ante o exposto, confirmo os efeitos da tutela e julgo parcialmente procedente o pedido do autor para determinar que a ré restitua integralmente o valor pago pela autora, acrescidos de correção monetária pelo IGPM desde a data de cada pagamento e juros de 1% (um) por cento ao mês a partir da citação e, determinar a rescisão do contrato firmado entre as partes, conforme entendimento reiterado de nossos tribunais e, por conseguinte julgo extinto a presente ação com resolução do mérito, nos termos do art. 269, I do Código de Processo Civil.¿            A Ré e a Autora, respectivamente, opuseram embargos de declaração (fls. 170/175 e 176/179).            Em sentença que julgou os referidos embargos, o Juízo de piso não acolheu os aclaratórios da parte requerida e proveu parcialmente o recurso da autora, se manifestando quanto a omissão acerca do valor a ser restituído, para condenar a devolução do montante de R$ 58.956,96 (cinquenta e oito mil, novecentos e cinquenta e seis reais e noventa e seis centavos).            Inconformada a Ré apresentou recurso de Apelação (fls. 188/194), alegando, em síntese, a necessidade de reforma da sentença, uma vez que a rescisão contratual foi por culpa exclusiva da Autora/Adquirente, devendo ocorrer a devolução parcial dos valores pagos.            Aduziu, ainda, que o juízo de 1º grau não observou corretamente os termos do contrato, uma vez que o referido instrumento prevê penalidade em caso de impontualidade no pagamento das prestações, motivo pelo qual deveria haver a compensação no valor a ser devolvido à autora referente aos dias que houve pagamento em atraso das prestações.            Às fls. 200/204 a parte requerente interpôs Apelação, pleiteando a reforma da sentença para que haja a devolução do valor de R$ 80.956,96 (oitenta mil, novecentos e cinquenta e seis reais e noventa e seis centavos), posto que o Juízo de piso não considerou o pagamento de uma parcela no importe de R$25.000,00 (vinte e cinco mil reais).            Aduz que, de fato, não possuía mais o recibo da referida parcela, porém apresentou provas que não restam dúvidas da quitação de tal valor. Somado a isto, a ré confessa em audiência o pagamento por parte da autora de todos as parcelas contratualmente previstas, menos a de entrega das chaves.            Suscita a ocorrência de dano moral e afirma ser devido o pagamento de indenização, dada a frustração da expectativa de fruição do bem decorrente do atraso excessivo pela requerida.            Por fim, sustentou a inocorrência de sucumbência recíproca, pois a empresa requerida decaiu na maior parte do pedido, devendo suportar sozinha as custas processuais e honorários.            Apelações recebidas somente no efeito devolutivo (fls. 208).            A empresa ré apresentou contrarrazões às fls. 209/219 e a parte autora às fls. 221/226 dos autos.            É o relatório.            DECIDO.            Preliminarmente, insta destacar que, consoante o art. 14 da Lei n. 13.105/2015 do NCPC/2015, a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada.            Outrossim, o recurso deve observar a legislação vigente na data em que proferida a decisão recorrida (EREsp 649.526/MG, Rel. Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, CORTE ESPECIAL, julgado em 15/06/2005, DJ 13/02/2006, p. 643).            Tendo a decisão recorrida sido publicada antes de 18 de março de 2015, data que entrou em vigor o CPC/2015, o presente julgamento deve respeitar os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência do CPC/1973, bem como observar as normas aplicáveis aos recursos previstas no antigo Código. 1 - DA APELAÇÃO DA EMPRESA RÉ            Conheço dos recursos porque preenchidos os requisitos de admissibilidade.            Cumpre salientar que, conforme se depreende dos autos, a Ré REAL ENGENHARIA E COMERCIO LTDA celebrou promessa de compra e venda em 31/10/2008 com a ré, sendo objeto do contrato a unidade 602, do Ed. Real Seasons - Winter, localizado na Rua Bernal do Couto n. 901, Umarizal, Belém/PA, com previsão de entrega para junho de 2009 e tolerância de 180 dias úteis (Cláusula 11.1 - fls. 32), tendo o prazo para a entrega do imóvel findado em dezembro de 2009.            Assim, é fato incontroverso a ocorrência de atraso na entrega do imóvel objeto do contrato entabulado entre as partes litigantes, uma vez que o ¿habite-se¿ somente foi expedido em 22/09/2010, ou seja, quase 01 (um) ano depois da data prevista contratualmente.            Não restam dúvidas de que a construtora apelante descumpriu sua obrigação contratual de entregar o imóvel no prazo acordado, dando ensejo a rescisão contratual.            Sabe-se que não tendo sido possível cumprir o prazo estabelecido no contrato, a obrigação pode ser rescindida com fundamento no artigo 35, III, do Código de Defesa do Consumidor, vejamos: "Art. 35. Se o fornecedor de produtos ou serviços recusar cumprimento à oferta, apresentação ou publicidade, o consumidor poderá, 6alternativamente e à sua livre escolha: I - exigir o cumprimento forçado da obrigação, nos termos da oferta, apresentação ou publicidade; II - aceitar outro produto ou prestação de serviço equivalente; III - rescindir o contrato, com direito à restituição de quantia eventualmente antecipada, monetariamente atualizada, e a perdas e danos." [grifei]            Ora, não há dúvida de que a tutela jurisdicional estabelecida na norma processual citada objetiva o resultado que deveria decorrer do cumprimento da obrigação no plano do direito material.            Logo, sendo constatada a culpa exclusiva da construtora pela rescisão contratual, não tem ela direito à retenção de qualquer percentual, pois tal fato configuraria enriquecimento ilícito, sendo uma recompensa para a parte que descumpriu o contrato.            A propósito, sobre o tema, o Superior Tribunal de Justiça já possui entendimento sumulado: ¿Súmula 543 - Na hipótese de resolução de contrato de promessa de compra e venda de imóvel submetido ao Código de Defesa do Consumidor, deve ocorrer a imediata restituição das parcelas pagas pelo promitente comprador - integralmente, em caso de culpa exclusiva do promitente vendedor/construtor, ou parcialmente, caso tenha sido o comprador quem deu causa ao desfazimento.¿ (Súmula 543, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 26/08/2015, DJe 31/08/2015) [grifei]            É pacífica a jurisprudência pátria nesse sentido: DISTRATO. COMPRA E VENDA. IMÓVEL. DATA DE ENTREGA. DATA DE OBTENÇÃO DE FINANCIAMENTO. ABUSIVIDADE. ATRASO. CONFIGURADO. DEVOLUÇÃO. QUANTIA PAGA. TOTALIDADE. 1. Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de compra e venda de imóveis em que as incorporadoras se obrigam à construção de unidades imobiliárias. 2. A vinculação da previsão de entrega da obra à data da assinatura do contrato de financiamento mostra-se desproporcional e excessivamente desvantajosa para o consumidor, haja vista a impossibilidade de o comprador saber qual o termo final de entrega do objeto contratado. 3. Demonstrada a existência de atraso na entrega do imóvel, fato determinante para o pedido de rescisão da avença entabulada entre as partes, impõe-se o retorno dos litigantes ao status quo ante, a partir da devolução à consumidora de todos os valores relacionados ao contrato. 4. Recurso conhecido e desprovido. (TJDF - APC 20130111534945 - Relator: Desa. Maria de Lourdes Abreu - 3ª Turma Cível - Julgado 24/02/2016 - DJe 02/03/2016) [grifei] APELAÇÃO CÍVEL. RESCISÃO DE CONTRATO. COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. ILEGITIMIDADE PASSIVA. ATRASO NA ENTREGA. RETENÇÃO DE VALOR. IMPOSSIBILIDADE. ILEGITIMIDADE PASSIVA: O contrato que instrui o feito foi firmado entre o autor e a demandada e isso, embora com anuência da empresa AJS Empreendimentos Imobiliários Ltda., dá à requerida legitimidade para compor o polo passivo da demanda. Ademais, o consumidor não tem obrigação de saber qual empresa é a responsável pela construção do imóvel, ainda mais se considerarmos que o pleiteado neste feito é, justamente, a rescisão do contrato de promessa de compra e venda que foi firmado pela requerida/apelante. DEVOLUÇÃO DOS VALORES PAGOS: Reconhecido o atraso na conclusão da obra deve ser responsabilizada a requerida pela rescisão contratual e não o comprador do imóvel. Então, se a rescisão ocorreu por inadimplência da promitente-vendedora em não entregar o imóvel na data limite avençada, e diante da ausência da comprovação de qualquer fato excludente de sua responsabilidade, ônus que era seu, é incontroversa a responsabilidade da requerida decorrente da mora e seus encargos incidentes, eis que, nenhuma prova veio aos autos capaz de direcionar a culpa pelo atraso a terceiro. Isso reconhecido as coisas devem voltar ao seu status quo ante. Aplica-se à hipótese o princípio que veda o enriquecimento ilícito, nos termos dos artigos. 804 e 805 do Código Civil. SUCUMBÊNCIA RECURSAL: O art. 85, §11º, do CPC/15 estabelece que o Tribunal, ao julgar recurso, majorará os honorários fixados anteriormente levando em conta o trabalho adicional realizado em grau recursal. Sucumbência recursal reconhecida e honorários fixados em prol do procurador da parte autora majorados. NEGARAM PROVIMENTO AO APELO. (Apelação Cível Nº 70073244568, Décima Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Eduardo João Lima Costa, Julgado em 28/09/2017) [grifei] APELAÇÃO CÍVEL. RESCISÃO DE CONTRATO. PROMESSA DE COMPRA E VENDA. ATRASO NA ENTREGA DA OBRA. DEVOLUÇÃO INTEGRAL DOS VALORES PAGOS. RETENÇÃO DE PERCENTUAL INCABÍVEL. Não tendo o imóvel sido entregue na data pactuada, por culpa do fornecedor, este deve ser responsabilizado pela rescisão do contrato; Não há que se falar na retenção de percentual sobre os valores já pagos pelos promitentes compradores, a título de multa, quando a rescisão ao contrato ocorre em virtude da conduta negligente da construtora." (TJMG. 12ª Câmara Cível. Apelação nº 1.0024.08.249744-7/001. Rel. Des. Domingos Coelho, DJe: 12/01/2011).            Portanto, devida a restituição integral dos valores pagos pela autora quando da compra e venda do imóvel.            Outro argumento recursal utilizado pela construtora apelante é o de que deve haver compensação no valor a ser devolvido referente aos dias que houveram pagamento em atraso das prestações, aduzindo que tal cláusula, prevista contratualmente, não foi observada pelo Juízo a quo.            Ressalto que não prospera referido argumento.            Isso porque, considero que incorreria em bis in idem a aplicação da cláusula 8.9 do contrato, o qual prevê referida compensação, uma vez que o adquirente, em caso de atraso no pagamento das prestações contratuais, já arca com juros de mora e multa, pelo que não cabe qualquer compensação no valor a ser devolvido, como quer fazer crer a Ré/Apelante.            Dessa forma, a construtora ré deverá devolver integralmente a quantia paga pela Autora Régia, não prosperando seus argumentos recursais, motivo pelo qual NEGO PROVIMENTO ao apelo da empresa. 2 - DA APELAÇÃO DA AUTORA            Insurge-se a Autora/Apelante contra a sentença no que tange o valor a ser devolvido, pois entende que o valor devido a ser devolvido é de R$ 80.956,96 (oitenta mil, novecentos e cinquenta e seis reais e noventa e seis centavos), já que o juízo de primeiro grau não considerou o pagamento da parcela de R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais).            Com efeito, não restou provado nos autos a natureza ou o pagamento do valor de R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais), o qual a Autora afirma ter sido pago e que o Juízo de piso desconsiderou ao calcular o montante a ser devolvido.            Constato no contrato firmado às fls. 27/28 que a forma de pagamento do imóvel a ser realizada seria o sinal, o qual foi R$ 10.000,00 (dez mil reais) pagos pela Adquirente (fls. 40), 12 (doze) parcelas no valor de R$2.413,08 (dois mil quatro centos e treze reais e oito centavos) também quitadas pela mesma (fls. 43/56) e mais uma parcela no valor de R$179.233,04 (cento e setenta e nove mil duzentos e trinta e três reais e quatro centavos), havendo somente o comprovante de pagamento do valor de R$20.000,00 (vinte mil reais) (fls. 42).            Com isso, retira-se dos autos que o valor efetivamente pago pela Autora à construtora ora Requerida foi o total de R$ 58.956,96 (cinquenta e oito mil, novecentos e cinquenta e seis reais e noventa e seis centavos), tal como lançado pelo Juízo a quo, não merecendo, desta forma, alteração da sentença ora vergastada.            Ponto outro que alega a recorrente em sua apelação diz respeito ao pedido de pagamento de indenização a título de danos morais.                         Como sabido, o dano moral indenizável, decorrente de uma conduta antijurídica, é aquele que submete a vítima à intensa dor íntima, ferindo sua dignidade, abalando sua imagem. É preciso que o prejuízo causado seja de fato relevante, ultrapassando a fronteira do simples desconforto, do mero aborrecimento.            A respeito da caracterização do dano moral, cabe destacar as lições dos professores A. Minozzi e Sérgio Cavalieri Filho, insertas no livro de autoria do segundo: "Não é o dinheiro nem coisa comercialmente reduzida a dinheiro, mas a dor, o espanto, a emoção, a vergonha, a injúria física ou moral, em geral uma dolorosa sensação experimentada pela pessoa, atribuída à palavra dor o mais largo significado." (in Studio Sul Danno non Patrimoniale, Milão, 1901, p. 31, Programa Responsabilidade Civil, Editora Malheiros, páginas 77 e seguintes).            Em regra, o simples inadimplemento contratual não enseja indenização por danos morais. Também meros e passageiros aborrecimentos do dia a dia, que não causam maiores consequências ao ser humano, não autorizam a indenização imaterial.            Entretanto, na espécie, a inexecução do contrato de compra e venda da unidade habitacional perdurou por quase um ano após a data de entrega prevista no contrato particular de promessa de compra e venda, fato este que causou, indubitavelmente, angústia ao comprador, frustrando suas justas expectativas e superando os meros aborrecimentos da vida cotidiana. Não se trata de simples inadimplemento contratual, mas de total desrespeito ao consumidor.            Na fixação do valor da indenização, o juiz deve estar atento à dupla finalidade da reparação, buscando um efeito repressivo e pedagógico ao agente, bem como propiciando à vítima uma satisfação, sem que isto represente um enriquecimento sem causa.            Sobre o tema, Rui Stoco, em sua obra "Responsabilidade Civil e sua Interpretação Jurisprudencial", Ed. Revista dos Tribunais, 3ª edição, 1997, p. 497, sustenta: "(...) o eventual dano moral que ainda se possa interferir, isolada ou cumulativamente, há de merecer arbitramento tarifado, atribuindo-se valor fixo e único para compensar a ofensa moral perpetrada".            Daí caber ao juiz a tarefa de arbitrar o valor da reparação, sem que possibilite lucro fácil ao autor, nem se reduza o aludido importe a montante ínfimo ou simbólico.            A doutrina e a jurisprudência têm procurado estabelecer parâmetros para o arbitramento do valor da indenização, traduzidos, por exemplo, nas circunstâncias do fato, bem como nas condições do autor do ofendido e do ilícito, devendo a condenação corresponder a uma sanção ao responsável pelo fato para que não volte a cometê-lo.            Também há de se levar em consideração que o valor da indenização não deve ser excessivo a ponto de constituir-se em fonte de enriquecimento do ofendido, nem apresentar-se irrisório, posto que, segundo observa Maria Helena Diniz: "Na reparação do dano moral, o juiz determina, por equidade, levando em conta as circunstâncias de cada caso, o quantum da indenização devida, que deverá corresponder à lesão e não ser equivalente, por ser impossível, tal equivalência. A reparação pecuniária do dano moral é um misto de pena e satisfação compensatória. Não se pode negar sua função: penal, constituindo uma sanção imposta ao ofensor; e compensatória, sendo uma satisfação que atenue a ofensa causada, proporcionando uma vantagem ao ofendido, que poderá, com a soma de dinheiro recebida, procurar atender a necessidades materiais ou ideais que repute convenientes, diminuindo, assim, seu sofrimento." ("A Responsabilidade Civil por Dano Moral", in Revista Literária de Direito, ano II, nº 9, jan./fev. de 1996, p. 9).            No caso, considerando as razões expostas, e atento ao princípio da prudência e às peculiaridades do caso sub judice, já apontadas, ausente o critério objetivo de fixação da verba indenizatória por danos morais, hei por bem reformar a sentença e deferir o pedido de danos morais, fixando a indenização em R$10.000,00 (dez mil reais), quantia que não configura uma premiação, nem mesmo uma importância insuficiente para concretizar a pretendida reparação.                         Quanto a insurgência da Autora acerca da sucumbência recíproca, a regra constante no caput do art. 21 do CPC/73 prevê que se as duas partes forem vencidas em seus pedidos, serão distribuídos igualmente os honorários: ¿Art. 21. Se cada litigante for em parte vencedor e vencido, serão recíproca e proporcionalmente distribuídos e compensados entre eles os honorários e as despesas. Parágrafo único. Se um litigante decair de parte mínima do pedido, o outro responderá, por inteiro, pelas despesas e honorários.¿            Assim, de acordo com a norma acima transcrita e a reforma da decisão do Juízo de piso nesta instância superior, por consequência lógica, considero não haver sucumbência recíproca, haja vista o deferimento do pedido de dano moral ora firmado em sede recursal, pelo que deve o Requerido suportar os valores de custas processuais e honorários.            DISPOSITIVO            1. Ante o exposto, CONHEÇO E NEGO PROVIMENTO ao apelo da empresa REAL ENGENHARIA E COMERCIO LTDA, nos termos da fundamentação.            2. Do mesmo modo, CONHEÇO E DOU PARCIAL PROVIMENTO ao apelo da Requerida, para deferir o pedido de danos morais em R$ 10.000,00 (dez mil reais) e retirar da sentença a sucumbência recíproca, mantendo o resto tal como lançada, nos termos da fundamentação.            P. R. I. C.            Belém, 30 de janeiro de 2018. MARIA FILOMENA DE ALMEIDA BUARQUE Desembargadora Relatora (2018.00346206-20, Não Informado, Rel. MARIA FILOMENA DE ALMEIDA BUARQUE, Órgão Julgador 3ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA, Julgado em 2018-02-07, Publicado em 2018-02-07)

Data do Julgamento : 07/02/2018
Data da Publicação : 07/02/2018
Órgão Julgador : 3ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA
Relator(a) : MARIA FILOMENA DE ALMEIDA BUARQUE
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