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Jurisprudência


TJPA 0001612-53.2010.8.14.0000

Ementa
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ COORDENADORIA DE RECURSOS EXTRAORDINÁRIOS E ESPECIAIS _________________________ PROCESSO N.º: 2010-3.015788.3 RECURSO ESPECIAL RECORRENTE: MESSIAS MORAIS RECORRIDO: JUSTIÇA PÚBLICA          MESSIAS MORAIS, por intermédio de seu Procurador Judicial, com fundamento no artigo 105, III, ¿a¿, da Carta Magna, interpôs o RECURSO ESPECIAL de fls. 224/236, em face do acórdão proferido por este Tribunal de Justiça, assim ementado: Acórdão n.º 147.140: ¿APELAÇÃO PENAL. ROUBO CIRCUNSTANCIADO. DESCLASSIFICAÇÃO PARA O CRIME DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. INVIABILIDADE. EXCLUSÃO DAS MAJORANTES. APLICAÇÃO DA PENA BASE NO MÍNIMO LEGAL. IMPOSSIBILIDADE. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS DEVIDAMENTE VALORADAS. PLEITO DE ALTERAÇÃO DA FRAÇÃO USADA NA TERCEIRA FASE DE 2/5 PARA 1/3. PROCEDÊNCIA. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO CONCRETA DA EXASPERAÇÃO. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. 1. Não há como desclassificar o crime de roubo qualificado para o crime de constrangimento ilegal, capitulado no art. 146 do CPB, quando as provas dos autos são uníssonas a comprovar a materialidade e a autoria do delito do art. 157, §2º I e II do CPB. 2. Restou cristalino nos autos que a ação do recorrente se deu com emprego ostensivo de arma branca e de fogo e em concurso de pessoas, restando inviável o decote das majorantes. 3. As circunstâncias judiciais foram devidamente analisadas e valoradas, sendo, em sua maioria, desfavoráveis ao apelante, o que justifica a fixação da pena-base acima do patamar mínimo de pena, conforme feito pelo magistrada. 4. acréscimo da reprimenda na terceira fase em decorrência das majorantes do roubo deve ser precedida de adequada fundamentação, consignando-se circunstâncias concretas que justifiquem a necessidade de sua adoção acima do mínimo, não sendo suficiente a simples menção às causas de aumento presentes no caso em análise. Súmula 443 do STJ. 5. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. DECISÃO UNÂNIME. (2015.02024600-61, 147.140, Rel. RONALDO MARQUES VALLE, Órgão Julgador 2ª CÂMARA CRIMINAL ISOLADA, Julgado em 2015-06-09, Publicado em 2015-06-12)¿.          Em recurso especial, sustenta o recorrente que a decisão impugnada violou o artigo 59 e 61, I, ambos do Código Penal. Nesse sentido, argumenta que os vetores ¿culpabilidade¿, ¿antecedentes¿, ¿conduta social¿, ¿personalidade¿, ¿motivos do crime¿ e ¿circunstâncias do crime¿ foram valorados de forma equivocada, bem como, afirma ser completamente ilegal a aplicação da agravante da reincidência aplicada na 2º fase da dosimetria, na medida em que, na época da prolação da sentença, não havia nenhum processo com trânsito em julgado em seu nome.          Contrarrazões às fls. 243/246, pugnando pelo provimento do presente recurso especial.          É o relatório. Decido.          Inicialmente, cumpre esclarecer que, não obstante a entrada em vigor do novo Código de Processo Civil em 18 de março de 2016, os recursos interpostos, ainda que após a vigência do novo CPC, em face de decisões publicadas antes da entrada em vigor do mesmo, serão apreciados com arrimo nas normas do CPC de 1973.          Isso porque ainda que a lei processual possua aplicabilidade imediata aos processos em curso (¿tempus regit actum¿), é cediço que o processo é constituído por atos processuais individualizados que devem ser considerados separadamente dos demais para o fim de se determinar qual a lei que os rege. Pelo isolamento dos atos processuais, a lei nova não alcança os efeitos produzidos em atos já realizados até aquela fase processual, pré-existente à nova norma.          No caso em apreço, o ato jurídico perfeito que gerou direito ao recorrente foi o Acórdão nº 147.140, reputando-se consumado segundo a lei vigente ao tempo em que se efetuou (art. 6º, §1º, da LINDB). Desta feita, tendo a Defensoria Pública sido intimada em 13/07/2015 (fls. 216-v/217), o recurso interposto contra a referida decisum será analisado com fulcro na Legislação Processual Civil de 1973. Ilustrativamente: PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. RECURSO REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. CONSELHO DE FISCALIZAÇÃO PROFISSIONAL. ART. 8º DA LEI 12.514/2011. INAPLICABILIDADE ÀS AÇÕES EM TRÂMITE. NORMA PROCESSUAL. ART. 1.211 DO CPC. "TEORIA DOS ATOS PROCESSUAIS ISOLADOS". PRINCÍPIO TEMPUS REGIT ACTUM. (...) 3. O Art. 1.211 do CPC dispõe: "Este Código regerá o processo civil em todo o território brasileiro. Ao entrar em vigor, suas disposições aplicar-se-ão desde logo aos processos pendentes". Pela leitura do referido dispositivo conclui-se que, em regra, a norma de natureza processual tem aplicação imediata aos processos em curso. 4. Ocorre que, por mais que a lei processual seja aplicada imediatamente aos processos pendentes, deve-se ter conhecimento que o processo é constituído por inúmeros atos. Tal entendimento nos leva à chamada "Teoria dos Atos Processuais Isolados", em que cada ato deve ser considerado separadamente dos demais para o fim de se determinar qual a lei que o rege, recaindo sobre ele a preclusão consumativa, ou seja, a lei que rege o ato processual é aquela em vigor no momento em que ele é praticado. Seria a aplicação do Princípio tempus regit actum. Com base neste princípio, temos que a lei processual atinge o processo no estágio em que ele se encontra, onde a incidência da lei nova não gera prejuízo algum às parte, respeitando-se a eficácia do ato processual já praticado. Dessa forma, a publicação e entrada em vigor de nova lei só atingem os atos ainda por praticar, no caso, os processos futuros, não sendo possível falar em retroatividade da nova norma, visto que os atos anteriores de processos em curso não serão atingidos. (...) 6. Recurso especial parcialmente provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ. (REsp 404796/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 26/03/2014, DJe 09/04/2014) (grifei).          A decisão judicial é de última instância, o recurso é tempestivo, as partes são legítimas e está presente o interesse em recorrer e a regularidade da representação.          O presente recurso especial merece seguimento.          . DA SUPOSTA VIOLAÇÃO AO ARTIGO 59 DO CÓDIGO PENAL          A causa de pedir do Recorrente diz respeito à dosimetria da pena, no que concerne a fixação da quantidade da sanção devida, tendo em vista que a exasperação se baseou em circunstâncias judiciais consideradas desfavoráveis, porém, não fundamentadas de forma adequada.          No presente caso, o juiz de primeiro grau ao proceder a dosimetria da pena imposta ao recorrente pelo reconhecimento da prática delitiva que lhe foi imputada, realizou a análise das circunstâncias judiciais do artigo 59 do Código Penal, valorando como desfavoráveis seis das oito vetoriais.          Ocorre que as seis circunstâncias judiciais consideradas desvaforáveis, foram fundamentadas genericamente, com avaliações subsumidas no próprio tipo penal imputado ao recorrente, dissociadas das circunstâncias concretas dos autos, ou contrárias aos elementos probantes.          Peço vênia para transcrever parte da sentença proferida em 1º grau: ¿A culpabilidade do agente restou evidenciada; Há registro de antecedentes criminais, posto que o réu já foi condenado em dois processos com trânsito em julgado nesta comarca, estando ainda respondendo a outros processos; a conduta social ruim; personalidade voltada para o crime; o motivo do crime se constituiu pelo desejo de obtenção de lucro fácil; circunstâncias do crime não o favorecem. Há uma preponderâncias das circunstâncias desfavoráveis. A situação econômica do réu presume-se não ser boa¿ (fl. 107) - grifo meu.          Pois bem, no vetorial ¿culpabilidade¿, o magistrado de forma genérica afirma que a mesma resta comprovada nos autos, sem especificar fatos concretos que embasem o grau de reprovabilidade da conduta. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é pacífica ao vedar o agravamento da pena-base fundado em motivação genérica, senão vejamos: ¿PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. FURTO QUALIFICADO TENTADO. DOSIMETRIA. VIOLAÇÃO AO ART. 59 DO CP. OCORRÊNCIA. CULPABILIDADE, MOTIVOS E COMPORTAMENTO DA VÍTIMA. VALORADAS NEGATIVAMENTE DE FORMA GENÉRICA E COM BASE EM ASPECTOS PRÓPRIOS DO TIPO PENAL. IMPOSSIBILIDADE. AFASTAMENTO DE TAIS CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS MANTIDO. RECURSO ESPECIAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO DESPROVIDO. I - Há flagrante ilegalidade no v. acórdão recorrido que, analisando as circunstâncias judiciais previstas no art. 59 do Código Penal, aprecia negativamente vetores ínsitos ao próprio tipo penal ou apresenta fundamentação sustentada em afirmações genéricas ou vagas. (...) (AgRg no AREsp 577.353/SP, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 16/02/2016, DJe 26/02/2016)¿.          No tocante ao vetor ¿antecedentes criminais¿, estão ausentes as razões para sua valoração negativa, tendo em vista que, na certidão de antecedentes criminais (fls. 35/36), inexiste qualquer indicação de condenação definitiva prolatada em desfavor do recorrente. Neste sentido colaciono jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça: ¿(...)RÉU TECNICAMENTE PRIMÁRIO. INEXISTÊNCIA DE CONDENAÇÃO DEFINITIVA. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 444/STJ(...). (...)2. Anotações constantes na folha de antecedentes criminais, sem notícia de trânsito em julgado, não se prestam a fundamentar a valoração negativa de nenhuma das circunstâncias judiciais. Inteligência da Súmula 444/STJ. (...) (HC 297.098/SP, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 16/02/2016, DJe 25/02/2016)¿ (grifei).          Quanto aos ¿motivos¿, os fundamentos utilizados são inerentes ao tipo penal, não podendo ser valorados novamente em desfavor do réu, neste raciocínio: HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO. ROUBO MAJORADO. PENA-BASE. EXASPERAÇÃO.CULPABILIDADE, ANTECEDENTES E CONSEQUÊNCIAS. LEGALIDADE. CONDUTA SOCIAL, PERSONALIDADE, MOTIVOS E CIRCUNSTÂNCIAS. CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO. 5. Afasta-se, ante a ocorrência de manifesta ilegalidade, a consideração desfavorável da motivação do crime, pois o lucro fácil é inerente ao roubo. (HC 212.016/GO, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 23/02/2016, DJe 02/03/2016).          Em relação ao vetor ¿personalidade do agente¿, a jurisprudência dominante do Superior Tribunal de Justiça entende que este não pode ser valorado de maneira negativa quando desacompanhado de elementos concretos para sua averiguação. Colaciono recente decisão do Superior Tribunal de Justiça: ¿PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ESPECIAL. PORTE OU POSSE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO. DOSIMETRIA PENAL. FIXAÇÃO DA PENA-BASE. PERSONALIDADE. VETOR NEGATIVO. FUNDAMENTAÇÃO INIDÔNEA. REDIMENSIONAMENTO. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO. (...) IV - De acordo com o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, o vetor personalidade não pode ser apreciado desfavoravelmente quando desacompanhado de elementos concretos para sua averiguação. (...) (HC 330.988/RJ, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 27/10/2015, DJe 05/11/2015).          Já o vetor ¿conduta social¿ foi pautado em argumento inservível para o agravamento da pena-base, pois, nos dizeres do Superior Tribunal de Justiça, avaliar a conduta social do réu como ruim é utilizar de fórmula vazia de conteúdo e que nada diz sobre o agente. Vejamos: ¿PENAL. RECURSO ESPECIAL. LATROCÍNIO. DOSIMETRIA. PENA-BASE. FIXAÇÃO ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. ANTECEDENTES, CULPABILIDADE, PERSONALIDADE, CONDUTA SOCIAL E CIRCUNSTÂNCIAS DO DELITO. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. AFASTAMENTO. RECURSO PROVIDO. (...) 5. A conduta social ruim, por sua vez, nada diz sobre o agente, sendo uma fórmula vazia de conteúdo. (...) (REsp 1511988/AC, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 15/12/2015, DJe 02/02/2016)¿ (grifei).          Por fim, no tocante ao vetor ¿circunstâncias¿, o magistrado sentenciante limitou-se a afirmar que as ¿circunstâncias do crime não o favorece¿, o que configura fundamentação genérica, inservível para o distanciamento da pena-base do mínimo legal, neste sentido: PENAL E PROCESSUAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. LESÃO CORPORAL. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. DOSIMETRIA. CIRCUNSTÂNCIAS DESFAVORÁVEIS. CONDUTA SOCIAL, MOTIVOS E CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME. MOTIVAÇÃO GENÉRICA E ABSTRATA. CONSEQUÊNCIAS DO CRIME. DESARMONIA NO ÂMBITO FAMILIAR. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. PENA-BASE FIXADA ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. 2. No caso em exame, o magistrado singular valorou negativamente a conduta social, os motivos e as circunstâncias do crime, utilizando-se de argumentos abstratos e genéricos, como por exemplo, quando se reporta aos "motivos e circunstâncias não justificáveis", e à "conduta social não recomendável", em desarmonia, portanto, com o disposto no artigo 59 do Código Penal. (HC 258.539/PE, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, QUINTA TURMA, julgado em 24/02/2015, DJe 03/03/2015)          Não se trata, no presente caso, de reexame do contexto fático-probatório, tendo em vista que as justificativas utilizadas para a exasperação, como já foi referido, não utilizam elementos concretos colhidos na instrução processual, e sim abstrações e elementos inerente ao crime pelo qual foi o recorrente condenado.          A dosimetria é uma operação lógica, formalmente estruturada, de acordo com o princípio da individualização da pena, cujo procedimento envolve profundo exame das condicionantes fáticas, sendo, em regra, vedado revê-lo em sede de especial.          No entanto, a avaliação de circunstâncias judiciais consideradas desfavoráveis amparadas em remissões genéricas e abstratas, sem a necessidade de entrar no mérito da questão, ou inerente ao próprio tipo penal, não é suficiente para exasperar a pena e, desta forma, não podem ser prejudiciais ao recorrente.          Portanto, no que diz respeito à violação ao artigo 59 do CP, o presente recurso especial merece ser admitido pela alínea 'a' do permissivo constitucional, eis que presentes os pressupostos de admissibilidade. Diante do exposto, dou seguimento ao recurso especial. À Secretaria competente para as providências de praxe. Belém, 11/05/2016          Desembargador RICARDO FERREIRA NUNES          Vice-Presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Pará Página de 6 mlrj 5 (2016.01955412-93, Não Informado, Rel. RONALDO MARQUES VALLE, Órgão Julgador 2ª TURMA DE DIREITO PENAL, Julgado em 2016-05-25, Publicado em 2016-05-25)
Decisão
DECISÃO MONOCRÁTICA

Data do Julgamento : 25/05/2016
Data da Publicação : 25/05/2016
Órgão Julgador : 2ª TURMA DE DIREITO PENAL
Relator(a) : RONALDO MARQUES VALLE
Número do documento : 2016.01955412-93
Tipo de processo : Apelação
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