TJPA 0001951-09.2016.8.14.0000
AGRAVO DE INSTRUMENTO N. 0001951-09.2016.8.14.0000 AGRAVANTE: BANCO ITAUCARD S/A AGRAVADO: WALDIRA MARIA MORAIS RELATORA: DESEMBARGADORA MARIA DE NAZARÉ SAAVEDRA GUIMARÃES EXPEDIENTE: 4ª CAMARA CÍVEL ISOLADA EMENTA AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO - INDEFERIMENTO DA LIMINAR - INAPLICABILIDADE DA TEORIA DO ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL - CONFRONTO COM JURISPRUDÊNCIA DOMINANTE DO STJ - RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. DECISÃO MONOCRÁTICA Trata-se de AGRAVO DE INSTRUMENTO COM PEDIDO DE EFEITO SUSPENSIVO interposto por BANCO ITAUCARD S/A, nos termos dos artigos 527 e seguintes do Código de Processo Civil, contra a decisão do Juízo de Direito da 1º Vara Cível e Empresarial de Altamira que, nos autos da AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO COM PEDIDO LIMINAR (proc. n. 0001184-53.2016.8.14.0005), indeferiu o pedido liminar de busca e apreensão tendo como ora agravada WALDIRA MARIA MORAIS. Na peça inaugural a empresa ora agravante, relatou que o recorrido realizou junto aquela instituição financeira contrato de financiamento com alienação fiduciária para obtenção de um automóvel, em 60 parcelas mensais, asseverando que o ora agravado deixou de pagar a prestação de n. 49 com vencimento em 22/10/2015, atualizado até a data de 12/01/2016, resultando o valor de R$ 10.276,95 (dez mil duzentos e setenta e seis reais e noventa e cinco centavos), pelo que requereu a concessão da liminar de busca e apreensão do veículo alienado fiduciariamente. O juízo a quo indeferiu a liminar de busca e apreensão, nos seguintes termos: Vistos etc. Trata-se de Ação de Busca e Apreensão, tendo por objeto o veículo marca/modelo CHEVROLET/CLASSIC LS, ano/modelo 2011/2011, placa OFJ5607, cor prata, chassi 9BGSU19F0BB310626, o qual fora alienado fiduciariamente em contrato de financiamento firmado entre as partes. Aduz o autor que o(a) demandado(a) deixou de pagar as prestações vencidas a partir de 22/10/2015, tendo sido constituído em mora, não tendo, todavia, adimplido com sua obrigação, razão pela qual manejou a presente ação. Juntou os documentos, entre eles o contrato de financiamento, a notificação extrajudicial do devedor e a planilha demonstrativa do débito. É o relatório, passo a DECIDIR. Compulsando os autos, verifico a existência de contrato entre autora e réu, contendo cláusula de alienação fiduciária do bem financiado. Todavia, constato que a parte requerida vinha adimplindo com sua obrigação, efetuando o pagamento aproximado de 80% do valor contratado, o que caracteriza o adimplemento substancial. A teoria do adimplemento substancial atua como instrumento de equidade colocado à disposição do intérprete, impondo que, nas hipóteses em que a extinção da obrigação pelo pagamento esteja próxima do final, exclua-se a possibilidade de resolução do contrato, permitindo-se tão somente a propositura da ação de cobrança do saldo em aberto. No direito pátrio, o adimplemento substancial, embora não tenha sido expressamente consagrado, vem sendo aplicado a partir da interpretação sistemática dos princípios da boafé objetiva, da função social dos contratos e da vedação ao enriquecimento sem causa, todos previstos no Código Civil de 2002. Nesse sentido, confiram-se os seguintes julgados: (...) Assim, conforme consta dos autos, a parte devedora já pagou 80% do valor do contrato (fl. 30), parecendo-me, nessas circunstâncias, uma arbitrariedade retirá-la da posse do bem antes de lhe dar uma oportunidade de purgar a mora. Ante o exposto, INDEFIRO a liminar de busca e apreensão formulado pela autora. Cite-se a parte ré para, querendo, contestar em 15 (quinze) dias, sob pena de revelia. Advirta-se o devedor de que, no prazo de cinco dias, a contar da citação, poderá pagar a integralidade da dívida pendente, segundo os valores apresentados pelo credor fiduciário na inicial. P. R. I. Altamira-PA, 28 de janeiro de 2016. CAROLINA CERQUEIRA DE MIRANDA MAIA Juíza de Direito Inconformado o autor interpôs o presente recurso, alegando em suas razões, suscintamente: a inaplicabilidade da teoria do adimplemento substancial com a necessidade do pagamento da integralidade do débito para obter a restituição do bem livre de ônus. Requereu ao final, a concessão de efeito suspensivo ativo à decisão agravada, e no mérito, a sua reforma, para que seja deferida a liminar para busca e apreensão do veículo. Coube-me por distribuição a relatoria do feito. (fls. 26) É o sucinto relatório. Decido. Com efeito, o presente recurso deve ser Provido Monocraticamente, senão vejamos. Em suas razões, insurge-se o agravante contra a decisão que indeferiu liminarmente a tutela antecipada de forma contrária a Legislação vigente, sob o argumento de que o devedor já teria pago aproximadamente 80% (oitenta por cento) das prestações devidas em decorrência da alienação fiduciária firmada entre as partes, bem como, por não observar o periculum in mora em se tratar de intervalo curto de tempo pelo que é pleiteado, afastando no momento, eminente risco ao credor. Merece acolhida a pretensão da agravante. Senão vejamos. Como se sabe, estando presentes os requisitos exigidos pelo art. 3º, do Decreto-Lei nº 911/69, deve-se deferir a liminar de busca e apreensão do bem objeto do contrato. Na dicção do artigo 2º, § 2º, do DL 911/69, vigente à época da propositura da ação, ¿A mora decorrerá do simples vencimento do prazo para pagamento e poderá ser comprovada por carta registrada expedida por intermédio de Cartório de Títulos e Documentos ou pelo protesto do título, a critério do credor.¿. Ressabidamente, a ¿comprovação da mora é imprescindível à busca e apreensão do bem alienado fiduciariamente¿ (STJ, Súmula 72). Neste sentido, verifica-se ao compulsar detidamente os presentes autos, que restou comprovada a mora do devedor, ora agravado por meio de declaração do oficial do Cartório, que goza de fé pública, afirmando que intimou o recorrido, conforme consta da decisão ora atacada. Quanto a purgação da mora, conforme entendimento atual e pacificado pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça, a quando do julgamento da questão nos autos do processo RE 1418593/MS (2013/0381036-4) conforme a sistemática do art. 543-C, do CPC (incidente de recursos repetitivos), tem-se que: "Nos contratos firmados na vigência da Lei n. 10.931¿2004, compete ao devedor, no prazo de 5 (cinco) dias após a execução da liminar na ação de busca e apreensão, pagar a integralidade da dívida - entendida esta como os valores apresentados e comprovados pelo credor na inicial -, sob pena de consolidação da propriedade do bem móvel objeto de alienação fiduciária¿, in verbis: DIREITO CIVIL. IMPOSSIBILIDADE DE PURGAÇÃO DA MORA EM CONTRATOS DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA FIRMADOS APÓS A VIGÊNCIA DA LEI 10.931/2004. RECURSO REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC E RES. 8/2008-STJ). Nos contratos firmados na vigência da Lei 10.931/2004, que alterou o art. 3º, §§ 1º e 2º, do Decreto-lei 911/1969, compete ao devedor, no prazo de cinco dias após a execução da liminar na ação de busca e apreensão, pagar a integralidade da dívida - entendida esta como os valores apresentados e comprovados pelo credor na inicial -, sob pena de consolidação da propriedade do bem móvel objeto de alienação fiduciária. De início, convém esclarecer que a Súmula 284 do STJ, anterior à Lei 10.931/2004, orienta que a purgação da mora, nos contratos de alienação fiduciária, só é permitida quando já pagos pelo menos 40% (quarenta por cento) do valor financiado. A referida súmula espelha a redação primitiva do § 1º do art. 3º do Decreto-lei 911/1969, que tinha a seguinte redação: ¿Despachada a inicial e executada a liminar, o réu será citado para, em três dias, apresentar contestação ou, se já houver pago 40% (quarenta por cento) do preço financiado, requerer a purgação de mora.¿ Contudo, do cotejo entre a redação originária e a atual - conferida pela Lei 10.931/2004 -, fica límpido que a lei não faculta mais ao devedor a purgação da mora, expressão inclusive suprimida das disposições atuais, não se extraindo do texto legal a interpretação de que é possível o pagamento apenas da dívida vencida. Ademais, a redação vigente do art. 3º, §§ 1º e 2º, do Decreto-lei 911/1969 estabelece que o devedor fiduciante poderá pagar a integralidade da dívida pendente e, se assim o fizer, o bem lhe será restituído livre de ônus, não havendo, portanto, dúvida acerca de se tratar de pagamento de toda a dívida, isto é, de extinção da obrigação. Vale a pena ressaltar que é o legislador quem está devidamente aparelhado para apreciar as limitações necessárias à autonomia privada em face de outros valores e direitos constitucionais. A propósito, a normatização do direito privado desenvolveu-se de forma autônoma em relação à Constituição, tanto em perspectiva histórica quanto em conteúdo, haja vista que o direito privado, em regra, disponibiliza soluções muito mais diferenciadas para conflitos entre os seus sujeitos do que a Constituição poderia fazer. Por isso não se pode presumir a imprevidência do legislador que, sopesando as implicações sociais, jurídicas e econômicas da modificação do ordenamento jurídico, vedou para alienação fiduciária de bem móvel a purgação da mora, sendo, pois, a matéria insuscetível de controle jurisdicional infraconstitucional. Portanto, sob pena de se gerar insegurança jurídica e violar o princípio da tripartição dos poderes, não cabe ao Poder Judiciário, a pretexto de interpretar a Lei 10.931/2004, criar hipótese de purgação da mora não contemplada pela lei. Com efeito, é regra basilar de hermenêutica a prevalência da regra excepcional, quando há confronto entre as regras específicas e as demais do ordenamento jurídico. Assim, como o CDC não regula contratos específicos, em casos de incompatibilidade entre a norma consumerista e a aludida norma específica, deve prevalecer essa última, pois a lei especial traz novo regramento a par dos já existentes. Nessa direção, é evidente que as disposições previstas no CC e no CDC são aplicáveis à relação contratual envolvendo alienação fiduciária de bem móvel, quando houver compatibilidade entre elas. Saliente-se ainda que a alteração operada pela Lei 10.931/2004 não alcança os contratos de alienação fiduciária firmados anteriormente à sua vigência. De mais a mais, o STJ, em diversos precedentes, já afirmou que, após o advento da Lei 10.931/2004, que deu nova redação ao art. 3º do Decreto-lei 911/1969, não há falar em purgação da mora, haja vista que, sob a nova sistemática, após o decurso do prazo de 5 (cinco) dias contados da execução da liminar, a propriedade do bem fica consolidada em favor do credor fiduciário, devendo o devedor efetuar o pagamento da integralidade do débito remanescente a fim de obter a restituição do bem livre de ônus. Precedentes citados: AgRg no REsp 1.398.434-MG, Quarta Turma, DJe 11/2/2014; e AgRg no REsp 1.151.061-MS, Terceira Turma, DJe 12/4/2013. REsp 1.418.593-MS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 14/5/2014. Somado a isso, compreendeu-se que somente se o devedor pagar a integralidade da dívida, incluindo as parcelas vencidas, vincendas e encargos, no prazo de 5 (cinco) dias após a execução da liminar, ser-lhe-á restituído o bem, livre do ônus da propriedade fiduciária, de sorte que ninguém é compelido a receber a quitação de uma obrigação senão na forma estritamente pactuada. Inadimplido o contrato, advém causa à sua resilição, com a cobrança integral do débito pendente, atendidas as circunstâncias legais. Corroborando com o entendimento acima esposado, vejamos os precedentes pertinentes ao tema: EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. PURGAÇÃO DA MORA. PAGAMENTO DA INTEGRALIDADE DO DÉBITO. 1. A jurisprudência do STJ possui entendimento assente de que com o advento da Lei nº 10.931/2004, cinco dias após a execução da liminar a propriedade do bem fica consolidada com o credor fiduciário, não havendo que se falar em purgação da mora, pois independentemente de percentual mínimo de adimplemento, o devedor tem que pagar a integralidade do débito remanescente, ou seja, as parcelas vencidas e as vincendas. 2. Agravo regimental a que se nega provimento. (STJ. AgRg no REsp nº 1446961/MS. Quarta Turma. Relatora Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI. DJe 02/06/2014) EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. PURGAÇÃO DA MORA. NÃO CABIMENTO. PAGAMENTO DA INTEGRALIDADE DO DÉBITO. DECRETO-LEI N. 911/1969. REDAÇÃO DA LEI N. 10.931/2004. 1.De acordo com o art. 3º do Decreto-Lei n. 911/1969, na redação dada pela Lei n. 10.931/2004, não mais se admite purgação da mora em ação de busca e apreensão, uma vez que, no novo regime, cinco dias após a execução da liminar, a propriedade e posse do bem passam a ser do credor fiduciário. 2. O devedor, nesse prazo, poderá pagar a integralidade do débito remanescente com base nos valores apresentados na inicial, hipótese na qual o bem lhe será restituído livre de ônus. 3. Agravo regimental desprovido. (STJ. AgRg no REsp nº 1418546/MS. Terceira Turma. Relator Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA. DJe 17/02/2014) EMENTA: ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. DECRETO-LEI N. 911/1969. ALTERAÇÃO INTRODUZIDA PELA LEI N. 10.931/2004. PURGAÇÃO DA MORA. IMPOSSIBILIDADE. NECESSIDADE DE PAGAMENTO DA INTEGRALIDADE DA DÍVIDA NO PRAZO DE 5 DIAS APÓS A EXECUÇÃO DA LIMINAR. 1. Para fins do art. 543-C do Código de Processo Civil: "Nos contratos firmados na vigência da Lei n. 10.931/2004, compete ao devedor, no prazo de 5 (cinco) dias após a execução da liminar na ação de busca e apreensão, pagar a integralidade da dívida - entendida esta como os valores apresentados e comprovados pelo credor na inicial -, sob pena de consolidação da propriedade do bem móvel objeto de alienação fiduciária". 2. Recurso especial provido. (STJ. REsp nº 1418593/MS. Segunda Seção. Relator Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO. DJe 27/05/2014) Desta feita, tenho que a decisão agravada que deixa de deferir a liminar de busca e apreensão do bem, para oportunizar a purgação da mora pelo Requerido está em confronto com a jurisprudência dominante do Superior Tribunal de Justiça. E nesse contexto, tem-se que o Relator, no Tribunal, pode dar provimento ao recurso, monocraticamente, quando a decisão recorrida estiver em confronto com súmula ou jurisprudência dominante do STF ou de Tribunal Superior (art. 557, § 1º-A, do CPC). Art. 557. O relator negará seguimento a recurso manifestamente inadmissível, improcedente, prejudicado ou em confronto com súmula ou jurisprudência dominante do respectivo tribunal, do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior. § 1º - A. Se a decisão recorrida estiver em manifesto confronto com súmula ou com jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior, o relator poderá dar provimento ao recurso. DISPOSITIVO Ante o exposto, com base no art. 557, §1º-A, do CPC, CONHEÇO DO AGRAVO DE INSTRUMENTO E DOU-LHE PROVIMENTO, reformando a decisão agravada para deferir a liminar de busca e apreensão pleiteada pelo agravante, nos termos da fundamentação supra. Oficie-se ao juízo a quo comunicando a presente decisão. Publique-se. Registre-se. Intime-se. Belém/PA, 18 de fevereiro de 2016. MARIA DE NAZARÉ SAAVEDRA GUIMARÃES Desembargadora - Relatora
(2016.00539397-23, Não Informado, Rel. MARIA DE NAZARE SAAVEDRA GUIMARAES, Órgão Julgador 4ª CAMARA CIVEL ISOLADA, Julgado em 2016-02-19, Publicado em 2016-02-19)
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AGRAVO DE INSTRUMENTO N. 0001951-09.2016.8.14.0000 AGRAVANTE: BANCO ITAUCARD S/A AGRAVADO: WALDIRA MARIA MORAIS RELATORA: DESEMBARGADORA MARIA DE NAZARÉ SAAVEDRA GUIMARÃES EXPEDIENTE: 4ª CAMARA CÍVEL ISOLADA EMENTA AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO - INDEFERIMENTO DA LIMINAR - INAPLICABILIDADE DA TEORIA DO ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL - CONFRONTO COM JURISPRUDÊNCIA DOMINANTE DO STJ - RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. DECISÃO MONOCRÁTICA Trata-se de AGRAVO DE INSTRUMENTO COM PEDIDO DE EFEITO SUSPENSIVO interposto por BANCO ITAUCARD S/A, nos termos dos artigos 527 e seguintes do Código de Processo Civil, contra a decisão do Juízo de Direito da 1º Vara Cível e Empresarial de Altamira que, nos autos da AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO COM PEDIDO LIMINAR (proc. n. 0001184-53.2016.8.14.0005), indeferiu o pedido liminar de busca e apreensão tendo como ora agravada WALDIRA MARIA MORAIS. Na peça inaugural a empresa ora agravante, relatou que o recorrido realizou junto aquela instituição financeira contrato de financiamento com alienação fiduciária para obtenção de um automóvel, em 60 parcelas mensais, asseverando que o ora agravado deixou de pagar a prestação de n. 49 com vencimento em 22/10/2015, atualizado até a data de 12/01/2016, resultando o valor de R$ 10.276,95 (dez mil duzentos e setenta e seis reais e noventa e cinco centavos), pelo que requereu a concessão da liminar de busca e apreensão do veículo alienado fiduciariamente. O juízo a quo indeferiu a liminar de busca e apreensão, nos seguintes termos: Vistos etc. Trata-se de Ação de Busca e Apreensão, tendo por objeto o veículo marca/modelo CHEVROLET/CLASSIC LS, ano/modelo 2011/2011, placa OFJ5607, cor prata, chassi 9BGSU19F0BB310626, o qual fora alienado fiduciariamente em contrato de financiamento firmado entre as partes. Aduz o autor que o(a) demandado(a) deixou de pagar as prestações vencidas a partir de 22/10/2015, tendo sido constituído em mora, não tendo, todavia, adimplido com sua obrigação, razão pela qual manejou a presente ação. Juntou os documentos, entre eles o contrato de financiamento, a notificação extrajudicial do devedor e a planilha demonstrativa do débito. É o relatório, passo a DECIDIR. Compulsando os autos, verifico a existência de contrato entre autora e réu, contendo cláusula de alienação fiduciária do bem financiado. Todavia, constato que a parte requerida vinha adimplindo com sua obrigação, efetuando o pagamento aproximado de 80% do valor contratado, o que caracteriza o adimplemento substancial. A teoria do adimplemento substancial atua como instrumento de equidade colocado à disposição do intérprete, impondo que, nas hipóteses em que a extinção da obrigação pelo pagamento esteja próxima do final, exclua-se a possibilidade de resolução do contrato, permitindo-se tão somente a propositura da ação de cobrança do saldo em aberto. No direito pátrio, o adimplemento substancial, embora não tenha sido expressamente consagrado, vem sendo aplicado a partir da interpretação sistemática dos princípios da boafé objetiva, da função social dos contratos e da vedação ao enriquecimento sem causa, todos previstos no Código Civil de 2002. Nesse sentido, confiram-se os seguintes julgados: (...) Assim, conforme consta dos autos, a parte devedora já pagou 80% do valor do contrato (fl. 30), parecendo-me, nessas circunstâncias, uma arbitrariedade retirá-la da posse do bem antes de lhe dar uma oportunidade de purgar a mora. Ante o exposto, INDEFIRO a liminar de busca e apreensão formulado pela autora. Cite-se a parte ré para, querendo, contestar em 15 (quinze) dias, sob pena de revelia. Advirta-se o devedor de que, no prazo de cinco dias, a contar da citação, poderá pagar a integralidade da dívida pendente, segundo os valores apresentados pelo credor fiduciário na inicial. P. R. I. Altamira-PA, 28 de janeiro de 2016. CAROLINA CERQUEIRA DE MIRANDA MAIA Juíza de Direito Inconformado o autor interpôs o presente recurso, alegando em suas razões, suscintamente: a inaplicabilidade da teoria do adimplemento substancial com a necessidade do pagamento da integralidade do débito para obter a restituição do bem livre de ônus. Requereu ao final, a concessão de efeito suspensivo ativo à decisão agravada, e no mérito, a sua reforma, para que seja deferida a liminar para busca e apreensão do veículo. Coube-me por distribuição a relatoria do feito. (fls. 26) É o sucinto relatório. Decido. Com efeito, o presente recurso deve ser Provido Monocraticamente, senão vejamos. Em suas razões, insurge-se o agravante contra a decisão que indeferiu liminarmente a tutela antecipada de forma contrária a Legislação vigente, sob o argumento de que o devedor já teria pago aproximadamente 80% (oitenta por cento) das prestações devidas em decorrência da alienação fiduciária firmada entre as partes, bem como, por não observar o periculum in mora em se tratar de intervalo curto de tempo pelo que é pleiteado, afastando no momento, eminente risco ao credor. Merece acolhida a pretensão da agravante. Senão vejamos. Como se sabe, estando presentes os requisitos exigidos pelo art. 3º, do Decreto-Lei nº 911/69, deve-se deferir a liminar de busca e apreensão do bem objeto do contrato. Na dicção do artigo 2º, § 2º, do DL 911/69, vigente à época da propositura da ação, ¿A mora decorrerá do simples vencimento do prazo para pagamento e poderá ser comprovada por carta registrada expedida por intermédio de Cartório de Títulos e Documentos ou pelo protesto do título, a critério do credor.¿. Ressabidamente, a ¿comprovação da mora é imprescindível à busca e apreensão do bem alienado fiduciariamente¿ (STJ, Súmula 72). Neste sentido, verifica-se ao compulsar detidamente os presentes autos, que restou comprovada a mora do devedor, ora agravado por meio de declaração do oficial do Cartório, que goza de fé pública, afirmando que intimou o recorrido, conforme consta da decisão ora atacada. Quanto a purgação da mora, conforme entendimento atual e pacificado pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça, a quando do julgamento da questão nos autos do processo RE 1418593/MS (2013/0381036-4) conforme a sistemática do art. 543-C, do CPC (incidente de recursos repetitivos), tem-se que: "Nos contratos firmados na vigência da Lei n. 10.931¿2004, compete ao devedor, no prazo de 5 (cinco) dias após a execução da liminar na ação de busca e apreensão, pagar a integralidade da dívida - entendida esta como os valores apresentados e comprovados pelo credor na inicial -, sob pena de consolidação da propriedade do bem móvel objeto de alienação fiduciária¿, in verbis: DIREITO CIVIL. IMPOSSIBILIDADE DE PURGAÇÃO DA MORA EM CONTRATOS DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA FIRMADOS APÓS A VIGÊNCIA DA LEI 10.931/2004. RECURSO REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC E RES. 8/2008-STJ). Nos contratos firmados na vigência da Lei 10.931/2004, que alterou o art. 3º, §§ 1º e 2º, do Decreto-lei 911/1969, compete ao devedor, no prazo de cinco dias após a execução da liminar na ação de busca e apreensão, pagar a integralidade da dívida - entendida esta como os valores apresentados e comprovados pelo credor na inicial -, sob pena de consolidação da propriedade do bem móvel objeto de alienação fiduciária. De início, convém esclarecer que a Súmula 284 do STJ, anterior à Lei 10.931/2004, orienta que a purgação da mora, nos contratos de alienação fiduciária, só é permitida quando já pagos pelo menos 40% (quarenta por cento) do valor financiado. A referida súmula espelha a redação primitiva do § 1º do art. 3º do Decreto-lei 911/1969, que tinha a seguinte redação: ¿Despachada a inicial e executada a liminar, o réu será citado para, em três dias, apresentar contestação ou, se já houver pago 40% (quarenta por cento) do preço financiado, requerer a purgação de mora.¿ Contudo, do cotejo entre a redação originária e a atual - conferida pela Lei 10.931/2004 -, fica límpido que a lei não faculta mais ao devedor a purgação da mora, expressão inclusive suprimida das disposições atuais, não se extraindo do texto legal a interpretação de que é possível o pagamento apenas da dívida vencida. Ademais, a redação vigente do art. 3º, §§ 1º e 2º, do Decreto-lei 911/1969 estabelece que o devedor fiduciante poderá pagar a integralidade da dívida pendente e, se assim o fizer, o bem lhe será restituído livre de ônus, não havendo, portanto, dúvida acerca de se tratar de pagamento de toda a dívida, isto é, de extinção da obrigação. Vale a pena ressaltar que é o legislador quem está devidamente aparelhado para apreciar as limitações necessárias à autonomia privada em face de outros valores e direitos constitucionais. A propósito, a normatização do direito privado desenvolveu-se de forma autônoma em relação à Constituição, tanto em perspectiva histórica quanto em conteúdo, haja vista que o direito privado, em regra, disponibiliza soluções muito mais diferenciadas para conflitos entre os seus sujeitos do que a Constituição poderia fazer. Por isso não se pode presumir a imprevidência do legislador que, sopesando as implicações sociais, jurídicas e econômicas da modificação do ordenamento jurídico, vedou para alienação fiduciária de bem móvel a purgação da mora, sendo, pois, a matéria insuscetível de controle jurisdicional infraconstitucional. Portanto, sob pena de se gerar insegurança jurídica e violar o princípio da tripartição dos poderes, não cabe ao Poder Judiciário, a pretexto de interpretar a Lei 10.931/2004, criar hipótese de purgação da mora não contemplada pela lei. Com efeito, é regra basilar de hermenêutica a prevalência da regra excepcional, quando há confronto entre as regras específicas e as demais do ordenamento jurídico. Assim, como o CDC não regula contratos específicos, em casos de incompatibilidade entre a norma consumerista e a aludida norma específica, deve prevalecer essa última, pois a lei especial traz novo regramento a par dos já existentes. Nessa direção, é evidente que as disposições previstas no CC e no CDC são aplicáveis à relação contratual envolvendo alienação fiduciária de bem móvel, quando houver compatibilidade entre elas. Saliente-se ainda que a alteração operada pela Lei 10.931/2004 não alcança os contratos de alienação fiduciária firmados anteriormente à sua vigência. De mais a mais, o STJ, em diversos precedentes, já afirmou que, após o advento da Lei 10.931/2004, que deu nova redação ao art. 3º do Decreto-lei 911/1969, não há falar em purgação da mora, haja vista que, sob a nova sistemática, após o decurso do prazo de 5 (cinco) dias contados da execução da liminar, a propriedade do bem fica consolidada em favor do credor fiduciário, devendo o devedor efetuar o pagamento da integralidade do débito remanescente a fim de obter a restituição do bem livre de ônus. Precedentes citados: AgRg no REsp 1.398.434-MG, Quarta Turma, DJe 11/2/2014; e AgRg no REsp 1.151.061-MS, Terceira Turma, DJe 12/4/2013. REsp 1.418.593-MS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 14/5/2014. Somado a isso, compreendeu-se que somente se o devedor pagar a integralidade da dívida, incluindo as parcelas vencidas, vincendas e encargos, no prazo de 5 (cinco) dias após a execução da liminar, ser-lhe-á restituído o bem, livre do ônus da propriedade fiduciária, de sorte que ninguém é compelido a receber a quitação de uma obrigação senão na forma estritamente pactuada. Inadimplido o contrato, advém causa à sua resilição, com a cobrança integral do débito pendente, atendidas as circunstâncias legais. Corroborando com o entendimento acima esposado, vejamos os precedentes pertinentes ao tema: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. PURGAÇÃO DA MORA. PAGAMENTO DA INTEGRALIDADE DO DÉBITO. 1. A jurisprudência do STJ possui entendimento assente de que com o advento da Lei nº 10.931/2004, cinco dias após a execução da liminar a propriedade do bem fica consolidada com o credor fiduciário, não havendo que se falar em purgação da mora, pois independentemente de percentual mínimo de adimplemento, o devedor tem que pagar a integralidade do débito remanescente, ou seja, as parcelas vencidas e as vincendas. 2. Agravo regimental a que se nega provimento. (STJ. AgRg no REsp nº 1446961/MS. Quarta Turma. Relatora Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI. DJe 02/06/2014) AGRAVO REGIMENTAL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. PURGAÇÃO DA MORA. NÃO CABIMENTO. PAGAMENTO DA INTEGRALIDADE DO DÉBITO. DECRETO-LEI N. 911/1969. REDAÇÃO DA LEI N. 10.931/2004. 1.De acordo com o art. 3º do Decreto-Lei n. 911/1969, na redação dada pela Lei n. 10.931/2004, não mais se admite purgação da mora em ação de busca e apreensão, uma vez que, no novo regime, cinco dias após a execução da liminar, a propriedade e posse do bem passam a ser do credor fiduciário. 2. O devedor, nesse prazo, poderá pagar a integralidade do débito remanescente com base nos valores apresentados na inicial, hipótese na qual o bem lhe será restituído livre de ônus. 3. Agravo regimental desprovido. (STJ. AgRg no REsp nº 1418546/MS. Terceira Turma. Relator Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA. DJe 17/02/2014) ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. DECRETO-LEI N. 911/1969. ALTERAÇÃO INTRODUZIDA PELA LEI N. 10.931/2004. PURGAÇÃO DA MORA. IMPOSSIBILIDADE. NECESSIDADE DE PAGAMENTO DA INTEGRALIDADE DA DÍVIDA NO PRAZO DE 5 DIAS APÓS A EXECUÇÃO DA LIMINAR. 1. Para fins do art. 543-C do Código de Processo Civil: "Nos contratos firmados na vigência da Lei n. 10.931/2004, compete ao devedor, no prazo de 5 (cinco) dias após a execução da liminar na ação de busca e apreensão, pagar a integralidade da dívida - entendida esta como os valores apresentados e comprovados pelo credor na inicial -, sob pena de consolidação da propriedade do bem móvel objeto de alienação fiduciária". 2. Recurso especial provido. (STJ. REsp nº 1418593/MS. Segunda Seção. Relator Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO. DJe 27/05/2014) Desta feita, tenho que a decisão agravada que deixa de deferir a liminar de busca e apreensão do bem, para oportunizar a purgação da mora pelo Requerido está em confronto com a jurisprudência dominante do Superior Tribunal de Justiça. E nesse contexto, tem-se que o Relator, no Tribunal, pode dar provimento ao recurso, monocraticamente, quando a decisão recorrida estiver em confronto com súmula ou jurisprudência dominante do STF ou de Tribunal Superior (art. 557, § 1º-A, do CPC). Art. 557. O relator negará seguimento a recurso manifestamente inadmissível, improcedente, prejudicado ou em confronto com súmula ou jurisprudência dominante do respectivo tribunal, do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior. § 1º - A. Se a decisão recorrida estiver em manifesto confronto com súmula ou com jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior, o relator poderá dar provimento ao recurso. DISPOSITIVO Ante o exposto, com base no art. 557, §1º-A, do CPC, CONHEÇO DO AGRAVO DE INSTRUMENTO E DOU-LHE PROVIMENTO, reformando a decisão agravada para deferir a liminar de busca e apreensão pleiteada pelo agravante, nos termos da fundamentação supra. Oficie-se ao juízo a quo comunicando a presente decisão. Publique-se. Registre-se. Intime-se. Belém/PA, 18 de fevereiro de 2016. MARIA DE NAZARÉ SAAVEDRA GUIMARÃES Desembargadora - Relatora
(2016.00539397-23, Não Informado, Rel. MARIA DE NAZARE SAAVEDRA GUIMARAES, Órgão Julgador 4ª CAMARA CIVEL ISOLADA, Julgado em 2016-02-19, Publicado em 2016-02-19)Decisão
DECISÃO MONOCRÁTICA
Data do Julgamento
:
19/02/2016
Data da Publicação
:
19/02/2016
Órgão Julgador
:
4ª CAMARA CIVEL ISOLADA
Relator(a)
:
MARIA DE NAZARE SAAVEDRA GUIMARAES
Número do documento
:
2016.00539397-23
Tipo de processo
:
Agravo de Instrumento
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