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Jurisprudência


TJPA 0002126-82.2014.8.14.0061

Ementa
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ COORDENADORIA DE RECURSOS EXTRAORDINÁRIOS E ESPECIAIS _________________________ PROCESSO Nº 0002126-82.2014.814.0061 RECURSO ESPECIAL      RECORRENTE: IVANEI DOS SANTOS LIMA RECORRIDO: JUSTIÇA PÚBLICA               Trata-se de recurso especial interposto por IVANEI DOS SANTOS LIMA, com fundamento no artigo 105, inciso III, alínea ¿a¿ da Constituição Federal, contra o v. acórdão no. 162.994, assim ementado: Acórdão 162.994 (Fls. 137/139) APELAÇÃO CRIMINAL. RECEPTAÇÃO. PRELIMINAR DE NULIDADE POR AUSÊNCIA DE TRANSAÇÃO PENAL. NÃO OCORRÊNCIA. APELANTE RESPONDIA POR OUTRO PROCESSO À ÉPOCA DA SENTENÇA. PREFACIAL REJEITADA. MÉRITO. ATIPICIDADE DA CONDUTA. INOCORRÊNCIA. MATERIALIDADE DELITIVA COMPROVADA. DOSIMETRIA. AFASTAMENTO DA VALORAÇÃO NEGATIVA DOS ANTECEDENTES CRIMINAIS. SÚMULA 444 DO STJ. PRESERVAÇÃO DAS DEMAIS. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.               Em recurso especial, sustenta o recorrente que a decisão impugnada violou o artigo 59 do Código Penal. Sustenta que os vetores ¿culpabilidade¿, ¿motivos¿, ¿circunstâncias¿, ¿consequências¿ e ¿comportamento da vítima¿ foram fundamentadas de forma inidônea.               Contrarrazões apresentadas às fls. 162/171.               É o relatório. Decido.               Verifico, in casu, que o insurgente satisfez os pressupostos de cabimento relativos à legitimidade, regularidade de representação, tempestividade e interesse recursal, inexistindo fato impeditivo ou extintivo ao direito de recorrer. Quanto ao preparo, este é dispensado em razão da natureza da Ação Penal (art. art. 3º, II da Resolução STJ/GP 01/2016.)               No presente caso, o magistrado de primeiro grau ao proceder o cálculo da reprimenda imposta ao recorrente pelo reconhecimento da prática delitiva que lhe foi imputada (receptação - art. 180, caput, CP), realizou a análise das circunstâncias judiciais do artigo 59 do Código Penal, valorando como desfavoráveis seis das oito vetoriais. Em face do decreto condenatório, foi interposta Apelação pelo acusado, a qual foi julgada parcialmente provida.               Da suposta violação aos artigos 59 do Código Penal.               Destaca-se, preliminarmente, que, ao julgar o recurso de apelação, a Câmara Julgadora retirou das circunstâncias judiciais negativas os ¿antecedentes criminais¿, subsistindo as demais.               Pois bem.               Quanto à culpabilidade e motivos do crime, o juízo de 1º grau, em decisão confirmada pela turma colegiada, os considerou como elementos desfavoráveis sob os seguintes fundamentos: (...)Analisando as circunstâncias judiciais do art. 59 do CPB, quanto à culpabilidade, observo que o réu possuía ao tempo dos fatos, a potencial consciência da ilicitude, sendo-lhe exigida conduta diversa da que teve. (...) Os motivos decorrem da expectativa de ganho fácil, sem responsabilidade. (...) - fl. 86               Nesse sentido, é cediço que o Superior Tribunal de Justiça tem entendimento pacificado no sentido de que a vetorial ¿culpabilidade¿ diz respeito ao grau de reprovabilidade da conduta e não ao elemento integrante do crime, não podendo ¿a consciência da ilicitude¿ servir como justificativa apta a elevar a pena base.               Ainda, no que diz respeito aos ¿motivos¿ do crime¿, é vedado ao juiz se utilizar de fundamentos que são inerentes ao tipo penal para fixação da pena basilar acima do mínimo legal.               É o posicionamento da Corte Superior. Vejamos: RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. TRÁFICO E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. RECEBIMENTO DA DENÚNCIA. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. ARTIGO 35, CAPUT, DA LEI N. 11.343/2006. PENA-BASE. CULPABILIDADE. CONCEITO ANALÍTICO DE CRIME. MOTIVOS. LUCRO FÁCIL. EXASPERAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. QUANTIDADE E NATUREZA DAS DROGAS. DESFAVORABILIDADE. ELEMENTOS IDÔNEOS. REGIME E SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVAS DE DIREITOS. CONCURSO MATERIAL. SOMATÓRIO DAS PENAS. INVIABILIDADE. NEGATIVA DE APELO EM LIBERDADE. RÉU QUE PERMANECEU PRESO DURANTE A INSTRUÇÃO. QUANTIDADE E QUALIDADE DAS DROGAS APREENDIDAS. NECESSIDADE DA PRISÃO PARA GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. SEGREGAÇÃO JUSTIFICADA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (...) 4. A potencial consciência da ilicitude ou a exigibilidade de conduta diversa são pressupostos da culpabilidade em  sentido estrito, não fazendo parte do rol das circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal, logo, não constitui elemento idôneo a justificar a exacerbação da pena-base. (...) 14. Recurso Ordinário em habeas corpus parcialmente provido tão somente para reduzir a pena quanto ao crime de associação para o tráfico para 3 (três) anos de reclusão e pagamento de 666 (seiscentos e sessenta e seis) dias-multa - reprimenda reduzida ao mínimo legal pela presença da atenuante da menoridade -, mantidos os demais termos do acórdão proferido no julgamento do recurso de apelação. (RHC 41.883/MG, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 05/04/2016, DJe 13/04/2016) HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. ROUBO. AUMENTO DA PENA-BASE. POSSIBILIDADE. CIRCUNSTÂNCIAS NEGATIVAS. EMPREGO DE VIOLÊNCIA QUE EXTRAVASA O TIPO PENAL. REGIME FECHADO. PENA SUPERIOR A 4 ANOS DE RECLUSÃO E CIRCUNSTÂNCIA JUDICIAL DESFAVORÁVEL. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. 1. O Superior Tribunal de Justiça, seguindo entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal, passou a não admitir o conhecimento do habeas corpus substitutivo de recurso previsto para a espécie. No entanto, deve-se analisar o pedido formulado na inicial, tendo em vista a possibilidade de se conceder a ordem de ofício, em razão da existência de eventual coação ilegal. 2. A dosimetria da pena insere-se dentro de um juízo de discricionariedade do julgador, atrelado às particularidades do caso concreto e subjetivas do agente, somente passível de revisão por esta Corte no caso de inobservância dos parâmetros legais ou de flagrante desproporcionalidade. 3. Nesse contexto, elementos próprios do tipo penal, alusões à potencial consciência da ilicitude, à gravidade do delito, ao perigo da conduta, à busca do lucro fácil e outras generalizações sem suporte em dados concretos não podem ser utilizados para aumentar a pena-base. (...) 6. Habeas corpus não conhecido. (HC 329.962/SP, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 04/10/2016, DJe 11/10/2016)               Nota-se, portanto, que os fundamentos utilizados no decreto condenatório são inidôneos, conforme orientação acima exposta.               No que diz respeito às ¿circunstâncias¿ e ¿consequências¿, a decisão primeva valorou-as em desfavor do réu nestes termos: ¿(...)As circunstâncias, uma vez que já tinha tirado o bem do local de onde adquiriu o bem, dificultado sua localização. As consequências não podem figurar em seu favor, uma vez que o fato contribui para aumentar a séria sensação de insegurança social nesta Comarca (...) - fl. 86               No entanto, denota-se que a referida argumentação é abstrata e genérica, não podendo ser utilizada como fundamento apto a ensejar exasperação da pena na 1ª fase da dosimetria. Conforme entendimento do STJ, o magistrado deve fundamentar sua decisão com elementos concretos dos autos que excedam ao comum do tipo penal. Vejamos. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. DESCABIMENTO. TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. PENA-BASE ACIMA DO MÍNIMO LEGAL SEM FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. ILEGALIDADE. REDUÇÃO AO PATAMAR MÍNIMO. MINORANTE DO ART. 33, § 4º, DA LEI 11.343/06. APLICAÇÃO DA FRAÇÃO MÁXIMA. POSSIBILIDADE. REGIME INICIAL. PENA-BASE NO MÍNIMO LEGAL. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS FAVORÁVEIS. ENUNCIADO N. 440 DA SÚMULA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA - STJ E N.718 E 719 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL - STF. SUBSTITUIÇÃO DA PENA CORPORAL POR RESTRITIVA DE DIREITOS. POSSIBILIDADE. PACIENTE PRIMÁRIO, DE BONS ANTECEDENTES E CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS BENÉFICAS. CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. WRIT NÃO CONHECIDO. CONCEDIDA A ORDEM DE OFÍCIO. (...) 2. No tocante à fixação da pena-base, verifico a ausência de fundamentação idônea apta a ensejar sua elevação. O magistrado sentenciante, ao analisar as circunstâncias do art. 59 do Código Penal - CP, utilizou-se de elementares do tipo, gravidade abstrata do delito, fundamentos genéricos e condenações por fatos posteriores para desaboná-las, justificando, assim, a elevação da reprimenda na primeira fase. Dessa forma, imperiosa a reforma das decisões de piso, quanto ao ponto, para reduzir a sanção básica ao mínimo legal, ante a ausência de elementos concretos aptos a fundamentar a sua exasperação. (...) - Writ não conhecido. Ordem concedida de ofício nos termos da fundamentação. (HC 241.650/RS, Rel. Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, QUINTA TURMA, julgado em 14/06/2016, DJe 21/06/2016) - grifei HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO. LATROCÍNIO. PENA-BASE. CULPABILIDADE, COMPORTAMENTO DA VÍTIMA, MOTIVOS E CONSEQUÊNCIAS DO CRIME. FUNDAMENTAÇÃO INSUFICIENTE. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO. 1. A revisão da dosimetria da pena no habeas corpus somente é permitida nas hipóteses de falta de fundamentação concreta ou quando a sanção aplicada é notoriamente desproporcional e irrazoável diante do crime cometido. 2. Deve ser reconhecida a ilegalidade na individualização da pena, em relação à culpabilidade, pois a instância antecedente utilizou os mesmos fundamentos (latrocínio cometido contra a irmã) para justificar tanto a exasperação da pena-base do paciente quanto para o reconhecimento da agravante genérica do art. 65, II, "e", do CP, incorrendo em indevido bis in idem. 3. As análises desfavoráveis dos motivos e das consequências do crime devem ser descontadas da dosimetria, pois baseadas em ilações genéricas e inerentes ao tipo penal, de que "nada há que favoreça ao réu", o crime foi praticado com o fim de "locupletar-se de bens alheios" e trouxe sensação de insegurança para a população da Comarca. 4. O fundamento genérico de que o sujeito passivo do crime em nada contribuiu para a conduta delitiva não justifica a apreciação negativa da circunstância judicial comportamento da vítima e também deve ser afastado. 5. Quanto às vetoriais personalidade do agente e circunstâncias do crime, não há ilegalidade a ser reconhecida neste writ, pois o julgador registrou que o paciente fugiu do distrito da culpa, foi expulso da Polícia Civil pelo cometimento de crime diverso e praticou o latrocínio se prevalecendo de relações domésticas, elementos concretos que evidenciam características individuais negativas e a especial reprovabilidade do agir. 6. Ordem não conhecida. Habeas corpus concedido de ofício, para redimensionar a pena-base do paciente e fixar a reprimenda final do crime de latrocínio em 23 anos e 4 meses de reclusão. (HC 248.901/PE, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 23/06/2015, DJe 03/08/2015) - grifei               Concernente ao ¿comportamento da vítima¿ trata-se de elemento neutro, não podendo ser valorado em prejuízo do réu quando a vítima não contribuiu para a prática do delito. Nesse sentido: PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DECISÃO RECORRIDA EM MANIFESTO CONFRONTO COM A JURISPRUDÊNCIA DO STJ. PROVIMENTO MONOCRÁTICO. POSSIBILIDADE. ART. 557, § 1º-A, DO CPC. OFENSA AO ART. 59, CAPUT, II, DO CP. OCORRÊNCIA. PENA-BASE FIXADA ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. COMPORTAMENTO DA VÍTIMA CONSIDERADO DESFAVORÁVEL. CONDUTA NEUTRA. FUNDAMENTAÇÃO INIDÔNEA. REDUÇÃO DA PENA. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. Estando a decisão recorrida em manifesto confronto com jurisprudência dominante deste Tribunal, o relator poderá dar provimento de forma monocrática. Inteligência do 557, § 1º-A, do CPC. 2. De fato é assente nesta Corte Superior o entendimento de que "quando o comportamento da vítima não contribui para o cometimento do crime, ou é considerado 'normal à espécie', não há falar em consideração desfavorável ao acusado." (HC 231.864/RS, Rel. Min. SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, DJe 21/06/2013) 3. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no REsp 1550460/PE, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 06/10/2015, DJe 27/10/2015)               Importa frisar que não se trata, no presente caso, de reexame do contexto fático-probatório, tendo em vista que as justificativas utilizadas para a exasperação, como já foi referido, não utilizam elementos concretos colhidos na instrução processual, e sim abstrações e elementos inerente ao crime pelo qual foi o recorrente condenado.               A dosimetria é uma operação lógica, formalmente estruturada, de acordo com o princípio da individualização da pena, cujo procedimento envolve profundo exame das condicionantes fáticas, sendo, em regra, vedado revê-lo em sede de especial.               Dessa forma, tais circunstâncias não podem ser prejudiciais ao recorrente, pelo fato dos fundamentos utilizados para o acréscimo da sanção serem indevidos e abstratos, de acordo com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.               Portanto, o presente recurso especial merece ser admitido pela alínea 'a' do permissivo constitucional, eis que presentes os pressupostos de admissibilidade.               Diante do exposto, dou seguimento ao recurso especial.               À Secretaria competente para as providências de praxe.                Belém, 19/12/2016 CONSTANTINO AUGUSTO GUERREIRO Desembargador Presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Pará Página de 6 4.6 (2016.05144952-38, Não Informado, Rel. MARIA EDWIGES MIRANDA LOBATO, Órgão Julgador 1ª TURMA DE DIREITO PENAL, Julgado em 2017-02-16, Publicado em 2017-02-16)
Decisão
DECISÃO MONOCRÁTICA

Data do Julgamento : 16/02/2017
Data da Publicação : 16/02/2017
Órgão Julgador : 1ª TURMA DE DIREITO PENAL
Relator(a) : MARIA EDWIGES MIRANDA LOBATO
Número do documento : 2016.05144952-38
Tipo de processo : Apelação
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