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Jurisprudência


TJPA 0002365-94.2014.8.14.0026

Ementa
D E C I S Ã O     M O N O C R Á T I C A             Trata-se de AGRAVO DE INSTRUMENTO COM PEDIDO DE EFEITO SUSPENSIVO interposto por ADMINISTRADORA DE CONSORCIO NACIONAL HONDA LTDA, nos termos dos artigos 522 e seguintes do Código de Processo Civil Brasileiro, contra a decisão do Juízo de Direito da Vara Única de Jacundá que, em sede de Ação de Busca e Apreensão com pedido liminar nº 0002365-94.2014.8.14.0026, movida contra WENDERSON BONFIM DE OLIVEIRA, que indeferiu o pedido liminar de busca e apreensão.             Na peça inaugural a autora/recorrente relatou que o ora agravado realizou junto aquela instituição financeira contrato de financiamento com alienação fiduciária para obtenção de uma motocicleta marca HONDA, tipo POP 100 97CC, cor preta, sem placa, ano/modelo 2013/2013, CHASSI Nº 9C2HB0210DR457522, no valor total de R$ 4.491,84 (fl. 79/82), assinado em 23/08/2013. Informou que o recorrido deixou de pagar as prestações vencidas desde 07/09/2013, pelo que requereu a concessão da liminar de busca e apreensão da motocicleta alienada fiduciariamente.              O juízo a quo indeferiu a liminar de busca e apreensão, nos seguintes termos: DECISÃO INTERLOCUTÓRIA (...) Vistos os autos. Recebo a inicial. Reservo-me ao direito de apreciar o pedido de busca e apreensão somente após a manifestação do requerido, tendo em vista o pagamento de parte substancial do contrato e a possibilidade de purgação da mora. Com efeito, entendo que neste caso o deferimento do pedido liminar afronta o devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa, além de constituir-se em lesão ao direito do consumidor, a isonomia e a função social do contrato, de vez que tal medida desequilibraria a relação jurídica de direito material envolvida na lide, considerando a vulnerabilidade do consumidor no mercado de consumo, além da prática forense demonstrar que na grande maioria destes casos quase sempre uma vez apreendido o bem, o consumidor acaba por perder a posse definitiva, além de todas as parcelas pagas no contrato, sendo a meu ver de bom alvitre possibilitar antes da busca o contraditório e a ampla defesa em limites mais extensos, com a possibilidade de purgação da mora ou até mesmo discussão da causa jurídica que ensejou o não pagamento das parcelas contratadas. Cite(m)-se o(s) requerido (os), para que ofereça resposta ao pedido, no prazo de 15 (quinze) dias, sob pena de revelia e confissão sobre a matéria de fato, podendo, neste prazo também efetuar a purgação da mora, utilizando a faculdade prevista no § 2º do artigo 3º do Decreto-Lei 911/69. Intime-se o(a) autor(a) desta decisão. (...)¿             Inconformado a autora interpôs o presente recurso, alegando em suas razões, suscintamente: [1] o preenchimento dos requisitos exigidos no Dec-Lei nº 911/69, com as alterações dadas pela Lei nº 10.931/2004; [2] comprovação da mora e o dever de concessão da liminar. Requereu assim, a concessão do efeito suspensivo a decisão agravada, e no mérito, o conhecimento e provimento do recurso.             Os autos foram distribuídos ao Excelentíssimo Juiz Convocado Dr. José Roberto P. M. Bezerra Junior (fl. 35), sendo a relatoria a mim transferida por força da Portaria nº 741/2015 - GP, de 11/02/2015. (fls. 110/101)             Vieram-me conclusos os autos em 13/03/2015 (fls. 101v).             É o relatório.   DECIDO.             O presente recurso comporta julgamento imediato, nos termos do art. 557, caput, do CPC, pelos motivos que passo a expor.             Em suas razões, insurge-se o agravante contra a decisão agravada que indeferiu liminarmente a tutela antecipada de forma contrária a lei, sob o argumento de violação do devido processo legal, contraditório e a ampla defesa, além de constituir uma lesão ao direito do consumidor.             Merece acolhida a pretensão da agravante. Vejamos.             Como se sabe, estando presentes os requisitos exigidos pelo art. 3º, do Decreto-Lei nº 911/69, deve-se deferir a liminar de busca e apreensão do bem objeto do contrato.             Na dicção do artigo 2º, § 2º, do DL 911/69, vigente à época da propositura da ação, ¿A mora decorrerá do simples vencimento do prazo para pagamento e poderá ser comprovada por carta registrada expedida por intermédio de Cartório de Títulos e Documentos ou pelo protesto do título, a critério do credor.¿.            Ressabidamente, a ¿comprovação da mora é imprescindível à busca e apreensão do bem alienado fiduciariamente¿ (STJ, Súmula 72).             In casu, resta comprovada a mora do devedor/agravado, por meio de declaração do oficial do Cartório, que goza de fé pública, afirmando que intimou a agravado (fl. 85), bastando isso para validar a notificação do débito.             Portanto, vislumbra-se que os requisitos exigidos no Decreto-Lei nº 911/69, foram devidamente preenchidos pela agravante, não podendo se falar em afronta ao devido processo legal, não havendo óbices à concessão da liminar pleiteada.            Por oportuno, acrescento que, quanto a purgação da mora, conforme entendimento atual e pacificado pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento da questão nos autos do processo RE 1418593/MS (2013/0381036-4) conforme a sistemática do art. 543-C, do CPC (incidente de recursos repetitivos), "Nos contratos firmados na vigência da Lei n. 10.931¿2004, compete ao devedor, no prazo de 5 (cinco) dias após a execução da liminar na ação de busca e apreensão, pagar a integralidade da dívida - entendida esta como os valores apresentados e comprovados pelo credor na inicial -, sob pena de consolidação da propriedade do bem móvel objeto de alienação fiduciária".            Vejamos o referido precedente, na íntegra. DIREITO CIVIL. IMPOSSIBILIDADE DE PURGAÇÃO DA MORA EM CONTRATOS DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA FIRMADOS APÓS A VIGÊNCIA DA LEI 10.931/2004. RECURSO REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC E RES. 8/2008-STJ). Nos contratos firmados na vigência da Lei 10.931/2004, que alterou o art. 3º, §§ 1º e 2º, do Decreto-lei 911/1969, compete ao devedor, no prazo de cinco dias após a execução da liminar na ação de busca e apreensão, pagar a integralidade da dívida - entendida esta como os valores apresentados e comprovados pelo credor na inicial -, sob pena de consolidação da propriedade do bem móvel objeto de alienação fiduciária. De início, convém esclarecer que a Súmula 284 do STJ, anterior à Lei 10.931/2004, orienta que a purgação da mora, nos contratos de alienação fiduciária, só é permitida quando já pagos pelo menos 40% (quarenta por cento) do valor financiado. A referida súmula espelha a redação primitiva do § 1º do art. 3º do Decreto-lei 911/1969, que tinha a seguinte redação: ¿Despachada a inicial e executada a liminar, o réu será citado para, em três dias, apresentar contestação ou, se já houver pago 40% (quarenta por cento) do preço financiado, requerer a purgação de mora.¿  Contudo, do cotejo entre a redação originária e a atual - conferida pela Lei 10.931/2004 -, fica límpido que a lei não faculta mais ao devedor a purgação da mora, expressão inclusive suprimida das disposições atuais, não se extraindo do texto legal a interpretação de que é possível o pagamento apenas da dívida vencida. Ademais, a redação vigente do art. 3º, §§ 1º e 2º, do Decreto-lei 911/1969 estabelece que o devedor fiduciante poderá pagar a integralidade da dívida pendente e, se assim o fizer, o bem lhe será restituído livre de ônus, não havendo, portanto, dúvida acerca de se tratar de pagamento de toda a dívida, isto é, de extinção da obrigação. Vale a pena ressaltar que é o legislador quem está devidamente aparelhado para apreciar as limitações necessárias à autonomia privada em face de outros valores e direitos constitucionais. A propósito, a normatização do direito privado desenvolveu-se de forma autônoma em relação à Constituição, tanto em perspectiva histórica quanto em conteúdo, haja vista que o direito privado, em regra, disponibiliza soluções muito mais diferenciadas para conflitos entre os seus sujeitos do que a Constituição poderia fazer. Por isso não se pode presumir a imprevidência do legislador que, sopesando as implicações sociais, jurídicas e econômicas da modificação do ordenamento jurídico, vedou para alienação fiduciária de bem móvel a purgação da mora, sendo, pois, a matéria insuscetível de controle jurisdicional infraconstitucional. Portanto, sob pena de se gerar insegurança jurídica e violar o princípio da tripartição dos poderes, não cabe ao Poder Judiciário, a pretexto de interpretar a Lei 10.931/2004, criar hipótese de purgação da mora não contemplada pela lei. Com efeito, é regra basilar de hermenêutica a prevalência da regra excepcional, quando há confronto entre as regras específicas e as demais do ordenamento jurídico. Assim, como o CDC não regula contratos específicos, em casos de incompatibilidade entre a norma consumerista e a aludida norma específica, deve prevalecer essa última, pois a lei especial traz novo regramento a par dos já existentes. Nessa direção, é evidente que as disposições previstas no CC e no CDC são aplicáveis à relação contratual envolvendo alienação fiduciária de bem móvel, quando houver compatibilidade entre elas. Saliente-se ainda que a alteração operada pela Lei 10.931/2004 não alcança os contratos de alienação fiduciária firmados anteriormente à sua vigência. De mais a mais, o STJ, em diversos precedentes, já afirmou que, após o advento da Lei 10.931/2004, que deu nova redação ao art. 3º do Decreto-lei 911/1969, não há falar em purgação da mora, haja vista que, sob a nova sistemática, após o decurso do prazo de 5 (cinco) dias contados da execução da liminar, a propriedade do bem fica consolidada em favor do credor fiduciário, devendo o devedor efetuar o pagamento da integralidade do débito remanescente a fim de obter a restituição do bem livre de ônus. Precedentes citados: AgRg no REsp 1.398.434-MG, Quarta Turma, DJe 11/2/2014; e AgRg no REsp 1.151.061-MS, Terceira Turma, DJe 12/4/2013. REsp 1.418.593-MS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 14/5/2014.            Sob essa nova sistemática, compreendeu-se que somente se o devedor pagar a integralidade da dívida, incluindo as parcelas vencidas, vincendas e encargos, no prazo de 5 (cinco) dias após a execução da liminar, ser-lhe-á restituído o bem, livre do ônus da propriedade fiduciária.            Afinal, ninguém é compelido a receber a quitação de uma obrigação senão na forma estritamente pactuada. Inadimplido o contrato, advém causa à sua resilição, com a cobrança integral do débito pendente, atendidas as circunstâncias legais.            Desta feita, conforme o entendimento jurisprudencial pacificado, não poderia ser outro o entendimento desta julgadora, senão, o de dar provimento liminarmente ao presente recurso de agravo, considerando, sobretudo, a sistemática do art. 557, §1º-A, do CPC.            ANTE O EXPOSTO, com base no art. 557, §1º-A, do CPC, CONHEÇO DO AGRAVO DE INSTRUMENTO E DOU-LHE PROVIMENTO, reformando a decisão agravada para deferir a liminar de busca e apreensão pleiteada pela agravante, tudo nos moldes e limites da fundamentação lançada.             Oficie-se ao juízo a quo comunicando a presente decisão.            Publique-se. Intime-se.             Belém (PA), 25 de maio de 2015.             EZILDA PASTANA MUTRAN             Juíza convocada/Relatora (2015.01777612-42, Não Informado, Rel. EZILDA PASTANA MUTRAN - JUIZA CONVOCADA, Órgão Julgador 2ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA, Julgado em 2015-05-27, Publicado em 2015-05-27)
Decisão
DECISÃO MONOCRÁTICA

Data do Julgamento : 27/05/2015
Data da Publicação : 27/05/2015
Órgão Julgador : 2ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA
Relator(a) : EZILDA PASTANA MUTRAN - JUIZA CONVOCADA
Número do documento : 2015.01777612-42
Tipo de processo : Agravo de Instrumento
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