TJPA 0002426-62.2016.8.14.0000
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ Gabinete da Desa. Luzia Nadja Guimarães Nascimento PROCESSO Nº 0002426-62.2016.8.14.0000 AGRAVO DE INSTRUMENTO COMARCA: BELÉM AGRAVANTE: VALE S/A ADVOGADO: DANIELE SERRUYA SORIANO DE MELO e OUTROS AGRAVADO: RAFAEL FRANCO OIZUMI ADVOGADO: SERLIGE COSTA DO NASCIMENTO AGRAVADO: SISTEMA DE ENSINO EQUIPE LTDA EPP ADVOGADO: JOSÉ ALEXANDRE CANCELA LISBOA COHEN RELATORA: DESA. LUZIA NADJA GUIMARÃES NASCIMENTO DECISÃO MONOCRÁTICA Trata-se de Agravo de Instrumento interposto por VALE S/A, nos autos de ação ordinária ajuizada por RAFAEL FRANCO OIZUMI, em face da decisão que deferiu antecipação de tutela, determinando que os réus (VALE S/A e SISTEMA DE ENSINO EQUIPE LTDA EPP) que realizassem a matrícula do filho do autor limitando a cobrança de mensalidade escolar nas series pretendidas ao preço daquelas praticadas no ano anterior pelo Grupo Educacional Futuro acrescido apenas a majoração do índice oficial de inflação. Em apertada síntese o filho do autor era aluno do Grupo Educacional Futuro, em tese mantida pela empresa VALE S/A, pagando mensalidade escolar em torno de R$490,00. Entre os anos de 2015 e 2016, ocorreu uma sucessão de instituições de ensino, ocasião em que a sucessora, Sistema de Ensino Equipe, passou a cobrar mensalidades na ordem de R$1.170,00, registrando-se aumento estimado de 140%. Inconformado o autor/agravado ajuizou ação para que seja reconhecida a abusividade do aumento e requereu liminar para assegurar a matricula no valor praticado no contrato de prestação de serviços educacionais firmado no ano anterior. A liminar foi concedida e é dela que se recorre. Alega a VALE S/A preliminarmente a sua ilegitimidade ativa do autor pois estaria pleiteando em nome próprio direito alheio (relação pai e filho), bem como ilegitimidade passiva uma vez que não guarda vinculo de gerência com a instituição de ensino, possuindo com aquela apenas contrato de prestação de serviços sem configurar relação mantenedora-mantida. Aponta a inexistência de fumus boni juris e periculun in mora que justifiquem a entrega da tutela nos termos do art. 461, § 3º do CPC. Informa que o autor/agravado não é empregado da VALE. Descreve que em decorrência de acordo coletivo de trabalho entre a agravante o Sindicato Metabase Carajás, a agravante custeia a educação dos seus empregados e dependentes, de forma que a cada 5 anos realiza processo licitatório para contratação de instituição de ensino para prestar serviços educacionais no município de Canaã dos Carajás, esclarecendo que o contrato com o Colégio Futuro exauriu e o Colégio Equipe restou contratado para a prestação do serviço, por conseguinte, tratando-se de empresas diversas não houve caracterização de aumento de mensalidade. A agravante finaliza afirmando que inexiste embasamento fático ou legal que a obrigue arcar com o custeio total ou parcial da educação do filho do agravado, requerendo o processamento do recurso no regime de instrumento, a concessão de efeito suspensivo e o provimento do agravo, para reformar a decisão vergastada. É o essencial a relatar. Examino. Tempestivo e adequado vou processar no regime de instrumento. Inicialmente afasto a preliminar de ilegitimidade ativa seja em razão da incapacidade absoluta do aluno (15 anos), bem como pelo autor ser o contratante de fato e de direito (responsável financeiro), bastando para tanto a leitura perfunctória do contrato de prestação de serviços educacionais em fls 51 e seguintes. Quanto a preliminar de ilegitimidade passiva, os argumentos se confundem com o próprio mérito da causa, razão pela qual também supero-a. Ao contrário do que quer fazer crer a recorrente, tem-se, no presente caso, típico contrato de execução continuada ou de trato sucessivo. Quando buscam uma instituição de ensino, os alunos e seus responsáveis não o fazem com a intenção de frequentar o curso por apenas 1 período, buscam certamente fazer o curso inteiro, seja o ensino fundamental, médio ou superior. Decerto que de nada serve a contratação de apenas um período do curso, quando o que se pretende é o certificado de sua integral conclusão (ensino médio). Nessa toada, o ato da recorrente de rescindir o contrato com uma instituição para contratação de outra que se instalou no mesmo espaço físico, que manterá em sua maioria o mesmo corpo discente, quiçá pretende absorver parte do corpo docente, tem sim, de forma inequívoca, reflexos diretos na vida escolar do filho do agravado, que pelos últimos seis anos frequentou aquele colégio. Esse é exatamente o escopo abrangido pela figura da justa expectativa nas contratações, que integra a boa-fé objetiva, disciplinada pelo Código Civil: ¿Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé¿ (CC, artigo 422). De fato, o viés objetivo do conceito de boa-fé constitui um parâmetro de caráter genérico, objetivo, em consonância com as tendências do direito contratual contemporâneo e que significa bem mais que simplesmente a alegação da ausência de má-fé, ou da ausência da intenção de prejudicar, mas que significa, antes, uma verdadeira ostentação da lealdade contratual, comportamento comum ao homem médio, o padrão jurídico standard. Neste momento de cognição sumária, imagino que acatar os argumentos da agravante nessas circunstâncias corresponderia a atenuar, prematuramente, sua responsabilidade, deixando o agravado em situação de exagerada desvantagem, incompatível com o princípio da boa-fé, pois significaria restrição a direitos próprios da natureza e da finalidade do contrato (direito à educação), o que é vedado por lei. Assim exposto, estou por conhecer do recurso e determinar seu processamento no regime de instrumento, sem conceder-lhe o efeito suspensivo requerido. Intime-se para o contraditório. Colha-se a manifestação do Parquet. Retornem conclusos para julgamento. P.R.I.C. Belém, DESA. LUZIA NADJA GUIMARÃES NASCIMENTO Relatora
(2016.00807565-37, Não Informado, Rel. JOSE MARIA TEIXEIRA DO ROSARIO, Órgão Julgador 2ª TURMA DE DIREITO PRIVADO, Julgado em 2016-03-07, Publicado em 2016-03-07)
Ementa
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ Gabinete da Desa. Luzia Nadja Guimarães Nascimento PROCESSO Nº 0002426-62.2016.8.14.0000 AGRAVO DE INSTRUMENTO COMARCA: BELÉM AGRAVANTE: VALE S/A ADVOGADO: DANIELE SERRUYA SORIANO DE MELO e OUTROS AGRAVADO: RAFAEL FRANCO OIZUMI ADVOGADO: SERLIGE COSTA DO NASCIMENTO AGRAVADO: SISTEMA DE ENSINO EQUIPE LTDA EPP ADVOGADO: JOSÉ ALEXANDRE CANCELA LISBOA COHEN RELATORA: DESA. LUZIA NADJA GUIMARÃES NASCIMENTO DECISÃO MONOCRÁTICA Trata-se de Agravo de Instrumento interposto por VALE S/A, nos autos de ação ordinária ajuizada por RAFAEL FRANCO OIZUMI, em face da decisão que deferiu antecipação de tutela, determinando que os réus (VALE S/A e SISTEMA DE ENSINO EQUIPE LTDA EPP) que realizassem a matrícula do filho do autor limitando a cobrança de mensalidade escolar nas series pretendidas ao preço daquelas praticadas no ano anterior pelo Grupo Educacional Futuro acrescido apenas a majoração do índice oficial de inflação. Em apertada síntese o filho do autor era aluno do Grupo Educacional Futuro, em tese mantida pela empresa VALE S/A, pagando mensalidade escolar em torno de R$490,00. Entre os anos de 2015 e 2016, ocorreu uma sucessão de instituições de ensino, ocasião em que a sucessora, Sistema de Ensino Equipe, passou a cobrar mensalidades na ordem de R$1.170,00, registrando-se aumento estimado de 140%. Inconformado o autor/agravado ajuizou ação para que seja reconhecida a abusividade do aumento e requereu liminar para assegurar a matricula no valor praticado no contrato de prestação de serviços educacionais firmado no ano anterior. A liminar foi concedida e é dela que se recorre. Alega a VALE S/A preliminarmente a sua ilegitimidade ativa do autor pois estaria pleiteando em nome próprio direito alheio (relação pai e filho), bem como ilegitimidade passiva uma vez que não guarda vinculo de gerência com a instituição de ensino, possuindo com aquela apenas contrato de prestação de serviços sem configurar relação mantenedora-mantida. Aponta a inexistência de fumus boni juris e periculun in mora que justifiquem a entrega da tutela nos termos do art. 461, § 3º do CPC. Informa que o autor/agravado não é empregado da VALE. Descreve que em decorrência de acordo coletivo de trabalho entre a agravante o Sindicato Metabase Carajás, a agravante custeia a educação dos seus empregados e dependentes, de forma que a cada 5 anos realiza processo licitatório para contratação de instituição de ensino para prestar serviços educacionais no município de Canaã dos Carajás, esclarecendo que o contrato com o Colégio Futuro exauriu e o Colégio Equipe restou contratado para a prestação do serviço, por conseguinte, tratando-se de empresas diversas não houve caracterização de aumento de mensalidade. A agravante finaliza afirmando que inexiste embasamento fático ou legal que a obrigue arcar com o custeio total ou parcial da educação do filho do agravado, requerendo o processamento do recurso no regime de instrumento, a concessão de efeito suspensivo e o provimento do agravo, para reformar a decisão vergastada. É o essencial a relatar. Examino. Tempestivo e adequado vou processar no regime de instrumento. Inicialmente afasto a preliminar de ilegitimidade ativa seja em razão da incapacidade absoluta do aluno (15 anos), bem como pelo autor ser o contratante de fato e de direito (responsável financeiro), bastando para tanto a leitura perfunctória do contrato de prestação de serviços educacionais em fls 51 e seguintes. Quanto a preliminar de ilegitimidade passiva, os argumentos se confundem com o próprio mérito da causa, razão pela qual também supero-a. Ao contrário do que quer fazer crer a recorrente, tem-se, no presente caso, típico contrato de execução continuada ou de trato sucessivo. Quando buscam uma instituição de ensino, os alunos e seus responsáveis não o fazem com a intenção de frequentar o curso por apenas 1 período, buscam certamente fazer o curso inteiro, seja o ensino fundamental, médio ou superior. Decerto que de nada serve a contratação de apenas um período do curso, quando o que se pretende é o certificado de sua integral conclusão (ensino médio). Nessa toada, o ato da recorrente de rescindir o contrato com uma instituição para contratação de outra que se instalou no mesmo espaço físico, que manterá em sua maioria o mesmo corpo discente, quiçá pretende absorver parte do corpo docente, tem sim, de forma inequívoca, reflexos diretos na vida escolar do filho do agravado, que pelos últimos seis anos frequentou aquele colégio. Esse é exatamente o escopo abrangido pela figura da justa expectativa nas contratações, que integra a boa-fé objetiva, disciplinada pelo Código Civil: ¿Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé¿ (CC, artigo 422). De fato, o viés objetivo do conceito de boa-fé constitui um parâmetro de caráter genérico, objetivo, em consonância com as tendências do direito contratual contemporâneo e que significa bem mais que simplesmente a alegação da ausência de má-fé, ou da ausência da intenção de prejudicar, mas que significa, antes, uma verdadeira ostentação da lealdade contratual, comportamento comum ao homem médio, o padrão jurídico standard. Neste momento de cognição sumária, imagino que acatar os argumentos da agravante nessas circunstâncias corresponderia a atenuar, prematuramente, sua responsabilidade, deixando o agravado em situação de exagerada desvantagem, incompatível com o princípio da boa-fé, pois significaria restrição a direitos próprios da natureza e da finalidade do contrato (direito à educação), o que é vedado por lei. Assim exposto, estou por conhecer do recurso e determinar seu processamento no regime de instrumento, sem conceder-lhe o efeito suspensivo requerido. Intime-se para o contraditório. Colha-se a manifestação do Parquet. Retornem conclusos para julgamento. P.R.I.C. Belém, DESA. LUZIA NADJA GUIMARÃES NASCIMENTO Relatora
(2016.00807565-37, Não Informado, Rel. JOSE MARIA TEIXEIRA DO ROSARIO, Órgão Julgador 2ª TURMA DE DIREITO PRIVADO, Julgado em 2016-03-07, Publicado em 2016-03-07)Decisão
DECISÃO MONOCRÁTICA
Data do Julgamento
:
07/03/2016
Data da Publicação
:
07/03/2016
Órgão Julgador
:
2ª TURMA DE DIREITO PRIVADO
Relator(a)
:
JOSE MARIA TEIXEIRA DO ROSARIO
Número do documento
:
2016.00807565-37
Tipo de processo
:
Agravo de Instrumento
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