TJPA 0002494-75.2017.8.14.0000
1ª TURMA DE DIREITO PRIVADO ORIGEM: 10ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE ANANINDEUA/PA AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 0002494-75.2017.8.14.0301 AGRAVANTE: MAXIMILIANO DE ARAÚJO COSTA APELADO: PARIS INCORPORADORA LTDA RELATORA: DESA. MARIA FILOMENA DE ALMEIDA BUARQUE AGRAVO DE INSTRUMENTO. ATRASO NA ENTREGA DA OBRA. PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA PARA A DEVOLUÇÃO DOS VALORES PAGOS PELO CONSUMIDOR/AGRAVANTE À CONSTRUTORA. RESCISÃO CONTRATUAL. POSSIBILIDADE. RESTITUIÇÃO INTEGRAL AO CONSUMIDOR DOS VALORES PAGOS. RECURSO A QUE SE PROVIMENTO. - Verifica-se dos autos que os litigantes celebraram o contrato de Promessa de Compra e Venda de fls. 30/44, tendo por objeto o apartamento nº 708, localizado no Residencial Ville Ametista - Paris, com prazo de entrega previsto para 31/12/2013, conforme cláusula ¿5¿, do Quadro Resumo (fls. 31). - De início, deve-se ressaltar a aplicação do Código de Defesa do Consumidor ao caso em tela por se tratar de uma relação consumerista. É cediço que um dos princípios que norteiam as relações contratuais é o chamado pacta sunt servanda, segundo o qual o contrato faz lei entre as partes e que, salvo reconhecimento judicial de qualquer abusividade, são válidas as cláusulas pactuadas e, portanto, devem ser cumpridas em sua integralidade. - Em se tratando de relação de consumo, o princípio do pacta sunt servanda foi relativizado, sendo lícito ao jurisdicionado requerer a intervenção do Estado a fim que o contrato seja revisto quando se tornar excessivamente oneroso para uma das partes, ou, ainda, quando contiver cláusulas abusivas. - No caso dos autos, o prazo de entrega do imóvel estava previsto para o dia 31/12/2013, nos termos da cláusula 5 do contrato. No entanto, a robusta documentação constante nos autos, demonstra que a agravada não teria concluído/entregue a obra no prazo ajustado. Não tendo a construtora agravada comprovado a entrega das chaves no prazo estipulado, impõe-se, portanto, a rescisão do contrato. - Desta forma, em face da declaração judicial da rescisão do instrumento contratual, os consumidores fazem jus à integralidade da quantia por eles paga, importância corrigida monetariamente na forma constante na sentença. DECISÃO MONOCRÁTICA Trata-se de AGRAVO DE INSTRUMENTO interposto por MAXIMILIANO DE ARAÚJO COSTA, em face da decisão interlocutória preferida pelo Juízo da 10ª Vara Cível da Comarca de Ananindeua/PA, nos autos da AÇÃO ORDINÁRIA, que deferiu a tutela antecipada apenas para suspender a exigibilidade do contrato em questão e impedir a inscrição do nome da autora em qualquer cadastro restritivo de crédito, não se manifestando acerca da devolução dos valores pagos pelo consumidor. A decisão agravada foi lavrada consoante segue: ¿(...) Do exposto, DEFIRO o pedido de antecipação de tutela, nos seguintes termos, conforme fundamentação acima, determino a suspensão da exigibilidade do contrato em questão ficando a requerida impedida de cobrar mensalidades vincendas, bem ainda, que se abstenha de cobrar e inscrever a parte autora em qualquer cadastro restritivo de crédito, ou, caso assim já tenham procedido, instá-las a suspender/cancelar os seus efeitos.¿ Alega que pagou antecipadamente à construtora o valor de R$ 21.407,54 (vinte e um mil, quatrocentos e sete reais e cinquenta e quatro centavos) e que em razão do atraso na entrega do imóvel faz jus tanto á rescisão do contrato como à devolução do valor acima referido. Requer, assim, o provimento do presente recurso a fim de que seja deferida a devolução do montante já pago pela aquisição do imóvel. Juntou documentos às fls. 16/103. O pedido de concessão do efeito suspensivo foi indeferido, conforme decisão de fls. 106. Contrarrazões apresentadas pela agravada às fls. 108/112. É o relatório. DECIDO. Primeiramente, faz-se mister salientar o disposto no art. 14 do Novo Código de Processo Civil, que assim dispõe: Art. 14. A norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada. Lecionando sobre o tema, o doutrinador Humberto Theodoro Júnior assevera que: "(...) Em suma: as leis processuais são de efeito imediato frente aos feitos pendentes, mas não são retroativas, pois só os atos posteriores à sua entrada em vigor é que se regularão por seus preceitos. Tempus regit actum. Deve-se, pois, distinguir, para aplicação da lei processual nova, quanto aos processos: 1) exauridos: nenhuma influência sofrem; 2) pendentes: são atingidos, mas ficando respeitado o efeito dos atos já praticados; 3) futuros: seguem totalmente a lei nova. (...)" (Curso de Direito Processual Civil. Teoria Geral do Direito Processual Civil e Processo de Conhecimento. Rio de Janeiro: Forense, 2013, vol. I. p. 21.) No caso dos autos, considerando que a decisão recorrida foi publicada em 02/02/2017, constata-se que o ato impugnado foi exaurido sob a égide do antigo Código de Processo Civil - NCPC, devendo, portanto, o presente o recurso ser analisado sob o prisma da antiga norma processual. Pois bem. Verifica-se dos autos que os litigantes celebraram o contrato de Promessa de Compra e Venda de fls. 30/44, tendo por objeto o apartamento nº 708, localizado no Residencial Ville Ametista - Paris, com prazo de entrega previsto para 31/12/2013, conforme cláusula ¿5¿, do Quadro Resumo (fls. 31). De início, deve-se ressaltar a aplicação do Código de Defesa do Consumidor ao caso em tela por se tratar de uma relação consumerista. Sobre os contratos, vale transcrever a lição de De Plácido e Silva: Contrato, expressa a idéia do ajuste, da convenção, do pacto ou da transação firmada ou acordada entre duas ou mais pessoas para um fim qualquer, ou seja, adquirir, resguardar, modificar ou extinguir direitos. Não obstante o principio de que os contratos fazem entre as partes a sua própria lei, segundo conceito do aforismo contractus ex conventione partium legem accipiunt, não se mostra válido, nem merece amparo legal, contrato que contravenha a regra ou a principio instituído em lei.Possui o vocábulo, por vezes, o sentido de expressar o próprio instrumento em que se elabora o contrato, isto é, o documento escrito em que o contrato se formou e pelo qual se prova a sua existência, e nessa circunstância, o contrato se diz público ou particular". (Vocabulário Jurídico, ed. Forense, 15ª edição, 2000.) É cediço que um dos princípios que norteiam as relações contratuais é o chamado pacta sunt servanda, segundo o qual o contrato faz lei entre as partes e que, salvo reconhecimento judicial de qualquer abusividade, são válidas as cláusulas pactuadas e, portanto, devem ser cumpridas em sua integralidade. Vejamos a doutrina de Caio Mário da Silva Pereira acerca do tema: Os sistemas de direito positivo consignaram a preeminência da regra segundo a qual o contrato se forma pelo consenso das partes. Retomou uma velha parêmia, pacta sunt servanda, não apenas para dizer que os contratos devem ser cumpridos (princípio da força obrigatória), mas para generalizar que qualquer ajuste, como expressão de acordo de vontade das partes, tem igual força cogente. (Instituições de direito civil - Contratos - vol. III. 1ª edição eletrônica. Rio de Janeiro, 2013) Referido preceito encontra-se expresso no Código de Defesa do Consumidor, que estabelece que as declarações de vontade constantes de escritos particulares, recibos e pré-contratos relativos às relações de consumo vinculam o fornecedor (art. 48). Ainda sobre a matéria, Cláudia Lima Marques assevera que: A ideia de força obrigatória dos contratos significa que, uma vez manifestada a vontade, as partes estão ligadas por um contrato, tem direitos e obrigações e não poderão se desvincular, a não ser através de outro acordo de vontades ou pelas figuras da força maior e do caso fortuito (acontecimentos fáticos externos e incontroláveis pela vontade do homem). Esta força obrigatória vai ser reconhecida pelo direito e vai se impor ante a tutela jurisdicional. (Contratos no código de defesa do consumidor: o novo regime das relações contratuais. 6ª ed. São Paulo. Editora Revista dos Tribunais, 2011, p. 68) Outrossim, reza o Código Civil brasileiro, em seu artigo 422, que os contratantes são obrigados a guardar os princípios da probidade e boa-fé antes, durante e após o término do contrato. Em se tratando de relação de consumo, o princípio do pacta sunt servanda foi relativizado, sendo lícito ao jurisdicionado requerer a intervenção do Estado a fim que o contrato seja revisto quando se tornar excessivamente oneroso para uma das partes, ou, ainda, quando contiver cláusulas abusivas. No caso dos autos, é fato incontroverso que o autor/agravante adquiriu, por meio de contrato de compra e venda, o imóvel descrito na petição inicial e no contrato de fls. 30/44. Verifica-se do contrato que o prazo de entrega do imóvel estava previsto para dezembro de 2013, nos termos da cláusula 5 do contrato particular de promessa de compra e venda ás fls. 05 dos autos. No entanto, a robusta documentação constante nos autos demonstra que a agravada não teria concluído/entregue a obra no prazo ajustado. Não tendo a construtora apelante comprovado a entrega das chaves no prazo estipulado, pode-se proceder a rescisão do contrato. Assim, havendo a inversão do ônus da prova e não tendo a apelante comprovado a conclusão/entrega da obra no prazo estipulado, conclui-se que foi a apelante que deu causa à rescisão. Desta forma, em face da declaração judicial da rescisão do instrumento contratual, os consumidores fazem jus à integralidade da quantia por eles paga (R$ 21.407,54 - fls. 45), importância corrigida monetariamente. Acerca do tema, o Colendo Superior Tribunal de Justiça já se posicionou: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. CIVIL. COOPERATIVA HABITACIONAL. DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL. IMÓVEL. ENTREGA. PRAZO. NÃO CUMPRIMENTO. QUANTIA PAGA. RESTITUIÇÃO INTEGRAL. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. SÚMULA N° 83 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. 1. Não há falar em retenção de valores de caráter administrativo na hipótese de descumprimento contratual da cooperativa, ocasionado pelo atraso na entrega do imóvel antes negociado, sendo devida a restituição integral dos valores já pagos. 2. Os magistrados da instância ordinária decidiram em perfeita consonância com a jurisprudência desta Corte, circunstância que atrai a incidência da Súmula nº 83/STJ. 3. Agravo regimental não provido. (AgRg no REsp 1536060/DF, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 13/10/2015, DJe 19/10/2015) No mesmo sentido, a jurisprudência dos Tribunais pátrios: APELAÇÃO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE RESOLUÇÃO CONTRATUAL C/C DEVOLUÇÃO DE QUANTIAS PAGAS E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL NA PLANTA. ATRASO NA ENTREGA. INADIMPLEMENTO. RESTITUIÇÃO INTEGRAL DOS VALORES QUITADOS. DANO MORAL EXISTENTE. 1- A promitente vendedora que der causa exclusiva e injustificada à rescisão do contrato, em virtude do atraso na entrega do imóvel, ainda que considerado o prazo de tolerância estipulado no ajuste, deverá responder pelos prejuízos ocasionados ao promissário comprador, procedendo à devolução integral dos valores pagos, de forma imediata e via parcela única, incluídos eventuais gastos com custos administrativos (como a comissão de corretagem). 2- É assente na jurisprudência o entendimento de que o injustificado e exagerado atraso na entrega de imóvel destinado à moradia própria enseja abalos na esfera psíquica do comprador. Afinal, o atraso substancial na entrega de imóvel destinado à moradia frustra a expectativa de concretização plena de direito fundamental (art. 6° da CRFB), impondo à parte uma série de dissabores e sujeições decorrentes não só do obstáculo à aquisição da casa própria, como da situação de sujeição inerente à figura do locatário. (TJMG - Apelação Cível 1.0024.12.278791-4/001, Relator(a): Des.(a) Cláudia Maia , 14ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 28/04/0016, publicação da súmula em 06/05/2016) APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ORDINÁRIA - PRELIMINAR DE SENTENÇA EXTRA PETITA - INOCORRÊNCIA - CONSTRUTORA - ATRASO ENTREGA DA OBRA - RESCISÃO DO CONTRATO - RESTITUIÇÃO INTEGRAL DOS VALORES PAGOS - DANOS MORAIS - OCORRENCIA. Não há que se falar em sentença extra petita quando a decisão utiliza o mesmo índice de correção utilizado pela Corregedoria Geral de Justiça de Minas Gerais. Evidenciada nos autos a culpa exclusiva da promitente vendedora pelo inadimplemento contratual e consequente rescisão do contrato, a devolução dos valores pagos deverá ocorrer de forma integral. O atraso na entrega do imóvel, cujas obras sequer iniciaram, não gera um mero aborrecimento, mas abalo moral. A indenização por danos morais não deve implicar em enriquecimento ilícito, tampouco pode ser irrisória, de forma a perder seu caráter de justa composição e prevenção. (TJMG - Apelação Cível 1.0024.12.196650-1/001, Relator(a): Des.(a) Aparecida Grossi, 16ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 27/01/0016, publicação da súmula em 05/02/2016) Ante o exposto, DOU PROVIMENTO AO RECURSO apenas para determinar a devolução dos valores pagos a construtora pelo consumidor. P. R. I. C. Belém/PA, 05 de março de 2018. MARIA FILOMENA DE ALMEIDA BUARQUE Desembargador Relator
(2018.00846685-46, Não Informado, Rel. MARIA FILOMENA DE ALMEIDA BUARQUE, Órgão Julgador 1ª TURMA DE DIREITO PRIVADO, Julgado em 2018-03-07, Publicado em 2018-03-07)
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1ª TURMA DE DIREITO PRIVADO ORIGEM: 10ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE ANANINDEUA/PA AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 0002494-75.2017.8.14.0301 AGRAVANTE: MAXIMILIANO DE ARAÚJO COSTA APELADO: PARIS INCORPORADORA LTDA RELATORA: DESA. MARIA FILOMENA DE ALMEIDA BUARQUE AGRAVO DE INSTRUMENTO. ATRASO NA ENTREGA DA OBRA. PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA PARA A DEVOLUÇÃO DOS VALORES PAGOS PELO CONSUMIDOR/AGRAVANTE À CONSTRUTORA. RESCISÃO CONTRATUAL. POSSIBILIDADE. RESTITUIÇÃO INTEGRAL AO CONSUMIDOR DOS VALORES PAGOS. RECURSO A QUE SE PROVIMENTO. - Verifica-se dos autos que os litigantes celebraram o contrato de Promessa de Compra e Venda de fls. 30/44, tendo por objeto o apartamento nº 708, localizado no Residencial Ville Ametista - Paris, com prazo de entrega previsto para 31/12/2013, conforme cláusula ¿5¿, do Quadro Resumo (fls. 31). - De início, deve-se ressaltar a aplicação do Código de Defesa do Consumidor ao caso em tela por se tratar de uma relação consumerista. É cediço que um dos princípios que norteiam as relações contratuais é o chamado pacta sunt servanda, segundo o qual o contrato faz lei entre as partes e que, salvo reconhecimento judicial de qualquer abusividade, são válidas as cláusulas pactuadas e, portanto, devem ser cumpridas em sua integralidade. - Em se tratando de relação de consumo, o princípio do pacta sunt servanda foi relativizado, sendo lícito ao jurisdicionado requerer a intervenção do Estado a fim que o contrato seja revisto quando se tornar excessivamente oneroso para uma das partes, ou, ainda, quando contiver cláusulas abusivas. - No caso dos autos, o prazo de entrega do imóvel estava previsto para o dia 31/12/2013, nos termos da cláusula 5 do contrato. No entanto, a robusta documentação constante nos autos, demonstra que a agravada não teria concluído/entregue a obra no prazo ajustado. Não tendo a construtora agravada comprovado a entrega das chaves no prazo estipulado, impõe-se, portanto, a rescisão do contrato. - Desta forma, em face da declaração judicial da rescisão do instrumento contratual, os consumidores fazem jus à integralidade da quantia por eles paga, importância corrigida monetariamente na forma constante na sentença. DECISÃO MONOCRÁTICA Trata-se de AGRAVO DE INSTRUMENTO interposto por MAXIMILIANO DE ARAÚJO COSTA, em face da decisão interlocutória preferida pelo Juízo da 10ª Vara Cível da Comarca de Ananindeua/PA, nos autos da AÇÃO ORDINÁRIA, que deferiu a tutela antecipada apenas para suspender a exigibilidade do contrato em questão e impedir a inscrição do nome da autora em qualquer cadastro restritivo de crédito, não se manifestando acerca da devolução dos valores pagos pelo consumidor. A decisão agravada foi lavrada consoante segue: ¿(...) Do exposto, DEFIRO o pedido de antecipação de tutela, nos seguintes termos, conforme fundamentação acima, determino a suspensão da exigibilidade do contrato em questão ficando a requerida impedida de cobrar mensalidades vincendas, bem ainda, que se abstenha de cobrar e inscrever a parte autora em qualquer cadastro restritivo de crédito, ou, caso assim já tenham procedido, instá-las a suspender/cancelar os seus efeitos.¿ Alega que pagou antecipadamente à construtora o valor de R$ 21.407,54 (vinte e um mil, quatrocentos e sete reais e cinquenta e quatro centavos) e que em razão do atraso na entrega do imóvel faz jus tanto á rescisão do contrato como à devolução do valor acima referido. Requer, assim, o provimento do presente recurso a fim de que seja deferida a devolução do montante já pago pela aquisição do imóvel. Juntou documentos às fls. 16/103. O pedido de concessão do efeito suspensivo foi indeferido, conforme decisão de fls. 106. Contrarrazões apresentadas pela agravada às fls. 108/112. É o relatório. DECIDO. Primeiramente, faz-se mister salientar o disposto no art. 14 do Novo Código de Processo Civil, que assim dispõe: Art. 14. A norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada. Lecionando sobre o tema, o doutrinador Humberto Theodoro Júnior assevera que: "(...) Em suma: as leis processuais são de efeito imediato frente aos feitos pendentes, mas não são retroativas, pois só os atos posteriores à sua entrada em vigor é que se regularão por seus preceitos. Tempus regit actum. Deve-se, pois, distinguir, para aplicação da lei processual nova, quanto aos processos: 1) exauridos: nenhuma influência sofrem; 2) pendentes: são atingidos, mas ficando respeitado o efeito dos atos já praticados; 3) futuros: seguem totalmente a lei nova. (...)" (Curso de Direito Processual Civil. Teoria Geral do Direito Processual Civil e Processo de Conhecimento. Rio de Janeiro: Forense, 2013, vol. I. p. 21.) No caso dos autos, considerando que a decisão recorrida foi publicada em 02/02/2017, constata-se que o ato impugnado foi exaurido sob a égide do antigo Código de Processo Civil - NCPC, devendo, portanto, o presente o recurso ser analisado sob o prisma da antiga norma processual. Pois bem. Verifica-se dos autos que os litigantes celebraram o contrato de Promessa de Compra e Venda de fls. 30/44, tendo por objeto o apartamento nº 708, localizado no Residencial Ville Ametista - Paris, com prazo de entrega previsto para 31/12/2013, conforme cláusula ¿5¿, do Quadro Resumo (fls. 31). De início, deve-se ressaltar a aplicação do Código de Defesa do Consumidor ao caso em tela por se tratar de uma relação consumerista. Sobre os contratos, vale transcrever a lição de De Plácido e Silva: Contrato, expressa a idéia do ajuste, da convenção, do pacto ou da transação firmada ou acordada entre duas ou mais pessoas para um fim qualquer, ou seja, adquirir, resguardar, modificar ou extinguir direitos. Não obstante o principio de que os contratos fazem entre as partes a sua própria lei, segundo conceito do aforismo contractus ex conventione partium legem accipiunt, não se mostra válido, nem merece amparo legal, contrato que contravenha a regra ou a principio instituído em lei.Possui o vocábulo, por vezes, o sentido de expressar o próprio instrumento em que se elabora o contrato, isto é, o documento escrito em que o contrato se formou e pelo qual se prova a sua existência, e nessa circunstância, o contrato se diz público ou particular". (Vocabulário Jurídico, ed. Forense, 15ª edição, 2000.) É cediço que um dos princípios que norteiam as relações contratuais é o chamado pacta sunt servanda, segundo o qual o contrato faz lei entre as partes e que, salvo reconhecimento judicial de qualquer abusividade, são válidas as cláusulas pactuadas e, portanto, devem ser cumpridas em sua integralidade. Vejamos a doutrina de Caio Mário da Silva Pereira acerca do tema: Os sistemas de direito positivo consignaram a preeminência da regra segundo a qual o contrato se forma pelo consenso das partes. Retomou uma velha parêmia, pacta sunt servanda, não apenas para dizer que os contratos devem ser cumpridos (princípio da força obrigatória), mas para generalizar que qualquer ajuste, como expressão de acordo de vontade das partes, tem igual força cogente. (Instituições de direito civil - Contratos - vol. III. 1ª edição eletrônica. Rio de Janeiro, 2013) Referido preceito encontra-se expresso no Código de Defesa do Consumidor, que estabelece que as declarações de vontade constantes de escritos particulares, recibos e pré-contratos relativos às relações de consumo vinculam o fornecedor (art. 48). Ainda sobre a matéria, Cláudia Lima Marques assevera que: A ideia de força obrigatória dos contratos significa que, uma vez manifestada a vontade, as partes estão ligadas por um contrato, tem direitos e obrigações e não poderão se desvincular, a não ser através de outro acordo de vontades ou pelas figuras da força maior e do caso fortuito (acontecimentos fáticos externos e incontroláveis pela vontade do homem). Esta força obrigatória vai ser reconhecida pelo direito e vai se impor ante a tutela jurisdicional. (Contratos no código de defesa do consumidor: o novo regime das relações contratuais. 6ª ed. São Paulo. Editora Revista dos Tribunais, 2011, p. 68) Outrossim, reza o Código Civil brasileiro, em seu artigo 422, que os contratantes são obrigados a guardar os princípios da probidade e boa-fé antes, durante e após o término do contrato. Em se tratando de relação de consumo, o princípio do pacta sunt servanda foi relativizado, sendo lícito ao jurisdicionado requerer a intervenção do Estado a fim que o contrato seja revisto quando se tornar excessivamente oneroso para uma das partes, ou, ainda, quando contiver cláusulas abusivas. No caso dos autos, é fato incontroverso que o autor/agravante adquiriu, por meio de contrato de compra e venda, o imóvel descrito na petição inicial e no contrato de fls. 30/44. Verifica-se do contrato que o prazo de entrega do imóvel estava previsto para dezembro de 2013, nos termos da cláusula 5 do contrato particular de promessa de compra e venda ás fls. 05 dos autos. No entanto, a robusta documentação constante nos autos demonstra que a agravada não teria concluído/entregue a obra no prazo ajustado. Não tendo a construtora apelante comprovado a entrega das chaves no prazo estipulado, pode-se proceder a rescisão do contrato. Assim, havendo a inversão do ônus da prova e não tendo a apelante comprovado a conclusão/entrega da obra no prazo estipulado, conclui-se que foi a apelante que deu causa à rescisão. Desta forma, em face da declaração judicial da rescisão do instrumento contratual, os consumidores fazem jus à integralidade da quantia por eles paga (R$ 21.407,54 - fls. 45), importância corrigida monetariamente. Acerca do tema, o Colendo Superior Tribunal de Justiça já se posicionou: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. CIVIL. COOPERATIVA HABITACIONAL. DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL. IMÓVEL. ENTREGA. PRAZO. NÃO CUMPRIMENTO. QUANTIA PAGA. RESTITUIÇÃO INTEGRAL. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. SÚMULA N° 83 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. 1. Não há falar em retenção de valores de caráter administrativo na hipótese de descumprimento contratual da cooperativa, ocasionado pelo atraso na entrega do imóvel antes negociado, sendo devida a restituição integral dos valores já pagos. 2. Os magistrados da instância ordinária decidiram em perfeita consonância com a jurisprudência desta Corte, circunstância que atrai a incidência da Súmula nº 83/STJ. 3. Agravo regimental não provido. (AgRg no REsp 1536060/DF, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 13/10/2015, DJe 19/10/2015) No mesmo sentido, a jurisprudência dos Tribunais pátrios: APELAÇÃO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE RESOLUÇÃO CONTRATUAL C/C DEVOLUÇÃO DE QUANTIAS PAGAS E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL NA PLANTA. ATRASO NA ENTREGA. INADIMPLEMENTO. RESTITUIÇÃO INTEGRAL DOS VALORES QUITADOS. DANO MORAL EXISTENTE. 1- A promitente vendedora que der causa exclusiva e injustificada à rescisão do contrato, em virtude do atraso na entrega do imóvel, ainda que considerado o prazo de tolerância estipulado no ajuste, deverá responder pelos prejuízos ocasionados ao promissário comprador, procedendo à devolução integral dos valores pagos, de forma imediata e via parcela única, incluídos eventuais gastos com custos administrativos (como a comissão de corretagem). 2- É assente na jurisprudência o entendimento de que o injustificado e exagerado atraso na entrega de imóvel destinado à moradia própria enseja abalos na esfera psíquica do comprador. Afinal, o atraso substancial na entrega de imóvel destinado à moradia frustra a expectativa de concretização plena de direito fundamental (art. 6° da CRFB), impondo à parte uma série de dissabores e sujeições decorrentes não só do obstáculo à aquisição da casa própria, como da situação de sujeição inerente à figura do locatário. (TJMG - Apelação Cível 1.0024.12.278791-4/001, Relator(a): Des.(a) Cláudia Maia , 14ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 28/04/0016, publicação da súmula em 06/05/2016) APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ORDINÁRIA - PRELIMINAR DE SENTENÇA EXTRA PETITA - INOCORRÊNCIA - CONSTRUTORA - ATRASO ENTREGA DA OBRA - RESCISÃO DO CONTRATO - RESTITUIÇÃO INTEGRAL DOS VALORES PAGOS - DANOS MORAIS - OCORRENCIA. Não há que se falar em sentença extra petita quando a decisão utiliza o mesmo índice de correção utilizado pela Corregedoria Geral de Justiça de Minas Gerais. Evidenciada nos autos a culpa exclusiva da promitente vendedora pelo inadimplemento contratual e consequente rescisão do contrato, a devolução dos valores pagos deverá ocorrer de forma integral. O atraso na entrega do imóvel, cujas obras sequer iniciaram, não gera um mero aborrecimento, mas abalo moral. A indenização por danos morais não deve implicar em enriquecimento ilícito, tampouco pode ser irrisória, de forma a perder seu caráter de justa composição e prevenção. (TJMG - Apelação Cível 1.0024.12.196650-1/001, Relator(a): Des.(a) Aparecida Grossi, 16ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 27/01/0016, publicação da súmula em 05/02/2016) Ante o exposto, DOU PROVIMENTO AO RECURSO apenas para determinar a devolução dos valores pagos a construtora pelo consumidor. P. R. I. C. Belém/PA, 05 de março de 2018. MARIA FILOMENA DE ALMEIDA BUARQUE Desembargador Relator
(2018.00846685-46, Não Informado, Rel. MARIA FILOMENA DE ALMEIDA BUARQUE, Órgão Julgador 1ª TURMA DE DIREITO PRIVADO, Julgado em 2018-03-07, Publicado em 2018-03-07)Decisão
DECISÃO MONOCRÁTICA
Data do Julgamento
:
07/03/2018
Data da Publicação
:
07/03/2018
Órgão Julgador
:
1ª TURMA DE DIREITO PRIVADO
Relator(a)
:
MARIA FILOMENA DE ALMEIDA BUARQUE
Número do documento
:
2018.00846685-46
Tipo de processo
:
Agravo de Instrumento
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