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Jurisprudência


TJPA 0002556-71.2010.8.14.0015

Ementa
SECRETARIA DA 3ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA. 5ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE CASTANHAL. APELAÇÃO CÍVEL Nº. 2012.3.028764-6. APELANTE: COMÉRCIO E TRANSPORTES BOA ESPERANÇA LTDA. ADVOGADO: HAROLDO CARLOS DO NASCIMENTO CABRAL E OUTROS. APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARÁ. PROMOTORA: MÔNICA CRISTINA GONÇALVES MELO DA ROCHA. RELATORA: DESA. EDINÉA OLIVEIRA TAVARES. DECISÃO MONOCRÁTICA Trata-se de APELAÇÃO CÍVEL interposta por COMÉRCIO E TRANSPORTES BOA ESPERANÇA LTDA, nos autos da Ação de Auto de Infração, contra sentença exarada pelo M.M. Juízo da 5ª Vara Cível da Comarca de Castanhal, que julgou procedente o Auto de Infração Administrativa lavrado contra a parte requerida, condenando a Empresa Infratora, ao pagamento de sanção pecuniária fixada no valor de 03 (três) salários mínimos, destinados ao Fundo Municipal de Direitos da Infância e Adolescente, gerido pelo Conselho Municipal de Direitos da Criança e Adolescente, por incorrer na infração administrativa disposta nos dispositivos dos artigos 83 c/c 251, do Estatuto da Criança e Adolescente (Lei n. 8.069/90). A Empresa infratora inconformada com a decisum interpôs Apelação. A Apelação foi recebida apenas no efeito devolutivo. O Apelado apresentou Contrarrazões, sustentando a manutenção da sentença vergastada, bem como requereu o não conhecimento e não provimento do apelo, como medida de direito e justiça. Encaminhados os autos a este E. Tribunal de Justiça do Estado do Pará, por distribuição, foram submetidos à relatoria do Exmo. Sr. Desembargador Leonam Gondim da Cruz Júnior. Os autos foram encaminhados para Procuradoria de Justiça do Estado do Pará, para manifestação e parecer. O Douto Promotor de Justiça Convocado, manifestou-se pelo CONHECIMENTO do Recurso e pelo NÃO PROVIMENTO, recomendando a manutenção da sentença guerreada em todos os seus termos. Em virtude da relotação do Exmo. Sr. Desembargador Leonam Gondim da Cruz Júnior para a Seção Criminal deste E. Tribunal, coube-me a relatoria, por redistribuição em maio de 2014. Eis a síntese do necessário. Decido. Conheço do recurso por estarem preenchidas as condições de admissibilidade. A Empresa apelante requer a reforma do ato decisório. Nesse sentido, em sede de apelação pleiteia pelo reconhecimento da inexistência da infração cometida. Aduz ainda, a invalidade do auto de infração lavrado, o cerceamento de defesa, e, a fixação de multa em valor exorbitante, o que violaria o princípio da razoabilidade. Numa análise acurada dos fatos e dos fundamentos jurídicos expostos nos autos, constato que as razões recursais não merecem prosperar. Consta nos autos que a lavratura do auto de infração foi realizada por agente de Proteção Voluntária da Infância e da Juventude, in loco, a qual, no momento da lavratura do presente auto observou a presença de 03 (três) menores impúberes acompanhados pelos pais, os quais não puderam comprovar documentalmente o parentesco, insurgindo em plena violação ao que enunciam os dispositivos do artigo 83, caput, e § 1°, b, 1, e do artigo 251, da Lei n. 8.069/90 . Pela leitura dos textos normativos apresentados alhures, verifica-se que a viagem de criança para fora da comarca onde reside depende, em regra, de autorização judicial. A intervenção do Judiciário somente não é exigida quando: a) o deslocamento for para comarca contígua, desde que na mesma unidade da Federação ou na mesma região metropolitana; b) a criança esteja acompanhada de ascendente ou colateral maior, até o terceiro grau, comprovado documentalmente o parentesco, ou de pessoa maior, expressamente autorizada pelo pai, mãe ou responsável. No caso em exame, observa-se que a empresa de ônibus transportava crianças acompanhadas de ascendente sem a prova documental do parentesco; logo, ainda que comprovado o vínculo materno após o desembarque ou na instrução do processo, resta configurado o ilícito administrativo previsto no art. 251, do ECA. Com efeito, é assente que o fato típico descrito no auto de infração consuma-se no momento do transporte da criança, por qualquer meio, sem observância das prescrições legais decorrentes do texto dos arts. 83, 84 e 84, do ECA, sendo irrelevante, em momento posterior ao transporte, se verificar que os menores estavam realmente acompanhados de suas genitoras. Nesse contexto, impende ressaltar que a finalidade do legislador, tem natureza pedagógica e preventiva, e visa, sobretudo, evitar o transporte irregular de crianças, com vista a protegê-las da ação criminosa decorrente de crimes como tráfico humano, sequestro, assassinatos e abusos sexuais, etc. Por conta disso, a comprovação documental de parentesco em momento posterior ao tempo do estado de flagrância da ocorrência do referenciado ato de infração administrativa, não elide o descumprimento das normas protetivas. Ademais, outra circunstância que ratifica a materialidade do ato de infração administrativa revela-se na narrativa escrita apresentada pela própria apelante, em suas razões recursais, quando afirma que os menores se encontravam acompanhados por seus responsáveis legais, porém, não portavam a documentação que pudesse comprovar o parentesco. Acrescenta-se ainda a isso, o fato de tanto o motorista do ônibus pertencente à Empresa apelante, quanto às genitoras dos menores, terem espontaneamente assinado o auto de infração administrativa, tomando ciência de seu inteiro teor, bem como corroborando com a veracidade dos fatos ora relatados. No tocante às alegações de invalidação do auto de infração, inexistência da infração e de cerceamento de defesa, tais pretensões restam prejudicadas, pois que o auto de infração foi lavrado por agente de Proteção Voluntária da Infância e da Juventude devidamente credenciada perante o Juizado da Infância e Juventude da Comarca de Castanhal; no bojo do auto de infração constam todas as informações necessárias exigidas pelo ECA, para a tipificação, materialização e autoria da infração administrativa e o nome da agente de Proteção Voluntária da Infância e da Juventude. Não obstante, ressalta-se que, no próprio auto de infração administrativa entregue ao motorista do ônibus de propriedade da Empresa apelante há a menção sobre o que dispõe o art. 195, da Lei n. 8.069/90, dando ciência à Empresa apelante da existência da infração, da lavratura do auto de infração e do prazo legal para apresentar defesa perante o juízo, nos seguintes termos, ipsis verbis: CIÊNCIA: Fica o autuado cientificado que, nos termos da Lei 8.069, de 13/07/1990 em seu art. 195, tem o prazo de 10 dias, a partir desta data, para apresentar defesa que deverá ser entregue no Cartório desde Juízo. Ora, resta clarificado que, a prova cabal de que a empresa apelante tomou ciência dos termos do auto de infração lavrado na data do dia 01/05/2010, consiste no fato de ter protocolizado, tempestivamente, defesa escrita, sob o n. 20101005144-3, na data de 10/05/2010, desconstruindo a hipótese de cerceamento de defesa, por falta de ciência. Quanto ao argumento de cerceamento de defesa em razão da impossibilidade jurídica de produção de provas testemunhal e do depoimento pessoal da agente de Proteção Voluntária da Infância e da Juventude, no caso em tela, conforme já mencionado ao norte, é totalmente desinfluente tais procedimentos processuais, pois que o ilícito se aperfeiçoa no momento do transporte, e a produção de provas posteriores não fará desaparecer o ilícito. Outrossim, impende ressaltar que, a natureza da lide, a constituição e o desenvolvimento processual, per si, deram condições ao magistrado a quo de sentenciar com espeque nos princípios da proteção à criança e adolescente, da economia e celeridade processual, já que a matéria ora debatida é unicamente de direito(Redação dada pela Lei nº 5.925, de 1º.10.1973)http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/1970-1979/L5925.htm (Redação dada pela Lei nº 5.925, de 1º.10.1973)http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/1970-1979/L5925.htm . Portanto, afasto as argumentações acerca da ilegalidade no ato de lavratura do auto de infração administrativa, e de violação aos princípios do contraditório e da ampla defesa, vez que o curso regular do processo está em total harmonia com os princípios da legalidade e do devido processo legal, e, com as normas jurídicas de proteção à criança e adolescente. Em relação à tese que assevera que a multa aplicada fere os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, verifica-se que tal afirmação é inverídica, haja vista que o valor fixado a título de multa está dentro do patamar legal previsto nos termos do art. 251, do ECA, senão vejamos: Art. 251, ECA. Transportar criança ou adolescente, por qualquer meio, com inobservância do disposto nos arts. 83, 84 e 85 desta Lei: Pena - multa de três a vinte salários de referência, aplicando-se o dobro em caso de reincidência. Nesse sentido, o entendimento que sustento baseia-se na consolidada jurisprudência proferida reiteradamente pelo Superior Tribunal de Justiça, conforme se observa na ementa do RESP. Nº 568.807 - RJ (2003/0136697-1), de relatoria do Excelentíssimo Ministro Castro Meira, a seguir: ADMINISTRATIVO. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. VIAGEM. MENOR DE 12 ANOS. VÍNCULO MATERNO. COMPROVAÇÃO POSTERIOR. ILÍCITO ADMINISTRATIVO. CARÁTER PEDAGÓGICO. MULTAANTECEDENTES. REINCIDÊNCIA. TRANSPORTADORA. 1. A viagem de criança para fora da comarca onde reside depende, em regra, de autorização judicial. A intervenção do Judiciário somente não é exigida quando: a) o deslocamento for para comarca contígua, desde que na mesma unidade da Federação ou na mesma região metropolitana; b) a criança esteja acompanhada de ascendente ou colateral maior, até o terceiro grau, comprovado documentalmente o parentesco, ou de pessoa maior, expressamente autorizada pelo pai, mãe ou responsável. Inteligência do art. 83 do ECA. 2. A empresa de ônibus que transporta criança acompanhada de ascendente sem a prova documental do parentesco - ainda que comprovado o vínculo materno após o desembarque ou na instrução do processo -, comete o ilícito administrativo previsto no art. 251 do ECA. 3. O fato típico aí descrito consuma-se no momento do transporte da criança, por qualquer meio, sem observar as prescrições dos arts. 83, 84 e 85 do ECA. É irrelevante se, em momento posterior ao transporte, se verifica que o menor de 12 anos estava realmente acompanhado de ascendente ou colateral maior, até o terceiro grau. 4. As normas encartadas nos arts. 83, 84, 85 e 251 da Lei n.º 8.069/90 têm finalidade muito mais pedagógica do que repressiva. Não encerram um fim em si mesmas. Objetivam, sobretudo, evitar o transporte irregular de crianças e, assim, conter o tráfico, seqüestro e outros crimes perpetrados em desfavor desses menores. Daí, porque, na espécie, a comprovação posterior da maternidade não elide o descumprimento das normas protetivas. 5. O montante da multa administrativa não resultou de reincidência - que, se comprovada, autorizaria a aplicação em dobro da sanção -, e sim da dosagem da pena, dentro dos lindes legais, considerando outras imputações por fatos análogos à empresa de transporte. 6. Recurso especial improvido. (Recurso Especial nº 568.807 - RJ (2003/0136697-1) Rel. Ministro Castro Meira). Na mesma esteira de pensamento, o E. Tribunal de Justiça do Estado do Pará já se pronunciou da seguinte maneira: APELAÇÃO CÍVEL INFRAÇÃO ADMINISTRATIVA ART. 83, § 1º, b, DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. Auto de Infração Administrativa lavrado contra empresa de transporte rodoviário em virtude do deslocamento para comarca contígua de prováveis pais que viajavam com filhos, sem qualquer documentação comprovando o parentesco Exigibilidade Legal A empresa de ônibus que transporta criança acompanhada de ascendente sem a prova documental do parentesco, ainda que comprovado o vínculo após o desembarque ou na instrução do processo, comete o ilícito administrativo previsto no art. 251, do ECA. As normas encartadas na Lei nº 8.069/90, têm finalidade muito mais pedagógica do que repressiva. Objetivam, sobretudo, evitar o transporte irregular de crianças e, assim, conter o tráfico, seqüestro e outros crimes perpetrados em desfavor de menores. Precedentes do STJ. Recurso conhecido e improvido Unânime. (TJPA. 3ª CCI. Apelação Cível n. 200030033396. Acórdão n. 72284. Des. Rel. Leonam Gondim da Cruz Junior. D. J. 26/06/2008, D. P. 30/06/2008). Ante o exposto, CONHEÇO do recurso, para NEGAR-LHE PROVIMENTO, devendo a decisum permanecer irretocável, por seus próprios fundamentos de fato e de direito. P. R. Intimem-se a quem couber. Belém, (PA)., 17 de julho de 2014. DESA. EDINÉA OLIVEIRA TAVARES Relatora (2014.04580654-89, Não Informado, Rel. EDINEA OLIVEIRA TAVARES, Órgão Julgador 3ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA, Julgado em 2014-07-28, Publicado em 2014-07-28)
Decisão
DECISÃO MONOCRÁTICA

Data do Julgamento : 28/07/2014
Data da Publicação : 28/07/2014
Órgão Julgador : 3ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA
Relator(a) : EDINEA OLIVEIRA TAVARES
Número do documento : 2014.04580654-89
Tipo de processo : Apelação
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