TJPA 0002968-48.2010.8.14.0015
SECRETARIA DA 3ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA. 5ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE CASTANHAL. APELAÇÃO CÍVEL Nº. 2012.3.028528-6. APELANTE: COMÉRCIO E TRANSPORTES BOA ESPERANÇA LTDA. ADVOGADO: HAROLDO CARLOS DO NASCIMENTO CABRAL E OUTROS. APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARÁ. PROMOTORA: MÔNICA CRISTINA GONÇALVES MELO DA ROCHA. RELATORA: DESA. EDINÉA OLIVEIRA TAVARES. DECISÃO MONOCRÁTICA Trata-se de APELAÇÃO CÍVEL interposta por COMÉRCIO E TRANSPORTES BOA ESPERANÇA LTDA, nos autos da Ação de Auto de Infração, contra sentença exarada pelo M.M. Juízo da 5ª Vara Cível da Comarca de Castanhal, que julgou procedente o Auto de Infração Administrativa lavrado contra a parte requerida, condenando a Empresa Infratora, ao pagamento de sanção pecuniária fixada no valor de 05 (cinco) salários mínimos, em razão da reiteração da conduta infracional por parte da Empresa ré, destinados ao Fundo Municipal de Direitos da Infância e Adolescente, gerido pelo Conselho Municipal de Direitos da Criança e Adolescente, por incorrer na infração administrativa disposta nos dispositivos dos artigos 83 c/c 251, do Estatuto da Criança e Adolescente (Lei n. 8.069/90). A Empresa infratora inconformada com a decisum interpôs Apelação. A Apelação foi recebida no duplo efeito. O Apelado apresentou Contrarrazões, sustentando a manutenção da sentença vergastada, bem como requereu o não conhecimento e não provimento do apelo, como medida de direito e justiça. Encaminhados os autos a este E. Tribunal de Justiça do Estado do Pará, por distribuição, foram submetidos à relatoria do Exmo. Sr. Desembargador Leonam Gondim da Cruz Júnior. Os autos foram encaminhados para Procuradoria de Justiça do Estado do Pará, para manifestação e parecer. A Douta Procuradora de Justiça da 15ª PJC, manifestou-se pelo CONHECIMENTO do Recurso e pelo DESPROVIMENTO, recomendando a manutenção da sentença guerreada em todos os seus termos. Em virtude da relotação do Exmo. Sr. Desembargador Leonam Gondim da Cruz Júnior para a Seção Criminal deste E. Tribunal, coube-me a relatoria, por redistribuição em maio de 2014. Eis a síntese do necessário. Decido. Conheço do recurso por estarem preenchidas as condições de admissibilidade. A Empresa apelante requer a reforma do ato decisório. Nesse sentido, em sede de apelação pleiteia pelo reconhecimento da inexistência da infração cometida. Aduz ainda, a invalidade do auto de infração lavrado, o cerceamento de defesa, e, a fixação de multa em valor exorbitante, o que violaria o princípio da razoabilidade. Numa análise acurada dos fatos e dos fundamentos jurídicos expostos nos autos, constato que as razões recursais não merecem prosperar. Consta nos autos que a lavratura do auto de infração foi realizada por agente de Proteção Voluntária da Infância e da Juventude, in loco, a qual, no momento da lavratura do presente auto de infração observou a presença de 02 (dois) menores impúberes acompanhados pelos pais, e uma terceira criança acompanhada pela avó, e que os ascendentes dos menores não puderam comprovar documentalmente o parentesco com estes, insurgindo em plena violação ao que enunciam os dispositivos do artigo 83, caput, e § 1°, b, 1, e do artigo 251, da Lei n. 8.069/90 . Pela leitura dos textos normativos apresentados alhures, verifica-se que a viagem de criança para fora da comarca onde reside depende, em regra, de autorização judicial. A intervenção do Judiciário somente não é exigida quando: a) o deslocamento for para comarca contígua, desde que na mesma unidade da Federação ou na mesma região metropolitana; b) a criança esteja acompanhada de ascendente ou colateral maior, até o terceiro grau, comprovado documentalmente o parentesco, ou de pessoa maior, expressamente autorizada pelo pai, mãe ou responsável. No caso em exame, observa-se que a empresa de ônibus transportava crianças acompanhadas de ascendentes sem a prova documental do parentesco como os menores; logo, ainda que comprovado o vínculo parental após o desembarque ou na instrução do processo, resta configurado o ilícito administrativo previsto no art. 251, do ECA. Com efeito, é assente que o fato típico descrito no auto de infração consuma-se no momento do transporte da criança, por qualquer meio, sem observância das prescrições legais decorrentes do texto dos arts. 83, 84 e 84, do ECA, sendo irrelevante, em momento posterior ao transporte, se verificar que os menores estavam realmente acompanhados de seus genitores e avó. Nesse contexto, impende ressaltar que a finalidade do legislador, tem natureza pedagógica e preventiva, e visa, sobretudo, evitar o transporte irregular de crianças, com vista a protegê-las da ação criminosa decorrente de crimes como tráfico humano, sequestro, assassinatos e abusos sexuais, etc. Por conta disso, a comprovação documental de parentesco em momento posterior ao tempo do estado de flagrância da ocorrência do referenciado ato de infração administrativa, não elide o descumprimento das normas protetivas. Ademais, outra circunstância que ratifica a materialidade do ato de infração administrativa revela-se na narrativa escrita apresentada pela própria apelante, em suas razões recursais, quando afirma que os menores se encontravam acompanhados por seus responsáveis legais, porém, não portavam a documentação que pudesse comprovar o parentesco. Acrescenta-se ainda a isso, o fato de tanto o motorista do ônibus pertencente à Empresa apelante, quanto os genitores e a avó dos menores, terem espontaneamente assinado o auto de infração administrativa, tomando ciência de seu inteiro teor, bem como corroborando com a veracidade dos fatos ora relatados. No tocante às alegações de invalidação do auto de infração, inexistência da infração e de cerceamento de defesa, tais pretensões restam prejudicadas, pois que o auto de infração foi lavrado por agente de Proteção Voluntária da Infância e da Juventude devidamente credenciada perante o Juizado da Infância e Juventude da Comarca de Castanhal; no bojo do auto de infração constam todas as informações necessárias exigidas pelo ECA, para a tipificação, materialização e autoria da infração administrativa e o nome da agente de Proteção Voluntária da Infância e da Juventude. Não obstante, ressalta-se que, no próprio auto de infração administrativa entregue ao motorista do ônibus de propriedade da Empresa apelante há a menção sobre o que dispõe o art. 195, da Lei n. 8.069/90, dando ciência à Empresa apelante da existência da infração, da lavratura do auto de infração e do prazo legal para apresentar defesa perante o juízo, nos seguintes termos, ipsis verbis: CIÊNCIA: Fica o autuado cientificado que, nos termos da Lei 8.069, de 13/07/1990 em seu art. 195, tem o prazo de 10 dias, a partir desta data, para apresentar defesa que deverá ser entregue no Cartório desde Juízo. Ora, resta clarificado que, a prova cabal de que a empresa apelante tomou ciência dos termos do auto de infração lavrado na data do dia 15/05/2010, consiste no fato de ter protocolizado, tempestivamente, defesa escrita, sob o n. 20101005875-8, na data de 25/05/2010, desconstruindo assim a alegação de cerceamento de defesa, por falta de ciência. Quanto ao argumento de cerceamento de defesa em razão da impossibilidade jurídica de produção de provas testemunhal e do depoimento pessoal da agente de Proteção Voluntária da Infância e da Juventude, bem como pela ausência de requisição por parte do Órgão Ministerial, para realização de audiência de instrução e julgamento, vislumbra-se que no caso em tela, conforme já mencionado ao norte, é totalmente desinfluente tais procedimentos processuais, pois que o ilícito se aperfeiçoa no momento do transporte, e a produção de provas posteriores não fará desaparecer o ilícito. Destarte, não podemos olvidar que, mesmo não sendo necessária a designação de audiência de instrução e julgamento, a Juízo de Piso, através de despacho exarado às fls. 47, designou audiência de instrução e julgamento para o dia 19/10/2011, às 10:00h, todavia, conforme se depreende do Termo de Audiência, às fls. 48, na dia da audiência constatou-se a ausência das partes requeridas, e diante de tal fato a MM. Juiza a quo deliberou dispensar a oitiva do motorista, em virtude do ora requerido não ser parte legítima para responder pela infração; e, em seguida, fez os autos conclusos para sentença. Outrossim, impende ressaltar que, a natureza da lide, a constituição e o desenvolvimento processual, per si, deram condições ao Juízo a quo de sentenciar com espeque nos princípios da proteção integral à criança e adolescente, da economia e da celeridade processual, já que a matéria ora debatida é unicamente de direito(Redação dada pela Lei nº 5.925, de 1º.10.1973)http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/1970-1979/L5925.htm (Redação dada pela Lei nº 5.925, de 1º.10.1973)http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/1970-1979/L5925.htm . Portanto, afasto as argumentações acerca da ilegalidade no ato de lavratura do auto de infração administrativa, e de violação aos princípios do contraditório e da ampla defesa, vez que o curso regular do processo está em total harmonia com os princípios da legalidade e do devido processo legal, e, com as normas jurídicas de proteção integral à criança e adolescente. Em relação à tese que assevera que a multa aplicada fere os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, verifica-se que tal afirmação é inverídica, haja vista que o valor fixado a título de multa está dentro do patamar legal previsto nos termos do art. 251, do ECA, senão vejamos: Art. 251, ECA. Transportar criança ou adolescente, por qualquer meio, com inobservância do disposto nos arts. 83, 84 e 85 desta Lei: Pena - multa de três a vinte salários de referência, aplicando-se o dobro em caso de reincidência. Nesse sentido, o entendimento que sustento baseia-se na consolidada jurisprudência proferida reiteradamente pelo Superior Tribunal de Justiça, conforme se observa na ementa do RESP. Nº 568.807 - RJ (2003/0136697-1), de relatoria do Excelentíssimo Ministro Castro Meira, a seguir: ADMINISTRATIVO. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. VIAGEM. MENOR DE 12 ANOS. VÍNCULO MATERNO. COMPROVAÇÃO POSTERIOR. ILÍCITO ADMINISTRATIVO. CARÁTER PEDAGÓGICO. MULTAANTECEDENTES. REINCIDÊNCIA. TRANSPORTADORA. 1. A viagem de criança para fora da comarca onde reside depende, em regra, de autorização judicial. A intervenção do Judiciário somente não é exigida quando: a) o deslocamento for para comarca contígua, desde que na mesma unidade da Federação ou na mesma região metropolitana; b) a criança esteja acompanhada de ascendente ou colateral maior, até o terceiro grau, comprovado documentalmente o parentesco, ou de pessoa maior, expressamente autorizada pelo pai, mãe ou responsável. Inteligência do art. 83 do ECA. 2. A empresa de ônibus que transporta criança acompanhada de ascendente sem a prova documental do parentesco - ainda que comprovado o vínculo materno após o desembarque ou na instrução do processo -, comete o ilícito administrativo previsto no art. 251 do ECA. 3. O fato típico aí descrito consuma-se no momento do transporte da criança, por qualquer meio, sem observar as prescrições dos arts. 83, 84 e 85 do ECA. É irrelevante se, em momento posterior ao transporte, se verifica que o menor de 12 anos estava realmente acompanhado de ascendente ou colateral maior, até o terceiro grau. 4. As normas encartadas nos arts. 83, 84, 85 e 251 da Lei n.º 8.069/90 têm finalidade muito mais pedagógica do que repressiva. Não encerram um fim em si mesmas. Objetivam, sobretudo, evitar o transporte irregular de crianças e, assim, conter o tráfico, seqüestro e outros crimes perpetrados em desfavor desses menores. Daí, porque, na espécie, a comprovação posterior da maternidade não elide o descumprimento das normas protetivas. 5. O montante da multa administrativa não resultou de reincidência - que, se comprovada, autorizaria a aplicação em dobro da sanção -, e sim da dosagem da pena, dentro dos lindes legais, considerando outras imputações por fatos análogos à empresa de transporte. 6. Recurso especial improvido. (Recurso Especial nº 568.807 - RJ (2003/0136697-1) Rel. Ministro Castro Meira). Na mesma esteira de pensamento, o E. Tribunal de Justiça do Estado do Pará já se pronunciou da seguinte maneira: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL INFRAÇÃO ADMINISTRATIVA ART. 83, § 1º, b, DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. Auto de Infração Administrativa lavrado contra empresa de transporte rodoviário em virtude do deslocamento para comarca contígua de prováveis pais que viajavam com filhos, sem qualquer documentação comprovando o parentesco Exigibilidade Legal A empresa de ônibus que transporta criança acompanhada de ascendente sem a prova documental do parentesco, ainda que comprovado o vínculo após o desembarque ou na instrução do processo, comete o ilícito administrativo previsto no art. 251, do ECA. As normas encartadas na Lei nº 8.069/90, têm finalidade muito mais pedagógica do que repressiva. Objetivam, sobretudo, evitar o transporte irregular de crianças e, assim, conter o tráfico, seqüestro e outros crimes perpetrados em desfavor de menores. Precedentes do STJ. Recurso conhecido e improvido Unânime. (TJPA. 3ª CCI. Apelação Cível n. 200030033396. Acórdão n. 72284. Des. Rel. Leonam Gondim da Cruz Junior. D. J. 26/06/2008, D. P. 30/06/2008). Ante o exposto, CONHEÇO do recurso, para NEGAR-LHE PROVIMENTO, devendo a decisum rechaçada permanecer irretocável, por seus próprios fundamentos de fato e de direito. P. R. Intimem-se a quem couber. Belém, (PA), 24 de julho de 2014. DESA. EDINÉA OLIVEIRA TAVARES Relatora
(2014.04580609-30, Não Informado, Rel. EDINEA OLIVEIRA TAVARES, Órgão Julgador 3ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA, Julgado em 2014-07-28, Publicado em 2014-07-28)
Ementa
SECRETARIA DA 3ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA. 5ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE CASTANHAL. APELAÇÃO CÍVEL Nº. 2012.3.028528-6. APELANTE: COMÉRCIO E TRANSPORTES BOA ESPERANÇA LTDA. ADVOGADO: HAROLDO CARLOS DO NASCIMENTO CABRAL E OUTROS. APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARÁ. PROMOTORA: MÔNICA CRISTINA GONÇALVES MELO DA ROCHA. RELATORA: DESA. EDINÉA OLIVEIRA TAVARES. DECISÃO MONOCRÁTICA Trata-se de APELAÇÃO CÍVEL interposta por COMÉRCIO E TRANSPORTES BOA ESPERANÇA LTDA, nos autos da Ação de Auto de Infração, contra sentença exarada pelo M.M. Juízo da 5ª Vara Cível da Comarca de Castanhal, que julgou procedente o Auto de Infração Administrativa lavrado contra a parte requerida, condenando a Empresa Infratora, ao pagamento de sanção pecuniária fixada no valor de 05 (cinco) salários mínimos, em razão da reiteração da conduta infracional por parte da Empresa ré, destinados ao Fundo Municipal de Direitos da Infância e Adolescente, gerido pelo Conselho Municipal de Direitos da Criança e Adolescente, por incorrer na infração administrativa disposta nos dispositivos dos artigos 83 c/c 251, do Estatuto da Criança e Adolescente (Lei n. 8.069/90). A Empresa infratora inconformada com a decisum interpôs Apelação. A Apelação foi recebida no duplo efeito. O Apelado apresentou Contrarrazões, sustentando a manutenção da sentença vergastada, bem como requereu o não conhecimento e não provimento do apelo, como medida de direito e justiça. Encaminhados os autos a este E. Tribunal de Justiça do Estado do Pará, por distribuição, foram submetidos à relatoria do Exmo. Sr. Desembargador Leonam Gondim da Cruz Júnior. Os autos foram encaminhados para Procuradoria de Justiça do Estado do Pará, para manifestação e parecer. A Douta Procuradora de Justiça da 15ª PJC, manifestou-se pelo CONHECIMENTO do Recurso e pelo DESPROVIMENTO, recomendando a manutenção da sentença guerreada em todos os seus termos. Em virtude da relotação do Exmo. Sr. Desembargador Leonam Gondim da Cruz Júnior para a Seção Criminal deste E. Tribunal, coube-me a relatoria, por redistribuição em maio de 2014. Eis a síntese do necessário. Decido. Conheço do recurso por estarem preenchidas as condições de admissibilidade. A Empresa apelante requer a reforma do ato decisório. Nesse sentido, em sede de apelação pleiteia pelo reconhecimento da inexistência da infração cometida. Aduz ainda, a invalidade do auto de infração lavrado, o cerceamento de defesa, e, a fixação de multa em valor exorbitante, o que violaria o princípio da razoabilidade. Numa análise acurada dos fatos e dos fundamentos jurídicos expostos nos autos, constato que as razões recursais não merecem prosperar. Consta nos autos que a lavratura do auto de infração foi realizada por agente de Proteção Voluntária da Infância e da Juventude, in loco, a qual, no momento da lavratura do presente auto de infração observou a presença de 02 (dois) menores impúberes acompanhados pelos pais, e uma terceira criança acompanhada pela avó, e que os ascendentes dos menores não puderam comprovar documentalmente o parentesco com estes, insurgindo em plena violação ao que enunciam os dispositivos do artigo 83, caput, e § 1°, b, 1, e do artigo 251, da Lei n. 8.069/90 . Pela leitura dos textos normativos apresentados alhures, verifica-se que a viagem de criança para fora da comarca onde reside depende, em regra, de autorização judicial. A intervenção do Judiciário somente não é exigida quando: a) o deslocamento for para comarca contígua, desde que na mesma unidade da Federação ou na mesma região metropolitana; b) a criança esteja acompanhada de ascendente ou colateral maior, até o terceiro grau, comprovado documentalmente o parentesco, ou de pessoa maior, expressamente autorizada pelo pai, mãe ou responsável. No caso em exame, observa-se que a empresa de ônibus transportava crianças acompanhadas de ascendentes sem a prova documental do parentesco como os menores; logo, ainda que comprovado o vínculo parental após o desembarque ou na instrução do processo, resta configurado o ilícito administrativo previsto no art. 251, do ECA. Com efeito, é assente que o fato típico descrito no auto de infração consuma-se no momento do transporte da criança, por qualquer meio, sem observância das prescrições legais decorrentes do texto dos arts. 83, 84 e 84, do ECA, sendo irrelevante, em momento posterior ao transporte, se verificar que os menores estavam realmente acompanhados de seus genitores e avó. Nesse contexto, impende ressaltar que a finalidade do legislador, tem natureza pedagógica e preventiva, e visa, sobretudo, evitar o transporte irregular de crianças, com vista a protegê-las da ação criminosa decorrente de crimes como tráfico humano, sequestro, assassinatos e abusos sexuais, etc. Por conta disso, a comprovação documental de parentesco em momento posterior ao tempo do estado de flagrância da ocorrência do referenciado ato de infração administrativa, não elide o descumprimento das normas protetivas. Ademais, outra circunstância que ratifica a materialidade do ato de infração administrativa revela-se na narrativa escrita apresentada pela própria apelante, em suas razões recursais, quando afirma que os menores se encontravam acompanhados por seus responsáveis legais, porém, não portavam a documentação que pudesse comprovar o parentesco. Acrescenta-se ainda a isso, o fato de tanto o motorista do ônibus pertencente à Empresa apelante, quanto os genitores e a avó dos menores, terem espontaneamente assinado o auto de infração administrativa, tomando ciência de seu inteiro teor, bem como corroborando com a veracidade dos fatos ora relatados. No tocante às alegações de invalidação do auto de infração, inexistência da infração e de cerceamento de defesa, tais pretensões restam prejudicadas, pois que o auto de infração foi lavrado por agente de Proteção Voluntária da Infância e da Juventude devidamente credenciada perante o Juizado da Infância e Juventude da Comarca de Castanhal; no bojo do auto de infração constam todas as informações necessárias exigidas pelo ECA, para a tipificação, materialização e autoria da infração administrativa e o nome da agente de Proteção Voluntária da Infância e da Juventude. Não obstante, ressalta-se que, no próprio auto de infração administrativa entregue ao motorista do ônibus de propriedade da Empresa apelante há a menção sobre o que dispõe o art. 195, da Lei n. 8.069/90, dando ciência à Empresa apelante da existência da infração, da lavratura do auto de infração e do prazo legal para apresentar defesa perante o juízo, nos seguintes termos, ipsis verbis: CIÊNCIA: Fica o autuado cientificado que, nos termos da Lei 8.069, de 13/07/1990 em seu art. 195, tem o prazo de 10 dias, a partir desta data, para apresentar defesa que deverá ser entregue no Cartório desde Juízo. Ora, resta clarificado que, a prova cabal de que a empresa apelante tomou ciência dos termos do auto de infração lavrado na data do dia 15/05/2010, consiste no fato de ter protocolizado, tempestivamente, defesa escrita, sob o n. 20101005875-8, na data de 25/05/2010, desconstruindo assim a alegação de cerceamento de defesa, por falta de ciência. Quanto ao argumento de cerceamento de defesa em razão da impossibilidade jurídica de produção de provas testemunhal e do depoimento pessoal da agente de Proteção Voluntária da Infância e da Juventude, bem como pela ausência de requisição por parte do Órgão Ministerial, para realização de audiência de instrução e julgamento, vislumbra-se que no caso em tela, conforme já mencionado ao norte, é totalmente desinfluente tais procedimentos processuais, pois que o ilícito se aperfeiçoa no momento do transporte, e a produção de provas posteriores não fará desaparecer o ilícito. Destarte, não podemos olvidar que, mesmo não sendo necessária a designação de audiência de instrução e julgamento, a Juízo de Piso, através de despacho exarado às fls. 47, designou audiência de instrução e julgamento para o dia 19/10/2011, às 10:00h, todavia, conforme se depreende do Termo de Audiência, às fls. 48, na dia da audiência constatou-se a ausência das partes requeridas, e diante de tal fato a MM. Juiza a quo deliberou dispensar a oitiva do motorista, em virtude do ora requerido não ser parte legítima para responder pela infração; e, em seguida, fez os autos conclusos para sentença. Outrossim, impende ressaltar que, a natureza da lide, a constituição e o desenvolvimento processual, per si, deram condições ao Juízo a quo de sentenciar com espeque nos princípios da proteção integral à criança e adolescente, da economia e da celeridade processual, já que a matéria ora debatida é unicamente de direito(Redação dada pela Lei nº 5.925, de 1º.10.1973)http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/1970-1979/L5925.htm (Redação dada pela Lei nº 5.925, de 1º.10.1973)http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/1970-1979/L5925.htm . Portanto, afasto as argumentações acerca da ilegalidade no ato de lavratura do auto de infração administrativa, e de violação aos princípios do contraditório e da ampla defesa, vez que o curso regular do processo está em total harmonia com os princípios da legalidade e do devido processo legal, e, com as normas jurídicas de proteção integral à criança e adolescente. Em relação à tese que assevera que a multa aplicada fere os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, verifica-se que tal afirmação é inverídica, haja vista que o valor fixado a título de multa está dentro do patamar legal previsto nos termos do art. 251, do ECA, senão vejamos: Art. 251, ECA. Transportar criança ou adolescente, por qualquer meio, com inobservância do disposto nos arts. 83, 84 e 85 desta Lei: Pena - multa de três a vinte salários de referência, aplicando-se o dobro em caso de reincidência. Nesse sentido, o entendimento que sustento baseia-se na consolidada jurisprudência proferida reiteradamente pelo Superior Tribunal de Justiça, conforme se observa na ementa do RESP. Nº 568.807 - RJ (2003/0136697-1), de relatoria do Excelentíssimo Ministro Castro Meira, a seguir: ADMINISTRATIVO. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. VIAGEM. MENOR DE 12 ANOS. VÍNCULO MATERNO. COMPROVAÇÃO POSTERIOR. ILÍCITO ADMINISTRATIVO. CARÁTER PEDAGÓGICO. MULTAANTECEDENTES. REINCIDÊNCIA. TRANSPORTADORA. 1. A viagem de criança para fora da comarca onde reside depende, em regra, de autorização judicial. A intervenção do Judiciário somente não é exigida quando: a) o deslocamento for para comarca contígua, desde que na mesma unidade da Federação ou na mesma região metropolitana; b) a criança esteja acompanhada de ascendente ou colateral maior, até o terceiro grau, comprovado documentalmente o parentesco, ou de pessoa maior, expressamente autorizada pelo pai, mãe ou responsável. Inteligência do art. 83 do ECA. 2. A empresa de ônibus que transporta criança acompanhada de ascendente sem a prova documental do parentesco - ainda que comprovado o vínculo materno após o desembarque ou na instrução do processo -, comete o ilícito administrativo previsto no art. 251 do ECA. 3. O fato típico aí descrito consuma-se no momento do transporte da criança, por qualquer meio, sem observar as prescrições dos arts. 83, 84 e 85 do ECA. É irrelevante se, em momento posterior ao transporte, se verifica que o menor de 12 anos estava realmente acompanhado de ascendente ou colateral maior, até o terceiro grau. 4. As normas encartadas nos arts. 83, 84, 85 e 251 da Lei n.º 8.069/90 têm finalidade muito mais pedagógica do que repressiva. Não encerram um fim em si mesmas. Objetivam, sobretudo, evitar o transporte irregular de crianças e, assim, conter o tráfico, seqüestro e outros crimes perpetrados em desfavor desses menores. Daí, porque, na espécie, a comprovação posterior da maternidade não elide o descumprimento das normas protetivas. 5. O montante da multa administrativa não resultou de reincidência - que, se comprovada, autorizaria a aplicação em dobro da sanção -, e sim da dosagem da pena, dentro dos lindes legais, considerando outras imputações por fatos análogos à empresa de transporte. 6. Recurso especial improvido. (Recurso Especial nº 568.807 - RJ (2003/0136697-1) Rel. Ministro Castro Meira). Na mesma esteira de pensamento, o E. Tribunal de Justiça do Estado do Pará já se pronunciou da seguinte maneira: APELAÇÃO CÍVEL INFRAÇÃO ADMINISTRATIVA ART. 83, § 1º, b, DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. Auto de Infração Administrativa lavrado contra empresa de transporte rodoviário em virtude do deslocamento para comarca contígua de prováveis pais que viajavam com filhos, sem qualquer documentação comprovando o parentesco Exigibilidade Legal A empresa de ônibus que transporta criança acompanhada de ascendente sem a prova documental do parentesco, ainda que comprovado o vínculo após o desembarque ou na instrução do processo, comete o ilícito administrativo previsto no art. 251, do ECA. As normas encartadas na Lei nº 8.069/90, têm finalidade muito mais pedagógica do que repressiva. Objetivam, sobretudo, evitar o transporte irregular de crianças e, assim, conter o tráfico, seqüestro e outros crimes perpetrados em desfavor de menores. Precedentes do STJ. Recurso conhecido e improvido Unânime. (TJPA. 3ª CCI. Apelação Cível n. 200030033396. Acórdão n. 72284. Des. Rel. Leonam Gondim da Cruz Junior. D. J. 26/06/2008, D. P. 30/06/2008). Ante o exposto, CONHEÇO do recurso, para NEGAR-LHE PROVIMENTO, devendo a decisum rechaçada permanecer irretocável, por seus próprios fundamentos de fato e de direito. P. R. Intimem-se a quem couber. Belém, (PA), 24 de julho de 2014. DESA. EDINÉA OLIVEIRA TAVARES Relatora
(2014.04580609-30, Não Informado, Rel. EDINEA OLIVEIRA TAVARES, Órgão Julgador 3ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA, Julgado em 2014-07-28, Publicado em 2014-07-28)Decisão
DECISÃO MONOCRÁTICA
Data do Julgamento
:
28/07/2014
Data da Publicação
:
28/07/2014
Órgão Julgador
:
3ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA
Relator(a)
:
EDINEA OLIVEIRA TAVARES
Número do documento
:
2014.04580609-30
Tipo de processo
:
Apelação
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